OS ENSINAMENTOS DOUTRINÁRIOS DO GRANDE BISPO DE CAMPOS SOBRE A INVASÃO DE TERRAS SÃO NOTÁVEIS PELA CLARIVIDENCIA E FIRMEZA
(continuação)
se demita de suas funções naturais e entregue às multidões, máxime quando açuladas por agitadores, o encargo de decidir em que casos há carência no exercício da função social da propriedade, e mais ainda a atribuição de fazer justiça por suas próprias mãos.
"Sem insistir em tudo quanto há de grave no fato, peço vênia para fazer notar a Vossa Excelência o seguinte: segundo as próprias diretrizes atribuídas ao Governo Fluminense, havendo efusão de sangue, a polícia deveria intervir. Semelhante norma importaria em que ou o proprietário resistiria legitimamente à mão armada para impor a intervenção da polícia, ou perderia seu direito.
"Em consequência, Sr. Governador, é para um regime de guerra privada e de vendeta, à qual muito em breve se misturariam as manobras da politicagem e do comunismo, que as deliberações atribuídas ao Governo Fluminense conduziriam nosso tão querido Estado do Rio, merecedor, por certo, de melhor sorte.
"Eu não me sentiria bem, Sr. Governador, se, como Bispo de uma das zonas mais tradicionais e prósperas deste glorioso Estado, não me dirigisse a Vossa Excelência a fim de lhe pedir que desminta a notícia, se falsa, ou revogue aquela diretriz, se efetivamente foi dada. Ainda segundo notícias de alguns jornais, tratar-se-ia de fazendas apropriadas por invasão de direito alheio, portanto pertencentes a pessoas sem título legítimo de propriedade. Neste caso, seria de alta conveniência declará-lo de público, para sossego daqueles que se alarmaram diante das perspectivas em que a diretriz atribuída ao Governo de Vossa Excelência os colocou.
"Vossa Excelência sabe com que cuidado me tenho mantido alheio às lutas e competições partidárias, ocupado tão somente no exercício de minha função pastoral. Se, pois, me dirijo a Vossa Excelência no sentido supra, faço-o com inteiro desprendimento de qualquer motivo terreno, e com o intuito de servir, como é meu dever de Bispo, à causa da harmonia social, baseada nos princípios sagrados da civilização cristã. Estou certo de que, por esta forma, presto um concurso eficiente para o êxito do governo de Vossa Excelência, pois êxito não pode haver fora das vias traçadas para as pessoas, como para os povos e os governos, por Nosso Senhor Jesus Cristo.
"Certo de antemão da favorável acolhida que à presente dará, Vossa Excelência, antecipo desde já meus agradecimentos, e rogo a Deus que favoreça com suas bênçãos a pessoa de Vossa Excelência, a sua Exma. Família, e o Estado do Rio que todos entranhadamente amamos".
A esta carta, o Exmo. Sr. Governador Dr. Celso Peçanha respondeu com amável missiva, da qual destacamos os tópicos seguintes:
"Apreciei, com a alta consideração que dispenso a Vossa Reverendíssima, as sabias e adequadas ponderações sobre a situação, à qual o meu Governo tem estado atento, através ordens expressas expedidas ao organismo competente: — a Secretaria de Segurança Pública, sempre no sentido do máximo respeito ao direito de propriedade, prestigiando a ação da Justiça, quando as dissensões estejam sub-judice, e agindo eficientemente, quando o assunto se circunscreva à área de ação policial.
"Jamais o meu Governo poderia omitir-se a respeito, sem que viesse a faltar a uma das suas mais elementares atribuições, qual seja a de zelar pelo bem público, promovendo-lhe a paz e o ambiente indispensável ao trabalho e ao progresso.
"E, para que Vossa Reverendíssima possa melhor conhecer das ordens que tenho expedido, junto a este oficio a notícia que me dá o titular daquela Secretaria e por onde se verifica estar a autoridade pública em vigília constante, para que se respeitem as leis vigentes no país, notadamente as que se relacionam com a segurança e garantia de todos os cidadãos, mantendo-se o Governo na sua posição de tutelar os direitos de todos os seus jurisdicionados.
