Santa Catarina Labouré procura converter membros da Comuna distribuindo-lhes Medalhas Milagrosas.
Uma semana depois desta aparição eclode a Revolução de julho de 1830, atestando o alcance profético das visões de Santa Catarina.
Tratava-se de uma nova explosão do espírito de 1789, manobrada pelos comitês republicanos e carbonários de insurreição, que empunhando a bandeira tricolor da Revolução Francesa derrubava o Rei Carlos X.
Um anticlericalismo virulento se manifesta: igrejas profanadas, cruzes postas por terra, comunidades religiosas invadidas, devastadas e dispersas; padres perseguidos e maltratados.
Entretanto, cumprem-se fielmente as promessas de Nossa Senhora: os Lazaristas e as Filhas da Caridade, ambos fundados por São Vicente de Paulo, atravessam incólumes esse turbulento período.
Impotente para levar às últimas consequências seus princípios igualitários, a Revolução faz sentar no trono de São Luís um rei não legitimo, embora verdadeiro príncipe.
Luís Felipe, filho de Felipe Egalité, era, dentro da Paris convulsionada, o homem escolhido para aliar o estabelecimento de uma pseudo ordem com a vitória dos ideais libertários. Foi feito rei a 7 de agosto de 1830.
Insaciável no anelo de seu próprio paroxismo, e não se contentando em haver derrubado a legitimidade dinástica, dezoito anos depois a Revolução põe por terra o próprio trono ilegítimo de Luís Felipe, o "rei-cidadão".
Santa Catarina, que temera e sofrera tanto com a queda do Rei Carlos X, não atribui, porém, o mesmo significado nem mostra a mesma dor ao ver cair Luís Felipe...
É proclamada a II República francesa.
Efêmero, o novo regime é dirigido, em meio ao caos e às barricadas, primeiro por um governo provisório, e mais tarde por um presidente eleito, Luís Napoleão, que três anos depois, em dezembro de 1851, por um golpe de estado, faz-se imperador sob o título de Napoleão III.
Mas retornemos ao manuscrito em que Santa Catarina relata a primeira aparição da Santíssima Virgem, naquela noite de 18 para 19 de julho de 1830. É Nossa Senhora quem adverte:
"Minha filha, eu gosto de derramar graças sobre a comunidade em particular. Eu a aprecio muito. Sofro porque há grandes abusos na regularidade. As Regras não são observadas. Há grande relaxamento nas duas comunidades. Dizei-o àquele que está encarregado de uma maneira particular da comunidade. Ele deve fazer tudo o que lhe for possível para repor a regra em vigor. Dizei-lhe, de minha parte, que vigie sobre as más leituras, as perdas de tempo e as visitas.......
"Conhecereis minha visita e a proteção de Deus e de São Vicente sobre as duas comunidades. Mas não se dará o mesmo com outras congregações. Haverá vítimas (ao dizer isto, a Santíssima Virgem tinha lágrimas nos olhos). Para o Clero de Paris haverá vítimas: Monsenhor, o Arcebispo (a esta palavra, lágrimas de novo).
"Minha filha, a Cruz será desprezada e derrubada por terra. O sangue correrá. Abrir-se-á de novo o lado de Nosso Senhor. As ruas estarão cheias de sangue. Monsenhor, o Arcebispo, será despojado de suas vestes (aqui a Santíssima Virgem não podia mais falar; o sofrimento estava estampado em sua face). Minha filha - me dizia ela - o mundo todo estará na tristeza. A estas palavras, pensei quando isto se daria. Eu compreendi muito bem: quarenta anos".
De fato, quatro décadas depois...
Em 1870, a França e a Alemanha entram em guerra.
A 2 de setembro, uma esmagadora e humilhante derrota obriga Napoleão III a capitular em Sedan.
Dias depois, em Paris, é novamente proclamada a República, à testa da qual estava um governo de defesa nacional, cujo espírito sectário bem se caracterizava pelo brado de Gambetta, um de seus mais destacados membros: "O clericalismo, eis o inimigo".
Em março seguinte, com a França ainda em sangue, arrebenta uma Revolução na capital, conhecida como a Comuna. O governo republicano é obrigado a transferir-se para Versailles, e a capital vive então setenta dias sob a tirania de um conselho geral, composto por furiosos anarquistas.
Cena de furor revolucionário durante a invasão do Palácio das Tulherias, em 1848, quando da deposição do Rei Luiz Felipe.
