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EISENHOWER CONFIRMA NA ONU AS AMEAÇAS DE NOSSA SENHORA DE FÁTIMA

Plinio Corrêa de Oliveira

Temos a impressão de que a alegria das festas de Natal e Ano Bom apresentou muito de artificial. O homem contemporâneo semi-paganizado se sente de tal maneira sobrecarregado de trabalhos e acabrunhado por preocupações, que quase não há para ele disponibilidades temperamentais para sensações tão diversas das de sua vida quotidiana, como sejam as doces alegrias do fim de ano. Para nós católicos, que consideramos os fatos à luz da fé, as perspectivas do futuro se marcam por dois traços bem nítidos. Em 8 de dezembro último, deram-se no mundo dois fatos de natureza e significação muito diversa. De um lado, o orbe católico dedicava o dia santo ao início do ano mariano, com atos de particular devoção à Virgem Imaculada. De outro lado, a ONU profundamente laica, ignorando a Imaculada Conceição, e fazendo abstração do dia santo, estava em sessão: numa grave e terrível sessão, aliás, pois na assembléia política mais importante da terra, o supremo magistrado da potência mais rica e mais armada discorria sobre o mais grave perigo material a que a humanidade haja sido exposta até nossos dias.

Disse bem o General Eisenhower que “a era atômica se desenvolveu em tal ritmo, que cada cidadão do mundo deverá ter alguma compreensão, ao menos em termos relativos, do alcance desse desenvolvimento, do seu profundo significado para todos nós”. Por isto, sobretudo para que o “significado profundo” ressalte aos olhos dos leitores esclarecidos por uma luz que no discurso do Presidente americano - como aliás na generalidade dos documentos diplomáticos de hoje - não brilha, isto é, a luz da Fé, pareceu-nos bem, atrair novamente a atenção dos leitores para algumas informações que o próprio discurso nos dá.

Em termos simples, mas muito graves, disse o General Eisenhower: “Sinto-me obrigado a falar hoje numa linguagem que, em certo sentido, é nova, uma linguagem que eu, que passei tantos anos de minha vida na carreira militar, teria preferido nunca usar. Essa nova linguagem é a da guerra atômica”.

E prosseguiu:

“A 16 de julho de 1945, os Estados Unidos realizaram a primeira experiência da explosão atômica.

“Desde esse dia de 1945, os Estados Unidos realizaram quarenta e duas provas de explosões atômicas.

“As bombas atômicas de hoje são mais de vinte e cinco vezes mais poderosas do que as armas anteriores ao amanhecer da era atômica, ao passo que as armas de hidrogênio têm um poderio equivalente ao de milhões de toneladas de “TNT”.

“Hoje o arsenal de armas atômicas dos Estados Unidos, que cresce dia a dia, excede de muitas vezes o total dos explosivos das bombas e projéteis que lançaram todos os aviões e todos os canhões empregados em todos os teatros de operações durante todos os anos da segunda guerra mundial.

“Em amplitude e variedade, o desenvolvimento das armas atômicas não foi menos notável. Esse desenvolvimento foi tal que elas tomaram praticamente o lugar das armas convencionais em nossas forças armadas”.

As imensas forças armadas de um dos grandes beligerantes de uma eventual guerra estão, pois, a bem dizer, inteiramente dotadas da potência destruidora decorrente da desagregação do átomo.

O mesmo já há algum tempo começou a dar-se com o outro grande eventual beligerante, isto é, a Rússia. Afirma Eisenhower:

“O segredo é também conhecido pela União Soviética.

“A União Soviética informou-nos que nos últimos anos dedicou grandes recursos às armas atômicas. Durante esse período, fez explodir uma série de dispositivos atômicos, inclusive pelo menos um que continha reações termo-nucleares.

“Se em certa época possuíram os Estados Unidos o que se podia chamar de monopólio do poder atômico, esse monopólio deixou de existir há alguns anos”.

Como é sabido, também a Inglaterra e a França possuem segredos atômicos. Refere-se sem dúvida a elas o Presidente, quando acrescenta que “os conhecimentos ora possuídos por quatro nações serão eventualmente compartilhados por outras”.

