AS RELAÇÕES ENTRE A SANTA SÉ E A ARGENTINA

F.F.A.

O Embaixador Santiago de Estrada é um nome conhecido por sua participação ativa no movimento de restauração católica que a Argentina viu surgir neste século, católico militante desde a mocidade, pôs a sua inteligência e o seu devotamento a serviço da solução dos problemas difíceis que a Igreja enfrenta em nossos dias, colaborando em grandes obras de apostolado em sua pátria.

Teve papel de destaque no movimento que se celebrizou com os Cursos de Cultura Católica, os quais reuniram a parte mais sadia da elite intelectual argentina num trabalho eficiente de afirmação do valor perene da doutrina católica. Esse florescimento de fé e de cultura teve grande repercussão não só em nosso continente como na Europa, e para ele Santiago de Estrada contribuiu com o ardor da mocidade e com a sólida formação intelectual que já então possuía.

Vieram depois os anos difíceis de Perón e a perseguição à Igreja, que encontrou o laicato argentino coeso em defesa dEla. Ainda não se apagaram na memória do mundo civilizado os atos de vandalismo praticados pelas hordas peronistas, incendiando templos históricos, sujeitando a vexames Prelados e simples fiéis, numa sanha impressionante que culminou com o ataque à Catedral de Buenos Aires, onde os elementos mais representativos do movimento católico portenho se encontravam reunidos para enfrentar os agressores.

Depois da queda de Perón, em 1958 o Presidente Frondizi convidou Santiago de Estrada para a embaixada da Argentina junto à Santa Sé. Nada mais grato ao coração de um católico que ama a Igreja, do que essa possibilidade de prestar serviços à sua pátria junto à Cátedra de São Pedro. Quatro anos passou ele na Cidade Eterna, colaborando para que se estabelecesse um clima de entendimento entre a Santa Sé e a Argentina. De volta a Buenos Aires, querendo prestar contas a seus patrícios do trabalho realizado, entregou ao público o livro "Nuestras relaciones con la Iglesia" (1), no qual expõe com clareza e objetividade as negociações com que procurou corrigir os erros acumulados pelos governos de seu país, durante anos, em matéria de relações entre a Igreja e o Estado.

A constituição que organizou a República Argentina, em 1853, reconheceu explicitamente que a Religião Católica era o fundamento da vida social de seu povo. A Revolução, no entanto, não podendo fazer pior, conservou nas leis da nova nação todos os desmandos regalistas que haviam medrado sob o regime do padroado espanhol, acrescentando-lhes ainda funestas consequências do laicismo que os movimentos de Independência trouxeram juntamente com o liberalismo desenfreado que impingiram às antigas colônias espanholas da América. A falta de adequação dos princípios revolucionados com a realidade viva do povo argentino gerou uma serie de incongruências nas relações do Estado com a Igreja. No desempenho de sua nobre missão, o Embaixador Santiago de Estrada procurou eliminá-las, negociando uma Concordata que não pôde levar a termo em virtude da mudança de governo que o levou a renunciar ao cargo.

"Nuestras relaciones con la Iglesia" expõe os fundamentos históricos e jurídicos do seu projeto e as tratativas mantidas com a Santa Sé. É um livro sólido que revela a profunda dedicação do Autor à Igreja e à Argentina, o seu saber jurídico, e o seu conhecimento da doutrina católica e das principais heresias que perturbaram e ainda perturbam a perfeita união entre Igreja e Estado que deveria existir em todos os países.

VOCAÇÃO PARA EDUCAR

Na época de confusão em que vivemos, é um verdadeiro prazer encontrar quem, não contaminado pelos "slogans" socialistas, conserva a lucidez de espírito indispensável para orientar as novas gerações, relembrando-lhes a imensa superioridade dos princípios católicos, apontando o verdadeiro caminho a seguir e precatando os jovens contra as insídias da Revolução. É o que sente quem lê a "plaquette" do Prof. José Newton Alves de Sousa, diretor da Faculdade de Filosofia do Crato, no Ceará, sobre "A Professora Primaria" (2).

