(continuação)
Urbanismo e arquitetura (conclusão)
Com a cumplicidade de certa opinião católica, a arquitetura moderna adultera a própria concepção de moradia
o homem social de Le Corbusier permanece ainda impregnado de cristianismo. Consciente ou inconscientemente é ainda uma célula cristã que sua técnica laica nos propõe" (6).
Quais os argumentos invocados por esse jornal a favor dessas habitações coletivas e para batizar o laicismo de Le Corbusier? Cingem-se eles ao muito conhecido conformismo que leva certos católicos a aceitar tudo, menos a solução católica para os nossos problemas. Neste caso particular do problema da habitação, aceitam-se como fato consumado: as concentrações urbanas, o proletariado industrial, a especulação econômica levada às explorações imobiliárias.
Deturpação do conceito de moradia
Como argumento caricatura contra a casa individual, cita "L'homme nouveau" o exemplo de Los Angeles, "aglomeração de 65 quilômetros de comprimento por 30 quilômetros de largura". Como se não estivéssemos na época do automóvel e dos meios ultra-rápidos de transporte, e como se Los Angeles não se achasse na terra da mecanização da vida, que é a America do Norte! Tratar-se-ia, segundo "L'homme nouveau", de "humanizar" a habitação coletiva. A rua é barulhenta e perigosa. Fujamos dela. "A técnica moderna nos permite elevar os imóveis a grandes alturas. Aproveitemo-nos desse fato. E em vez de construir na testada das ruas, criando no fundo das casas becos, poços insalubres, fujamos da rua! Deixemos-lhe assegurada a função de circulação mecânica e criemos ilhas de verdura livres de automóveis, onde as crianças possam brincar sem perigo" (7).
E assim, com a cumplicidade de certa opinião católica, a própria concepção da moradia é adulterada por esses preparadores da "nova ordem" totalitária: a casa passou a ser considerada, não como o ambiente favorável ao pleno desenvolvimento moral da família, mas como um "serviço de utilidade pública" em igualdade de condições com o serviço de água, de esgoto, de transportes, etc. Daí a tendência à construção desses grandes conjuntos residenciais para aluguel, sob a égide do Estado, muitas vezes sob o eufemismo de certos órgãos autárquicos, em um sistema de convivência social forçada, com peças coletivas em comum, com jardins em comum, com play-grounds, piscinas, cantinas, enfim todo um tumultuar satânico de atrações que invade a vida familiar e afugenta a tranquilidade do lar, transformando-o em um mero lugar transitório para o descanso noturno e eventualmente para refeições entre uma solicitação exterior e outra. A intenção clara e patente é que não mais seja ao ambiente familiar que caiba a obra de plasmar os homens, mas a esses pontos de atração coletiva, feitos à imagem e semelhança dos criadores desses ambientes onde reina a promiscuidade.
Estamos diante do "demônio da organização", da preocupação de construir a vida social à feição de uma gigantesca máquina industrial, em que tudo gravita em torno de ciclópicos organismos de caráter impessoal.
Os muros de Babilônia
O mal tem raízes bem profundas, como acabamos de ver, e para ele não encontraremos remédio com o simples piscar de sua cauda. E aos que de boa fé possam dizer que a empresa industrial gigantesca, ou os babilônicos conjuntos residenciais, ou as grandes propriedades são um imperativo de nossa época, pelos progressos da técnica, que impediriam a ordenação descentralizada, diversificada e orgânica da vida social e econômica, com a coexistência da grande, da média e da pequena propriedade, respondamos com Pio XII: "Nem se diga que o progresso técnico se opõe a tal regime e arrasta em sua corrente irresistível toda atividade no sentido de propriedades e organizações gigantescas, diante das quais um sistema social fundado sobre a propriedade individual deve inelutavelmente ruir. Não: o progresso técnico não determina, como um fato inevitável e necessário, a vida econômica. Ele, até por demais frequentemente, se submeteu docilmente às exigências de cálculos egoísticos, ávidos de acrescentar indefinidamente os capitais; por que, pois, não se submeteria também à necessidade de manter e assegurar a propriedade particular de todos, pedra angular da ordem social? Também o progresso técnico, como fato social, não deve prevalecer sobre bem geral, mas, pelo contrário, deve ser a este ordenado e subordinado" (8).
