Descendo sob a borrasca
Degrau a degrau, o homem contemporâneo, vítima da Revolução, vai descendo sob a borrasca para os abismos que preparou em seu trajeto a grande impiedade do século XVI, agravada pela ignominiosa revolução de 1789: espera-o a fauce hiante do comunismo, que é uma consequência lógica dos erros do protestantismo e da Revolução Francesa.
Graças a Deus, por todo o mundo, uma renovação de fé íntegra dá razões para esperar. A borrasca, aliás, é também ela um convite para que o filho pródigo interrompa sua caminhada, e retorne à casa paterna.
Pensando, criticando, matizando e esperando na borrasca do século XX
Plinio Corrêa de Oliveira
Da gloriosa Polônia, que a tirania comunista reduziu à categoria de nação exangue e indigente, nos veio através das agências telegráficas uma notícia confrangedora: prosseguindo em sua política de estatalização progressiva, o governo decretou, a partir do dia 1º de janeiro deste ano, o fechamento de todos os escritórios de advocacia particulares. De então por diante, os advogados que desejarem continuar na profissão, deverão trabalhar, ou a serviço direto do Estado, ou para as cooperativas (controladas, todas, pelo Estado), ou em escritórios coletivos de advocacia.
Poucas medidas podem ser tidas como mais odiosas do que esta. Com efeito, o seu resultado consiste em que nenhum ou quase nenhum advogado poderá exercer sua profissão com verdadeira independência em relação ao governo.
No que diz respeito aos advogados a serviço do Estado, ou de cooperativas paraestatais, a asserção é evidentemente verdadeira.
Quanto aos escritórios coletivos, ela não é tão evidente, se bem que igualmente certa. Com efeito, a maioria, em todas as profissões, é habitualmente acomodatícia e submissa. Os escritórios coletivos de advocacia não soem escapar à regra. Em consequência a maior parte dos advogados dificilmente aceitará como colegas nos ditos “escritórios coletivos”, profissionais que exerçam sua missão de forma a incorrer no desagrado de um Poder Público iracundo, que tem à sua disposição mil e mil modos para pressionar a magistratura e perseguir os causídicos seus desafetos.
Isto equivale a afirmar que poloneses que queiram entrar em juízo contra o governo, ou que por qualquer motivo hajam incorrido na cólera deste, não disporão em nenhum caso de assistência jurídica de confiança. Seus advogados serão os próprios asseclas de seu onipotente adversário.
Isto só, já bastaria para reduzir a nossa tão querida e infeliz Polônia às condições jurídicas de uma taba de índios...
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Se um decreto como este – censurável em qualquer país por ser intrinsecamente mau – fosse publicado por algum governo anticomunista, por certo se levantaria no mundo todo um alarido de protesto.
Esse protesto não partiria, como é óbvio, só das cidadelas comunistas, e dos subúrbios destas, que são os meios socialistas. Ele encontraria eco espalhafatoso e estridente em muitos arraiais demo-cristãos, “católicos progressistas”, burgueses “esclarecidos”, etc.
Como os Srs. Paulo de Tarso, Plinio Arruda Sampaio, André F. Montoro, por exemplo, ficariam indignados!
Mas, essa violência exercida em proveito do comunismo passou sem despertar cóleras maiores.
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As mesmas cidadelas, os mesmos subúrbios e arraiais, existentes por este mundo afora, são truculentamente favoráveis à supressão do regime colonial onde quer que ainda exista. Viram sem protestos a queda de Goa. E não almejam senão a expulsão de Portugal de Angola e de Moçambique.
Entretanto, no dia 7 de março p.p., a Agência Tass de Moscou publicava uma “declaração autorizada”, pronunciando-se violentamente pelo “statu quo” brutal e injustamente colonialista na Alemanha Oriental.
E isto não contristou a nenhum destes Srs. Ao menos, se os contristou, não o disseram, ou o disseram bem, bem baixinho...
Que inefáveis Srs. habitam essas cidadelas, subúrbios e arraiais...
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Os mesmos Srs., iguais a si próprios em todas as latitudes, tiveram crises de lágrimas humanitárias, quando uns tantos ou quantos bonzos se suicidaram em Saigon. Nós também lamentamos profundamente esses atos nefandos, mas em um espírito muito outro.
Com efeito, por uma notável coincidência os prantos desses Srs. engrossavam a oposição ao governo Ngo Dihn Diem, que os comunistas tanto queriam derrubar.
A razão alegada para tantas lágrimas e soluços era o valor de cada vida humana.
Curioso que o responsável por essas torpes e deploráveis imolações era, direta e proximamente, o budismo que inspira formas de protesto tão cruéis e criminosas. Mas não foi contra o budismo, que a cólera de tantos desses inefáveis Srs. no mundo inteiro se levantou. Foi contra o governo Ngo Dihn Diem, detestado também pelos comunistas.
Agora, os comunistas fizeram horrores em Zanzibar. Mas parece que naquela remota ilha é bem menor o valor da vida humana. Pois a este respeito a choradeira cosmopolita dos chora-bonzos não se manifestou.
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Um dos mais aplicados e pontuais choradores desse gênero de pranto é sem dúvida o Sr. Bertrand Russell. Chora logo entre os primeiros, sempre que se apresenta ocasião.
Da unilateralidade desse sistemático chorar, dá bem uma ideia a atitude do escritor britânico em face do fato recentemente
(continua)
160 mil brasileiros proclamam:
reformas de base importam mesmo numa questão de consciência (págs. 4-5)