(continuação)

CONGREGAÇÃO DOS NOBRES (conclusão)

Destinada aos filhos de uma das mais ilustres aristocracias da Cristandade, como é a de Roma, a Congregação Mariana da Assunção tem contado em suas fileiras com um sem número de figuras eminentes. Dois Santos e um Beato: S. Roberto Belarmino, S. José Pignatelli e o Bem-aventurado Gregorio Barbarigo; três Servos de Deus, um dos quais é o Papa Inocêncio XI; dezessete Sumos Pontífices, entre os quais Pio IX, Bento XV e Pio XII, gloriosamente reinante; centenas de Cardeais, de príncipes, duques, marqueses, condes; vários membros das casas reais de Savoia e Bourbon, entre os quais se destacam o Rei Carlos Emanuel IV da Sardenha, que abdicou para se fazer Jesuíta, o Rei Carlos Luiz de Nápoles, o Rei Humberto II da Itália, atualmente no exílio; três Grão-Mestres da Soberana Ordem Militar de Malta, os Príncipes Giovanni Batista Ceschi, Galeazzo Thun Hohenstein, e Ludovico Chigi Albani della Rovere, este último recentemente falecido.

As grandes famílias da nobreza italiana aparecem por várias vezes nos registros da Congregação; além daquelas a que aludimos no começo deste artigo, encontramos repetidamente os nomes sonoros de Albani, Doria, Massimo, Pallavicini, Pignatelli, Ruspoli, Visconti, Travaglini, Borromeo, Cafarelli, Barberini, Durazzo, Odescalchi, Piccolomini, Rezzonico, Strozzi, Alighieri, Ganossa, Crescenzi, Fontanelli, Fornaciari, etc., etc.

Entretanto a Congregação não foi feita apenas para a aristocracia das várias regiões da Península: Membros da alta burguesia, tanto de Roma como de outras cidades, e representantes das elites sociais de todos os países, vivendo na Cidade dos Papas, a ela têm pertencido. Entre estes o livro do Pe. Casteliani cita três embaixadores de Portugal — o Barão Pedro Venda da Cruz, José Maria Migueis e José Nosolini — e os representantes diplomáticos da Áustria, França, Espanha, Argentina, Colômbia, Equador e Haiti, bem como o Comandante da Guarda Suíça, Barão de Pfyffer d’Altishofen.

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São deveres da elite social de uma nação, dirigir a vida política, promover o desenvolvimento das ciências e das artes, proteger as demais classes, ser no mais alto grau o espelho e a encarnação dos valores culturais de seu povo; mas sua missão primordial é dar o exemplo de uma vida profundamente cristã, e guiar os homens no cumprimento da lei de Deus.

Do desempenho desta missão nobilíssima decorre para a aristocracia o prestigio, a honra, e o direito de exercer um papel preponderante na sociedade. Mas quando deixa de cumpri-la, e apostata da fidelidade à Igreja, perde sua razão de ser, se eclipsa e sai da História — se não tiver abusado de sua preponderância tiranicamente, até ser esmagada pela violência.

A Congregação Mariana de Nossa Senhora da Assunção exerceu através dos séculos e exerce em nossos dias o apostolado de concorrer para a santificação da nobreza da Cidade Eterna. Fazendo-o, ela realiza uma função duplamente admirável, dando ao mundo paganizado e igualitário de hoje o exemplo de uma aristocracia profundamente católica, e ensinando aos seus membros o desempenho mais perfeito de sua alta missão.


VERBA TUA MANENT IN AETERNUM

SEITA DE HOMENS UNIDOS POR UM PACTO DE INIQÜIDADE.

LEÃO XIII: Compreendereis facilmente, Veneráveis Irmãos, que Nos referimos a essa seita de homens que, debaixo de nomes diversos e quase bárbaros, se chamam socialistas, comunistas ou niilistas, e que, espalhados por toda a superfície da terra, e estreitamente ligados entre eles por um pacto de iniquidade, já não procuram um abrigo nas trevas dos conciliábulos secretos, mas caminham ousadamente à luz do dia, e se esforçam por levar a cabo o desígnio, que têm formado de há muito, de destruir os alicerces da sociedade civil. É a eles, certamente, que se referem as sagradas letras quando dizem (S. Jud. 8): "Eles mancham a carne, desprezam o poder e blasfemam da majestade". — (Encíclica "Quod Apostolici Muneris", de 28-XII-1878).

ATENTADO MONSTRUOSO, COMBATER O DIREITO DE PROPRIEDADE

LEÃO XIII: Seduzidos por fim (os socialistas, comunistas e niilistas) pela cobiça dos bens presentes, que é "a origem de todos os males e que faz errar na fé aqueles em que domina" (1 Tim. 6, 10), eles combatem o direito de propriedade, sancionado pela lei natural; e, por um atentado monstruoso, enquanto afetam interessar-se pelas necessidades de todos os homens e pretendem satisfazer-lhes todos os desejos, trabalham por arrebatar e pôr em comum tudo o que foi adquirido ou por título de legítima herança, ou pelo trabalho do espírito e das mãos, ou pela economia. — (Encíclica "Quod Apostolici Muneris", de 28-XII-1878).

AONDE LEVA A TESE DA SOBERANIA ABSOLUTA DO ESTADO EM TUDO O QUE É TEMPORAL

S. PIO X: À escola dos modernistas não basta que o Estado seja separado da Igreja. Assim como a fé deve subordinar-se à ciência quanto aos elementos fenomênicos, assim também nas coisas temporais a Igreja há de sujeitar-se ao Estado. Isto não afirmam talvez muito abertamente; mas por força de raciocínio são obrigados a admiti-lo. Em verdade, supondo que o Estado tenha absoluta soberania em tudo o que é temporal, se acontecer que o crente, não satisfeito com a religião do espírito, se manifeste em atos exteriores, como, por exemplo, em administrar ou receber os Sacramentos, isto já deve necessariamente cair sob o domínio do Estado. Postas as coisas neste pé, para que servirá a autoridade eclesiástica? Visto que esta não tem razão de ser sem os atos externos, estará em tudo e por tudo sujeita ao poder civil. É esta inelutável consequência que leva muitos dentre os protestantes "liberais" a desembaraçar-se de todo culto externo e até de toda sociedade religiosa externa, procurando pôr em voga uma religião a que chamam "individual". E se os modernistas não se atiram desde já francamente a tais extremos, insistem pelo menos em que a Igreja se deixe espontaneamente conduzir por eles até onde pretendem levá-la e se amolde às formas civis. — (Encíclica "Pascendi Dominici Gregis", de 8-IX1907).

OS LUGARES SANTOS DEVEM FICAR SOB TUTELA DA CRISTANDADE

PIO XII: E como, nesta vigília do Santo Natal, Nosso pensamento não buscaria ainda uma vez aquela terra da Palestina onde o Filho de Deus feito homem viveu sua vida terrestre; a Palestina, onde, mesmo com a suspensão das hostilidades, não aparece ainda um seguro fundamento de paz? Possa encontrar-se enfim uma solução feliz que, vindo em socorro das necessidades de tantos milhares de míseros prófugos, satisfaça ao mesmo tempo os votos de toda a Cristandade, ansiosa pela tutela dos lugares Santos, tornando-os livremente accessíveis e protegidos, mediante a constituição de um regime internacional. — (Rádio-Mensagem do Natal de 1948).

CATÓLICOS QUE DELIBERADAMENTE IGNORAM ENSINAMENTOS DOS PAPAS

PIO XII: Alguns há que, de propósito, desconhecem tudo quanto os Romanos Pontífices expuseram nas Encíclicas, sobre o caráter e a constituição da Igreja, a fim de fazer prevalecer um conceito vago que eles professam e dizem ter tirado dos antigos Padres, principalmente os gregos. Os Sumos Pontífices, dizem eles, não querem dirimir questões disputadas entre os teólogos; e, assim, cumpre voltar às fontes primitivas e explicar com os escritos dos antigos as modernas constituições e decretos do Magistério.

Este modo de falar pode parecer eloquente, mas não carece de falácia. Pois é verdade que os Romanos Pontífices em geral concedem liberdade aos teólogos nas questões controvertidas entre os mais acreditados doutores; porém, a história ensina que muitas questões que outrora foram objeto de livre, discussão já não podem mais ser discutidas. — (Encíclica "Humani Generis", de 12-VIII-1950).


NOTA INTERNACIONAL

Cresce o poder da gentilidade

Adolpho Lindenberg

A CONFERÊNCIA de Bandoeng, que se inicia enquanto escrevemos esta nota, já se transformou em um duelo entre nações que obedecem à diretriz comunista e outras que se enquadram na órbita da política ocidental.

Constituem o primeiro grupo, orientado pelo premier indú Jawaharlal Nehru, a China comunista, Índia, Egito, Indonésia, Ceilão, Birmânia e Vietnã Setentrional; o segundo grupo é composto pela Turquia, Irak, Paquistão, Sião e Filipinas.

Vejamos, para saber o que devemos temer ou o que podemos esperar desta conferência, os aspectos favoráveis a cada uma destas facções antagônicas.

Aspectos favoráveis ao comunismo

1. Os líderes das potências esquerdistas, Nehru, Chu En Lai, Krishna Menon e Nasser, têm um prestígio internacional e um traquejo de política de bastidores que não encontra paralelo entre os representantes do outro lado.

2. A reunião se realiza na Indonésia e foi convocada por iniciativa da Índia.

3. A população, o poderio econômico e militar, as condições geográficas da China comunista, da Índia e do Egito são incomparavelmente superiores aos dos outros, países da Ásia e da África.

4. O horror à guerra atômica, as reminiscências das lutas contra o domínio inglês e o ódio à raça branca (evidenciado pelo fato de os australianos não terem sido convidados para a conferência) que dominam grandes setores da opinião pública das nações asiáticas e africanas, são facilmente exploráveis pela propaganda comunista, que daí pode tirar excelentes slogans contra os ocidentais.

52 Nehru é hoje em dia o melhor instrumento da política exterior russa. Desde que subiu ao poder, o primeiro ministro indú tem-se aplicado a afastar da órbita ocidental as nações vizinhas, para levá-las a uma posição "neutra" e "mediadora". Acontece, no entanto, que, como soe acontecer, a "neutralidade" constantemente favorece o pior lado. A Índia, ao mesmo tempo que agradecia os auxílios e os desmedidos empréstimos norte-americanos, por outro lado apoiava a Rússia nos debates na ONU, e sempre se inclinou pela China comunista em sua luta com Chiang Kai Chek. — A conferência de Bandoeng é o fruto e a oportunidade de consolidação de toda uma política indú orientada à formação de um vasto agrupamento de nações que constitua uma terceira força com acentuadas simpatias pelo regime soviético. E lembremo-nos de que em uma eventual guerra entre o Ocidente e a Rússia os Estados que participam do conclave poderão pesar na balança de modo decisivo.

Aspectos favoráveis às nações anticomunistas

1. A política pseudo-pacifista do premiar indú acha-se um tanto ou quanto desmoralizada pelas invasões da Coréia do Sul, da Indochina e agora das ilhas sob a jurisdição de Taipé. Afinal, o principal perigo de uma nova hecatombe mundial reside atualmente na constante ameaça de agressão por parte dos soldados da China comunista. E é difícil defender a tese de que Chu En Lai é um entusiasta da paz e tudo está fazendo para a preservar.

2. O fato de nem a China nacionalista nem a Austrália terem sido convidadas serviu para caracterizar a orientação esquerdista da conferência. Se, por qualquer razão, e parece que há muitas, as várias delegações não chegarem a acordos concretos, isso significará uma derrota da política exterior soviética. Não há outra alternativa: ou a facção esquerdista domina a conferência e faz com que ela resulte num triunfo da posição neutralista, ou a Chancelaria russa terá fracassado.

Para que se possa falar em vitória das nações anticomunistas, no entanto, é suficiente um impasse ou a aprovação de conclusões anódinas.

3. O novo eixo Cairo-Nova Delhi-Pequim, aparentemente um êxito diplomático dos comunistas, pode facilmente se transformar em faca de dois gumes. Tanto a Índia como o Egito, conservando cuidadosamente a máscara da neutralidade, vêm se esforçando por reunir seus vizinhos em uma frente anti-norte-americana. Aliando-se agora, ostensivamente, a uma potência comunista, seu jogo corre o risco de ser desmascarado aos olhos do mundo. Por outro lado, o Egito terá força política enquanto permanecer o orientador da Liga Árabe. Ora, o pacto turco-iraquiano pode ser considerado como uma cisão da aliança pan-árabe, e a aproximação do Egito com uma potência comunista será novo motivo para divergências.

4. Até o presente momento, as únicas nações asiáticas que realmente apóiam a política externa norte-americana são a Coréia do Sul e as Filipinas. A formação de um forte bloco favorável à Rússia terá o poder de aproximar dos Estados Unidos os países que se sentirem ameaçados com isso. A Turquia, o Paquistão, o Iraque, o Sião, o Vietnã Meridional, e outros Estados de menor importância, serão naturalmente levados a agir em comum nesta e em outras conferências análogas e a se opor à aprovação de teses e programas que signifiquem em predomínio do bloco esquerdista.

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Esperemos o desenrolar da conferência e principalmente as reações que provocará na opinião pública do Ocidente e das nações participantes. Talvez ela redunde na extensão da órbita soviética a grandes setores do mundo asiático Talvez sirva para desmascarar os líderes nacionalistas do tipo de Nehru, Nasser, e outros. Talvez ainda, aproxime das nações ocidentais países que até a pouco lutavam contra elas, por sua independência.

Estas são as perspectivas para um futuro mais ou menos próximo. Quanto ao futuro remoto, há que considerar um ponto de importância transcendental: os povos representados em Bandoeng formam mais da metade da população do mundo. Dotados de riquezas naturais imensas, ávidos de se equipar com os recursos da técnica, estão eles fadados a adquirir um poderio de que o prestígio da conferência de Bandoeng é um prenúncio. Ora, todo este mundo novo que cresce é gentílico. Em presença dele, as nações cristãs divididas entre si, religiosamente decadentes, minadas por crises de toda ordem, manterão sua atual supremacia mundial?


AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES

Amor e temor na piedade cristã

Plinio Corrêa de Oliveira

Segundo o ensinamento da Igreja, o amor e o temor de Deus são virtudes. E como entre as virtudes não pode haver antagonismo nem contradição, nem o amor exclui o temor, nem o temor exclui o amor.

Mais ainda. Ambas estas virtudes são essenciais à salvação. Se não se compreende um Santo sem amor de Deus, igualmente não se compreende um Santo sem temor.

Pode-se afirmar que o amor é virtude mais alta que o temor. Pode-se afirmar que estas virtudes influenciam em proporções diferentes cada alma, conforme seu feitio e as vias da graça. Mas abstrair de uma virtude sob pretexto de estimular a outra, calar sobre o temor para desenvolver o amor, ou vice-versa, é, normalmente, infligir às almas um irremediável prejuízo.

Ora, tempo houve em que a piedade dos fiéis, profundamente equilibrada, estimou devidamente o amor e o temor, de onde um reflexo muito proporcionado de um e de outro na oratória sagrada, na arte, na literatura religiosa. Com o correr do tempo, o jansenismo acentuou até o exagero, e o delírio, o papel do temor. Reagindo contra este exagero, Santos, teólogos, pregadores, escritores insistiram à porfia no papel do amor. Inútil é dizer quantos tesouros de graça, de sabedoria teológica e pastoral, de beleza artística, foram assim engendrados na Santa Igreja, pelo que esta tinha de mais representativo e melhor.

Aplicou-se assim o sábio princípio estratégico segundo o qual sempre que se pronuncia um exagero num sentido, se deve insistir no sentido oposto.

Sejamos de nosso tempo. Apliquemos este princípio a nossos dias. De que lado está o exagero? Do lado do amor? Do lado do temor? Parece-nos que o homem contemporâneo não peca pelo excesso, nem do amor, nem do temor. Muito pelo contrário, esquecido de Deus, encharcado de laicismo, de naturalismo e de Indiferentismo não se incomoda com Deus, quer para O amar, quer para O temer.

De onde, nesta carência total de amor e de temor, o remédio está em chamar a Deus os homens pela atração de uma e outra destas virtudes. Pois o temor, também o temor atrai para Deus: o início da Sabedoria é precisamente o temor.

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Para isto muito pode auxiliar a arte religiosa, meio maravilhoso para nos mostrar como amar e como temer a Jesus Cristo, Senhor Nosso.

Na famosa Capela Scrovegni, de Pádua, o pincel imortal de Giotto nos deixou este Cristo Escarnecido, admirável representação da paciência do Divino Mestre. Sua Face adorável está barbaramente ferida. Mãos sacrílegas puxam-Lhe os cabelos e a barba. A coroa de espinhos, emblema irrisório de sua realeza, Lhe cinge a fronte venerável. Mas Jesus, olhos baixo como que não vê seus inimigos, nem sente o extremo da afronta senão para sentir uma tristeza sem fim. É bem o Salvador meiguíssimo, que tudo sofre de coração manso e humilde, para nos remir.

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"Judas, com um ósculo trais o Filho do homem?" No momento memorável deste beijo infame e desta pergunta terrível as duas faces estavam próximas. Giotto figura a cena em outro quadro da mesma capela. Judas, a fronte baixa, carnes flácidas, olhar torvo, nariz vulgar, lábios asquerosamente moles e derramados, revela no seu todo uma infâmia inexprimível. Jesus, nobre, de uma superioridade infinita, de uma elevação moral inefável, o a fita com um olhar em que há um doce lampejo de amor, uma censura, uma severidade, uma repulsa sem fim. Pobre e miserável Judas, que não quis abrir sua alma, nem ao amor nem ao temor que este olhar suscitava, a que a pergunta melancólica e pungente convidava.

E porque sua alma resistiu a todos os convites do amor e temor, caminhou do furto para o deicídio, e do deicídio para o desespero...