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no Brasil como na França ou em qualquer outro lugar. Isso posto, dizei-me se algum dia houve, sob as aparências de um homem de negócios ao mesmo tempo prudente e audacioso que soube valorizar o café, um francês de maneiras mais corteses, de conversação mais amável e de espírito mais aristocraticamente leve.”

Dessa descrição, retenhamos dois pontos:

1. O fazendeiro paulista era como “um senhor feudal imbuído de pensamento europeu”;

2. A sociedade paulista apresentava “o duplo fenômeno de se orientar de modo resoluto para o espírito francês e de, paralelamente, desenvolver todos os traços da individualidade brasileira”.

Ruas Direita e 15 de Novembro, em São Paulo, nos anos 10.

O senhor feudal

Quem eram os senhores feudais? Quando da decadência do Império Romano e a invasão da Europa por povos bárbaros oriundos do leste e do norte do continente europeu, boa dose de caos se fez presente em vários lugares. Em 711, os maometanos invadiram também pelo sul, dominando a Península Ibérica. Mas foram derrotados por Carlos Martel ao tentar conquistar o reino dos francos.

A personalidade excepcional do Imperador Carlos Magno colocou certa ordem na Europa de então. Após sua morte, o Império foi dividido entre seus três filhos, que não possuíam as qualidades do pai. Isso provocou o enfraquecimento e a fragmentação dos Estados, gerando muita insegurança, sobretudo entre os mais fracos. Assim, numerosos pequenos feudos ou propriedades autônomas para sobreviver buscavam proteção junto a um senhorio mais poderoso, em condições de assegurar-lhes certos direitos e liberdades.

Nasceu assim o sistema feudal, tendo por base um conjunto de relações pessoais fundadas na ajuda recíproca. Convinha aos poderosos, porque estes precisavam de homens para os trabalhos da agricultura e para seus pequenos ou grandes exércitos. Convinha aos mais fracos, pois sem a proteção de um exército não tinham condições de enfrentar invasões predatórias, numa época que conservava ainda muito de barbárie. E o relacionamento feudal era de tipo paterno e filial.

Mais do que sua definição histórica ou sociológica, o que interessa ressaltar aqui é o significado de senhor feudal. Este indica um homem de valor excepcional, por suas qualidades de liderança, de combate, por seu espírito empreendedor, dispondo de recursos que o torna capaz de dominar e proteger os territórios sob a sua jurisdição ou influência. Ao mesmo tempo protetor dos mais fracos e necessitados.

A epopeia das Cruzadas decorrera em grande parte da fé de senhores feudais. Godofredo de Bulhões, Simão de Montfort e tantos outros heróis foram senhores feudais e cruzados, como também São Luís IX, rei de França, e ainda outros soberanos. Godofredo conquistou Jerusalém. Simão erradicou a heresia cátara do sul da França. Ambos foram católicos de grande estatura, não obstante as detrações de que eles são objeto por parte de inimigos da Religião Católica.

Plinio Corrêa de Oliveira (foto) foi cognominado, como dito acima, o “Cruzado do século XX”, por sua combatividade, pela pureza de seu ideal católico e contrarrevolucionário. Se ele jamais empunhou contra alguém uma espada, entretanto sempre empunhou o gládio do espírito. Basta folhear qualquer de suas biografias para convencer-se do quanto ele realizou como homem de luta e de ação.*

O homem de salão

Os senhores feudais constituíram também a matéria-prima da aristocracia, com a obrigação de frequentar as cortes de seus reis ou suzeranos, onde era mister aprimorar-se no trato social, na elegância, e nos requintes de educação e caridade que constituíam o ornato de um governante.

No Ancien Régime, época histórica que antecedeu a Revolução Francesa, as contendas já não se decidiam somente nos campos de batalha, mas principalmente nas cortes, entre diplomatas, ministros e outros representantes da sociedade, inclusive da burguesia, cujo papel assumiu importância cada vez maior na Europa, a partir do século XIV.

Apareceram então os homens simultaneamente de combate e de salão, como os mosqueteiros do Rei Luís XIII. Homens que eram tão experientes no manejo da espada como no trato social e em manobras políticas; mestres

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