São três discursos que proferiu como paraninfo de novas educadoras e que fez imprimir para "homenagear o professor, notadamente a mestra primaria" (p. 3). Já se vê por aí o apreço que o Autor tem por essas moças dedicadas que, muitas vezes, devem deixar casa e família para levar às crianças o ensino que de outro modo estas não receberiam. Acontece, no entanto, que esse sacrifício meritório é frequentemente mal aproveitado, quando não totalmente desbaratado, porque a grande maioria se contenta com a tarefa de alfabetizar. É que consideram o ensino um fim em si, esquecendo-se do verdadeiro objetivo de sua própria missão.

Contra esse desvirtuamento se insurge o Prof. José Newton Alves de Sousa no primeiro de seus discursos, prevenindo suas paraninfadas contra os escolhos que encontrarão no exercício da profissão, pedindo-lhes que se lembrem sempre de que "a vocação para o ensino pressupõe uma outra, mais geral e profunda: a vocação para educar" (p. 5). Estuda as razões pelas quais essa vocação é tão raramente compreendida, mesmo nos ambientes educacionais, apontando como principal entre elas o afastamento dos educadores da doutrina católica, pois, quando Nosso Senhor Jesus Cristo "Se ausenta da escola, a escola se desencaminha e se incapacita para educar, ou, se pretende educar, não o pode fazer verdadeiramente, por lhe faltar o mais importante, que é Deus" (pp. 10-11). Conclui com um apelo às novas diplomadas para se manterem fiéis à Igreja, de modo a poderem, com o auxílio que Ela lhes assegura, melhor exercer a profissão que abraçaram.

No segundo discurso, estuda a figura da professora primaria, pondo em evidencia as virtudes que devem caracterizá-la e os principais defeitos que dificultam o cumprimento de seus deveres. Relembra que a ela incumbe formar almas semelhantes a Deus, o que lhe será impossível se ela mesma não tiver sólida formação católica. Ora, tantas são as dificuldades de toda ordem que a mestra primaria deve vencer, tantos os erros que se infiltraram no ensino, tais as incompreensões, mesmo por parte das famílias de seus alunos, que só o desejo constante de santidade poderá sustentá-la e guiá-la na consecução do objetivo a que se consagrou.

Termina o volume com um discurso sobre a responsabilidade do professor. Incitando seus colegas de magistério a refletirem sobre o futuro da sociedade, que em grande parte depende deles, convida-os o Autor a resistirem a essa onda de materialismo que a Revolução conseguiu impingir ao mundo, e a educarem os seus alunos no respeito aos valores tradicionais. Só assim poderá o Brasil ter o verdadeiro progresso que todos desejamos.

Como já dissemos, foi uma satisfação lermos esse volume. As ideias nele expostas e defendidas revelam o verdadeiro educador que é o Prof. José Newton Alves de Sousa.

«Nuestras Relaciones con la Iglesia Hacia un Concordato entre la Sede Apostólica y el Estado argentino», por Santiago de Estrada — Ediciones Theoria (Moreno 1368), Buenos Aires — 1963.

«A Professora Primaria», por José Newton Alves de Sousa — Edições Medianeira (Rua D. Quirino, 35), Crato, Estado do Ceará — 1963.


REFORMA AGRÁRIA QUESTÃO DE CONSCIÊNCIA EM 30 DIAS

P. V. X. S.

• O pronunciamento dos autores de RA-QC contra o projeto Aniz Badra-Ivã Luz de reforma agrária (ver «Catolicismo», n.° 161, de maio p.p.) foi publicado na íntegra pelo «Jornal do Brasil» do Rio de Janeiro e, pelo «Correio de Minas» de Belo Horizonte, tendo sido objeto de resumos ou comentários dos seguintes jornais: «A Gazeta Esportiva», «A Gazeta», «Diário de São Paulo» e «Folha de São Paulo», da Capital paulista; «O Jornal» do Rio de Janeiro; «A Gazeta» de Florianópolis; «O Estado de Minas» e «Diário de Minas», de Belo Horizonte; e «Diário de Sorocaba», da cidade homônima (SP). As repercussões daquele pronunciamento na Câmara Federal foram noticiadas por «A Gazeta Esportiva», «A Gazeta», «Diário de São Paulo», «Diário do Comercio» e «Folha de São Paulo», da Capital paulista; «O Globo» do Rio de Janeiro; «Estado de Minas» de Belo Horizonte; e «Correio de Marília», da cidade de igual nome (SP).

• A convite das senhoras mineiras que ofereceram ao Marechal Castelo Branco a faixa presidencial com que este assumiu a suprema magistratura da Nação, o Exmo. Revmo. Sr. D. Geraldo de Proença Sigaud procedeu à benção litúrgica daquela insígnia.

