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Discurso do Exmo. Sr. Bispo Diocesano

"Quanto temos desejado entrar em cada um de vossos lares e de vossos corações!"

Por ocasião da inauguração, largamente noticiada pela imprensa diária, da Radio Católica de Campos -- que teve lugar no dia 11 de fevereiro p.p., centenário da primeira aparição de Nossa Senhora em Lourdes — o Exmo. Revmo. Sr. Bispo Diocesano,- D. Antonio de Castro Mayer, proferiu a alocução que temos a honra de publicar:

Os moralistas, os psicólogos, os literatos têm tratado com frequência do tema sacrossanto e insondável que é o amor materno. E quanto mais dele se ocupam, tanto mais se lhes torna patente que o afeto posto pela Providencia no coração de urna mãe, conserva sempre um fundo de riquezas inesgotáveis a respeito do qual jamais se conseguirá dizer a última palavra. Entretanto, qualquer mãe, por modesta e pouco instruída que seja, sabe, em toda a sua realidade, o que é esse potencial de amor e dedicação que lhe vibra na alma.

Na Sagrada Escritura, Deus se serve com frequência do amor paterno ou materno como termo de comparação para nos fazer entender quanto nos ama. Contudo, num tópico que talvez sobreleve a todos em poder de expressão, Ele afirma que o amor divino excede incomparavelmente a tudo quanto possa haver de ternura no coração materno : "Meu pai e minha mãe me abandonaram. O Senhor, porém, me tomou sob sua guarda" (Sl. 26, 10) .

Ora, o amor sobrenatural que o Bispo tem aos seus diocesanos, como participação que é do próprio amor divino, é igualmente insondável, superior à capacidade de expressão da palavra humana, e mais profundo que todo afeto natural.

Quantas vezes, diletos filhos, temos sentido o desejo de entrar em cada um de vossos lares, mais ainda, em cada um de vossos corações, para aí, em contacto direto e íntimo de alma a alma, vos dizer as palavras de vida que o Divino Salvador pôs nos lábios dos Apóstolos e seus Sucessores. Pensamos, neste momento, muito particularmente naqueles que, vivendo afastados da Igreja, estão também longe de nossa convivência pessoal; visitamo-vos muito afetuosamente, nesta primeira emissão da Radio Católica de Campos, caríssimos filhos. É-nos dado, finalmente, realizar pelo rádio esse nosso velho anseio. É ela a Rádio que a Santa Igreja organizou especialmente para entrar em vossos lares, para estar a disposição de vossas necessidades espirituais, a todas as horas, nos momentos de dor, de dúvida ou alegria.

Neste instante em que ouvis a voz de vosso Pastor, a graça do Espírito Santo, que age continuamente nas almas, também atua misteriosamente em cada um de vós. "Hodie si vocem eius audieritis, nolite obdurare corda vestra" (Si. 94, 8 ) . Ao ouvir a voz da própria Igreja, mesmo os mais afastados sentirão uma nostalgia profunda da Fé que professaram na sua infância, daquele estado de alma tranquilo, límpido e cheio de louçania, que neles produzia a inocência. Esta nostalgia é um convite que Deus vos faz para que, como o filho pródigo, regresseis ao lar paterno. Bem sabemos que nesse caminho de volta, dificuldades e perigos de toda ordem vos esperam. O primeiro deles é a vossa própria fraqueza, acentuada, quiçá, por anos inteiros de lamentável capitulação diante do vício e do pecado. Entretanto, como outrora os Anjos de Belém, o vosso Bispo vos anuncia uma grande alegria. Não há caminho fechado nem obstáculo insuperável para quem reza deplorando seus extravios e pedindo o socorro divino. A cada um de vós o Salvador, realmente presente no Tabernáculo, espera com as palavras: Vinde a mim os que estais fatigados e Eu vos consolarei (cf. Mt. 11, 28) . Se vos desalenta o vosso pecado, lembrai-vos de que em todas as igrejas existe a imagem materna dAquela que é, não só o Auxílio dos cristãos, mas a Virgem do Perpétuo Socorro, refúgio pacientíssimo de todos os pecadores.