Quando, a 18 de maio, Notre Dame des Victoires —histórico santuário favorecido por todas as graças ligadas às aparições da Rue du Bac, e sede de uma arquiconfraria mundialmente difundida, cuja insígnia é a Medalha Milagrosa - foi invadida pelo batalhão dos "vingadores da República" que praticaram, então, infames sacrilégios, Santa Catarina declarou: "Tocaram em Notre Dame des Victoires. Pois bem! É a derrota deles, não irão mais longe".
De fato, três dias depois entrava em Paris o exército regular, vitorioso contra a insurreição revolucionária, mas sem ainda dominar toda a cidade.
Por ordem do comitê executivo da Comuna, a 24 de maio foi fuzilado no cárcere de La Roquette - conforme previra Nossa Senhora - o Arcebispo de Paris, Mons. Darboy.
Já em seus estertores finais, dois dias depois, os rebeldes assassinaram vinte dominicanos e outros reféns, clérigos e soldados. É a semana sangrenta...
Entretanto, mais uma vez, os Lazaristas e as Filhas da Caridade, sob a proteção de Nossa Senhora, atravessam incólumes uma Revolução.
Durante a Comuna, enquanto todas as irmãs, em meio aos insultos e ameaças dos Communards, estavam tomadas de terror, Santa Catarina era a única a não ter medo: "Esperai, a Virgem velará por nós, não nos ocorrerá nenhum mal".
Quando os revolucionários invadiram o convento das Filhas da Caridade e expulsaram-nas, Santa Catarina previu que todas estariam de volta dentro de um mês, no dia 31 de maio; e assegurou à Superiora que a própria Santíssima Virgem guardaria a casa intacta.
Ao retirar-se, Santa Catarina apanha a coroa da imagem do jardim a fim de subtraí-la à profanação, dizendo a Nossa Senhora: "Eu voltarei para vos coroar no dia 31 de maio". Estas e muitas outras previsões, relativas aos setenta dias da Comuna, cumpriram-se com perfeita exatidão.
Derrotada por fim a Comuna, Adolf Thiers é nomeado, em agosto, primeiro presidente da anticlerical III República, que assim substitui o Império de Napoleão III. A Revolução, em seu terceiro passo, mais uma vez triunfara, e assim chegará até nossos dias...
Realizou-se, pois, processivamente, ao longo de quarenta anos, em três etapas, tudo quanto o coração de São Vicente, Nosso Senhor Eucarístico e a Santíssima Virgem previram em suas aparições a Santa Catarina, em 1830.
Porta de entrada do convento da Rue du Bac A Medalha Milagrosa é revelada a Santa Catarina Labouré.
Voltemos ao ano de 1830, à capela da Rue du Bac. Quatro meses haviam transcorrido desde a primeira aparição de Nossa Senhora, que deixara em Santa Catarina profundas saudades e um imenso desejo de rever a Mãe de Deus. Eis como em seus manuscritos a própria noviça das Filhas da Caridade narra a segunda aparição:
"No dia 27 de novembro de 1830 vi a Santíssima Virgem, de estatura média, estava de pé, trajando um vestido de seda branco-aurora feito à maneira que se chama à Ia Vierge, afogado, mangas lisas, com um véu branco que Lhe cobria a cabeça e descia de cada lado até em baixo. Sob o véu, vi os cabelos lisos repartidos ao meio e por cima uma renda de mais ou menos três centímetros de altura, sem franzido, isto é, apoiada ligeiramente sobre os cabelos. O rosto bastante descoberto, os pés apoiados sobre meia esfera, e tendo nas mãos uma esfera de ouro, que representava o Globo. Ela tinha as mãos elevadas à altura do estômago de uma maneira muito natural, e os olhos elevados para o Céu... Aqui seu rosto era magnificamente belo. Eu não saberia descrevê-lo... E depois, de repente, percebi nesses dedos anéis revestidos de pedras, umas mais belas que as outras, umas maiores e outras menores, que lançavam raios cada qual mais belo que os outros. Partiam das pedras maiores os mais belos raios, sempre alargando para baixo, o que enchia toda a parte de baixo. Eu não via mais os seus pés... Nesse momento em que estava a contemplá-La, a Santíssima Virgem baixou os olhos, fitando-me. Uma voz se fez ouvir, dizendo-me estas palavras: