O PROGRESSO DA CIVILIZAÇÃO
O SANTO PADRE PIO XII AFIRMA A LICEIDADE DA GUERRA PREVENTIVA
(continuação)
democráticos" é simples: "eles asseguram que, para eliminar tais inconvenientes, bastará introduzir o princípio da responsabilidade pessoal e do equilíbrio das energias, no complexo algum tanto mecânico e puramente funcional da vida em sociedade".
Portanto, mais uma verdade a ensinar: o princípio da responsabilidade pessoal; mais uma fórmula a aplicar, o equilíbrio de energias. E tudo ficará automaticamente resolvido.
O mundo do futuro pertence aos instrutores e aos técnicos. Não aos Sacerdotes, moralistas e educadores.
ATEÍSMO TEÓRICO E PRÁTICO
O Santo Padre observa muito bem que tal concepção deriva do ateísmo, um "ateísmo teórico e mesmo prático", professado pelos que "idolatram a tecnologia e a concepção mecanicista dos acontecimentos, e acabam por converter-se necessariamente em inimigos da verdadeira liberdade humana".
Esta adoração do ídolo do século XX, que é a técnica, mata realmente toda verdadeira liberdade. Pois a técnica, produto da instrução, é infalível como ela. Quem tem gostos ou tendências contrárias aos dogmas da técnica é um marginal, um doente. A técnica deve tirar-lhe a liberdade, analisá-lo, e transformá-lo, para fazê-lo concordar com ela. E assim se estabelece no mundo a mais pesada ditadura de todos os tempos.
O DRAMA DO MUNDO MODERNO
O drama do mundo moderno consiste na "contradição flagrante" que há "entre a esperança confiada ao homem moderno - ... - de poder criar um mundo em que sejam abundantes os bens, livre da pobreza e da incerteza, e a amarga realidade de longos anos de lutas e ruínas, com o consequente temor, agravado nestes últimos meses, de não poder lançar sequer o fundamento de um modesto princípio de harmonia duradoura e de paz". E prossegue o Pontífice: "Há algo que não funciona devidamente no complexo sistema da vida moderna; um erro essencial que o corrói radicalmente".
A causa está precisamente no ateísmo inerente ao "realismo" técnico hodierno: "As dificuldades que o mundo hoje enfrenta são a prova da profunda separação entre a vida e a fé cristã, e é essencial sanar a todo custo este mal".
NÃO NOS ACOVARDEMOS DIANTE DO SÉCULO
Diante deste erro tentacular, que vai transformando a face da terra, e que tem a seu serviço as potências imensas do tecnicismo, não seria ridículo que os católicos procurassem reagir? Não seria mais sábio calar, ou pelo menos dissimular sua oposição ao erro, para tentar dirigir o movimento tecnicista, em lugar de lhe combater de frente os exageros?
A resposta do Vigário de Cristo é clara: a fé move montanhas, e para ela nenhum obstáculo é insuperável. É este o exemplo magnífico que colhemos no passado da Igreja. E que vale para o presente. "Os cristãos de hoje não se acham em condições menos favoráveis que seus antepassados, os quais chegaram, com o auxílio da fé, a superar as contradições de sua época". Devem eles ter presente que "o sentido profundo da vida humana não repousa em fórmulas e em leis, mas sim na obra livre do Criador, e que o homem só possuirá a verdade e a verá, quando se unir à luz que brilhou pela primeira vez em toda a sua plenitude em Belém".
É junto a Jesus Cristo que se encontra toda a solução. "O cristão precisa inclinar-se diante do berço de Belém para conhecer a verdade sobre a natureza humana, resumida em uma síntese visível no Filho de Deus recém-nascido. A origem, a essência, o destino e a história do homem acham-se ligados àquele Infante, ao fato de haver Ele nascido entre nós. Seus vagidos são como a narração de nossa história, e sem eles o conhecimento da natureza do homem continuaria um enigma impenetrável".
Assim, o católico, para ser homem de seu tempo, não deve pactuar com os erros deste. Pelo contrário, deve saber discerni-los com clareza, e apontar para eles a verdadeira solução, a qual é, como foi e será sempre, Nosso Senhor Jesus Cristo.
OCIDENTE E ORIENTE
O texto incompleto de que dispomos não nos habilita a dizer qual o nexo que o Santo Padre estabelece entre estes magníficos ensinamentos e as diretrizes que dá em seguida sobre a coexistência entre comunistas e não-comunistas.
