UMA ESTRANHA MANEIRA
(continuação)
Para que prosseguir?
A certa altura do "passeio" "O Mundo e Eu" alerta o leitor "para um problema que o envolve, como brasileiro desejoso de fé" (p. 106). Perigo! De que se trata?
"Há — explica o Autor — em vários meios (independentemente do nível econômico ou cultural) do catolicismo brasileiro uma certa preterição da Pessoa de Jesus. Em alguns deles o fato assume proporções chocantes, nos quais Jesus Cristo se tornou o grande marginal da fé, em comparação com o destaque que se dá aos santos, sobretudo a certos.
Não se deixe embaraçar. Felizmente já está relativamente adiantada uma reação de católicos esclarecidos per uma teologia cristocêntrica e evangélica. Você que deseja ter fé e viverá sua fé no Brasil, deve se imunizar, libertar-se prèviamente dessa deformação, desse santismo que, em contraposição ao cristianismo apresenta as mais variadas modalidades. Antonismo, jorgismo, tadeísmo, beneditismo, barbarismo...
Os santos são criaturas humanas. Portadores de natureza humana. Todos os santos reunidos não atingiriam Deus, se estivessem divorciados de Jesus Cristo. Mesmo a mensagem intercessora quando rouba ao Cristo o centro, torna-se nefasta, perniciosa, porque faz com que alguém esteja subjetivamente unido ao santo sem se unir conscientemente a Deus. A intimidade com os santos pode ser um bem se nos vigiarmos em mantê-los perante Cristo como as pétalas em relação ao pistilo" (pp. 105-106).
Não é esse o único risco a evitar.
Entre dezoito "medidas que no conjunto formam uma orgânica pedagogia para a conquista da fé" (p. 200), o Revmo. Padre inclui, em décimo quarto lugar, uma referência a "Você e a Virgem". E começa por advertir contra um perigo: "CONTANTO QUE NÃO A TRANSFORME EM PAREDE ENTRE VOCÊ E JESUS, tente dedicar ao menos um aceno interior de dúvida respeitosa para com ela" (p. 220 — grifamos).
O culto dos Santos, se é tal que Nosso Senhor é preterido, é defeituoso. Todo culto aos Santos deve ter a Deus como objeto último, pois Ele, e só Ele, é nosso fim. A devoção a Nossa Senhora, da mesma forma, tem por fim levar a Jesus, e efetivamente conduz a Ele. Não há oposição entre Maria e seu Divino Filho. Ela nos deu Jesus, Ela nos dará a Jesus. Veja-se o que diz a esse respeito São Luís Maria Grignion de Montfort para responder aos jansenistas que combatiam a devoção a Nossa Senhora sob pretexto de que não seria cristocêntrica. Jesus Cristo é o centro de toda a vida religiosa verdadeira, mas isto não impede que se cultuem os Santos como intercessores, não impede que se cultue a Virgem como a Medianeira de todas as graças, como o caminho mais curto, fácil e seguro de chegar a Jesus. Neste sentido fala toda a Tradição. De Santo Irineu ao Papa Paulo VI, Não compreendemos como se possa chegar à verdadeira fé com desconfiança da devoção a Nossa Senhora.
Mas não é só,
A página 182 do livro ensina a tratar com os lobos: "Pertencer à Igreja [...] não confere a nenhum católico o direito de inferiorizar quem quer que seja, de menosprezar, e muito menos de hostilizar nenhum outro homem. Pertença ele à religião que pertencer. Seja ele um lobo religioso. Jesus Cristo orientou-nos na atitude a tomar também neste terreno. Ele quer que não percamos nunca a boa-vontade, a benevolência. "Eu vos envio como cordeiros no meio de lobos" (Mt. 10, 16). Como cordeiros. Não como lobos entre lobos".
Para que prosseguir? Que mais se pode dizer de um livro que recomenda cautela quando se trata da Divina Pastora de nossas almas, e dos Santos que nos assistem do alto dos Céus, ao mesmo tempo que pretende que diante do lobo, de seus dentes e de suas garras, nos portemos como cordeiros que não sabem se defender?
A entrevista que o presidente da FAREM não lerá
Publicado com grande destaque pela imprensa diária, vem repercutindo intensamente nos meios rurais e políticos de todo o País o recente manifesto de mil e duzentos fazendeiros de Minas, protestando contra o apoio que, através de seu presidente, a Federação da Agricultura daquele Estado (FAREM) deu ao Estatuto da Terra, em "flagrante contradição com a sua missão de defesa dos interesses da classe rural, especialmente do direito de propriedade". A vista da resposta dada pelo presidente da entidade, Sr. Josaphat Macedo, os primeiros signatários do documento, Srs. Alderico e José Lucas da Silva, fazendeiros em São Gonçalo do Abaeté, fizeram declarações à reportagem da ABIM:
Depois da resposta do Sr. Josaphat Macedo, ainda continuam os Srs. a considerar que foi bem sucedido o manifesto dos mil fazendeiros, que o censurou por se ter declarado solidário com o Estatuto da Terra?
