Conclusão da página 3

TEXTO DA CARTA DA TFP

Duas viaturas da polícia, postadas no local, assistiram impassíveis a essa flagrante violação das liberdades constitucionais.

Esta a verdadeira versão do ocorrido. Terminados os incidentes, sucederam-se as pessoas que procuravam a TFP para hipotecar solidariedade.

A TFP acentua que, em seu furor sectário, os agressores progressistas não souberam opor um só argumento ao volante por ela distribuído. Suas armas foram a calúnia — pois é notório que os diretores da TFP sempre foram destemidos adversários do fascismo — e a violência. Essa mesma violência de que o Pe. Comblin faz apologia em seu escrito incendiário.

Assim, os progressistas, açulados por um enraivecido Sacerdote, pretenderam transformar as imediações da Igreja de Santo Inácio em um feudo no qual governam como ditadores, e onde não têm vigência a Constituição brasileira.

Quanto ao noticiado incidente entre elementos desta Sociedade e Padres Carmelitas de Belo Horizonte, na realidade tudo se reduziu ao seguinte: os jovens da TFP distribuíram largamente na via pública a carta do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira alusiva ao Pe. Comblin; nisto não foram obstados pelos referidos Religiosos, nem o poderiam ser, pois estavam no exercício de liberdade garantida pela Constituição. Simplesmente, em alguns sermões os Padres Carmelitas se manifestaram em desacordo com a carta da TFP. Os jovens permaneceram em seu trabalho até o fim da última Missa, dominical".

Esse comunicado foi divulgado pelos órgãos da imprensa paulista "Folha da Tarde", "Diário da Noite" (edição nacional), "Última Hora", "Folha de S. Paulo", "O Estado de S. Paulo", "Cidade de Santos" e "A Tribuna", de Santos.

Depois de distribuído à imprensa o esclarecimento da TFP, "O Estado de S. Paulo" fez referência ao incidente do Rio na sua secção "Notas e Informações" do dia 3 de julho. A propósito de recentes tentativas de entendimentos entre as autoridades e os estudantes, visando pôr fim à agitação universitária, diz o articulista que pior do que a atitude dos jovens rebeldes é a de certos representantes do Clero. E prossegue: "Até aqui, os elementos dissidentes do Clero limitavam-se a agir cá fora. Hoje é no próprio adro dos templos que seu trabalho deletério se faz sentir, como o demonstrou ainda anteontem o oficiante da Missa celebrada no Colégio de Santo Inácio, em Botafogo. Em seu sermão convidou aquele Sacerdote os fiéis presentes a solidarizarem-se com D. Helder Camara, identificando o Antístite nordestino e a sua campanha com a própria Igreja. O resultado dessa estranha atitude foi a luta física que no final da cerimônia se estabeleceu às portas do templo entre os que se mostraram sensíveis ao apelo feito do púlpito e um grupo de católicos que distribuíra um manifesto criticando o Padre Joseph Comblin e o apoio que lhe vem dispensando D. Helder Camara".


IMPRESSIONANTE PRONUNCIAMENTO DOS EXMOS. SRS. ARCEBISPO DE DIAMANTINA E BISPO DE CAMPOS

A propósito do estudo do Pe. Joseph Comblin, os Exmos. Revmos. Srs. D. Geraldo de Proença Sigaud, Arcebispo de Diamantina, e D. Antonio de Castro Mayer, Bispo desta Diocese, endereçaram em data de 23 de junho p. p. uma carta ao Eminentíssimo Cardeal D. Agnelo Rossi, Arcebispo de São Paulo e Presidente da CNBB. Cópias dessa carta foram distribuídas por seus signatários ao Venerando Episcopado Brasileiro.

De natureza estritamente reservada, o documento chegou, através de. alguma indiscrição, ao conhecimento da imprensa diária, que deu ampla divulgação ao seu texto integral. À vista desse fato, "Catolicismo" não vê impedimento em transcrever também ele a carta, para informação de seus leitores.

Reza o pronunciamento dos dois egrégios Prelados:

"Diamantina, 23 de junho de 1968

Eminência Reverendíssima

Osculando a Sagrada Púrpura, com saudações muito cordiais, tomamos a liberdade de tecer, junto a Vossa Eminência Reverendíssima, alguns comentários ao parecer do R. P. Joseph Comblin, professor no Instituto Teológico do Recife, sobre o documento a ser discutido na reunião do CELAM deste ano. Somos a isso levados pela transcendência que adquire a posição tomada pelo professor belga no Instituto Teológico do Recife: não somente porque se destina a ser apresentada à reunião da Comissão Episcopal de toda a América Latina; como principalmente porque pretende desmoralizar a Hierarquia e o Clero, com o fim de atingir a própria estrutura da Igreja, no intuito de favorecer a subversão da ordem para a instalação de um regime comunista no País.