Não será a magnitude do problema que nos fará recuar diante de sua solução. Como os antigos israelitas escravizados dentro dos muros de Babilônia, suspiremos e rezemos pelo dia de nossa redenção. E essa liberdade de filhos de Deus a que aspiramos não nos será concedida pelos conjurados da revolução totalitária no campo religioso, político, econômico e artístico, mas pela sincera adesão aos principies emanados da Cátedra da Verdade, que, como fermento, aí estão à nossa espera para levedar toda a massa.
(1) Albert Frank-Duquesne: "Réflexions sur Satan en marge de la tradition Judéo-Chrétienne".
(2) Herbert Read : "The Politics of the Unpolitical".
(3) Idem.
(4) Ver, por exemplo, o que diz Robsjohn-Gibbings em "Mona Lisa's Mustache".
(5) Gaston Bardet: "De l ‘Urbanisme à l'Architecture", em "L'Architecture Française", n.° 101-102.
(6) "Le Cas Le Corbusier — Les techniques d'urbanisme face aux exigences de la Foi", em "L'homme nouveau" de 7-12-1952.
(7) Idem.
(8) Rádio mensagem de 1° de setembro de 1944.
Correspondência
Do Exmo. Revmo. Snr. D. José Joaquim Gonçalves, DD. Bispo Diocesano de Vitoria (Espírito Santo): “... Tenho lido o precioso, utilíssimo e fidelíssimo jornal CATOLICISMO! Irei fazer uma grande propaganda dele, aqui na Diocese..."
*
Do Revmo. Padre Clemente Treson, C. SS. R. (Juazeiro - Bahia): "Recebi a remessa do seu conceituado jornal-revista, e agradeço.
A revista me agrada muito. É verdadeiro Catolicismo que fala nas suas páginas irradiando o genuíno espírito da Igreja. Nem julgava possível existir no Brasil uma revista tão "ultramontana"!
Parabéns e votos de constante progresso..."
*
Do General Rinaldo Camara (Porto Alegre — Rio Grande do Sul): "Considero seu jornal uma realização oportuna e primorosa, tanto na forma como no fundo. É um dever auxiliar obra de tal alcance religioso e social. Sua matéria histórica também muito me tem agradado..."
*
De Ultramontano (Campos): "Recebendo a visita de um seminarista da Congregação de X..., mostrou-se ele entusiasta do "existencialismo cristão" de Gabriel Marcel, afirmando ser de todo conforme à doutrina da Igreja. Embora ignorante no assunto, não me soa bem tudo isto. Gostaria que CATOLICISMO dissesse uma palavra a respeito".
R - A Igreja tem uma Filosofia, melhor diríamos está de posse da Filosofia: a Escolástica. E quem quiser acertar em Teologia, isto é, quem desejar traduzir bem em conceitos humanos as verdades divinas que a Misericórdia de Deus quis revelar-nos, só tem um dicionário, a Escolástica.
Isto que dizemos é doutrina tradicional, como é tradicional, na heresia, o afastamento da Filosofia Tomista. De uma e outra afirmação, há muitos documentos pontifícios.
E mais recentemente, a "Humani Generis", escrita a propósito de "algumas falsas opiniões que ameaçam destruir os fundamentos da Doutrina Católica", demora-se sobre o Tomismo para mostrar sua excelência, para vingá-lo das acusações dos modernistas, e para salientar que o desprezá-lo tem sido a causa de muitas aberrações da verdade nos meios católicos. Eis, de fato, o fecho da parte da encíclica consagrada à Escolástica: "Seria desnecessário deplorar estas aberrações da verdade se todos, mesmo nas disciplinas filosóficas, atendessem com a devida docilidade ao Magistério da Igreja" (AAS. 42, p. 375).
A palavra deste Magistério está sintetizada no Código de Direito Canônico, que, no § 2 do Canon 1366, preceitua sejam os futuros Sacerdotes instruídos nas ciências filosóficas "segundo o método, a doutrina e os princípios do Doutor Angélico".