Foi plenamente bem sucedido. Quer se considere o tamanho, quer a qualidade da resposta.
Aconteceu ao presidente da FAREM um fato sem precedentes na história de qualquer associação rural do País: uma moção de desconfiança, em matéria grave, assinada por mais de mil sócios.
A única saída para o Sr. Josaphat Macedo seria convocar uma reunião geral de todos os fazendeiros de Minas, pedir demissão do cargo, e se fazer reeleger vitoriosamente. Não tendo segurança suficiente para fazer isto, provou ele que já não representa a classe. Isto ficou patente para os Poderes Públicos e para todos os que têm de tratar com a FAREM. Mas, S. Sa., obstinado em permanecer no cargo, apegado a ele, fica fazendo o papel de um personagem inexpressivo e vazio no cenário mineiro e nacional.
Consciente de sua falta de base, procurou ser discreto na resposta. Aproveitou-se de uma assembléia pouco concorrida, onde quase todos os presentes eram de sua intimidade, e deu uma resposta que foi distribuída à imprensa, rádio e TV como uma pequena notícia. Se o Sr. Josaphat Macedo quisesse fazer esquecer a mensagem que recebeu, sua atitude não seria outra.
Quanto à qualidade da resposta, carece ela absolutamente de força de convicção. Mil fazendeiros leram a circular do presidente da FAREM e a entenderam como advogando ineludivelmente o apoio da classe ao Estatuto da Terra.
A única resposta, para S. Sa., seria analisar o documento criticado pelos mil fazendeiros, provando que ele não tem o sentido que lhe foi atribuído. Mas o Sr. Josaphat Macedo percebeu que esta tarefa era impossível. Em lugar de provar que não defendera o Estatuto que o acusavam de ter defendido, repetiu enfàticamente, várias vezes, que tinha combatido a reforma agrária Goulart — coisa que estava fora de cogitação — e que lutara contra a promulgação do Estatuto da Terra. Mas não se defendeu da acusação, irrespondível, de ter dado agora apoio à reforma agrária. Realmente, a circular do Sr. Josaphat Macedo, que motivou a carta dos mil fazendeiros, apóia o Estatuto da Terra.
O que os Srs. crêem que vai fazer o Sr. Josaphat Macedo?
Ele vai ficar calado, porque não tem o que dizer. E provavelmente fará de conta que não leu esta entrevista!
Uma causa que "Catolicismo" defende há 15 anos
O EXMO. REVMO. SR. Bispo Diocesano tem recebido cartas-circulares de Sras. de Minas, mais ou menos do mesmo teor. Aqui reproduzimos uma delas:
"Minas Gerais, mês de julho, 1967
Exmo. Revmo. D. Antonio de Castro Mayer
Respeitosas saudações.
Com a reverente humildade, apanágio dos mineiros diante dos que representam sua religião, em abril um grupo se dirigiu a todos aqueles que, no Brasil, representa vam a Igreja Católica.
Vários, apesar de seus trabalhos, escreveram aos assinantes, e concordavam com o que, com o maior respeito, os homens de Minas diziam.
Outros, honraram a pureza da intenção do manifesto, publicando-o em jornais das Dioceses, na íntegra. Foi uma corajosa e leal afirmação pública de que pensavam do mesmo modo e que haviam compreendido que era atendendo ao próprio Papa, que os leigos se haviam dirigido ao clero.
Entretanto, o Rev.mo. Arcebispo e o Revmo. Bispo da terra donde partiu o Manifesto não se pronunciaram, nem tomaram qualquer medida contra os abusos, contrários ao pensamento do Concílio, que existem em Minas, e, especialmente em Belo Horizonte.
Sábado, dia 22 de julho, houve a missa habitual na Igreja do Carmo. Então, no Evangelho, o padre que celebrava a missa: Frei Paulo atacou os assinantes do manifesto de São Paulo e os assinantes do manifesto de Minas Gerais. Chamou-os publicamente de fariseus.
O povo de Minas não se conforma com isto. No mesmo dia, em outras Igrejas, era explicada ao povo a boa intenção da Missa do Galo [Forte], lição aprendida no Encontro do clero com os bispos...
Sabemos que o manifesto dos mineiros não foi levado a plenário, por ser de "âmbito local". Como julgaram isto? Baseados em que? Já havia em jornais, protestos de S. Paulo, casos em Pernambuco, no E. do Rio, na Guanabara, etc. Por que um pe dido de auxílio, um grito de alarma não foi levado em consideração?
Sabemos que de D. Geraldo Morais Penido partiu o ataque ao manifesto e a idéia (na segunda reunião) de uma solidariedade, que devia ser assinada por todas os bispos mineiros. Como podem assinar solidariedade, se não conhecem os problemas de Belo Horizonte? Ou conhecem e acham que, por piedade fraternal, deviam assinar o documento? Onde ficou a piedade paternal para com as almas dos fiéis?
Diante da acusação pública de Frei Paulo, numa missa, pedimos o pronunciamento público de V. Excia. Revma. Se os mineiros merecem ataque, que êste seja feito. Se têm razão, que isto seja declarado.
