COMO APROVEITAR A GRANDE LIÇÃO QUE A HUNGRIA DÁ À CRISTANDADE
Adolpho Lindenberg
A influência noturna parece querer perpetuar-se ainda, com a solidão das horas perdidas dominando e desolando a rua, e as trevas ensombrando o ambiente, protegidas em sua resistência ao sol nascente pelo denso arvoredo. Mas para o viandante abriu-se uma réstia radiosa de luz, que inunda vitoriosamente as pedras do caminho. O silencio e as trevas não o impressionam. Ele encontrou a via que o levará em breve a uma clareira já toda batida pelo sol. Imagem expressiva da situação da Cristandade, neste mudar de ano. As sombras do neopaganismo, das heresias, da corrupção moral, nos circundam. Mas começamos a ter nossos olhos deslumbrados por um grande facho de luz. É o martírio glorioso do povo húngaro, que empolga o mundo e nos mostra a via da regeneração. Regeneração que não se pode fazer só com doutrinas, discursos, instituições e obras sociais, mas lambem com penitencia, mortificação, expiação, sangue e mais sangue generosamente vertido pela Santa Igreja de Deus. Per Crucem ad lucem". O Vexilo real de Jesus Cristo está alçado na Hungria. Sigam os povos católicos este admirável exemplo de amor à Cruz, que lhes dá a antiga terra dos Reis Apostólicos, e em breve raiará sobre todo o mundo a grande luz, que é nosso Divino Salvador, sol de justiça.
A epopeia da revolta húngara é tão rica em significado que poderíamos escrever toda uma série de artigos analisando as lições que dela se desprendem para o mundo contemporâneo. Neste limiar de 1957 limitar-nos-emos a traçar algumas considerações sobre dois exemplos que o indômito povo de Budapest deu à humanidade hodierna, enfraquecida e corrompida pelos erros liberais, Dois exemplos: o de como lutar por um ideal, e o de quanta força adquire uma opinião pública quando se cristaliza em torno de principies claros e verdadeiros.
O Santo Padre, em numerosas ocasiões, tem exortado os católicos de todo o mundo a participar ativamente da direção da vida pública das suas nações respectivas. Um país não pode ser recristianizado exclusivamente por uma ação visando o afervoramento religioso de seus habitantes no mero âmbito da vida privada. É preciso antes de tudo a pratica das virtudes, é necessário o apostolado individual, mas lambem são imprescindíveis modificações radicais nas instituições políticas, sociais e econômicas, de modo a torná-las a representação viva, concreta e atual dos principies ensinados pela Santa Igreja.
É a essa tarefa, que cabe tão marcadamente aos leigos, que o Soberano Pontífice conclama a elite do laicato católico. E é em função dela que queremos analisar o duplo exemplo que nos dá a Hungria.
Para que uma ideologia triunfe e domine a vida política de um país, é necessário que seus propugnadores procurem solucionar em exatíssima consonância com seus princípios todos os problemas que se lhes apresentem. A coerência imprime aos movimentos ideológicos uma unidade, um ritmo e mesmo uma beleza que atraem e entusiasmam todos os espíritos retos.
As verdades pregadas pela Igreja a respeito de política possuem entre si uma harmonia tão perfeita, e resolvem de modo tão conveniente todos os problemas da atualidade, que bem se vê serem frutos de uma Instituição divina. Durante a Idade Média, grande parte delas foi posta em pratica e, desde aquele tempo até nossos dias, os Papas vêm constantemente promulgando ensinamentos e normas sobre a matéria.
Erram, pois, os católicos (e pensamos principalmente nos chamados católicos de esquerda") que, para atrair as simpatias populares, julgam necessário mesclar e poluir as lições vivas dadas pela história da civilização cristã e pelos documentos pontifícios, com conceitos revolucionários, igualitários e socializantes. Os partidos que se apresentam ao público como ca tolices e esquerdistas — e dos quais o M.R.P. francês e certas correntes do P.D.C. italiano constituem exemplos típicos —em virtude de sua inconsequência e da impossibilidade de harmonizar seus ideais contraditórios, tinham de se tornar, como de fato se tornaram, impopulares e, digamos mesmo, objeto de mofa. Assim, mais uma vez se vê que o demônio nunca cumpre o que promete: essa conivência de alguns políticos católicos com erros socialistas, visando fins de propaganda, até hoje só lhes tem acarretado impopularidade e criado situações insolúveis.
Agir com coerência, no entanto, exige do católico muita coragem. Propugnar uma reforma das instituições políticas, sociais e econômicas, para pô-las em consonância com os principies católicos, importa em contrariar preconceitos e interesses poderosos. Por isso, os liberais e os pusilânimes de toda ordem julgam que esses ensinamentos da Igreja e suas decorrências logicas e necessárias não devem ser apresentados de modo claro e definido, pois isso afastaria ainda mais as massas do redil de Nosso Senhor Jesus Cristo; uma reforma total das instituições provocaria, por outro lado, um movimento contrário, devido à inercia natural que se opõe a todas as modificações bruscas.
Estamos novamente em face de uma ilusão. Este nosso século tem-nos ensinado que a audácia de oferecer um programa de reformas radicais obedecendo a uma ideologia coerente, sempre tem atraído e empolgado as multidões. Paralelamente, os movimentos de meios termos e meias medidas em geral se têm mostrado incapazes de satisfazer a ânsia que todos sentem, de soluções para os problemas gravíssimos da atualidade.
O comunismo e o nazismo tiveram a coragem de propor ao mundo, desiludido das fantasias liberais, sistemas falsos mas coerentes, e graças a essa coragem e a essa coerência conseguiram ser — se bem que baseados no erro — urna esperança para massas inteiras.
Por que nós, filhos da Igreja, que somos os únicos a possuir em sua plenitude a verdade, e a dispor dos meios sobrenaturais para adquirir um desassombro heroico, não havemos de constituir movimentos políticos inteira e ortodoxamente católicos? Sim, movimentos que não temam apresentar, para todos os problemas da hora presente, soluções plenamente de acordo com os principies católicos e escoimadas de qualquer resíduo liberal, nazista ou esquerdista. Para aqueles que praticam o
(continua)