É, pois, um erro julgar que qualquer filosofia é boa, ou que o fiel tem liberdade absoluta de seguir nesta matéria suas inclinações, gostos ou simpatias, como se a Santa Sé, guia dos homens no caminho da verdade natural e sobrenatural, nada houvesse ensinado ou ordenado a respeito.
*
Ao preceituar a Escolástica, não desconhece a Igreja a possibilidade de progresso do espírito humano neste assunto. Este progresso, porém, há de ser orgânico. As bases já estão colocadas, e é preciso não suprimi-las. Sobre elas constroe-se o edifício, que é passível de novos acréscimos ou de ajustamentos. Assim soa o programa de Leão XIII, na "Aeterni Patris", sobre a restauração da Filosofia do Aquinate nas Escolas Católicas: "Vetem novis augere et perficere". Programa que o Pontífice reinante comenta com estas palavras: "Pode-se dar à filosofia, mesmo nas questões essenciais, uma veste mais conveniente e mais rica; poder-se-á reforçar a mesma filosofia com expressões mais eficazes, despojá-la de certos adminículos escolásticos menos conducentes, enriquecê-la ainda — com prudência todavia — de certos elementos que são fruto de progressivo trabalho da inteligência humana. Não se deverá jamais, porém, subvertê-la ou contaminá-la com falsos princípios, nem estimá-la só como um grandioso monumento de valor puramente arqueológico. Pois a verdade, e toda sua manifestação filosófica, não podem estar sujeitas a mudanças quotidianas, especialmente tratando-se de princípios evidente e diretamente conhecidos como tais pela razão humana ou de asserções referendadas, já pela sabedoria dos séculos, já pela harmonia com os dados da Revelação Divina" ("Humani Generis", AAS. 42, p. 572).
A Igreja não é retrograda, nem revolucionaria. Ela é tradicional, e tradição — como esplendidamente expôs o Santo Padre Pio XII em uma de suas alocuções à Nobreza e ao Patriciado Romanos — é vida que se renova e se aperfeiçoa, sempre porém na identidade do indivíduo.
Estas considerações mostram como andam fora do caminho reto aqueles que, levados por um prurido de novidade ou um falso zelo de conquista do mundo moderno, pretendem ajustar os dados da Fé aos novos sistemas filosóficos que se sucedem uns aos outros numa demonstração magnífica da falibilidade do orgulho humano. No século passado, o hegelianismo fascinou alguns espíritos da Alemanha, e logo surgiram os teólogos hegelianos, que, como era de se esperar, terminaram no "Index Librorum prohibitorum".
Hoje está na moda o existencialismo. E já aparecem os "vanguardeiros" no campo católico a procurar uma cabeça de ponte nos arraiais daqueles que estão de fora. Também a Igreja maternalmente já advertiu: "Nenhum católico pode pôr em dúvida quanto tudo isto (refere-se o Papa à pretensão daqueles que pensam que, com algum retoque, todas as filosofias se podem conciliar com o dogma católico) seja falso, especialmente tratando-se de sistemas como... o existencialismo, quando professa o ateísmo ou quando nega o valor do raciocínio no campo da metafísica" ("Humani Generis", ibid., p. 573/4).
E, como que aplicando a nosso país estes salutares principias da "Humani Generis", recomenda a Sagrada Congregação dos Seminários e das Universidades em carta ao Venerando Episcopado Brasileiro: "Se o professor tiver aprofundado a doutrina tradicional e estiver entusiasmado por ela, também os discípulos haverão de saboreá-la, sem necessidade de ir beber em fontes envenenadas. Se, pelo contrário, o professor, sob pretexto de filosofia modernizada ou de teologia "viva", procura ensinar com sentenças oratórias e com expressões peregrinas as novidades da moda do dia, deformará as inteligências e comprometerá o futuro da Igreja em todo o campo das influencias de seus alunos" (AAS. 42, p. 838/9).