Entretanto, parece-nos que este nexo não é tão difícil de ser percebido. Com efeito, a idolatria da técnica e da ciência é como que o substrato comum a todas as concepções exaltadamente democráticas que prevalecem nas duas grandes partes em que se divide o mundo moderno. Pois o Ocidente, como o Oriente, adora a técnica, espera tudo do sufrágio universal e das multidões, confia na ciência mais do que em tudo. Simplesmente - e neste "simplesmente" vai uma imensidade de circunstâncias importantíssimas - no Ocidente esta adoração não vai tão longe que se persiga a verdadeira Religião, que se neguem os direitos naturais do homem, como o de constituir família monogâmica e indissolúvel, de ter uma propriedade pessoal, etc. Muitas tradições, muitas instituições, muitos hábitos mentais ainda vigentes impedem que se tirem, nesta parte do mundo, todas as consequências da adoração da máquina. Enquanto por detrás da cortina de ferro já se chegou a uma aplicação muito mais vasta das máximas da tecnolatria.
É verdade que entre os russos as eleições são falseadas, e não é o povo que manda. Mas na mente dos déspotas do Kremlin esta situação é transitória. Quando o comunismo tiver terminado sua penetração junto às massas, e estas, devidamente "instruídas", conhecerem toda a "verdade", deverão tomar conta do poder.
Assim, o Santo Padre Pio XII deu um alto testemunho de sua imparcialidade, deixando claro que, a seu ver, o mundo não se divide em um bloco de nações que seria o Reino de Deus na terra, e outro que é o reino do erro. Mas que ele vê também no Ocidente lacunas graves e até gravíssimas, que se aparentam com as de além cortina de ferro.
Isto posto, o Pontífice tem uma admirável tomada de posição contra o comunismo.
ABERTURAS PARA A ESQUERDA
Esta folha não se tem fartado de apontar a seus leitores o comunismo como o maior inimigo da Igreja neste século. Entretanto, tal é a mania de conciliação que lavra em certos círculos católicos, que chegam a sonhar com uma colaboração com ele. Ou com o socialismo, que é um comunismo velado, adocicado, que progride com sorrisos e por etapas, mas que visa o mesmo fim. É mais ou menos o que em outros países se tem chamado, entre católicos, uma "abertura para a esquerda".
Quando tocamos nestes e noutros assuntos conexos, alguns leitores velam a face. Como tratar disto, quando se semeia assim a desunião em nossos arraiais, e se desedifica os que não são católicos?
Sua Santidade, entretanto, sem recear estes inconvenientes, se exprime formalmente a este respeito: "Com profundo pesar devemos lamentar..., que alguns católicos, eclesiásticos e leigos, emprestem seu apoio à tática da confusão para obter resultados que eles mesmos não desejam. Como é ainda possível deixar de ver que este é o fim de todo aquele insincero agitar-se que se oculta sob o nome de conversações e de encontros? Que objetivo tem o encontrar-se para conversar, se não se tem uma linguagem comum, ou como é possível encontrar-se, se os caminhos são divergentes e se uma das partes rejeita obstinadamente e nega os valores absolutos comuns, tornando assim praticamente inoperante qualquer coexistência na verdade?".
E sobre as chamadas "tomadas de contato" com o adversário, diz Pio XII: "Não cortar as pontes, mas sim manter relações mútuas. Mas para tanto é plenamente suficiente que os homens responsáveis pelos Estados e pela política acreditem dever manter contatos e relações tendo em vista a paz da humanidade, e não interesses particulares. Para tanto basta que as Autoridades Eclesiásticas competentes considerem assim dever agir para obter o reconhecimento dos direitos e das liberdades da Igreja".
O GUARDA-CHUVA DE CHAMBERLAIN
As pessoas que acompanharam o desenrolar dos pródromos da segunda guerra mundial lembram-se de que, no campo antinazista, se haviam delineado duas tendências diversas. Uns queriam contemporizar, outros consideravam necessário deflagrar a guerra quanto antes, a fim de evitar que as conquistas de Hitler se tornassem ainda maiores, e a força de resistência do ditador germânico com isto acrescesse ainda mais.
Chamberlain, com seu emblemático guarda-chuva, representava a primeira tendência. Levado por ambições, por ingenuidades, por fraquezas de toda ordem, foi ele cedendo até o momento em que o poderio nazista se estendeu como uma sombra sobre toda a Europa central E o resto todos conhecem.