• Novos manifestos de agricultores em apoio às teses de RA-QC em matéria de reforma agrária foram subscritos em concentrações rurais realizadas em Londrina (PR) e Oliveira (MG). Foram noticiados por «O Estado de São Paulo», «A Gazeta» e «A Gazeta Esportiva», de São Paulo; «Jornal da Manhã» de Ponta Grossa (PR) ; «Nosso Jornal» de Rio Negro (PR) ; e «Diário da Tarde» de Florianópolis.

• «A Folha de Minas» de Belo Horizonte começou a republicar, nos últimos dias de março, a série de artigos que o Sr. Gustavo Corção escreveu em 1961 contra RA-QC (e que foram refutados pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, sem treplica — ver «Catolicismo», nos 124 e 125, de abril e maio de 1961). Após a vitoria da revolução que derrubou o governo Goulart, aquele jornal interrompeu a publicação...

• O «Jornal da Bahia» de Salvador publicou artigo intitulado «Reforma Agrária — Questão de Consciência», em que o Sr. Napoleão Lopes Filho tece grandes elogios ao livro dos Srs. D. Geraldo de Proença Sigaud, D. Antonio de Castro Mayer, Prof. Plinio Corrêa de Oliveira e economista Luiz Mendonça de Freitas.

• Comentários sobre a grande influência de natureza ideológica exercida por RA-QC sobre a opinião pública nacional, concorrendo para criar o estado de espírito que permitiu a vitoriosa revolução de março, foram publicados pelo «Diário de São Paulo», «A Gazeta Esportiva», «Democracia Cristã», de São Paulo; «Correio de Minas» de Belo Horizonte; «Diário da Tarde» e «A Gazeta», de Florianópolis; e «A notícia» desta cidade.

OUTRAS NOTAS ANTI-SOCIALISTAS

O Senador João Pedro Gouvea Vieira, do Estado do Rio, pronunciou oportuno discurso na Câmara Alta a respeito do efeito danoso da inflação sobre a estrutura das empresas privadas. Ressaltando que a contínua desvalorização da moeda vem aniquilando progressivamente entre nós a iniciativa particular, o representante fluminense mostrou que, atualmente, quase que só permanecem na área desta última as indústrias de bens de consumo. Acrescentou que o processo de estatização que nossa economia vem sofrendo deve ser enfrentado com coragem, para que seus efeitos danosos não terminem por nos lançar em pleno socialismo.

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Em discurso pronunciado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o Deputado Anibal Teixeira, referindo-se à interpelação de católicos mineiros à AC de Belo Horizonte a respeito das reformas de base, denunciou a intervenção de comunistas que procuraram depredar as bancas que recolhiam assinaturas.

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O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, Presidente Nacional da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade e coautor do livro "Reforma Agrária — Questão de Consciência", telegrafou ao Sr. Roberto Oliveira Campos, Ministro do Planejamento, felicitando-o pelo projeto de Reforma Habitacional recentemente publicado. Reza o telegrama: "A Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade felicita a V. Excia. pelo projeto de lei de Reforma Habitacional que visa solucionar o grave problema habitacional das classes necessitadas estimulando a difusão da propriedade urbana e confia em larga medida a solução à iniciativa privada. O projeto se distancia portanto, dos preconceitos socialistas e demagógicos até aqui preconizados na matéria. A Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade apela a V. Excia. para que o próximo projeto de lei do inquilinato seja concebido em um espírito igualmente escoimado de demagogia e socialismo, e promova a abolição gradual do congelamento dos aluguéis, bem como de outras medidas draconianas que desalentam as aplicações de capital privado no setor habitacional, com grave prejuízo para a solução desse problema".