*
Sobre Gabriel Marcel, como orientação — é o que nos pedem, — trazemos aqui algumas notas colhidas em autorizadas apreciações de sua obra.
1. A Ontologia de G. Marcel exclui a idéia "ingenuamente racional" de um sistema de afirmação válido para todos. Sua metafísica é pessoal: nem é descritiva - o ser não se apresenta como dado do conhecimento, - nem demonstrativa, pois não há conhecimento objetivo do ser. Para Marcel, "realidade, pensamento e certeza" são coisas unidas de maneira indissociável: afirmação que se poderia admitir referindo-se a Deus, mas que seria censurável atribuída ao homem.
A Ontologia de Marcel é pois, anticonceitual. A percepção do ser se faz por um Choque, um Encontro, no qual o ser se manifesta ao ser, não como um outro, mas como um tu e eu. Pertence à liberdade revelar-nos esta Presença.
Como se vê, o sistema não é muito claro. Aliás, "L'Ami du Clergé" - revista a que não falta grande dose de irenismo - salienta como característica do existencialismo a dificuldade de ser compreendido, de maneira que até nos seus melhores exegetas seria fácil salientar verdadeiras contradições (in "Notes de Philosophie", 1949, p. 199).
O certo é que esta Ontologia não nos parece escapar à censura formulada pelo Santo Padre ao rejeitar o existencialismo "quando nega o valor do raciocínio no campo da Metafísica" ("Humani Generis", AAS. 42, p. 574). Pois onde se rejeita a formulação conceitual, não há lugar para o raciocínio.
2. Outras observações mostrariam como a filosofia de Gabriel Marcel é excessivamente pessoal, de maneira que Jolivet pôde ver na sua obra "menos uma filosofia do que um método". De fato, ela surgiu de considerações de seu autor sobre a existência, a natureza mesma do existir, que, no seu caso se articularam com um conjunto de preocupações, levando-o tudo isso à conversão ao Catolicismo. Fato individual que, "do ponto de vista apologético, não poderá vir a ter uma aplicação geral".
Nesta ordem de idéias passamos às suas concepções sobre a Fé, que, tomadas como soam, ficam entre o racionalismo e o fideismo. Para. Marcel, "o objeto da Fé não é daqueles que se podem verificar e controlar... é uma coisa que é mais interior do que eu o sou a mim mesmo". De duas uma: ou a Fé faz parte do complexo de todo o homem - generalizando como convém a todo sistema filosófico - e estamos no racionalismo, ou melhor no naturalismo; ou a Fé, porque anterior, é incapaz de ser verificada pela razão, pela inteligência; é um dado da experiência que se impõe por si, e estamos no fideismo. Não é, pois, sem razão que "L'Ami du Clergé", no artigo citado, pondera que só pelo fideísmo se poderia relacionar o existencialismo cristão com os ensinamentos das verdades reveladas. "Pôde-se verificar, assim conclui o articulista, ao longo da análise do pensamento de G. Marcel que nenhum motivo de credibilidade pode ser invocado pelo existencialismo".
3. Diríamos nós que, talvez, a conversão de Gabriel Marcel. intelectualmente esteja ainda em caminho, pois uma adesão plena à Santa Igreja só virá quando o seu pensamento filosófico deixar essas gangas. Em outras palavras, quando esse filósofo perceber que os problemas e questões que o atormentam, na miséria, encontram solução na Escolástica, que é contraria às angustias e desesperos, porque tranquiliza como a posse da verdade. Também em Filosofia, a conformidade perfeita com o Magistério da Igreja é fonte de paz e conforto.
*
Tudo quanto expusemos nos leva a achar que cedeu muito aos ardores da mocidade o seminarista que se entusiasmou por um sistema filosófico tão alheio à Escolástica.
O fiel, e muito mais o Padre, só se devem entusiasmar pelo que é da Igreja. E não ter receio de que o tratem de atrasado e ignorante por esse motivo. Riqueza verdadeira é o que nos dá a Igreja. O resto são lantejoulas que envelhecem com o tempo. Ou não temos fé?