"Conforme há de verificar Vossa Reverendíssima, de forma alguma existe a mínima parcela de contribuição para o fomento de quaisquer situações irregulares e ilegais, que só podem encontrar, como têm encontrado, toda a repulsa e ação repressiva da autoridade constituída".
Da carta dirigida ao Exmo. Sr. Governador pelo DD. Secretário da Segurança Pública, Sr. Dr. Theodoro Gouvêa de Abreu, destacamos as seguintes afirmações:
A Secretaria de Segurança Pública não está alheia às investidas de indivíduos armados contra a propriedade imobiliária rural. Ao contrário, tem efetuado detenções pessoais e apreensão de armas.
O que não tem feito a Secretaria de Segurança é intrometer-se em questões de posse e domínio, eis que esse assunto é da alçada do Poder Judiciário, provocada por uma das partes interessadas. Quando ocorre essa hipótese, isto é, discussões de posse ou domínio entre proprietários e cidadãos que já ocupam a terra, não pode efetivamente o aparelhamento policial tomar nenhuma iniciativa, aguardando sempre a solicitação da Justiça.
Quanto a piquetes que se organizam de elementos estranhos à terra a ser ocupada, a Secretaria não permitirá a invasão, como ocorreu recentemente no Município de Cachoeira de Macacu".
Divulgando esta correspondência, de acordo com o Exmo. Sr. Governador do Estado, é Nosso intuito desfazer todo o mal que a circulação das referidas notícias vinha fazendo na população de Nossa amada Diocese.
Folgamos em manifestar de público Nosso contentamento pelas informações e garantias que pressurosamente Nos deu o Exmo. Sr. Governador Dr. Celso Peçanha.
Dado e passado em Nossa Episcopal Cidade de Campos, sob selo e sinal de Nossas armas, aos 13 dias do mês de dezembro do ano de 1961.
VERBA TUA MANENT IN AETERNUM
• A doutrina de Cristo não pode conciliar-se com as veleidades e desejos do mundo
JOÃO XXIII: Temos como ponto de orientação a antiga tradição, a antiga escola de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ela se harmoniza e se ajusta com as numerosas exigências da vida moderna. Mas quando se diz que as condições atuais admitem, ou aconselham, ou toleram tal ou tal outra coisa contraria a esta escola, deve-se responder resolutamente: não. Assim é que, por exemplo, cumpre repelir toda tentativa que vise atingir a modéstia e a pureza na vida, na ação, na visão, na palavra, na imprensa, em todas as outras manifestações; e deve-se ter sempre presente que a doutrina de Cristo não pode conciliar-se com as veleidades e desejos do mundo. —(Discurso pronunciado na Audiência Geral em Castelgandolfo, de 27-VII-1960, de acordo com o resumo publicado pelo "Osservatore Romano" em língua francesa, de 5-VIII-1960).
• Escola neutra ou laica: reinado tirânico e todo-poderoso de uma seita tenebrosa
SÃO PIO X: A necessidade desta instituição (das escolas católicas) parece aumentar manifestamente em razão da evolução dos tempos e dos costumes modernos. A este motivo se acrescenta a existência dessas escolas públicas, despojadas de toda religião, em que se considera como que um divertimento o pôr em ridículo as coisas mais santas, e onde os lábios do mestre e os ouvidos dos discípulos se acham igualmente abertos à impiedade. Referimo-Nos a essa escola que por suma injustiça se intitula neutra ou laica, quando outra coisa não é, na realidade, senão o reinado tirânico e todo-poderoso de uma seita tenebrosa. Este novo jugo de uma liberdade hipócrita, vós já o tendes denunciado em alta voz e com intrepidez, Veneráveis Irmãos, principalmente nesses países em que os direitos da Religião e da família foram mais ousadamente calcados aos pés; em que a própria voz da natureza, que ordena preservar a fé e o candor da juventude, foi sufocada. — (Encíclica "Editae Saepe Dei", de 26-V-1910).
• Têm valor no Corpo Místico de Cristo as orações particulares?