É a repetição deste exemplo de lamentável imprevidência, de funesto e errôneo utilitarismo, que se trata de evitar: "Estamos persuadido de que mesmo hoje, em face de um inimigo decidido a impor de qualquer maneira e a todos os povos uma forma de vida particular e intolerável, só uma atitude forte e unânime de todos os que amam a verdade e o bem comum pode preservar a paz, e a preservará. Seria um erro fatal repetir o que se passou, em circunstâncias análogas, nos anos que precederam o segundo conflito mundial, quando cada uma das nações ameaçadas, e não apenas as menores, procurou garantir sua salvação em detrimento da salvação das outras, esforçando-se por tirar discutíveis proveitos econômicos e políticos das dificuldades de outrem. A consequência disso foi que todas as nações foram arrastadas juntas para a guerra".
LICEIDADE DA GUERRA PREVENTIVA
Passemos agora àquele que é talvez o texto política e doutrinariamente mais importante de toda a alocução. Até aqui, todos os doutrinadores têm admitido a legítima defesa. Mas é também lícita uma agressão feita para prevenir outra? É a respeito deste ponto muito sensível que o Vigário de Jesus Cristo se exprime com uma sabedoria e uma clareza que dispensam comentários: "A situação de hoje, que não encontra paralelo no passado, deveria ser claramente conhecida por todos. Já não é possível duvidar dos objetivos e dos métodos que se escondem atrás das armas, quando estas se lançam fragorosamente, semeando a morte além de suas fronteiras para obrigar as populações civis a aceitar uma forma de vida que repelem abertamente; quando, impedindo a realização de possíveis acordos e mediações, empregam-se as armas atômicas para realizar determinadas aspirações, justificadas ou não. É claro que nas atuais circunstâncias pode dar-se o caso de uma nação, esgotados todos os esforços para evitar a guerra, ser obrigada a deflagrá-la para defender-se. Nessas circunstâncias, a guerra não poderia ser considerada ilícita e os católicos não poderiam opor-se às medidas de legítima defesa adotadas por um governo livremente eleito".
PIO XII E A ONU
Infelizmente, no que diz respeito às medidas concernentes ao desarmamento e à paz, os trechos fornecidos pelas agências telegráficas são insuficientes para se estabelecer uma vista de conjunto do pensamento pontifício. Vê-se que Pio XII está propenso a dar seu apoio a medidas tendentes a estabelecer um equilíbrio entre os povos dentro do quadro da ONU, e a favorecer o acréscimo de prestígio dessa organização, por meio de tribunais internacionais, e mesmo tropas colocadas ao seu serviço.
Contudo, também aí o erro do falso realismo pode penetrar. Consistiria ele em despir a ONU de seu conteúdo moral, fazendo dela uma instituição destinada a resolver mecanicamente os problemas internacionais.
A este propósito, afirmou o Santo Padre que um "falso realismo" se manifestou recentemente entre vários membros daquela organização, no momento em que se discutia o restabelecimento do respeito aos valores humanos oprimidos, o que levou à adoção de dois pesos e duas medidas. "Ninguém - disse o Papa - espera ou reclama o impossível, nem mesmo das Nações Unidas, mas se poderia esperar que a autoridade dessa organização se fizesse sentir, pelo menos por intermédio de observadores nos locais onde os valores essenciais do homem estão em perigo extremo.
"Por digna de reconhecimento que seja a condenação, pela ONU, de violações graves dos direitos dos homens e de povos inteiros, poder-se-ia desejar, todavia, que fosse interditado aos países que se recusam a admitir observadores em seus territórios, assim demonstrando que têm da soberania do Estado uma concepção que solapa os próprios fundamentos da ONU - que fosse interditado, dizíamos, a esses países exercer seus direitos de membros da organização. Esta deveria ter, outrossim, o direito e o poder de prevenir qualquer intervenção militar por parte de uma nação contra outra, sob qualquer pretexto que seja, bem como de assumir a proteção da ordem do Estado ameaçado, com forças policiais suficientes".
* * *
Assim, pois, o mundo contemporâneo ouviu dos lábios do "doce Cristo na terra" as palavras de conforto e de direção de que precisa nesta quadra difícil. Particularmente, dirigiram-se elas ao nobre povo magiar martirizado. Estamos certos de que farão um grande bem a nossos leitores, e ao ambiente brasileiro tão profundamente necessitado de tais ensinamentos.
N.R.: Já se achava composto o presente artigo quando nos chegou às mãos o "Osservatore Romano" de 28 de dezembro p.p., edição hebdomadária em francês, com a mensagem de Natal do Soberano Pontífice. Pudemos então verificar que, salvas pequenas incorreções de pormenor, o texto que reproduzimos é conforme ao oficial.