Visão caluniosa do Episcopado

De fato, como Vossa Eminência certamente terá visto, o relatório do Pe. Comblin difama os Srs. Bispos, aos quais acusa de incompetência, de filhotismo, de peitar o Poder Judiciário, obtendo sentenças favoráveis, mas injustas. Apresenta-os ainda como indolentes, que presenciam a miséria do povo e, em vez de minorá-la, se acumpliciam com os que sugam esses miseráveis.

Um tal quadro dos Bispos brasileiros incute na mente dos fiéis que os Bispos progressistas — quiçá apenas D. Helder e os que publicamente o acompanham — são os únicos que compreendem a missão da Igreja, que tiram o povo da miséria, que são os verdadeiros Pastores.

Um verdadeiro soviet eclesiástico

Como consequência dessa visão caluniosa dos Bispos do Brasil, o Pe. Comblin preconiza uma aposentadoria para a maioria do Episcopado e do Clero, mediante a implantação de um verdadeiro soviet eclesiástico, diante do qual os Bispos ficariam pràticamente anulados. Aliás, os amores do Pe. Comblin não se voltam para os membros da classe a que pertence. Não só calunia o Clero, como reprova os gastos com Seminários, e opõe-se à vinda de Sacerdotes estrangeiros para auxiliar o escasso Clero nacional.

Por outro lado, investe também contra a estrutura canônica das Ordens e Congregações religiosas, porquanto almeja uma CRB que liquide as diferenças características das diversas Famílias religiosas. Sua intenção é obter assim uma massa de manobra que facilite a promoção de uma revolução social de cunho materialista, através de reformas socialistas, confiscatórias e niveladoras. O fim almejado é a subversão de toda a estrutura social, e a criação da massa anorgânica sob a tirania do Estado, como acontece nos países comunistas.

Mas, segundo os desejos do Pe. Comblin, a Igreja não somente deve contribuir para a instalação de semelhante tirania, como deve Ela também se enquadrar na obediência servil ao colégio soviético que irá dominar a Pátria.

Elogio a Fidel Castro

Para se julgar o caráter da revolução político-social que idealiza o Pe. Comblin para o Brasil, notemos que ele considera injustos e nocivos ao desenvolvimento do País os arrendamentos de terras e prédios, o emprego de capital em ações de empresas comerciais, e etc. E, para que não haja dúvida sobre suas intenções, faz ele o elogio da revolução comunista do México, deplorada por Pio XI, e da outra igualmente comunista de Fidel Castro, cujo início consubstanciou-se no confisco dos imóveis rurais e urbanos, e das empresas comerciais. Semelhante atitude do Pe. Comblin contraria rotundamente a doutrina tradicional da Igreja.

No entanto, não perturba a consciência do Sacerdote belga nem sequer o tristemente célebre "paredón" de Fidel Castro, porquanto o Pe. Comblin justifica a repressão violenta contra os recalcitrantes que não se amoldam ao nivelamento massificante por ele sonhado.

Porquanto, o Pe. Comblin deixa claro que esse duplo politburo, civil e eclesiástico, não é aceito pela maioria dos brasileiros; e que será necessário usar do poder despótico para impô-lo. Entende mesmo que a Igreja teria feito melhor formando agitadores do que gastando, como fez, tanto dinheiro com seus Seminários.

Deseja uma total subversão da ordem jurídica existente

Não é somente para a Igreja que as ideias do Pe. Comblin constituem um perigo. Pois ele deseja, outrossim, uma total subversão da ordem jurídica existente. Deseja mesmo que se coliguem as forças católicas para auxiliar os mais audazes no assalto ao Estado, derrubando o Governo, desmoralizando e dissolvendo as Forças Armadas e anulando o Poder Judiciário: numa palavra, provocando a anarquia.

Infelizmente, tais idéias não representam a opinião pessoal de um visionário ou fanático. No documento que analisamos, acham-se reunidos em forma mais ou menos sistemática, proposições que surgem aqui e acolá, nos meios católicos conhecidos como progressistas. É um pensamento que se difunde em toda uma corrente ativa, organizada e dotada de apoio publicitário, a qual, como é notório, encontra audiência e encorajamento até em certos membros de nossa classe.