Um católico humilde que se dirige a um representante de Cristo, merece uma resposta qualquer.
Aguardamos esta resposta, que servirá de orientação para todos os que desejam, a Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica.
Foram os homens de Minas, diante das reclamações e dos fatos narrados pelas famílias, que assinaram o manifesto "dos fariseus".
São as mulheres mineiras, que pedem, justiça, agora.
Confiam nessa justiça, pois se estão dirigindo a representantes da Igreja, mas sobretudo a homens que abandonaram tudo para servir a Deus.
Não desejamos cartas particulares, motivo pelo qual não segue o endereço. Queremos declarações públicas, como público foi o ataque do Padre, dentro da Igreja, no Evangelho, diante de nossos filhos.
"Honrarás pai e mãe" é um mandamento "ultrapassado" e que defenderemos enquanto Deus nos der forças para pedir auxílio aos bons. Nossos filhos ouviram que seus pais são fariseus. Pedimos, humildemente, que a Igreja impeça que nós tenhamos de lhes mostrar e de lhes contar o que ainda não sabem sobre a parte da Igreja que já não segue o Evangelho.
É com o maior respeito que fazemos êste pedido, apoiados na justiça com que sempre agiu Nosso Senhor, que nunca se calou para proteger os apóstolos.
Pedimos que V. Revma. abençoe a
Minas Católica".
A carta acima, como as outras recebidas, demonstra uma preocupação com a pureza da Fé e o futuro católico das gerações vindouras, que merece respeito e consideração. Tanto mais que semelhante angústia de alma está inteiramente de acordo com as preocupações manifestadas na Carta que o Santo Padre Paulo VI escreveu aos Exmos. Revmos. Bispos do Brasil reunidos em Aparecida para a VIII Assembléia Geral da CNBB. O manifesto, a que se referem as missivas em apreço, estava aliás vazado em linguagem cortês e apontava abusos, alguns dos quais a grande imprensa tem tornado públicos pelo Brasil inteiro. Se, pois, as Sras. de Minas, por causa da atitude de seus maridos, foram injuriadas publicamente, em sermão, o fato é lamentável. Que o fossem em qualquer outra circunstância, já seria para reprovar-se: quanto mais nas circunstâncias apontadas.
Outra coisa é a censura que estas zelosas Sras. julgam dever fazer ao nosso Bispo Diocesano por não ter publicado o manifesto a que aludem, nem se ter comunicado com os signatários do mesmo. A cópia que S. Excia. Revma. recebeu não trazia a indicação de quem lha havia enviado. Depois, nela se dizia que o original tinha sido encaminhado à Santa Sé através da Nunciatura Apostólica. O que quer dizer que os católicos de Minas haviam tomado o caminho certo. Todo fiel pode dirigir-se diretamente ao Santo Padre para manifestar as perplexidades de sua alma. Aliás, para sanar o mal que o documento deplora, ninguém melhor do que o Pai Comum. O que podemos fazer é nos solidarizarmos com o empenho demonstrado em prol da integridade da Fé e dos costumes. Ora, isto os fiéis de todo Brasil de há tempo podem ver em "Catolicismo", que desde sua fundação, há mais de quinze anos, se bate por essa causa.
AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES
Se a batina perdeu toda influência,
POR QUE USÁ-LA DIANTE DO DOPS?
Plinio Corrêa de Oliveira
Um alegre grupo de rapazes. O que são? Estudantes? Comerciários? Quiçá operários? Os trajes nada indicam. Entretanto, trata-se de Dominicanos, fotografados sem batina, pela reportagem de uma revista carioca, na Igreja, de São Domingos das Perdizes, em São Paulo. Os leitores talvez estranhem. Pois, se é natural que cada qual se apresente com os trajes que lhe são próprios, é difícil compreender que esses Religiosos se deixem fotografar em trajes laicos. Se é verdade que o hábito não faz o monge, o bom monge, que se alegra realmente de ser monge, não prescinde de seu hábito.
A explicação para esta incongruente atitude dos jovens Dominicanos consistiria naturalmente em que o traje eclesiástico vai perdendo seu prestígio nos dias de hoje, o que obriga o verdadeiro apóstolo a prescindir dele, pelo menos em muitos casos, se quer alcançar alguma influência junto ao público.
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No dia 2 de agosto p.p. jovens Dominicanos passeiam em frente ao edifício do Departamento de Ordem Política e Social, em São Paulo, em protesto pela detenção de Sacerdotes e estudantes envolvidos na agitação promovida pela UNE.
Na outra foto, dois moços de batina, um dos quais Dominicano, ostentam um cartaz alusivo.
Por que usar a batina nessa ocasião? Não é precisamente porque qualquer atitude da polícia contra eclesiásticos revestidos de traje talar indignaria o povo, enquanto o efeito seria muito menor se os eclesiásticos estivessem à paisana?
Como então não reconhecer a enorme influência que o traje talar conserva? E por que então abandoná-lo? Uma incongruência a mais, no meio de tantas incongruências trágicas, características do momento que passa.