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Campos aclama a Imagem de Fátima

As manifestações imponentes com que a imagem de Nossa Senhora de Fátima foi acolhida nesta cidade constituíram, por certo, motivo de intenso e piedoso jubilo para nosso egrégio Bispo Diocesano. Com efeito, Campos inteira mobilizou-se ao apelo do grande Bispo mariano para em união com ele e sob sua direção prestar uma série de homenagens apoteóticas à Rainha do Céu. Indicio expressivo de quanto vem florescendo nesta Diocese a Religião Católica, pelo trabalho, pela doutrina, pelo exemplo de altas virtudes, do Exmo. Revmo. Sr. Dom Antonio de Castro Mayer.

Os três dias em que a imagem de Nossa Senhora de Fátima permaneceu em Campos foram para esta cidade como que uma transfiguração. Quem conhece superficialmente o campista, quem o vê entregue aos afazeres quotidianos de sua vida, todo voltado para o trabalho, não imagina talvez que tesouros de Fé e de devoção mariana nele existem. Campos não é hoje em dia uma cidade do positivismo e do laicismo, mas uma cidade essencialmente católica, metrópole não só econômica como também religiosa do Norte fluminense.

Ao alto, a imagem da Santíssima Virgem, em seu carro triunfal, percorre à noite a Praça do Santíssimo Salvador. Toda a cidade está presente para aclamar a Mãe de Deus.

Sua Excia. Revma. o Sr. Dom Antonio de Castro Mayer, ladeado pelos membros da comitiva que acompanha a imagem peregrina, pelo Exmo. Revmo. Mons. Julio de Moura, Vigário Geral, e por personalidades do Clero desta Diocese.

Terminada a missa campal na Praça do SSmo. Salvador, e feita a Consagração da Diocese ao Imaculado Coração de Maria, pelo Exmo. Sr. Bispo Diocesano, a imagem de Na. Sra. de Fátima, carregada pelo Revmo. Clero da Diocese, percorre a multidão tomada de intenso fervor.

OS CATÓLICOS FRANCESES DO SÉCULO XIX

O Bispo de Arras salva o Univers da investida do Bispo de Orléans

Fernando Furquim de Almeida

Sob pretexto de evitar que se acreditasse em "pretensas divisões do episcopado", Mons. Dupanloup pediu a assinatura de todos os bispos da França para uma declaração segundo a qual os atos dos bispos não podiam ser criticados pelos jornais; que o uso dos clássicos na educação da juventude não era mau nem perigoso, desde que as obras estudadas fossem convenientemente expurgadas; e que esse expurgo deveria ser feito única e exclusivamente pelo bispo de cada diocese, reputando-se indevida a interferência de qualquer escritor ou jornalista.

Essa declaração não continha nada de novo, e em tese era aceitável para qualquer bispo. Nem sequer entrava no âmago da questão dos clássicos, pois o que estava em jogo não era saber se os clássicos podiam ou não ser selecionados, e sim se deviam continuar a ter um papel preponderante na educação secundária, ou se cumpria nela introduzir também, em larga escala, os clássicos cristãos. Mas, dado o incidente que Mons. Dupanloup tivera com o "Univers", o apoio do episcopado a essa circular significaria praticamente a condenação de Veuillot.

Foi debaixo do maior sigilo que o Bispo de Orléans enviou emissários aos bispos que ainda não tinham se manifestado favoráveis a Mons. Gaume, a fim de obter-lhes a adesão. A acolhida que esses enviados receberam foi a mais variada, e tudo veio a transpirar. Monsenhor Dupanloup, apressado, tentou obter o pronunciamento dos que hesitavam ou delicadamente adiavam a resposta, escrevendo-lhes cartas sucessivas, que chegaram a desagradar os que não desejavam assinar o documento. Monsenhor Dépéry, por exemplo, à terceira carta que recebeu, acabou por responder do seguinte modo:

"Monsenhor, creio em Deus, criador do universo, mas não creio na boa fé dos que querem destruir o "Univers".

"Creio em Jesus Cristo, que estabeleceu a Igreja com os doutores cristãos, e não com os doutos do paganismo.

"Creio na comunhão dos santos, mas não quero pertencer à da "Gazette", do "Siècle", dos "Débats", da "Presse" e do "Charivari".