Em geral, nossa formação filosófica se ressente de naturalismo. No estudo dos várias sistemas filosóficos esquecemos, por amor aos homens, a consideração de que estes na sua maior parte, disfarçam nos ataques à Escolástica, ou na ignorância a seu respeito, urna atividade consciente contra a Igreja e a Revelação. De fato, fazem obra diabólica das mais genuínas; poas solapam os fundamentos até mesmo da Religião Natural, procurando extirpar qualquer possibilidade de adesão à Palavra Revelada. Não faríamos mal se déssemos mais valor às bem formuladas críticas de Papini aos sistemas filosóficos modernos. Lá estão no "Gog", capítulo das "Idéias de Benrubi". Leia-se, que é interessante e faz bem.
VERBA TUA MANENT IN AETERNUM
VIVEMOS EM UM MUNDO PAGANIZADO
PIO XII: É preciso que, escutando o conselho materno que Ela dava nas bodas de Cana, façamos tudo o que Jesus nos disse. E Ele disse a todos que façam penitência -- poenitentiam agite, — que emendem a sua vida e fujam do pecado, causa principal dos grandes castigos com que a Justiça do Eterno penitencia o mundo; que em meio deste mundo materializado e paganizante, em que toda a carne corrompeu os seus caminhos, sejam o sal e a luz que preserva e ilumina, cultivem esmeradamente a pureza, reflitam nos Seus costumes a austeridade santa do Evangelho, e, desassombradamente, e a todo o custo, como protestava a Juventude Católica de Fátima, vivam como católicos sinceros e convictos a cem por cento. Mais ainda: que, cheios de Cristo, difundam em torno de si, perto e ao longe, o perfume de Cristo e com a prece assídua, particularmente com o terço quotidiano e com os sacrifícios que Deus inspira, procurem às almas pecadoras a vida da graça e a vida eterna (Mensagem à Nação Portuguesa, de 31-X-1942, em que o Santo Padre consagrou o mundo ao Imaculado Coração de Maria).
0 QUE NÃO SE DEVE ESQUECER NA CONSIDERAÇÃO DO MISTÉRIO DO CORPO MISTICO
PIO XII: Por isso não censuramos os que, por diversos caminhos, se esforçam por atingir e quanto possível ilustrar este mistério tão sublime de nossa admirável união com Cristo. Uma coisa porém devem todos ter por certa e indiscutível, se não querem desviar-se da verdadeira doutrina e do reto magistério da Igreja: rejeitar toda explicação desta mística união que pretenda elevar os fiéis tão acima da ordem criada que eles cheguem a invadir a divina, a ponto de se atribuírem em sentido próprio um só que seja dos atributos de Deus. (Encíclica "Mystici Corporis Christi", de 29-VI-1943).
A ÚNICA CIVILIZAÇÃO VERDADEIRA É A CATOLICA
B. PIO X: Não, Veneráveis Irmãos — e é preciso lembrá-lo energicamente nestes tempos de anarquia social e intelectual, em que todos se erigem em doutores e legisladores — a cidade não será construída de outra forma senão aquela pela qual Deus a construiu; a sociedade não será edificada se a Igreja não lhe lançar as bases e não dirigir os trabalhos; não, a civilização não mais está para ser inventada nem a cidade nova para ser construída nas nuvens. Ela existiu, ela existe; é a civilização cristã, é a cidade católica. Trata-se apenas de instaurá-la e restaurá-la sem cessar sobre os seus fundamentos naturais e divinos contra os ataques sempre renascentes da utopia malsã, da revolta e da impiedade: "omnia instaurare in Christo". — (Carta Apostólica "Notre Charge Apostolique", de 25-VIII-1910).
OS EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS: ANTÍDOTO CONTRA OS ERROS SOCIALISTAS
B. PIO X: Certamente não poderíeis fazer obra melhor (do que a dos Exercícios Espirituais) para vir em socorro do povo, exposto hoje a tantos perigos, principalmente nessas regiões. Chamando-se os homens à meditação das verdades eternas, fazendo-os compreender que nascemos todos para bens incomparavelmente mais elevados e magníficos do que os da terra, o povo será fortalecido na consciência do dever, e os de condição modesta não se deixarão seduzir pelas mentiras dos socialistas, que resumem na vida presente toda a felicidade do homem — (Carta "Exercitiorum Spiritualium" ao Pe. Criquelion, de 8-XII-1904).
