C. A. de Araujo Viana
A recente inclusão das obras de André Gide no Índice dos livros proibidos veio por em foco o assunto da produção literária e artística em face da Religião e da moral. Não nos queremos referir, senão de passagem, à opinião liberal, segundo a qual a condenação de maus livros constituiria uma violação da liberdade, uma luta contra a luz da verdade, pelo que o Index seria um atentado permanente contra o progresso das letras e da ciência.
Este argumento já foi cabalmente desfeito pelo saudoso Cardeal Merry Del Val, na carta-prefacio do Índice dos livros proibidos, de 7 de junho de 1929: "De início, é evidente que ninguém ensina mais vigorosamente do que a Igreja Católica essa verdade que o homem foi dotado por Deus da liberdade, e ninguém mais do que Ela defendeu esse "dom eminentíssimo de Deus" contra quem ouse nega-lo ou diminui-lo de qualquer maneira.. Somente espíritos infectados por essa peste moral conhecida pelo nome de liberalismo podem ver nesse freio colocado à libertinagem pelo poder legítimo um atentado ao livre arbítrio, como se, pelo fato de ser dono de seus atos, estivesse o homem autorizado a fazer sempre o que desejar".
Nem se deve apelar para os méritos intelectuais do autor, pois "o valor literário ou científico, mesmo se for real, não pôde certamente legitimar a difusão de um livro contrário à Religião e aos bons costumes, porque então far-se-á, pelo contrário, uma medida de repressão tão mais eficaz quanto as malhas do erro forem mais tênues e os atrativos do mal mais sedutores" (documento citado).
E até escritores católicos como Mauriac nos trazem ao espírito aquilo que a Santa Sé diz em sua Instrução "Inter mala", de 3 de maio de 1927, contra a literatura sensual e místico-sensual: "Com efeito, numerosos são os escritores que pintam em cores vivas a obscenidade e, desprezando toda regra e toda compostura, fazem descrições pornográficas, às vezes em linguagem velada, às vezes crua e cinicamente. Eles descrevem, com os mais subtis detalhes, as corrupções mais degradantes e as revestem de todos os encantos e de todas as belezas do estilo, ao ponto de nada deixar intacto no domínio moral".
Ainda recentemente esse mesmo Mauriac fazia sua autodefesa, procurando distinguir entre o ensaísta, que manifesta a opinião própria do autor, e os personagens de seus romances, que em seu comportamento não devem ser confundidos com o seu criador, o qual com eles apenas se propõe mostrar a vida tal como ela se apresenta em toda a riqueza de seus enredados dramas psicológicos. Não é este o ensinamento da Santa Sé, que nos adverte do seguinte: "E que não se objete que muitas dessas obras devem ser verdadeiramente louvadas pelo valor e beleza do estilo, pelos seus ensinamentos psicológicos, conformes às descobertas modernas, por sua pretensa reprovação dessas vergonhosas voluptuosidades carnais, através do fato de serem elas expressas em sua brutal e repulsiva realidade, ou de serem mostradas acompanhadas de torturas de consciência" (Instrução "Inter mala"). A intenção do autor, qualquer que ela seja, não pode impedir a perversão dos espíritos através dessas leituras.
A falta de preocupação moral e de ortodoxia na criação literária -e artística tem causas mais profundas. E em certos ambientes católicos, que até agora se curvaram, extasiados, diante de Gide, e que se ocupam livremente de Balzac, de Proust e de outros demiurgos do mundo literário, sem nenhuma ressalva, quanto à perniciosidade de sua obra, tal atitude não se explica unicamente pela chamada peste do liberalismo, a que alude o Cardeal Merry Del Val, mas também por uma concepção panteísta do Corpo Místico, que os faz condenar o "moralismo" das piedades medieval e moderna, como verdadeiras degenerescências do Cristianismo "clássico" dos quatro primeiros séculos. Com efeito, se todas as ações do homem não são senão maneiras de ser da Divindade, e se dela somos fragmentos, nenhuma ação que pratiquemos pode ser considerada moralmente má, e por conseguinte perde o sentido qualquer referência à moral. Nada mais natural, portento, que darmos largas aos nossos instintos. Junte-se a isso uma falsa distinção entre a Igreja "jurídica" e a Igreja da "caridade", e teremos uma explicação para essa derrubada completa das fronteiras que separam o lícito do ilícito em matéria de criação literária e artística, bem como os filhos da Igreja dos filhos da iniquidade.
Eis a razão pela qual podemos afirmar que a corrupção social não parte atualmente apenas dos ambientes declaradamente hostis à Igreja, mas lambem do interior da própria cidadela católica, como há pouco amargamente acentuava o Santo Padre Pio XII referindo-se à chamada literatura sexual: "Há um terreno no qual esta educação da opinião pública, e sua retificação, se impõem com uma urgência trágica. Ela se acha, neste campo, pervertida por uma propaganda que não se hesitaria de chamar funesta, se bem que desta vez ela emane de fonte católica, e vise agir sobre os católicos, e mesmo se os que a exercem não pareçam suspeitar que são, sem o saber, iludidos pelo espírito do mal". (Alocução aos Pais de Família Franceses, de 18 de setembro de 1951 (*).
Ora, tanto no caso da literatura ímpia, como da subversiva, como da sensual, o que vemos em primeiro lugar é uma atitude de rebeldia em relação à autoridade suprema da Santa Sé. As determinações da Igreja aí estão expostas com toda a clareza e nenhum intelectual católico pode alegar ignorância daquilo que lhe é vedado fazer no campo literário e artístico, bem como no social e político. A Fé sem as obras não tem vida. E não é aquele que diz: Senhor, Senhor, que entrará no reino dos céus, mas o que fizer a vontade de Deus e de Sua Igreja. Seguir em tudo a Santa Igreja de Nosso Senhor, eis o que nos distingue não somente dos heterodoxos, mas lambem dos pagãos, dos idólatras, dos ímpios de toda a espécie.