"Creio na ressurreição dos mortos, mas temo muito a dos galicanos e parlamentares.

"Creio na vida eterna, mas não desejo a dos Campos Elíseos, por mais bela que a descrevam os poetas pagãos.

"Em suma, Monsenhor, sou pela adoção dos autores cristãos em uma justa proporção, em renunciar às obras-primas de Roma e Atenas cuidadosamente expurgadas do que têm — e é muito — de contrário aos bons costumes e à Fé católica".

O Cardeal Gousset, que apoiava a tese de Mons. Gaume e ainda não fora consultado, alarmado com o novo processo de pronunciamento do episcopado, excogitado por Mons. Dupanloup, escreveu ao Cardeal Antonelli, Secretário de Estado de Pio IX, pedindo a intervenção da Santa Sé. Ao mesmo tempo enviou aos bispos franceses uma circular confidencial, chamando a atenção sobre o perigo da declaração.

"Soube — diz ele na circular — que certos emissários de Mons. Dupanloup se apresentaram de sua parte ou em seu nome, em diversas dioceses, mas ignoro o que propuseram ou solicitaram. Receio muito que, sob o pretexto de evitar desunião no episcopado, se tenha começado por dividi-lo, comprometendo com assinaturas individuais uma parte dos bispos sem o conhecimento dos outros, talvez com o objetivo nítido de colocá-los em oposição. Qualquer que tenha sido sua intenção, prevejo que os atos e negociações do Bispo de Orléans terão um resultado de que seu zelo e piedade não poderão se felicitar. Não é com esses processos que serão resolvidas definitivamente questões como a que temos no momento, e me permitirei dizer que essa tentativa nem sequer deveria ter sido esboçada".

As negociações de Mons. Dupanloup chegaram ao conhecimento do público, no campo de cujas atenções a questão dos clássicos foi completamente suplantada pela declaração. Corria que o Bispo de Orléans já conseguira sessenta assinaturas, e esperava-se a todo momento a condenação do "Univers". A realidade, no entanto, era bem outra. A declaração dividira completamente o episcopado, e um verdadeiro dilúvio de cartas e memórias confidenciais circulava entre os bispos; porém nenhum tomava publicamente partido pelo jornal, de modo que a impressão dominante era de que este estava perdido.

Veuillot, vendo a impossibilidade de continuar a editar um jornal cuja condenação os leitores esperavam para breve, e era anunciada com explosões de júbilo por todos os seus inimigos sem que ninguém o defendesse, resolveu sair de Paris para não assistir ao fracasso de sua obra. Preparou desanimado a edição do número que julgava ser um dos últimos, e partiu para Vitry com a família, deixando o "Univers" confiado a seu irmão Eugênio. Depois de sua partida, porém, chegou à redação uma carta de Mons. Parisis, uma das mais destacadas figuras do episcopado, elogiando e defendendo calorosamente o jornal. A edição foi refeita, e no dia seguinte o "Univers" publicava a carta do Bispo de Arras.

Em carta à sua irmã Elisa, Veuillot conta como teve conhecimento da intervenção de Mons. Parisis:

"Feliz Elisa, que é que te falta no mundo? Estás em Bemay, e além disso enviamos-te a carta do Bispo de Arras. Espero que estejais todos contentes. Uma das minhas alegrias foi pensar na alegria de todos. Fiquei tão surpreso como os outros. Tinha partido para Vitry às 5 horas, deixando pronta a edição do jornal. Havia escrito a alguns amigos sinceros, mas impotentes, cartas em que lhes anunciava minha próxima morte. Via bem que tudo ia mal, não somente para nós, como para todos os ultramontanos da França, a quem eu acusava de fraqueza.

"Encontrei em Vitry o Cura de Saint-Nicolas, e passei a tarde tentando demonstrar-lhe que a questão acabaria bem. No dia seguinte fomos à missa, e Matilde e eu comungamos em espírito de submissão. Depois de nossa ação de graças, voltamos para casa.

"Trazem-nos o jornal. Eu o abro negligentemente, para ler notícias diversas... Olhe! Olhe! Eis Matilde que se põe a chorar...