Se por Democracia Cristã se entende, não uma forma de organização política ou social, mas o bem comum da Cristandade — e é este o único sentido que tem a expressão nos documentos pontifícios — esse ideal se realizou esplendidamente por ocasião das Cruzadas, quando Imperadores, Reis, nobres e plebeus se coligaram contra o muçulmano. Era uma "democracia" cristã na qual o valor supremo era o cristão, e o conceito "democrático" tinha um alcance todo convencional. Realidade bem diversa de certa democracia cristã contemporânea, em que o valor dominante é o democrático, e a palavra cristão não se sabe bem o que significa. — No clichê: o Bem-aventurado Urbano II, no Concilio de Clermont, convoca os povos cristãos para a primeira Cruzada, — gravura em madeira do livro "Grand Voyage de Hierusalem", impresso em 1522.
A DEMOCRACIA CRISTÃ NA ENCRUZILHADA:
COLABORAÇÃO OU LUTA COM O SOCIALISMO
Cunha Alvarenga
Há um ano atrás, em crônica sob o título de "As ondas sucessivas da revolução igualitária" ("Catolicismo", no 62, fevereiro de 1956), havíamos prometido aos nossos leitores que, em ocasião oportuna, iríamos "abordar certos desvios doutrinários e certa atuação pratica, de pendores acentuadamente socialistas, dos adeptos de uma mal compreendida democracia cristã".
Ocupada nossa atenção por outros temas que reclamavam a prioridade de nossos comentários, somente hoje retomamos o fio interrompido. Ao fazê-lo, temos que lamentar que uma mole de fatos ocorridos durante o passado ano de 1956 venha corroborar tudo aquilo que íamos afirmar ha doze meses. Daí uma ligeira modificação que introduzimos no plano destas notas. Em primeiro lugar vamos citar fatos recentes que eloquentemente exemplificam os desvios doutrinários e disciplinares de importantes setores dos Partidos chamados Democratas Cristãos da Europa. Depois, e isto em nossa próxima crônica, daremos as origens dos pressupostos errados que se acham na base dessas lamentáveis atitudes.
Havíamos mostrado que tanto Leão XIII quanto Pio XII — este sobretudo em sua rádio-mensagem do Natal de 1944, ao enfrentar magistralmente o problema da democracia em nossos dias não restringiram a expressão Democracia Cristã ao campo estreito de um partido político ou de uma facção. Também havíamos dito que tampouco se acha ela obrigatória e visceralmente ligada à forma republicana de governo e muito menos ao falso princípio da infalibilidade do sufrágio universal e direto. Conforme sintetizou S. Excia. Revma. o Sr. Bispo de Campos, D. Antonio de Castro Mayer, em sua Carta Pastoral sobre Problemas do Apostolado Moderno, "Democracia Cristã é expressão usada para indicar qualquer governo que promova o bem comum sob a lei de Deus, seja esse governo monárquico, aristocrático ou democrático".
É claro que, quando falamos da Democracia Cristã, não temos em vista o que estas palavras designam nos documentos pontifícios, mas certos meios políticos, intelectuais, ou de ação social, geralmente designados por demo-cristãos. Fazemos notar, também, que neste artigo não temos intenção de analisar de qualquer forma a atuação do P.D.C. brasileiro.
TENDÊNCIA LAICISTA E ESQUERDISTA
Ao emergir o mundo ocidental do caos da última grande guerra, surgiu na Europa e na América Latina a denominação "Democracia Cristã" aplicada a um partido político. Em considerável número de casos, os promotores desse movimento eram membros do laicato que sustentavam a opinião de que os fiéis, enquanto tais, não se deveriam organizar em partido político, mesmo em países de maioria católica. Por outras palavras, na, generalidade dos casos, essa Democracia Cristã nasceu como partido político sob os bafejos do preconceito neo-laicista do democratismo maritainiano. E se em um ou outro Partido Democrata Cristão tal não aconteceu desde o início, não tardou muito que ocorresse ali uma penetração maritainista ponderável. Para angariar votos era posto em relevo o elemento cristão, mas para as decisões políticas surgia quase sempre, em uns lugares, não poucas vezes em outros, o elemento democrático em sua deformação maritainista, ou diferenciação da esfera própria da vida civil dos povos. Ao lado desses pruridos emancipacionistas em relação à Igreja, não raramente se patenteava também uma acentuada tendência para a esquerda, ou para as soluções coletivistas, e, como via de consequência, o pendor para a colaboração estreita com os partidos de colorido marxista, desde o mais róseo socialismo ao mais rubro comunismo.
Documentemos com o caso da Itália.
