BISPO E VEDETES AMBOS HEROIS?
Pe. Ribeiro do Rosario
O Cristianismo desde o seu inicio é franca oposição ao espírito do mundo.
Surgiu em atitude de ofensiva: "Não penseis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a paz, mas sim a espada" (Mat. 10, 34).
Apresentou-se como movimento de renovação: "Andemos em novidade de vida" (Rom. 6, 4).
Traçou, nitidamente, uma linha divisória entre o bem e o mal: "Não vos unais em junta desigual com os infiéis. Que comercio há entre a justiça e a iniquidade? Que comunidade entre a luz e as trevas? Que concórdia entre Cristo e Belial?" (2 Cor. 6, 14).
Ora, se a orientação do Cristianismo é essa, impor-lhe outra seria desfigurá-lo.
Como, pois, compreender o surto inquietante de uma tendência moderna para conciliar o espírito cristão com certo mundanismo absorvente?
Tendência estranha, que pretende valer-se do que é profano, do que cheira a paganismo, como meio de difusão da verdade de Cristo.
Antigamente, aos que se dedicavam à conquista das almas, indicava-se a leitura do "De Consideratione", de São Bernardo, ou da obra de Dom Chautard. Hoje, prefere-se falar em "apostolado do futebol" e até em "apostolado do baile"...
Para "combater" as revistas mundanas que pululam pelo nosso imenso Brasil, fundam-se outras, religiosas mas cheias de concessões ao mundanismo. Não é por mal, certamente. Se encharcam tais publicações de mundanalidades, é para que vão ao encontro do gosto do povo. Só assim serão lidas as coisas de largo alcance espiritual nelas disseminadas... O seu mundanismo é meio e não fim. É a isca do tortuoso anzol dos modernos pescadores de homens.
Não há de ser com outro intuito que uma instituição com raízes na Idade Média mantém atraente revista toda enfeitada de adereços dos mais pitorescos, como, por exemplo, retrato de mocinha brejeira, olhos sombreados, estampado a cores na capa, e descrições ilustradas de filmes feitas com excelente desenvoltura...
A propósito, não nos esqueçamos que as revistas mundanas, que se deseja combater, trazem também, entre suas profanidades, algumas publicações de cunho devoto, transcritas mesmo por jornais religiosos.
Pois bem. Se nas revistas declaradamente paganizadas encontram-se (também) assuntos religiosos, e se as revistas religiosas incluem (também) conteúdo pagão, que diferença haverá entre umas e outras? Por que combater aquelas? Verdade é que não estão ainda perfeitamente igualadas, também seria demais...
Não é minha intenção falar aqui dos consultórios sentimentais que, à semelhança do que existe nas folhas profanas, sustentam, em jornais católicos, ilustres senhoras, arvoradas em diretoras de consciências.
Nos últimos tempos, apareceu nova modalidade de publicações religiosas ultramodernas. São os folhetos.
Na quaresma deste ano, grande editora paladina da boa imprensa lançou um que, tanto pela crueza de certas expressões, como por uma ilustração piegas, mereceu comentários menos favoráveis.
Mas o folheto que mais desnorteia é o intitulado "Aurora nas Selvas", recentemente editado. Trata-se de um edificante resumo da vida belíssima do santo Bispo e missionário Dom Henrique Verjus, apóstolo da Nova Guiné, morto em odor de santidade no final do século passado.
Esse opúsculo seria excelente, se o seu autor, tão bem intencionado, não tivesse tido o mau gosto de gravar em uma das páginas um retratinho de artista de teatro, ao lado de uma tese estapafúrdia sobre "semelhanças e diferenças entre vedette e santo"...
Que relação pode haver entre vedette e santo? Que utilidade haverá em aproximá-los?
Pois, por incrível que pareça, o referido livrinho estabelece — e com que seriedade! — estranho confronto entre seres tão dissociados...
Para que não se duvide, transcrevamos um trecho do originalíssimo paralelo: "Ambos são heróis: o (sic) vedette é um herói do físico: beleza, habilidade, distinção artística; o santo é um herói do espírito: caráter, perfeito equilíbrio somático-psíquico, grande caridade".
Salvo melhor juízo, não passa de tolice o tal excerto. Primeiro, porque é disparatado e irritante fundir santo e artista de teatro em uma mesma classificação. Em segundo lugar, porque o apressado escritor não focalizou nenhuma traço de heroísmo, nem no santo nem na vedette. Ao menos, não consta que beleza, habilidade, caráter e mesmo grande caridade sejam heroísmo...
