No ÚLTIMO dia 26 de agosto transcorreu o bicentenário da "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão", proclamada durante a Revolução Francesa pela Assembleia Constituinte da França. Essa "Declaração" tornou-se o "catecismo cívico" dos revolucionários, algo parecido com aquilo que o Decálogo representa para o Cristianismo.
Entretanto, os "novos Moisés da humanidade", ao compilarem a súmula dos "direitos", fizeram questão de olvidar "o fantasma dos deveres" (1), além de passarem em silêncio pontos fundamentais de várias questões importantes. Tal omissão permitiu a "violação legal", pelos próprios constituintes, daquela publicitada "Declaração".
De fato, foi após a "Declaração" que os bens da Igreja foram confiscados, as ordens monásticas extintas, instituiu-se um passaporte para transitar entre as cidades, foi supressa a liberdade de associação e de imprensa e inventou-se a guilhotina, alimentada pela "lei dos suspeitos". Ademais, o culto católico foi proibido, foram deportados 75 mil padres e bispos, sendo centenas deles chacinados. Sem falar da guerra declarada à Áustria, e as invasões napoleônicas em toda a Europa.
Não obstante a lúgubre realidade histórica que envolve a "Declaração" de 26 de agosto de 1789, a data foi comemorada não só em Paris, com a inauguração do "Arc de la Défense", gigantesco edifício em forma de cubo vasado que abrigará a Fundação dos Direitos do Homem, mas também na capital paulista, onde a Secretaria Municipal de Cultura promoveu o projeto "Cidade, Cidadão, Cidadania".
Cada entidade participante do evento teve oportunidade de "interpretar" a seu modo o significado da controvertida "Declaração".
Na galeria Prestes Maia, no centro da cidade, o artista plástico Cildo Meireles deixou uma montanha de dois metros de altura de papel celofane amassado. Sem nenhuma explicação, longe de relacionar a "obra" com os "Direitos do Homem", o público entendeu tratar-se de uma "abstração" representando o lixo de São Paulo! (2).
Não menos insólita foi a "versão" de Guto Lacaz, que exibiu no Parque Ibirapuera um conjunto de cadeiras flutuando sobre a água. A que propósito? Ninguém ficou sabendo.
Por sua vez, Siron Franco pretendeu representar os "direitos dos presidiários", ao instalar duas jaulas em duas estações do metrô. O tiro, porém, saiu pela culatra: "Se todos os delegados construíssem mais essas coisas, os bandidos acabavam", comentou uma sensata dona de casa.
Em vários pontos da cidade foram afixados painéis exaltando o "nascimento da cidadania". Um deles (vide foto) representa uma coluna de carros blindados parados diante de um vulto, numa clara alusão ao massacre de estudantes perpetrado pelos comunistas na Praça da paz Celestial de Pequim.
O autor do quadro, todavia, parece ter esquecido que o comunismo é filho da Revolução Francesa. Lenine, por exemplo, dizia-se "filho espiritual de Robespierre" (3). Foi em nome da "igualdade", contida na Declaração de 1789, que Mao Tsé-Tung implantou na China o regime coletivista e promoveu a "revolução cultural" para mudar os hábitos "burgueses" da população.
Os generais comunistas que ordenaram o massacre dos estudantes chineses alegaram agir "em nome do povo", do mesmo modo que, em 1793, a Convenção Nacional decretou, também em "nome do povo", o genocídio da Vendéia.
É por isso que muitos historiadores veem na Revolução Francesa, não a gênese da democracia, mas do totalitarismo: "A Revolução e a Declaração dos Direitos do Homem não fizeram senão pavimentar com belas palavras, mal esclarecidas, o caminho de grandes crimes" (4).
A célebre apóstrofe de Madame Roland, "liberdade, liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome", pronunciada quando a famosa revolucionária, já ultrapassada por desdobramentos posteriores da Revolução, subia ao cadafalso, bem poderia ser aplicada também aos "Direitos do Homem": quantos crimes se cometem em seu nome!
BRÁULlO DE ARAGÃO
AQUI EM CASA somos assinantes da revista "Catolicismo". E eu particularmente me sinto um privilegiado por ter acesso às enormes besteiras publicadas mensalmente nessa revista. Certos artigos beiram ao ridículo onde acredito eu que somente pessoas que não têm consciência da realidade que os cercam deem credibilidade a eles.
Se fosse citar os ilariantes artigos publicados neste periódico, seria obrigado a citar todos eles, pois até hoje, depois de receber por mais de um ano essa publicação, não encontrei ainda palavras sensatas que viessem a retratar, que viessem mostrar a realidade na qual está enquadrada a maioria do sofrido povo brasileiro.
Hoje o país agoniza, e a qualidade de vida da população brasileira pode ser comparada com a dos mais pobres países do continente africano. O analfabetismo absoluto afeta cerca de 20% da população, o relativo o dobro. Numa sociedade moderna a totalidade da população de 15 anos ou mais possui o que diz respeito ao 1º grau no ensino brasileiro. No Brasil, os que chegam a concluir o 1º grau, nessa faixa etária, são menos de 10%.
A qualidade de vida do brasileiro é baixíssima. Mais da metade dos domicílios não têm luz elétrica, 71 % não possuem água encanada, mais de 85% não possuem escoadouro adequado, 65% não dispõe de filtro e mais de 79% não tem geladeira.
