Neste transe de luto e dor o Santo Padre Pio XII é objeto, mais do que nunca, do amor e da veneração de todo o orbe.
DOCUMENTOS ESSENCIAIS sobre a crise religiosa na Itália
A propósito da dolorosa crise de caráter religioso, político e social eclodida na Itália, e que constitui objeto do artigo estampado em nossa primeira página, publicou o "Osservatore Romano" — em sua edição em francês de 7 de março p. p. — nota cujo alcance é desnecessário pôr em relevo. Traduzimo-la para conhecimento de nossos leitores:
Depois do processo de Florença
Nas presentes condições de amargura, de tristeza e de ultraje, suscitadas na Itália para a Igreja — para o Sacro Colégio, o Episcopado, o Clero e os fiéis católicos — o Santo Padre acolheu os numerosos testemunhos que Lhe traziam, de todas as partes do mundo, a fervorosa expressão da aflição comum, à qual se unem preces pedindo ao Senhor misericórdia e perdão para os transviados. Em razão das circunstâncias, Sua Santidade julgou dever suspender neste ano a costumada festa da Coroação, que deveria ser celebrada no dia 12 deste mês de março, na Basílica Patriarcal Vaticana.
De muitos lados pergunta-se qual seja nosso pensamento sobre a recente sentença do Tribunal de Florença a respeito do Bispo de Prato.
Publicamos, na segunda página, a carta serena que o Bispo tinha dirigido ao Presidente daquele Tribunal. Nesse documento, o Prelado afirmava que um ato de verdadeira jurisdição episcopal, praticado por ele no governo espiritual dos fiéis, em aplicação dos principies da doutrina e da moral católica, bem como dos sagrados cânones, não poderia ser controlado por um tribunal civil, sem que este se imiscuísse assim nos sagrados direitos da Igreja, lesasse a liberdade do exercício da autoridade espiritual e transgredisse as disposições da Concordata.
Nada temos a acrescentar a essas declarações. A consequência é clara.
Como, ademais, em Florença, muito se falou de Direito Canônico, nossa atenção foi chamada para o que estabelece o Canon 2341: "Se alguém ousar citar perante juiz leigo um Cardeal da Santa Igreja Romana, ou um Legado da Sé Apostólica, ou um oficial maior da Cúria Romana, por questões relativas a seus cargos, ou ainda seu próprio Ordinário, incorre ipso facto em excomunhão reservada de modo especial à Santa Sé ... ", e o Canon 2334: "São punidos por excomunhão latae sententiae reservada de modo especial à Santa Sé... os que impedem direta ou indiretamente o exercício da jurisdição eclesiástica, tanto no foro interno quanto no foro externo ..."
A propósito do processo contra o Bispo de Prato
Sob este título, o mesmo número do órgão oficioso do Vaticano reproduz a carta serena e sobranceira que o Exmo. Revmo. Mons. Pietro Fiordelli, Bispo de Prato, dirigiu ao Presidente do Tribunal de Florença, na véspera da abertura do processo intentado pelo casal Bellandi. A leitura desse documento, que não vimos publicado na imprensa diária do país, é indispensável para o perfeito conhecimento da questão:
"Sr. Presidente,
Desejo expor-vos com toda a deferência as razões pelas quais não creio poder assistir aos debates da causa contra mim intentada.
Nada poderia ser mais alheio a minhas intenções — faço questão de dizê-lo desde logo — do que, agindo assim, faltar à deferência devida ao Tribunal que presidis. Membro, eu mesmo, da Magistratura sagrada da Igreja, estou consciente da dignidade e das altas funções do juiz. Peço, pois, que acrediteis em minha profunda estima e consideração.
Minha consciência de Bispo impõe, todavia, que eu não compareça, porque o motivo pelo qual sou chamado a juízo não é senão um ato de meu poder espiritual, uma medida tomada por mim no exercício de minha jurisdição episcopal para cumprir um dever que me era imposto pelo ministério pastoral.