É VONTADE DE DEUS QUE TUDO NOS VENHA POR MARIA
PIO XI: Todavia, Veneráveis Irmãos, se bem que tantos e tão grandes males nos ameacem, e tenhamos de temer outros ainda maiores para o futuro, não devemos perder a coragem nem deixar esmorecer em nós a esperança confiante que se apóia unicamente em Deus. Ele, que fez curáveis os povos e nações (cf. Sap. I, 14), não deixará, seguramente, perecer aqueles que foram redimidos pelo Seu Precioso Sangue, nem abandonará a Sua Igreja. Mas, como lembramos de início, empreguemos, aos pés de Deus, sobretudo a mediação da Bem-aventurada Virgem, muito agradável a Seus olhos, pois que, para Nos servirmos das palavras de São Bernardo (Serm. in Nativ. B. M. V.), "tal é Sua vontade (de Deus), o qual quis que recebêssemos tudo por intermédio de Maria" (Encíclica "Ingravescentibus Malis", de 29-IX-1937).
AS MAIORES VÍTIMAS DO MAU CINEMA
PIO XI: Esta é a causa principal da fascinação exercida por essas representações sobre a infância, a adolescência e a juventude; de modo que justamente na idade em que nasce e deve tomar forma o senso de honestidade, em que os princípios de justiça e probidade se desenvolvem no espírito, quando emerge a noção do dever e surgem as melhores resoluções de perfeição de vida, é então que o cinema exerce sua influência e consegue sua maior eficácia. E, ó dor! em nossos dias tal eficácia, com extrema frequência, é perniciosa e nos traz à memória, ao contemplar tão grande ruína para as crianças e sobretudo para os jovens, cuja integridade e castidade correm perigo nas salas de espetáculos, aquela duríssima sentença de Jesus Cristo contra os corruptores de menores: A quem escandalizar, porém, a um destes pequeninos que crêem em mim, seria melhor pendurar-lhe no pescoço uma pedra de moinho, e submergi-lo no fundo do mar (Math. XVIII, 6). Hoje em dia é de necessidade imperiosa trabalhar com o maior empenho para que tais espetáculos não sejam escolas de vício, mas contribuam eficazmente para a educação dos homens e para elevar o nível dos costumes. — (Encíclica "Vigilanti Cura", de 15-VII-1936).
OS QUE TUDO ESPERAM DA COLETIVIDADE, PERDERAM A PRÓPRIA IDEIA DE LIBERDADE
PIO XII: Aqueles, por exemplo, que no campo econômico ou social desejam fazer cair tudo sobre a sociedade, até mesmo a direção e segurança das próprias existências, ou quotidiano cada vez menos de si próprios - isto é, das próprias convicções e conhecimentos - e cada vez mais tudo já preparado pela imprensa, rádio, cinema e televisão, esperam hoje o alimento espiritual como hão de ter idéia da verdadeira liberdade, como a hão de estimar e desejar, se ela desapareceu das suas vidas? Não passam de simples engrenagens nos diversos organismos sociais, deixaram de ser homens livres capazes de assumir e aceitar uma parte de responsabilidade na administração pública. Por isso, se os ouvimos gritar - Abaixo a guerra!, como havemos de ter confiança? Em verdade, não é a voz deles, é a voz anônima do grupo social a que estão ligados (Rádio mensagem do Natal de 1951).
* * *
NOVA ET VETERA
Proletarização da Burguesia
J. de Azeredo Santos
Publicaram os jornais diários dos grandes centros do país, com abundância de detalhes, a grave denúncia feita por pessoas de responsabilidade, no sentido de que "os criadores da questão social no Brasil são a COFAP e a CEXIM, ambas infiltradas de comunistas".
