PALAVRA DO SACERDOTE
Monsenhor José Luiz Villac
Pergunta — Tenho uma grande dúvida, pelo que lhes escrevo. No artigo "O concerto dos campanários", de Gabriel J. Wilson [Catolicismo, dezembro/2014], há alguns comentários sobre o Concílio Vaticano II. Em resumo, pergunto: — Em que parte do Concílio Vaticano II está a recomendação de que os bispos sejam mais administradores e menos pastores? Por favor, agradecerei muito pela resposta.
Resposta — O artigo que motivou a pergunta da missivista, dizia: "A catedral é a mãe das igrejas ou paróquias. O bispo é o pai dos fiéis. Não são os bispos os continuadores dos Apóstolos? [...] Hoje a ideia dominante sobre os bispos é voltada para a administração dos bens materiais da diocese, ou para insuflar a luta dos pobres contra os ricos. […] Depois do Concílio Vaticano II, pode-se dizer que o bispo deixou de ser "pai" para ser administrador, político, comunicador ou manipulador de massas… Com certo exagero, tudo, menos o pastor realmente preocupado em salvar as suas ovelhas".
Dói-me dizê-lo, mas concordo com essa avaliação. Não no sentido de que todos os bispos correspondam a essa imagem, mas no fato de que os fiéis e o público ficaram com essa imagem na retina, por causa das insistentes tomadas de posição "revolucionárias" da CNBB e dos bispos mais aplaudidos pela mídia esquerdista. Também é fato que isso se deu principalmente depois do Concílio Vaticano II e, no que concerne à América Latina, após a reunião do CELAM (1968), em Medellín, onde foi aprovado um plano pastoral de apoio às reivindicações políticas e sociais da esquerda, em nome de uma transviada "opção preferencial pelos pobres".
"Eu sou a videira e vós sois os ramos"
Quanto à pergunta restrita da missivista, se há algum documento do último concílio indicando que os bispos devem ser mais administradores e menos pastores, a resposta é que, obviamente, isso não está dito textualmente em nenhuma passagem. Mas é preciso reconhecer, em sentido contrário, que as novidades conciliares em matéria de eclesiologia (a parte da Teologia que estuda a natureza e a estrutura da Igreja) contribuíram de fato para essa evolução. O que se torna patente comparando o conceito tradicional do caráter hierárquico da Igreja e o ponto de vista dos documentos conciliares, em particular a Constituição dogmática Lumen gentium.
Como dizia o antigo Catecismo, a Igreja é "a sociedade de todos os cristãos que professam a mesma fé e recebem os mesmos Sacramentos, sob a obediência dos legítimos Pastores e principalmente do Papa"1. Em contraposição à heresia protestante, acentuava-se, portanto, seu caráter de sociedade visível e com limites definidos (a mesma fé, os mesmos sacramentos, a obediência aos legítimos Pastores). A eclesiologia tradicional, porém, não se limitava a registrar esses traços externos que distinguem a Igreja Católica, mas obviamente insistia no seu caráter espiritual e místico de verdadeira família de Deus, na qual os membros são gerados e nutridos pela união com Jesus Cristo, que disse aos Apóstolos: "Eu sou a videira e vós sois os ramos. O ramo não pode dar fruto de si mesmo se não permanecer na videira" (Jo. 15,5). Nessa família espiritual, como ensina São Paulo, "em um só Espírito fomos batizados todos nós, para formar um só Corpo", no qual "Deus dispôs os membros, cada um como lhe aprouve" (1 Cor. 12,13 e 18).
Omissões em documentos conciliares
A eclesiologia tradicional destacava que essa dignidade fundamental de cada fiel, enquanto membro do Corpo Místico, não impede o caráter hierárquico que Jesus Cristo deu à Igreja, a qual, "por sua natureza", como ensina São Pio X, "é uma sociedade desigual, isto é, comporta uma dupla ordem de pessoas, os Pastores e a grei. [...] E estas duas ordens são de tal maneira distintas, que só na Hierarquia reside o direito e a autoridade de orientar e dirigir os associados ao fim da sociedade"2.
Nessa visualização, assim como o Papa é o sucessor de São Pedro no governo da Igreja universal, assim também os Bispos são sucessores dos Apóstolos, como Pastores legítimos de uma porção do rebanho, em união com o Papa e com os demais Bispos. Eles são ministros de Cristo, mestres da Fé, pontífices e dispensadores dos mistérios de Deus (1 Cor. 1,4), verdadeiros pastores com um poder próprio, ordinário e imediato sobre os fiéis sob sua jurisdição, embora seu exercício seja regulado pela autoridade suprema do Papa. Em virtude de tal poder, os Bispos têm o direito e o dever de legislar, julgar e governar no que se refere ao bem de suas ovelhas, ao culto e ao apostolado.
Sem negar frontalmente nenhuma dessas verdades, a eclesiologia da Lumen gentium e dos demais documentos conciliares, pelas suas omissões e/ou ênfases excessivas, proporciona uma visão de conjunto muitíssimo diferente. Já é assaz eloquente a ordem que foi dada à redação dos três primeiros capítulos da Lumen gentium: o mistério da Igreja, o Povo de Deus, a constituição hierárquica da Igreja. Neles, acentuam-se seu caráter de "sacramento" do encontro de Deus com a humanidade (em detrimento do caráter de sociedade visível) e sua existência comunitária (com desvantagem para sua natureza hierárquica). Sem falar do ofuscamento das fronteiras visíveis da Igreja, por causa do ominoso subsistit in analisado em nossa última matéria, na qual faz desbordar a Igreja de Cristo para além das fronteiras institucionais da Igreja Católica.
"Colegialidade", inspirada na Igreja ortodoxa russa
O cardeal belga Leo-Joseph Suenens, líder da ala progressista, comentou em 1968: "Se me perguntassem qual é o ‘germe de vida’ mais rico em consequências pastorais que devemos ao Concílio, eu responderia sem duvidar: a redescoberta do Povo de Deus como um todo, como uma globalidade". Segundo o Pe. Bruno Chénu, professor de eclesiologia na Universidade Católica de Lyon e chefe da redação do jornal "La Croix" (1988-1997), "a imagem do Povo de Deus permite, com efeito, sublinhar o caráter peregrino da Igreja, sua natureza igualitária e comunitária, sem silenciar o apelo de Deus que a constitui. Porque todos os cristãos
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