Os fatos, Sr. Presidente, são de vosso conhecimento. Informado de que duas pessoas, batizadas na Igreja Católica, pertencentes a minha Diocese, e das quais sou, por conseguinte, responsável perante Deus, tinham intenção de se unirem unicamente pelo laço civil, vi-me no dever, como Bispo, de convocar uma delas, até então praticante, e de lhe explicar, com o afeto entristecido de um pai, a gravidade do pecado que constitui, para um católico, a recusa do casamento religioso: pecado tanto mais inescusável quanto, na Itália, o casamento religioso produz igualmente efeitos civis. Exortei-a e conjurei-a a voltar atrás de sua decisão e a não afastar de si, e do lar que ela ia fundar, a benção de Deus.
Para grande tristeza minha, não fui ouvido.
Diante da grande publicidade de que propositalmente se tinha cercado esse fato deplorável, considerando o grave escândalo que o mesmo produzia entre os fiéis, e não logrando vencer a obstinação dos noivos, vime constrangido a declarar publicamente qual a dolorosa condição em que seu ato ia colocá-los diante da Igreja, e quais as sanções canônicas em que eles incorreriam. E todavia, mesmo então, não quis renunciar à esperança de que aqueles que não se tinham rendido a minhas exortações, se arrependessem em face das graves consequências de sua falta.
Deixai-me confiar-vos, Sr. Presidente, toda a amargura que sinto quando vejo os filhos das trevas se aplicarem por todos os meios a arrancar de meus caros diocesanos a luz da fé e o conforto das práticas religiosas. Enquanto assim se esforçam, em ódio à Religião, a induzi-los a se unirem somente pelos laços do ato civil, eu, como Bispo, estimei e estimo de meu dever a defesa da dignidade do Sacramento, da santidade do lar, na convicção, em que me acho, de que a sanidade e a integridade cristã da família constituem a base do verdadeiro bem da Igreja e da Nação.
Por todos esses motivos, compreendereis que devo evitar que minha atitude se afigure ou seja interpretada como reconhecimento de que possa ser submetido ao julgamento do magistrado civil um ato concernente ao "governo espiritual dos fiéis", um ato, além do mais, cuja liberdade é garantida pelos Tratados de Latrão e solenemente proclamada pelo artigo 7.° da Constituição ("O Estado e a Igreja Católica são, cada um em sua ordem, independentes e soberanos").
De minha conduta no "governo espiritual dos fiéis", devo responder perante minha consciência de Bispo, perante o Soberano Pontífice, perante Deus. Jamais quereria eu assumir a grave responsabilidade de não me ter comportado de modo a impedir, no que me concerne, que se prejudicasse a liberdade da Igreja ou se atentasse contra a Concordata.
Confio, Sr. Presidente, em que, com vosso senso de equidade, sabereis apreciar em seu justo valor minhas preocupações e minha resolução".
VERDADES ESQUECIDAS
O HOMEM PODE CONHECER QUEM É MALDITO POR DEUS
São Tomás de Aquino
Da Suma Teológica, a propósito do texto reproduzido em nosso último número, em que a mesma Suma mostra como amaldiçoar pode ser ato de virtude:
Objeção:
Sobre aquelas palavras de Balaão: “Como amaldiçoarei a quem Deus não amaldiçoou?" (Num. 23, 8), comenta a Glosa: "Não se pode ter justo motivo para amaldiçoar quando se ignoram os sentimentos do pecador". Mas o homem não pode conhecer os sentimentos de outro homem, nem saber se este é maldito por Deus. Logo, a ninguém é licito amaldiçoar o próximo.
Resposta:
Embora não se vejam os sentimentos do pecador, pode-se, não obstante, percebê-los por algum pecado manifesto, pelo qual se deve aplicar castigo. Do mesmo modo, embora não seja possível conhecer quem é que Deus amaldiçoa com reprovação eterna, pode-se saber quem é maldito por Deus em razão da culpabilidade de sua falta atual. — (S. T. 2a. 2ae., q. 76, a. 1, ad 5um.) .