Estes são os dados certos. No terreno das probabilidades, quem poderá contestar que a Alemanha e o Japão também possuem a este respeito progressos científicos que ignoramos? A consequência é clara. Uma nova guerra mundial será um dilúvio atômico. A perspectiva que assim se abre é terrível: “a probabilidade da destruição da civilização, do aniquilamento do patrimônio insubstituível da humanidade, que nos foi legado de geração em geração, e da condenação do gênero humano a ter que começar novamente a luta ancestral contra a selvageria, pela justiça e pelo direito”.

Contra esta perspectiva apocalíptica que o General Eisenhower qualifica em outro tópico de seu discurso, de “câmara de horrores”, qualquer proteção é pouco eficaz. Diz Eisenhower sobre o terror de uma represália, considerado como meio psicológico de defesa contra uma agressão atômica: “Mesmo uma superioridade numérica e a consequente capacidade para uma represália devastadora, não constituem por si mesmas uma garantia contra os espantosos danos materiais e a perda de vidas humanas que infligiria uma agressão de surpresa”.

O radar e outros meios de defesa também não oferecem garantias suficientes: “O mundo livre tratou, naturalmente, de elaborar um grande programa de estabelecimento de sistemas de alarme e de defesas, grande pelo menos numericamente. Esse programa será acelerado e ampliado.

“Contudo, ninguém pense que a aplicação de enormes somas em armas e sistemas de defesa pode garantir uma segurança absoluta para as cidades e os cidadãos de qualquer nação. A horrenda matemática da bomba atômica não permite uma solução tão fácil. Ainda contra a mais poderosa defesa, qualquer agressor em posse de um número mínimo de bombas atômicas para um ataque de surpresa, poderia lançar, provavelmente, um número suficiente de suas bombas nos alvos escolhidos, causando espantosos danos”.

A moral está moribunda no campo das relações internacionais. No que diz respeito à Rússia soviética há muito tempo já morreu, ou antes jamais existiu. Ninguém teria, pois, o direito de se surpreender com uma súbita agressão atômica, da parte dos russos: até no calor reconfortante da maior cordialidade diplomática, os soviéticos podem de um momento para outro decidir-se a deflagrar a guerra, começando pelo bombardeio atômico, ou de hidrogênio, de Londres, Paris, Nova York ou S. Francisco. Isto, que é uma terrível possibilidade, se torna uma probabilidade em qualquer das inúmeras tensões a que a política internacional está continuamente sujeita.

No início do século, o mais ousado autor de folhetins não teria podido imaginar nada de pior. A realidade tomou formas, cores, ares de folhetim. Concluamos pois esta parte do comentário - se quisermos ficar no diapasão da realidade - com uma frase folhetinesca: as asas da morte, o espectro da guerra e da catástrofe universal pairam sobre o mundo.

CATOLICISMO publica neste número uma extensa resenha dos acontecimentos do ano findo. Foram muitos, e dignos de nota. Mas todos eles só têm seu pleno significado quando considerados em função desta grande alternativa - paz e guerra - que, já o sabíamos e o discurso de Eisenhower o veio tornar ainda mais visível, se confunde para o mundo com esta outra alternativa: destruição apocalíptica, ou sobrevivência da atual civilização.

Considerando a política interna dos países europeus, nota-se no Ocidente uma tendência nitidamente conservadora, e uma gradual normalização das condições de vida.

Na Itália, cujo povo tem qualidades de recuperação e trabalho excepcionais, tudo parece indicar que o ano de 1953 foi muito fecundo no sentido da normalização. Politicamente, a queda de De Gasperi e a ascensão de Pella representaram um progresso da direita. Na grave crise de Trieste, Pella lucrou muito em prestígio, e a importância internacional da Itália se revelou em franco renascimento.

Se é verdade que o gabinete Laniel conseguiu dar por fim à França em 1953 uma estabilidade que ela esteve longe de ter em 1952 e em boa parte deste ano, a guerra da Indochina continuou a pesar

(continua)