PIO XII: Há ainda alguns que afirmam não terem as nossas preces verdadeira eficácia impetrativa, bem como trabalham por espalhar a opinião de que a Oração feita em particular pouco vale e é a oração pública, feita em nome da Igreja, que tem verdadeiro valor, por partir do Corpo Místico de Jesus Cristo. Não é exato; o Divino Redentor não só uniu estreitamente a Si a Igreja como Esposa amantíssima, senão também nEla as almas de todos os fiéis e de cada um deles, com quem deseja ardentemente entreter-Se na intimidade, sobretudo depois da Comunhão. E, embora a oração pública, feita por toda a Igreja, seja mais excelente que qualquer outra, graças à dignidade da Esposa de Cristo, contudo todas as orações, ainda as mais particulares, têm o seu valor e eficácia, e aproveitam grandemente a todo o Corpo Místico, no qual não pode nenhum membro fazer nada de bom e justo que, em razão da Comunhão dos Santos, não contribua também para a salvação de todos. Nem aos indivíduos, por serem membros desse Corpo, se lhes veda pedirem para si graças particulares, mesmo temporais, com a devida sujeição à vontade divina; pois que continuam sendo pessoas independentes com suas indigências próprias (cf. S. Tom., II-II, q. 83, a. 5 e 6). Quanto à meditação das coisas celestes, os documentos eclesiásticos, a prática e os exemplos de todos os Santos provam bem em quão grande estima deve ser tida por todos. — (Encíclica "Mystici Corporis Christi", de 29-VI-1943).
Aspectos da Velha Goa, conquistada em 1510 por Afonso de Albuquerque e até o século passado capital da Índia Portuguesa: a Catedral, outrora sede do Padroado do Oriente; o Arco dos Vice-Reis, por onde estes entravam na cidade para tomar posse do governo da Índia; o sarcófago de prata lavrada que contém o corpo incorrupto de São Francisco Xavier, na Igreja do Bom Jesus.
Revolução e Contra-Revolução
em trinta dias
Plinio Corrêa de Oliveira
No decurso de todo este ano, a expectativa dos fiéis se voltará, cheia de veneração e esperança, para o II Concílio do Vaticano, que, conforme a Constituição Apostólica “Humanae Salutis”, assinada pelo Santo Padre João XXIII no último Natal, será inaugurado em dia e mês ainda não marcados de 1962.
Entre as conjeturas concernentes ao Concílio, algumas há que fazem sorrir. Ou, antes, fariam chorar se pudessem ser tomadas a sério. É o que caberia dizer, por exemplo, da ideia de que, ansiosa por realizar a unidade entre os cristãos, a Santa Igreja haveria de renunciar a uma parte de sua doutrina. Mas isto é sempre assim. O espírito das trevas semeia confusão em toda a medida do possível. E acaba sempre derrotado pela Igreja Infalível.
Entretanto, este confusionismo tem uma importância secundária, em comparação com o grande movimento de ardor religioso que a perspectiva da abertura da santa e majestosa assembleia vai despertando, e cada vez mais despertará.
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Registramos com viva satisfação o fato de haver a Câmara Municipal de Campos, por iniciativa do vereador Severino Veloso de Carvalho, aprovado por unanimidade uma moção de louvor à monumental “Carta Pastoral prevenindo os diocesanos contra os ardis da seita comunista”.
Com esse pronunciamento o Legislativo campista deixa patente a alta oportunidade, para a própria sociedade temporal, dos sábios e brilhantes ensinamentos do grande e destemido Bispo D. Antonio de Castro Mayer.
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Destacamos com júbilo o gesto pelo qual Sua Santidade o Papa João XXIII concedeu a venera de Comendador da Ordem de São Gregório Magno ao ilustre católico argentino Sr. Jorge Pereda. Figura de relevo nos ambientes rurais da nação irmã, S. Excia. é leitor assíduo de “Catolicismo”, e propugnador dedicado e eficiente das ideias sustentadas no livro “Reforma Agrária — Questão de Consciência”.
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Os comentários desta secção não podem deixar de ser consagrados, hoje, em grande parte, à invasão de Goa, Damão e Diu. Em resumo, constituiu ela uma agressão cínica e brutal, que desperta indignação, até mesmo em nosso século cuja história está tão cheia de traços de brutalidade e cinismo.