A vós, pois, amados filhos, com este convite à esperança e à emenda, se abre de modo todo particular, vibrante de amor sobrenatural e paterno, o coração de vosso Bispo. Rejubila-nos a idéia de que este contacto não será efêmero, mas dia a dia, hora a hora, a Radio Católica tornará presentes em vossos lares a doutrina e o amor de Nosso Senhor Jesus Cristo.

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REVMOS. Srs. Padres, damos por bem empregados todos os empenhos e todos os esforços que efetuamos para que chegasse este momento em que os filhos de Santo Afonso de Ligorio, sob a sabia direção do Pe. Anselmo Meinders, com a eficiente cooperação do Pe. Ambrosio Wynen e do Pe. Raimundo Almeida Pinto, começam uma nova e esplêndida etapa de seu apostolado na Diocese. Nosso pensamento volta-se neste instante com afetuosa simpatia para o Revmo. Provincial, Pe. Gregorio Wuts, sem cuja valiosa aprovação e incitamento não teríamos chegado a este momento feliz; e também para o Pe. Lucas Veeger, zeloso ideador deste empreendimento, ao qual pertence grande parte dos méritos e das alegrias deste ato inaugural.

Em torno deste núcleo central consideramos com afeto e gratidão a vasta falange dos membros da Liga Jesus Maria José, que tanto concorreram para converter em realidade o ideal da Rádio Católica, e todo o povo de nossa Diocese, que com tão larga generosidade contribuiu para este fim.

Aproveitamos o ensejo para agradecer ao Exmo. Sr. Presidente da República, Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela alta simpatia com que acedeu a nosso pedido de concessão de uma rádio emissora católica em Campos. Retribua-lhe a Providência Divina em copiosas graças o benefício assim prestado à população desta Diocese.

Em ato tão solene é-nos impossível manter sob silêncio o nome venerando de nosso amado Metropolita, o Emmo. Cardeal D. Jaime de Barros Câmara, Arcebispo do Rio de Janeiro. Queira Sua Eminência receber neste ato a expressão de nosso profundo acatamento e sincero afeto.

Vai ainda para mais alto nosso coração. Na Cidade Eterna, abre-se ele com indizível respeito e entranhado amor ante a figura imortal do Vigário de Jesus Cristo, Sua Santidade o Papa Pio XII, gloriosamente reinante. É em conformidade com os riquíssimos ensinamentos de sua Encíclica "Miranda prorsus" que nos abalamos a uma utilização, em toda a sua amplitude, deste novo meio de apostolado.

Sua Santidade faz-se representar em nosso país pela figura ilustre do Exmo. Remo. Sr. D. Armando Lombardi, Núncio Apostólico. Voltamo-nos em espírito para esse ilustre Prelado, depositando em suas mãos nosso propósito de, na mais intima união com a Santa Sé, trabalhar pelo rádio para a exaltação da Santa Igreja.

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A exaltação da Santa. Igreja, Revmos. Padres, amados filhos, outra coisa não é senão a exaltação da Cruz augusta de nosso SS. Redentor, Nosso Senhor Jesus Cristo. — "Quando fôr exaltado, atrairei a Mim todas as coisas. — Si exaltatus fuero onmia traham ad meipsum" .(Jo. 12, 32) . Missionária constante, a Radio Católica de Campos não terá outra linguagem, nem outros métodos, senão os que Santo Afonso de Ligorio idealizou e dispôs para atrair todos os povos ao grêmio da Igreja

Apresentar a verdade no encanto de sua simplicidade, na nobreza de sua austeridade, sem mitigações nem concessões, procurando restituir aos homens o gosto pelo que é serio, grave e recolhido, combatendo a sede incessante de prazeres, a dissipação total dos espíritos, o sensacionalismo fácil dos noticiários superficiais e vazios, eis o programa que juntos seguiremos. Estas são as notas que caracterizam o timbre da voz de Jesus Cristo. Ainda nos mais distantes arraiais, suas ovelhas a conhecerão e ouvirão: "Minhas ovelhas ouvem a minha voz" (Jo. 10, 27).

Para que tantas graças circulem pelas ondas desta emissora, é preciso que esteja ela muito ligada com o canal de todas as dádivas divinas, que é Maria Santíssima, Senhora Nossa, Medianeira universal da graça de Deus. Queira Ela receber, como humilde tributo de nosso amor, esta Rádio que para seu serviço neste momento oferecemos e consagramos ao seu Coração Imaculado. A Rádio Católica de Campos terá realizado com- superabundância os nossos desígnios se concorrer para a preparação dos dias gloriosos, que São Luís Maria Grignion de Montfort anteviu, do Reinado de Maria.