"Para acabar a festa, Eugênio chega. Esperava que eu ainda não tivesse lido o jornal. A famosa carta chegara com o correio da tarde, e foi enviada para a oficina com a alegria que podes imaginar".

Termina descrevendo cenas ocorridas na redação, e que patenteavam a "alegria louca" que se apoderou de todos.


NOVA ET VETERA

Educação e Despersonalização

J de Azeredo Santos

Lá está no "De Magistro": "No verdadeiro sentido da palavra, pode o homem ser chamado doutor e mestre da verdade, iluminando a mente, não como se infundisse na razão a luz intelectual, mas porque, pelos sinais exteriores que propõe, ajuda essa luz a atingir a perfeição científica. Neste sentido diz S. Paulo (Efesios III, 8 e 9): A mim, o mínimo de todos os santos, me foi dada esta graça... de patentear como se realizou esse mistério, oculto desde a eternidade em Deus". Efetivamente, "como se diz que o médico produz a saúde embora seja exterior a sua ação, ao passo que só a da natureza é interior; assim também se diz que o homem ensina a verdade, embora a anuncie exteriormente e Deus a ensine interiormente" ("De Magistro", art. 1, resp. ao 7º arg.), isto é, um homem pode causar noutro a ciência, graças à cooperação da razão natural deste último.

Eis porque São Tomaz é tido por precursor da pedagogia moderna, no que diz respeito à participação ativa do aluno. Não se trata de novidade, mas de mera questão de bom senso: como fazer o aluno aprender, se este se recusa a cooperar, a pensar, a assimilar o que lhe é ensinado? Entretanto, já os maniqueus faziam confusão sobre este assunto, dando à mente humana uma auto-suficiência que lhe não pertence após a Queda. E Santo Agostinho lhes respondia: "Como a terra, antes do pecado irrigada por uma fonte, depois dele precisou de chuva caída das nuvens; assim também a mente humana, simbolizada pela terra, antes do pecado era fecundada pela fonte da verdade, ao passo que depois precisa de doutrina alheia como de chuva que desce das nuvens" ("Contra Maniqueos", II, cap. 4). E esse velho preconceito gnóstico da rejeição da autoridade externa ressurge hoje sob novas roupagens.

PROCURA-SE UMA REDOMA

Acha-se no Brasil o psicólogo húngaro professor Bela Székely. Passou pela Bahia, por Minas Gerais e por São Paulo. Na capital deste último Estado, a convite da secretária de Educação da Prefeitura, manteve uma palestra com professores e professoras municipais, sobre problemas de psicologia educacional. Entre os pontos abordados pelo visitante, segundo resumo publicado pela imprensa diária, constou o seguinte: "Acha o prof. Székely que o professor não deve influir de nenhum modo nas idéias do aluno, pelo contrário, deve deixar que este pense o mais livremente possível Não deve orientar seu pensamento e sim despertar a criança para que ela tome seu próprio rumo, aprenda a tomar resoluções e se sinta cada vez mais independente. Uma criança não deve sujeitar-se a nenhuma influência ou dogma. Não deve ser dirigida sua educação religiosa, política, psicológica, inclinações, etc. Ela deve aprender a ser boa e a agir por si mesma, como base para sua formação" ("Diário de S. Paulo", de 30 de abril de 1953).

A ser fiel o relato dos jornais, teremos que perguntar ao professor Bela Székely onde é que se fabricam redomas especiais para impedir as crianças de tomar contacto com o meio ambiente e sofrer o efeito das influências externas que as assediam por todos os lados. Talvez o prof. Székely parta do pressuposto de que as crianças se acham nas mãos de maus mestres, de médiuns espíritas, de heterodoxos, de incrédulos, de indivíduos de mentalidade totalitária ou laicista, que vão inocular o veneno das idéias errôneas nesses cérebros em formação. Foi tendo em vista este perigo que a Igreja condenou a proposição segundo a qual "os católicos podem aprovar um sistema de educação que esteja separado da Fé católica e do poder da Igreja, e que tenha por objeto único, ou pelo menos principal, a ciência das coisas naturais e o que se limita à vida social deste mundo" (Proposição 48 do "Syllabus", de Pio IX). Mas se a escola é realmente o prolongamento do lar, será ali que o menino há de receber boa parte de sua formação.