A ação evidentemente nefasta de organismos desse tipo no campo da realidade prática, nos faz lembrar o que pregam certos doutrinadores da revolução proletária quanto ao fato de não bastar a chamada "legislação social" para a transformação real de uma sociedade capitalista em uma sociedade trabalhista. Não bastaria agir no plano intelectual, teórico, jurídico. Seria preciso fazer viver essa transição por meio de medidas práticas, para ir gradualmente habituando o povo com o regime trabalhista. E a generalização do trabalho pelo empobrecimento da burguesia seria um dos meios práticos de ser vivida essa transição. Um meio útil, importante, indispensável mesmo.
O EMPOBRECIMENTO DA CLASSE MÉDIA
Ora, a nocividade de organismos como a COFAP e a CEXIM se acha apenas agravada pela circunstância de estarem eles dominados por elementos comunistas. Tal como se dá com outros institutos que praticam em nossa economia a teoria da terra arrasada, e como acontece de modo mais impressionante ainda no caso da Previdência Social monopolizada pelo Estado, essa indevida e absorvente intervenção estatal não é condenável unicamente por razões da ideologia eventualmente esposada por quem detêm em suas mãos os cordéis desses poderosos meios de opressão social, mas em si mesma, por atentar contra as bases naturais da organização social, artificialmente destruindo a prosperidade e implantando tiranicamente o empobrecimento exigido pelos aprendizes de feiticeiro da revolução igualitária. A atuação de elementos comunistas aumenta o efeito corrosivo de tais entidades, mas mesmo em mãos de técnicos neutros os resultados práticos finais, embora talvez mais demorados, seriam idênticos.
Salta aos olhos de quem observa a nossa realidade social, o progressivo e rápido empobrecimento da classe média no Brasil, dessa mesma classe média de cuja existência e prosperidade tanto depende a grandeza desta imensa parcela do solo americano, como bem acentuou o Santo Padre Pio XII em carta dirigida ao povo brasileiro. Cresce entre nós cada vez mais, e de modo inquietador, o contingente do proletariado provindo da pequena e média burguesia. A instabilidade política e econômica, o aviltamento da moeda seguido de exações confiscatórias e de leis que atentam contra o lícito usufruir de rendas, resultante do labor dos que conseguiram criar um pequeno patrimônio pela parcimônia, - tais como a que estatuiu o congelamento dos alugueis, - tudo isso faz com que no Brasil nos afastemos cada vez mais da normalização das condições de vida do proletariado, desejada pela Igreja, e que, pelo contrário, o número desses mesmos proletários tenda a crescer pela decadência da pequena e média burguesia. Tudo isso acompanhado de nunca vista concentração de poder econômico nas mãos daqueles poucos que fazem reverter em seu proveito a cornucópia das graças oficiais.
FORMA COLETIVISTA DE ECONOMIA
Dizia Leão XIII que o respeito que o católico deve à autoridade civil não exclui a manifestação de desacordo quanto a atos injustos emanados dessa mesma autoridade. Seja-nos lícito, portanto, dentro deste tema do desaparecimento da classe média, tecer alguns comentários em torno da seguinte afirmação do atual Chefe do Governo, em seu discurso de Petrópolis de 5 de setembro de 1950, durante a campanha presidencial: "A previdência social é a forma coletivista da economia industrial, do "pé-de-meia" que, antigamente, na economia patriarcal, era virtude quase privativa do pequeno burguês amealhador. Para o proletariado, sujeito às crises periódicas de super-produção, só a grande economia institucional resolve os seus problemas e pode alcançar as suas necessidades, suplementando o salário".