Então o que vemos no Brasil? O que vemos é um dualismo social, onde de um lado encontra-se uma moderna sociedade industrial, que já é a oitava economia do mundo ocidental e do outro lado, encontra-se uma sociedade primitiva, vivendo em um nível de subsistência, no mundo rural, ou em condições de miserável marginalidade urbana, ostentando padrões de pobreza e ignorância comparáveis, como dito anteriormente, as mais atrasadas sociedades afro-asiáticas.
O percentual de miseráveis que vivem na zona rural ultrapassa a 50% do total de miseráveis que temos no Brasil, ou seja, a maioria vive na zona rural. E qual é a saída para essa gente? Será que a solução está nos grandes centros? Lógico que não. Essas pessoas se deslocando do campo para a cidade estariam apenas transferindo o problema da zona rural para a urbana. Uma das soluções está na REFORMA AGRÁRIA, que é por esta revista muito combatida. A solução para essas pessoas está no próprio campo, e é dever do Estado desapropriar terras improdutivas e produtivas e distribuir para essa gente. O que não podemos permitir é que essas pessoas sem passado e sem futuro continuem vagando por aí a espera de um milagre divino.
Na revista do mês de julho, Sr. José Fernando Ribeiro de Barros, São Paulo, afirma que os trabalhadores rurais levam um "vidão". Como pode um ser humano ser tão hipócrita? A não ser que ele considere um "vidão" uma pessoa não ter acesso à educação, como acontece com a maioria no campo, não ter acesso a um programa assistencial de saúde, não ter acesso ao lazer, enfim, não ter mínimas condições de levar uma vida digna.
Ao invés desta revista se preocupar com as filas na União Soviética ou com os antigos automóveis que trafegam pelas ruas de Cuba, esta revista poderia se voltar para o Brasil, e mostrar nossas filas por exemplo. Não filas para a compra de bens de consumo, pois o povo não tem dinheiro para isso, mas vergonhosas filas para se ter direito a um atendimento médico de péssima qualidade, ou filas onde aposentados são obrigados a ficar horas para receber míseras quantias da Previdência.
Fala-se em massacre de estudantes na China. Mas porque não falarmos em massacre de camponeses, massacre de índios, não na China, não na União Soviética, muito menos em Cuba, mas sim aqui no Brasil. Vamos falar da fome, que mata mais do que qualquer guerra já registrada na história.
Por que mascarar a realidade? Por que defender um capitalismo que tem legado aos países do 3° mundo condições sub-humanas de vida.
Já estamos cheios de tanta farsa. Mas toda farsa mais cedo ou mais tarde acaba sendo desmascarada. Atenciosamente,
P .S. Espero que minha carta, se publicada, seja publicada em sua totalidade, sem que haja distorções em minhas palavras como vocês fazem com os fatos (Carlos Américo, Campos - RJ).
NOTA DA REDAÇÃO
TRANSCREVEMOS tudo, inclusive os erros de português.
Temos nesta seção publicado muitas cartas de leitores que elogiam a objetividade e a qualidade das matérias publicadas em "Catolicismo". É um testemunho que nos honra e incentiva. Porém, a carta deste missivista é de certo modo ainda mais comprobatória da objetividade do que publicamos.
De fato, numa carta tão furiosa e sobretudo tão longa, o Sr. Carlos Américo (cujo segundo nome parece ser mais propriamente um prenome do que um sobrenome) não encontrou nada de consistente para nos impugnar. Tudo se resume a generalidades, inverdades e insultos.
Quanto a estes últimos - que parecem ter sido escritos para preencher a falta de argumentos - deixemo-los cair no chão. Pode-se discordar e objetar sem insultar. Tal é, aliás, a regra da boa polêmica, que o missivista não seguiu.
Note-se que para o Sr. Carlos Américo, "Catolicismo" não traz absolutamente nada de bom. Para ele, todos os artigos são hilariantes (ele escreve sem h; a ortografia não é o seu forte), e "palavras sensatas" ele ainda não as encontrou em nossa revista, com relação à realidade brasileira. Não se poderia ser mais radical.
Seriam insensatas, pois, as palavras que temos publicado de economistas, jornalistas, homens públicos de projeção e até de operários e "assentados"? E seriam hilariantes temas aqui tratados como o Santo Sudário, massacres na China, a pobreza na Rússia ou em Cuba ... ?
Protestamos contra a injúria gratuitamente lançada sobre todos os leitores que nos honram com seu assentimento, tratados pelo missivista como "pessoas que não têm consciência da realidade"; e em particular protestamos contra o insulto dirigido ao Sr. José Fernando Ribeiro de Barros. Se o Sr. Carlos Américo manifestasse seu desacordo de modo cortês ou pelo menos neutro, seria digno de ser levado em consideração. Porém, nesses termos ...
Mas eis que nosso missivista se mostra documentado! Ele brande estatísticas. É pena, porém, que não indique a fonte de onde tirou os dados, para que possamos julgar da idoneidade dela. As porcentagens são assim atiradas ao ar, sem que saibamos de onde elas provêm.
Ora, os dados mais recentes sobre o assunto são os publicados pelo IBGE, referentes a 1987, com base no Plano Nacional de Amostragem Domiciliar (vol. 11, tomo I, pág. 33). E