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O Deputado Pe. Godinho, falando na Câmara Federal sobre os acontecimentos que deram causa à revolução de 31 de março, afirmou: "Nem setores da Igreja escaparam ao assalto tenaz. A sua imensa reserva de caridade e a sua infinita capacidade de compreensão foram exploradas pelos que, em todas as partes do mundo onde se apoderaram do controle do Estado, incendiaram seus templos, assassinaram ou mataram seus ministros, esmagaram as suas tentativas de influir nos espíritos, moveram guerra sem quartel contra a própria ideia de Deus, crucificaram Cristo, de novo, como ainda há pouco dizia o insuspeito François Mauriac. Deturparam-se textos de Encíclicas, procurou-se dividir os cristãos, lançando-se uns contra os outros, torceu-se o pensamento de um admirável Pontífice, profanou-se a sua memória, insultou-se um outro Papa, explorou-se a inocência dos úteis, serviu-se da utilidade dos ignorantes e dos carreiristas. (...) Tentou-se esvaziar o Evangelho para que se transformasse num mero estatuto da SUPRA ou num decreto de reforma urbana. Quis-se fazer de Cristo um simples reformador social, uma espécie da Carlos Marx crucificado, como se o Evangelho tivesse apenas multiplicação de pães e de peixes, curas de cegos e de paralíticos".

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Telegramas de Moscou informam que o governo russo outorgou autonomia às granjas coletivas "para estabelecer a superfície a cultivar e o número de cabeças de gado a criar", bem como decidiu que de agora em diante "o trabalho das granjas coletivas será julgado segundo os resultados da atividade produtiva geral das granjas, e não com base nos resultados obtidos na execução do programa de vendas ao Estado". Não é esse mais um sinal do malogro de uma experiência socialista?


AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES

Tônus aristocrático nos aspectos quotidianos da intimidade doméstica

Plinio Corrêa de Oliveira

Em uma verdadeira democracia, asseverou Pio XII ( cf. Alocução de 16-1-1948 à Nobreza e ao Patriciado Romano ), deve haver instituições de tônus aristocrático. Não o tivesse afirmado o imortal Pontífice, e os apodos, as difamações, as perseguições do democratismo revolucionário desabariam sobre quem afirmasse essa sentença. Como foi Pio XII quem o disse, o democratismo revolucionário tudo faz para silenciar sobre esta frase, e a lançar ao olvido. E, se alguém a cita, ele conserva um silêncio encafifado e furioso, de boca fechada é certo, mas como que mordendo com olhos contra o insolente que exumou o incômodo texto pontifício.

Habituados a não dar a menor importância aos furores do democratismo revolucionário, não só exumamos esse texto, mas o comentamos. E não só o comentamos mas — o que ainda mais irrita — o ilustramos.

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Esse tônus aristocrático, do qual falava Pio XII, constitui de certo ponto de vista a mais alta afirmação da dignidade humana, a manifestação do que nela há de profundamente respeitável. Neste sentido, as instituições literárias, artísticas, sociais ou outras ( à sua maneira também as corporações de trabalhadores ), imbuídas de uma nota aristocrática, pelo fato mesmo de estimularem a seleção das verdadeiras elites nos vários domínios da atividade humana, beneficiam, elevam e dignificam todo o corpo social, e constituem um fator para a dignificação do homem em qualquer degrau da hierarquia social em que se encontre.

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O homem se senta à mesa, não só para se nutrir, mas para descansar com os seus num convívio despreocupado, ameno, prazeroso.

Por isto mesmo, os objetos de que se circunda nas refeições devem convidá-lo ao repouso, à distensão, ao sorriso próprios a uma decorosa intimidade.

Nossos clichês mostram uma série de pequenos objetos de mesa do século XVIII, nos quais os leitores que têm sensibilidade artística não duvidarão em reconhecer autenticas pequenas obras-primas destinadas a proporcionar ao homem um prazer do espírito quando vê os objetos de sua mesa, ou deles se serve. Leveza, distinção, graça, tudo neles atesta a presença de um tônus verdadeiramente aristocrático, a indicar um alto respeito pelas conveniências espirituais do homem até mesmo no prosaísmo de sua existência diária.

Esse alto padrão se difundiu naquela época, como é natural, por todo o corpo social, com os competentes matizes. Ele não era monopólio dos grandes, mas representava, pelo contrário, um estímulo a que todos nele se inspirassem, guardadas as devidas proporções. Daí a beleza dos objetos domésticos de então mesmo em camadas muito modestas da população.

As próprias peças aqui exibidas constituem uma prova de quanto esse espírito se embebia em todo o corpo social.

Com efeito, se esses objetos eram para o uso dos grandes, exprimiam não só o tônus que estes sabiam comunicar à sua existência, mas também o gosto maravilhoso dos artistas e artesãos — todos saídos habitualmente do povo — que concebiam e executavam estas pequenas obras-primas.