A caridade pode ser heroica, mas nem toda caridade o é. Beleza heroica, quem sabe se existe?...
Castilho escreveu famoso "paralelo entre Vieira e Bernardes"; Victor Hugo, "entre o homem e a mulher"; em plano infinitamente superior, São Paulo traçou a semelhança entre o sacerdócio de Cristo e o de Melquisedec. Faltava uma imaginação vivaz, para estabelecer "semelhanças e diferenças entre vedette e santo"...
Ainda bem que o autor, após meticuloso estudo, conseguiu, em luminoso "ergo", provar que o admirável missionário foi missionário mesmo... e não vedette.
Mas tudo isso se explica: são coisas do modernismo literário.
VERBA TUA MANENT IN AETERNUM
No dia 29 de dezembro de 1959, o Santo Padre João XXIII recebeu os participantes da assembléia anual da Federação Universitária Católica Italiana.
* Sem Jesus Cristo, a inteligência humana está sempre em trevas
Dirigindo-lhes a palavra, Sua Santidade — segundo o resumo publicado pelo "Osservatore Romano" em francês, de 8-1-1960 — lembrou um comentário de São Jerônimo à passagem do Evangelho que relata a fuga para o Egito. Observa o "Doctor Maximus”: "Quando José tomou o Menino e sua Mãe a fim de irem para o Egito, fê-lo à noite, em meio às trevas, porque Cristo deixou os incrédulos, dos quais Se afastava, na noite da ignorância".
Explicando essas palavras, disse o Papa que devemos velar por que o Senhor não Se afaste de nossa inteligência, de nossos estudos, e da pesquisa e interpretação feitas pelos diversos ramos da ciência segundo a natureza e valor de cada qual. Pois, uma vez que Cristo Se afasta, é a ignorância que reina.
* Cristo é o objeto de todo e qualquer estudo superior
Em suma, para o cristão, para o católico, o objeto dos estudos superiores, mesmo daqueles que não são de ordem ascética ou teológica, é sempre Jesus Cristo que dá a conhecer e ilumina todas as coisas.
O Sumo Pontífice observou ainda que não se trata, evidentemente, de agir como o califa Omar I, que mandou queimar a biblioteca de Alexandria sob o pretexto de que o Alcorão bastava. Mas cumpre afirmar claramente que o Evangelho, bem como o Antigo Testamento e toda a Sagrada Escritura, precisam ocupar, por toda parte e sempre, a posição que lhes é devida. Nos últimos dias, o Santo Padre relera os 36 primeiros capítulos do Profeta Isaias. Eles apresentam traços precisos e fulgurantes sobre a sorte dos povos que se desviaram do bom caminho. Que tesouro de sabedoria se encontra nessas páginas!
A luz de Jesus Cristo deverá, pois, iluminar sempre os nossos estudos. Tudo se faz na luz de Cristo, que é Caminho, Verdade e Vida. Conservemos todas as bibliotecas, e tratemos de tirar delas todo o proveito, mas sempre sob a direção do Mestre: Ele pronuncia poucas palavras, porém são palavras que permanecem eternamente.
AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES
Tradição e modernidade igualitária
Plinio Corrêa de Oliveira
Sobre um elefante esplendidamente decorado, a Rainha Elizabeth II, acompanhada do Marajá de Jaipur, passeia por ocasião de sua recente visita à Índia. A distinção natural da Soberana e a majestade da Coroa são realçadas condignamente por todos os recursos de uma arte requintada, em que a riqueza e o bom-gosto se conjugam. Assim se faz entender como que intuitivamente aos povos a dignidade do poder público, e a origem divina que — nas diversas formas de governo — ele possui.
Na mesma ocasião, foi tirada esta outra fotografia. Mulheres com roupas de homem, gente de escol com trajes mais que populares. Ao centro, a Rainha ladeada pelo Marajá e pela Maharani de Jaipur. Pouco além, o Duque de Edimburgo. Voltam de uma caçada. Mas as caçadas de nenhum modo impõem roupas dessas. Para não mencionar os elegantíssimos trajes de caça tradicionais da Europa, basta pensar na indumentária com que caçavam até há pouco os próprios hindus. Disto há um exemplo nos dois criados montados em elefantes, ao fundo: os personagens mais distintamente vestidos do grupo.