Precisamente há cem anos ocorreu em Lourdes a primeira aparição de Nossa Senhora. Escolhemos para a presente cerimônia inaugural, este centenário que foi marco inicial de uma incontável série de favores. A era das graças especiais que se abriu a 11 de fevereiro de 1858, culminou com a mensagem de Fátima. Lourdes e Fátima são os dois elos extremos da mesma sequência áurea. O espírito desta Rádio será o da Mensagem de Fátima. Melhor programa não poderia haver para os homens, do que a linguagem amorosa de nossa Mãe Celeste".


GESTO PONTIFÍCIO DE LARGA REPERCUSSÃO

Sua Santidade o Papa Pio XII houve por bem conferir as insígnias da Ordem de São Silvestre, no grau de Comendador, ao Prof. Dr. Antonio Ablas Filho.

A Ordem de São Silvestre foi criada em 1841 pelo Papa Gregório XVI, para premiar méritos relevantes adquiridos no serviço da Igreja.

O gesto paternal do Sumo Pontífice, conferindo-a ao Prof. Dr. Antonio Ablas Filho, vem, premiar longa e esplêndida folha de serviços por este prestados à Diocese de Santos, em que reside.

Militando com denodo e brilho nas fileiras marianas desde sua juventude, S. Sa. também se distinguiu por sua atividade nas Conferencias de S. Vicente de Paulo e na Ordem Terceira do Carmo da qual foi Prior. Foi, outrossim, Presidente do Centro Frederico Ozanam daquela cidade. S. Excia. Revma. o Sr. D. Idilio José Soares, ao fundar a Ação Católica em sua Diocese, nomeou-o Presidente de sua primeira Junta Diocesana. Depois de prestar também nessas funções os mais assinalados serviços, o Prof. Dr. Antonio Ablas Filho foi eleito Presidente da Federação Mariana e da Adoração Perpétua Diocesanas, cargos que atualmente ocupa.

Sendo um dos elementos de maior destaque no meio médico de Santos, foi convidado para reger a cátedra de Medicina Legal na Faculdade de Direito daquela cidade, o que vem fazendo com raro brilho.

Por todas estas razões, o ato do Sumo Pontífice teve em Santos a mais grata e profunda repercussão, tanto nos meios religiosos, como intelectuais e sociais, irradiando-se dai para tantos outros lugares onde gozam da maior consideração o novo dignitário, bem como sua esposa, Da. Julia de Freitas Guimarães Ablas, a conhecida escritora católica e talentosa organizadora do Coro São Pio X.

Sendo o Prof. Dr. Antonio Ablas Filho agente de "Catolicismo" no sul do pais, estamos certos de que todos os leitores desta folha se rejubilarão com o justíssimo prêmio dado pelo augusto Pontífice ao valoroso líder católico santista.


"ABENÇOE O SENHOR OBRAS DE TANTO ZELO E FERVOR"

Em 1º de janeiro p.p., o Exmo. Revmo. Sr. Bispo Diocesano escreveu à Sagrada Congregação dos Seminários e Universidades, para dar notícias do primeiro ano de existência do Seminário Menor fundado por S. Excia. Revma. Em resposta, recebeu a seguinte carta (que traduzimos do original italiano) , assinada pelo Emmo. Cardeal José Pizzardo e subscrita pelo Exmo. Revmo. Mons. Carlos Confalonieri, respectivamente Prefeito e Secretario daquela Sagrada Congregação:

"Roma, 11 de janeiro de 1958

Excelência Reverendíssima,

Recebi com grande prazer Sua carta de 1º de janeiro deste ano, na qual Vossa Excelência nos informa que o Seminário Menor dessa Diocese completou seu primeiro ano de vida de maneira de todo satisfatória, quer do ponto de vista da disciplina, quer dos estudos.

O novo prédio, cujas obras já se acham notavelmente adiantadas, constitui o fruto de Seu zelo indefesso e da dedicada colaboração do Clero e dos Fiéis. Estamos certo de que logo, com a ajuda de Deus, o nobre afã de Vossa Excelência encontrará seu digno coroamento.