Recentemente a revista "Idea", dirigida por Mons. Pietro Barbieri e muito influente nos círculos intelectuais católicos italianos, afirmava que no Congresso Democrata Cristão reunido em Nápoles há cerca de dois anos atrás, já era nítida a tendência para a esquerda de grande parte dos congressistas. "Podemos agora — lê-se mais adiante — depois de quase dois anos de experiência, observar como as nossas previsões se realizaram com a exatidão de uma profecia. Fácil profecia, na verdade, à qual poder-se-ia chegar pela simples observação dos fatos. A Democracia Cristã, pelo menos em seus órgãos dirigentes, se mostrou sempre propensa à esquerda e preparou, com progressiva ação linear, o precipitar inelutável desta sua solução predileta do problema político italiano, na qual cedo ou tarde terá de cair pela lei de gravidade" (artigo "Ancora sull'apertura a sinistra", p. 447 do número de agosto de 1956).
A atual conjuntura política italiana veio dar ensejo a que se manifestassem com mais intensidade essas tendências esquerdistas existentes no seio da Democracia Cristã. Com efeito, as eleições administrativas — municipais e provinciais — de 27 de maio de 1956 deram certa vantagem aos socialistas de Nenni e a um partido dito centrista, o Social Democrático Italiano, dissidência dos primeiros dirigida por Saragat. O Partido Comunista sofreu certo retrocesso, em beneficio dos citados socialistas. A Democracia Cristã e os partidos da direita mantiveram suas posições, mas saíram enfraquecidos alguns partidos do centro. Nessas condições, para conseguir um governo estável, em numerosos municípios os democratas cristãos se viram na contingência de escolher entre a colaboração dos monarquistas e a dos socialistas, tendo em diversos casos optado lamentável e inexplicavelmente pela segunda solução. Lamentável e inexplicavelmente, dissemos, e com razão. Pois ambas as facções socialistas têm como denominador comum ideológico um erro condenado e detestado pela Igreja — o marxismo — coisa que nem de longe acontece com os monarquistas.
A essa altura se acentuaram as manobras políticas no sentido da unificação das aludidas correntes socialistas, começando Nenni e seus correligionários — por motivos obviamente pragmatistas — a dar sinais de repudio às suas ligações com o comunismo.
O CONGRESSO DEMO-CRISTÃO DE TRENTO
Diante desse panorama, em outubro do ano findo novamente reuniu-se em congresso a D.C., desta vez na cidade de Trento. Ali, sobretudo nos bastidores, mas também em plenário, feriu-se a questão da "abertura à esquerda", isto é, da colaboração com os partidos socialistas, para solucionar as dificuldades políticas.
A presença do elemento comunista na unificação do socialismo italiano tornaria demasiadamente escandalosa a aliança da Democracia Cristã com esses grupos marxistas. Por isso, segundo o observador de "Il Messaggero" (jornal católico pró-governista), a questão de uma eventual coligação com o socialismo unificado foi "vista pelo Congresso em função do isolamento do Partido Comunista e, assim, do alargamento da base democrática do ordenamento político italiano" (II Messaggero di Roma", de 18 de outubro de 1956). Nesse sentido declarou o líder democrata cristão Amintore Fanfani durante o citado conclave, referindo-se às facções socialistas italianas, "que os pactos com os comunistas não são o melhor caminho para conquistar aquele caráter de partido democrático que é a premissa indeclinável para se efetuar o acordo entre a Democracia Cristã e os socialistas" ("Il Messaggero di Roma", de 20 de outubro de 1956). Note-se a aberração: não importa que o socialismo seja anticristão, desde que se revista do aspecto democrático.
Mas não faltam vozes para condenar os desvios da Democracia Cristã na Itália. Essa propensão a dar ao movimento católico o aspecto de uma trepadeira que não se desenvolve se não encontra onde se agarrar, foi objeto de um artigo que teve a maior repercussão, publicado primeiramente em, "Il Giornale d'Italia" e depois em folheto, por D. Luigi Sturzo, Sacerdote de renome internacional, fundador do Partido Popular Italiano, do qual nasceu a D.C., e Senador da República. Ali se dizia que "sob o fascismo não poucos perderam o senso da personalidade político-social dos católicos; hoje, em não poucos, nota-se a tendência a confundir a personalidade político-social dos católicos com a dos socialistas" (L'Apertura a sinistra e l'unificazione socialista", ed. Politica Popolare, Napoles, 1956, p. 45).
"Querem aceder uma lanterna para ver mais claramente o sol do ensinamento pontifício"
As provas? Indaga D. Sturzo. Ei-las: "Apenas voltei à Itália (após seu exílio
(continua)