FALSIDADE E DANOS DO NATURALISMO PEDAGOGICO

Segundo ensina a Igreja, o sujeito da educação é o homem todo inteiro, espírito unido ao corpo em unidade de natureza, com todas as suas faculdades naturais e sobrenaturais, — o homem vítima da queda, mas resgatado por Nosso Senhor Jesus Cristo. E, no início de sua caminhada sobre a terra, como há de achar o caminho da salvação aquele que sofre os efeitos do pecado original, particularmente a debilidade da vontade e as tendências desordenadas?

"A estultice está ligada ao coração do menino, mas a vara da disciplina a afugentará (Prov. XXII, 15). Faz-se, pois, mister corrigir as inclinações desordenadas, fomentar e ordenar as boas, desde a mais tenra infância e, sobretudo, deve-se iluminar o entendimento e fortalecer a vontade com as verdades sobrenaturais e os meios da graça, sem a qual não se pode, nem dominar as inclinações perversas, nem alcançar a devida perfeição educativa da Igreja, perfeita e completamente dotada por Cristo com a doutrina divina e os sacramentos, meios eficazes da graça" (Encíclica "Divini lllius Magistri").

"Uma criança não deve sujeitar só a nenhuma influência ou dogma", teria dito o prof. Székely. "Não deve ser dirigida sua educação religiosa, política, psicológica, inclinações, etc.. Ela deve aprender a ser boa e a agir por si mesma". Esta sentença de orgulho e auto-suficiência é a caricatura do que nos diz São Tomaz sobre a missão orientadora do mestre. Estamos diante de velho conhecido, o naturalismo pedagógico denunciado por Pio XI: "É falso todo naturalismo pedagógico que de qualquer modo exclua ou deprecie a formação sobrenatural cristã na instrução da juventude; e é errôneo todo método de educação que se funde, no todo ou em parte, sobre a negação ou olvido do pecado original e da graça e, portanto, sobre as forças exclusivas da natureza humana. Tais são, geralmente, esses sistemas atuais de nome diverso, que apelam para uma pretendida autonomia e liberdade ilimitada da criança e que diminuem ou mesmo suprimem a autoridade e a obra do educador, atribuindo ao educando uma preeminência exclusiva de iniciativa e uma atividade independente de toda lei superior natural e divina, na obra de sua educação" (Enc. cit.).

A VERDADEIRA COOPERAÇÃO ATIVA

No mundo moderno o homem é cada vez mais o joguete de poderosas influências externas despersonalizadoras. Deve-se pois louvar tudo o que concorra para que ele realize sua própria personalidade. Dia a dia se torna mais premente a necessidade da cooperação ativa do estudante, também vítima do meio ambiente, para que ele tenha idéias próprias e aprenda a raciocinar por si mesmo, pois o comum em nossos dias são os cérebros vazios, são os pensamentos estereotipados pela propaganda, pelos slogans dos anúncios, da imprensa, do rádio, do cinema, da televisão, por todos esses fatores que porfiam em fazer o homem agir à revelia de sua consciência apresentando-lhe as idéias já mastigadas, os problemas já resolvidos (e que soluções!), seu caminho já traçado (e que caminho!).

Do ponto de vista católico, podemos afirmar que esse respeito pela pessoa humana fez sempre parte da educação tradicionalmente ministrada pela Igreja, "à semelhança do modo pelo qual o próprio Deus guarda respeito pelas criaturas, às quais chama à cooperação ativa, segundo a própria natureza de cada uma, já que Sua sabedoria abarca fortemente desde uma extremidade à outra, e dispõe todas as coisas com suavidade (Sap. VIII, 1)" (Pio XI na enc. "Divini lilius Magistri").

Suscitemos uma verdadeira cruzada contra essas influências deletérias que se exercem no sentido de reduzir a humanidade à zoocracia, a um rebanho de animais irracionais. Mas lutemos também contra os que aceitam, resignados e até embevecidos, os elementos deformadores do homem no mundo moderno, e querem encerrar em uma verdadeira redoma aqueles que, como os mestres, na acepção católica da palavra, podem influir no espírito dos jovens para neutralizar ou contrariar o trabalho dos imensos laboratórios montados para despersonalizar o homem moderno.