Ora, em nenhum ponto da doutrina social católica se vê esse apelo a uma "forma coletivista da economia industrial", nem a essa "grande economia institucional" que mantém o proletário como proletário, sempre caudatário desses ciclópicos organismos econômicos. A base da previdência social continua, na era industrial, a ser a família auto-suficiente, capaz de se defender a si própria. As formas coletivistas de economia, sobretudo quando implantadas coercitivamente pelo Estado, são o contrário do que continua a ensinar a Igreja, como bem acentua Pio XII: "Ouve-se agora os homens empregarem frequentemente esta expressão: segurança social. Se isto quer dizer precisamente segurança por meio da sociedade, tememos muito que o casamento e a família aí encontrem um dano. Que dano? Tememos, não somente que a sociedade civil se ocupe de uma coisa que, de si, é estranha às suas atribuições, mas também que o sentido da vida cristã e o próprio plano de sua organização sejam com isso feridos e mesmo golpeados de morte... Para os cristãos e, em geral, para todos os que crêem em Deus, a segurança social outra coisa não pode ser senão uma segurança em uma sociedade e com uma sociedade que considera a vida natural do homem e a origem e o desenvolvimento da família como o fundamento sobre o qual se apoia a própria sociedade para exercer regularmente e seguramente todos os seus encargos e obrigações... Eis porque, se se deseja trabalhar ativamente para a salvaguarda da sociedade humana, se torna necessário nada negligenciar para salvar e amparar a família, e torná-la capaz de se defender a si própria" (Alocução à Hierarquia Católica, de 2 de novembro de 1950). E na carta que Mons. J. B. Montini, então Substituto da Secretaria de Estado de Sua Santidade, dirigiu ao Presidente das Semanas Sociais do Canadá, por ocasião da assembléia realizada de 25 a 28 de setembro de 1952, lemos o seguinte: "O Santo Padre já alertou mais de uma vez o mundo do trabalho contra as deturpações de iniciativas excelentes em principio, mas que devem situar-se em seu devido lugar, no conjunto de um problema, sob pena de lesarem outros interesses respeitáveis e de não conseguirem o objetivo que lhes competia para o bem comum. Ele o fez, entre outras ocasiões, em seu importante discurso de 2 de novembro de 1950 à Hierarquia Católica, mostrando como um seguro social que fosse monopólio do Estado seria prejudicial às famílias e às profissões, em favor e por meio das quais deve antes de tudo exercer-se".
A REDENÇÃO DO PROLETARIADO
O seguro social não é senão mero complemento do trabalho e da poupança, em caso de infortúnio. Estes são, pois, o principal na economia do trabalhador. Eis porque vive a Igreja a repetir a necessidade do acesso à propriedade como um dos meios de se superar a condição de proletário que acompanha o trabalhador no mundo de hoje. O seguro social, normalmente, seria um elemento secundário, para situações singulares, e não deve substituir o "pé-de-meia", mesmo porque, segundo a doutrina social da Igreja, o salário justo deve ser suficiente não somente para as necessidades imediatas de um trabalhador morigerado, mas também para a formação do patrimônio familiar, pela poupança. Falando sobre o desaparecimento do proletariado por meio do acesso à propriedade, diz Pio XI: "Com todo o empenho e todo o esforço se há de procurar que, ao menos para o futuro, as riquezas adquiridas se acumulem com medida equitativa em mãos dos ricos, e se distribuam com bastante profusão entre os trabalhadores, não certamente para fazê-los remissos no trabalho, porque o homem nasce para o trabalho como a ave para voar, mas para que aumentem com a poupança seu patrimônio; e administrando com prudência o patrimônio aumentado, possam mais fácil e seguramente sustentar os encargos de sua família, e saídos das inseguranças da vida, cujas vicissitudes tanto agitam aos proletários, não só estejam dispostos a suportar as contingências da vida, mas também possam confiar em que, ao abandonar este mundo, os que deixam atrás de si permaneçam de algum modo providos" (Enc. "Quadragesimo Anno").
Como argutamente observa o Conde de Portsmouth, ao estudar os males da dominação política, social e econômica do mundo de hoje, tal dominação se baseia em geral no poder sem responsabilidade e no lucro sem produção, pelo que "a miséria e a degeneração têm vindo caminhando à frente da procissão do progresso moderno" (em "Alternative to Death"). Não será, portanto, essa "forma coletivista da economia industrial" que resolverá os problemas do proletariado, nem os da superprodução, ou melhor, do infra-consumo, - pelo contrario, as chamadas democracias ocidentais, com essa tendência coletivista e centralizadora, sempre seguida do inevitável séquito de burocracia e de corrupção, apenas preparam as veredas para o advento do coletivismo integral.