(*) V. Catolicismo de janeiro de 1952.
Um dos países do mundo em que mais floresceram as Congregações Marianas foi a Polônia. Pode-se dizer que os poloneses timbraram em conservar, em toda a nação, viva e ardentíssima devoção à Virgem especialmente por meio das Congregações. Ao estalar a última guerra, só em uma cidade universitária havia na Polônia quase mil sodalícios marianos, com perto de cem mil membros. A catástrofe que, mais uma vez, ensanguentou a Polônia, aparentemente destruiu esta magnifica falange. Dizemos "aparentemente", porque a vitalidade mariana destes congregados não esmoreceu mesmo debaixo da mais atroz perseguição, bem como continua em toda a sua pujança nos varies países em que se encontram exilados muitos deles.
A história dessas Congregações neste decênio de atribulações está pontilhada de fatos edificantes. Entre outros, a "Acies Ordinata", a esplendida revista do Secretariado Mundial das Congregações Marianas, em seu número de janeiro-março de 1952, conta a origem da imagem de Nossa Senhora da Via Dolorosa dos Poloneses. É a seguinte.
Num campo de concentração soviético, de prisioneiros poloneses, havia vários congregados. Todo o culto religioso era aí rigorosamente proibido. Os comunistas confiscaram todos os objetos de piedade, terços, escapulários, medalhas. Nessas circunstancias, contra toda esperança, confiados apenas na inabalável certeza da proteção carinhosa da Mãe Celeste, resolveram esses congregados, para alimentar o espirito de piedade e aumentar a devoção à mesma Virgem, esculpir uma Sua imagem, semelhante àquela que costumavam venerar em Vilna, sua terra natal. Mas, como?
Os próprios comunistas lhes vieram em auxilio sem o saber. De fato. Ordenaram que fosse restaurado o teto de uma igreja ortodoxa abandonada. Esta obra proporcionou aos congregados a madeira necessária para confeccionar a imagem. Logo mais os comunistas' mandaram que os prisioneiros pintassem as paredes de uma sala de espetáculos cinematográficos. Com isso puseram nas mãos dos congregados apetrechos preciosos para encarnar sua imagem. Por fim, foi preciso que se aparelhasse uma igreja meio em ruivas para ali instalar um celeiro. Ora, numa das paredes do velho templo havia uma imagem da Santíssima Virgem que aos congregados serviu de modelo para o acabamento de sua obra.
Assim surgiu a famosa imagem da Bem-aventurada Virgem Maria da via dolorosa dos poloneses, que hoje se venera em Londres e alimenta no povo mártir a esperança de um retorno à pátria, onde ela será gloriosamente entronizada.
Ao lado deste fato que mostra até que ponto pode chegar o amor, a devoção e a confiança em Maria Santíssima por parte dos Congregados Marianos poloneses, há outros que denunciam seu zelo pela salvação das almas.
Como é sabido, durante a última guerra a Polônia ficou à mercê de seus tradicionais inimigos, a Prússia e a Rússia, que em seu território disputavam entre si a supremacia por via das armas. Esta circunstância possibilitou a formação do exército polonês nas regiões ocupadas pela Rússia, mas que teve, pouco mais tarde, que -emigrar. Esta migração foi feita nas condições mais precárias. Obrigados a andar a pé centenas de quilômetros, sem alimentação, sem vestes além das já dilaceradas com que se cobriam, num inverno de cinquenta grau abaixo de zero! Assim de um milhão e meio de soldados, apenas pouco mais de cem mil chegaram ao seu destino, que era a Pérsia. Aí foram estabelecidos provisoriamente em Pahlevi, primeira estação da via crucis dos pobres poloneses.
Todas as misérias que sofreram debilitou-lhes o espirito, de maneira que nos exilados criou-se um ambiente de condescendência para com os vícios mais degradantes. Foi a hora dos congregados. Primeiro isoladamente, o apostolado pessoal. O conselho ao vizinho afim de que não se deixasse levar pela tentação, ou se levantasse do estado miserável em que havia caído. Logo mais começou uma vida mais social, de Congregação, com atos de piedade em comum.
O resultado deste apostolado foi a constituição de uma verdadeira Congregação, não mais na Pérsia, mas no Iraque, em Quizil Robat, segunda estação dos refugiados poloneses. Como esta, e com o mesmo espírito apostólico de levantar o ânimo dos exilados, e leva-los à pratica da Fé que professavam, fundaram-se Congregações de poloneses na Palestina, na Índia, na África, no Líbano e em várias nações europeias.
Atualmente têm as Congregações Marianas dos Poloneses no exilio uma Confederação Nacional sediada em Londres.
São Francisco de Sales
Por mim eu quereria que as pessoas devotas fossem sempre as mais bem vestidas de seu grupo, mas as menos pomposas e afetadas, e, como se lê nos Provérbios, que elas fossem ornadas de graça, decoro e dignidade. São Luís resume tudo isso em uma palavra, afirmando que cada um deve vestir-se segundo o seu estado; de modo que as pessoas prudentes e a gente de bem não possam dizer: vós fazeis demais, nem os jovens, vós fazeis de menos. Mas caso os jovens não queiram se contentar com o decoro, é preciso seguir a opinião das pessoas prudentes (III Parte, Cap. 25).