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Quais os argumentos da Índia? Que, sendo Goa, Damão e Diu “enclaves” na península hindu, pertencem naturalmente à Índia. E que essa simples consideração anula quatrocentos anos de história, e dá à Índia o direito de se atirar sobre aquelas possessões portuguesas.
O argumento não poderia ser mais pueril. Ele envolve a afirmação de que um país não pode jamais ceder a outro, legitimamente, um “enclave” em seu território. Ou que um país não pode adquirir em justa guerra um “enclave” em território de outrem. Ora, tanto um quanto outro pressuposto é manifestamente falso. Uma nação soberana pode, por justas razões, renunciar a uma parcela de seu território. Uma nação empenhada em guerra justa pode ressarcir os danos que lhe provêm do adversário, mediante alguma proporcionada parcela do território deste. E, pois, a simples condição de “enclave” não é uma prova de ilegitimidade de domínio.
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A Inglaterra e os Estados Unidos se mostraram absolutamente frios ante a queda de Goa, como a reconhecer a legitimidade da agressão praticada por Nehru.
Como explicar então que se mantenham inteiramente à vontade em autênticos “enclaves”, como Gibraltar e a Zona do Canal do Panamá?
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Mas, dir-se-á, a aquisição de Goa, Damão e Diu foi ilegítima. Por isto, é natural que contra ela se volte a Índia espoliada.
Sem entrar na discussão referente à legitimidade da conquista lusa - e Portugal teria aí bons argumentos a alegar - seria o caso de exigir que todas as conquistas territoriais praticadas nos últimos quatro séculos fossem revistas, para se lhes apurar a legitimidade, e assim se voltar ao “statu quo” vigente há cem, duzentos ou até quatrocentos anos atrás. Se o bom senso mostra o desatino desse alvitre, por que aplicá-lo só a Goa, Damão e Diu?
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Objetará algum teimoso que a população das possessões portuguesas na Índia é toda hindu, e por isto aplaudiu o gesto de Nehru. Este argumento é um tecido de inverdades. A população de Goa, Damão e Diu não é toda hindu, e não há a menor prova séria de que ela quisesse a anexação. Antes, há prova do contrário. Com efeito, se Nehru tinha tal certeza da adesão dos habitantes dos “enclaves”, por que não reptou Portugal a fazer um plebiscito sob controle internacional? Nehru, o liberal, o não-intervencionista, o aparente adorador do mito rousseauniano da soberania popular, teria ficado coerente consigo mesmo, caso assim tivesse agido.
Astuto como uma raposa, o “premier” hindu bem podia prever o imenso prejuízo que lhe adviria de seu ato de violência. E se a ele se decidiu, só pode ter sido pela convicção de que a via plebiscitária lhe seria inútil.
Caíram os “enclaves”, e isto é lamentável. Mas ao mesmo tempo caiu a máscara de Nehru, e isto é magnífico.
Pobre máscara, que se tornara diáfana e esfarrapada depois da aprovação da ominosa conduta soviética por ocasião do levante húngaro. Só se iludiam ainda com ela os tolos, porque só a tolos podia ela velar ainda a realidade. Parece que agora nem os tolos nela acreditam. Isto é de uma importância política imensa, pois nunca os tolos foram mais numerosos, mais arrogantes e mais considerados que em nossos dias!
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Que dizer do aplauso de Kruchev à agressão hindu? Não vale a pena, entre gente séria, comentá-lo. Há algo de mais evidente, de mais constante, de mais banal do que a solidariedade entre os autores de crimes idênticos?
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Não nos indignamos apenas à vista de uma grave injustiça. Aflige-nos a queda do grande baluarte cristão na Índia, chamado a Roma do Oriente, relicário do corpo de São Francisco Xavier e foco de irradiação da Fé em todo aquele país.
Não foi só, e talvez não tenha sido principalmente Portugal, quem perdeu, mas a Igreja. Isto explica o sentido mais profundo da alegria do ditador soviético. E nos deixa perplexos ante a “moderação” do protesto brasileiro.