Para este ano está prometida a construção da casa de campo: outra obra providencial que legará de modo imperecível o nome de Vossa Excelência à amada Diocese de Campos.

Admirado com obras de tanto zelo e fervor, enquanto me é grato exprimir-lhe meus aplausos mais sinceros e cordiais, rogo ao Senhor que Se digne abençoar Sua solerte atividade e realizar Suas santas intenções.

Com protestos de particular estima e simpatia me confirmo

de Vossa Excelência Reverendíssima

devotadíssimo no Senhor

J. Card. Pizzardo

† C. Confalonieri"


AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES

Trabalho-diversão e

trabalho-heroísmo

Plinio Corrêa de Oliveira

Fisionomias inteiramente distendidas. Sorrisos em todos os lábios.

Atitudes que exprimem um alto grau de bem-estar físico e psíquico. Os trajes, em meios-tons claros e discretos, reforçam esta impressão. O que fazem estes jovens? Se estivessem em torno de uma mesa de chá, num salão "cosy", seu modo de ser não seria outro. Mas o que é esta mesa? Jogam nela algum jogo novo e estranho, que lhes dá tanta e tão distensiva distração? Longe disto.São operários, que trabalham numa fábrica...

Esta visão do trabalho é evidentemente mentirosa. Todo trabalho exige esforço. E o esforço cansa, pesa, desgasta. Ora, deste quadro, precisamente as idéias de cansaço, peso e desgaste estão inteiramente banidas. Dir-se-ia que não houve o pecado original, e que o suor, esse terrível símbolo do esforço penoso, não é inerente ao trabalho.

Claro está que, em circunstâncias especiais, a atividade profissional pode ser sumamente aprazível e distensiva. Mas essas circunstâncias são efêmeras. Por pouco que o trabalho se prolongue, ou se repita, o cansaço e a impressão penosa de luta começam a aparecer.

Que um desenhista tenha resolvido figurar nesta falsa luz o trabalho, não é coisa de maior monta. O importante está em que seu desenho é expressão típica de uma tendência muito generalizada em nossa época: um horror fundamental a todo sofrimento, que conduz a ocultar a dor e a apresentar o universo como um paraíso de delícias. A dor seria principalmente produto subjetivo da mente. Se o homem sorrisse diante de tudo, teria eliminado o sofrimento, senão totalmente, pelo menos em grandíssima parte.

Daí provém a frase famosa: quebre a perna e continue sorrindo.

É esta concepção da vida, fútil, falsa, convincente só para tolos, que a gravura exprime. Ela se resume em duas palavras: neopaganismo naturalista.

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Rosto longo, traços finos e firmes, olhar penetrante e resoluto, segurando com vigor varonil um grande remo, este pescador basco tem uma rude profissão em que sua alma se plasmou e dignificou. Em todo o sentido da palavra, ele é um homem. E um homem que tem a altaneria cavalheiresca de um verdadeiro cristão, de um católico autêntico.

Toda a sua personalidade é marcada pelo esforço, pela luta, pelo risco. Vê-se que inúmeras vezes ele enfrentou os furores ou as traições do oceano, e os dominou. E que está inteiramente disposto a uma série incontável de outras empresas audazes.

Subjacente à fisionomia deste trabalhador, e ao ambiente que ela traz consigo, está toda uma concepção católica do trabalho e da dor. O sofrimento existe. Mas é um dom admirável de Deus para que o homem, auxiliado pela graça, tempere e eleve sua personalidade. São Francisco de Sales chamava o sofrimento o oitavo Sacramento. Ocultar a dor é esconder um dos mais nobres e importantes aspectos da existência. Se se analisar bem a vida, ver-se-á que quase toda ou toda a beleza que ela contém resulta de uma dor nitidamente antevista e nobremente suportada até o fim. O que seria este pescador, sem as grandes lutas de sua existência? Não são elas a sua genuína e rútila gloria?

É obvio que, sem o auxílio da graça, o homem não pode suportar retamente e em sua totalidade os esforços e sacrifícios de mil gêneros, que a vida impõe. Mas, quando a alma corresponde à graça, ela é capaz dessa grande e gloriosa conformidade com a dor.

Daí a concepção católica do trabalho, em que precisamente o que este tem intrinsecamente de mais belo está em ser penoso.