O documento do Pe. Comblin deixou ver aos setores mais responsáveis da opinião nacional que espécie de doutrinas e programas encontram livre trânsito no Instituto Teológico do Recife. A profunda estranheza provocada por êste fato sobreleva de ponto considerando-se que o referido instituto funciona sob a supervisão de D. Helder Camara, o qual é ao mesmo tempo Secretário Nacional da Ação Social, isto é, do setor da CNBB incumbido de estudar e propor solução para os problemas sociais e econômicos do Brasil.

Compreende Vossa Eminência que, se deixarmos sem protesto a atitude insólita do Pe. Comblin, corremos o risco de passar, junto ao povo fiel, corno réus confessas, e promotores da revolução social comunista. Os fiéis poderiam ver no nosso silêncio a confirmação das acusações que nos faz o Pe. Comblin, e julgar ou ao menos suspeitar que realmente somos indolentes, negocistas, incapazes e desonestos, e que aceitamos como missão da Igreja a obra subversiva que ele aponta como o ideal para a atividade eclesiástica.

Queira, pois, Vossa Eminência ver nestes nossos comentários um desencargo de consciência, de quem está convencido da injustiça das acusações feitas aos Venerandos Bispos brasileiros, e percebe o alcance que representa essa investida subversiva, a mais séria que o Brasil sofreu em toda a sua existência.

Medidas contra o Pe. Comblin

Tomamos, pois, a liberdade de solicitar de Vossa Eminência queira providenciar as medidas no sentido de expurgar os meios católicos destas influências doutrinárias deletérias que vêm causando neles enorme devastação.

Parece-nos igualmente que seria de grande oportunidade um pronunciamento público que torne claro aos olhos dos poderes civis e militares a inteira rejeição, por parte do Episcopado, do programa e dos métodos comunistas contidos no documento do Pe. Comblin.

Certos da benévola acolhida que Vossa Eminência vai dar a esta nossa carta, com o respeito que devemos a Vossa Eminência subscrevemo-nos,

Servos em Jesus Cristo,

† GERALDO DE PROENÇA SIGAUD

Arcebispo de Diamantina

† ANTONIO DE CASTRO MAYER

Bispo de Campos".


Nota do Emmo. Cardeal Rossi

Referindo-se à carta que lhe enviaram os Exmos. Srs. Arcebispo de Diamantina e Bispo de Campos, Sua Eminência o Cardeal Rossi distribuiu esta nota à imprensa:

"Tendo sido divulgada uma carta a mim dirigida pelos Exmos. Srs. Arcebispo de Diamantina e Bispo de Campos sobre o documento do Padre J. Comblin, desacompanhada de minha resposta, satisfaço ao pedido dos jornalistas que desejam uma informação quanto à posição da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil neste caso.

Respondi àqueles, ilustres prelados que se tem dado ao relatório do Padre Comblin um valor oficial que em nenhum momento teve, porquanto é apenas um estudo, como tantos outros apresentados particularmente ao Exmo. Sr. Arcebispo de Olinda e Recife e que não foi por S. Exa. apresentado a nenhum órgão oficial da CNBB e, portanto, muito menos à próxima reunião do Episcopado Latino-Americano em Medellin.

Quanto às idéias do relatório, creio que os ilustres Prelados podem, e devem discuti-las na próxima reunião da CNBB, mesmo por causa de uma divulgação sensacional que tiveram na imprensa, que sinceramente desejo para os comunicados que a CNBB oportunamente fornecer para esclarecimento da opinião pública.

Nesta circunstância, gostaria de esclarecer que sou Presidente da Comissão Central da CNBB até as próximas eleições, esperando já ter dado minha colaboração à CNBB, aguardando ansiosamente a eleição de novo Presidente da Comissão Central da CNBB".


"RESPOSTA A UMA ENTREVISTA"

Por um erro da tipografia saiu empastelado em nosso último número, na matéria "Resposta a uma entrevista", o segundo parágrafo da última coluna da sétima página. O texto correto é o seguinte:

"É verdade que a defesa, neste caso, ocupa uma extensão consideravelmente maior que a acusação. Não cremos, entretanto, que esta circunstância exima V. Revma. de publicar a presente carta, pois — como é sabido — pode-se responder de modo conciso a acusações definidas e documentadas. Nada mais difícil e mais longo, no entanto, do que refutar acusações genéricas e carentes de provas".


NOVA IGREJA

D. A. C.

Na exortação "Petrum et Paulum" de 22 de fevereiro do ano passado, com que estabeleceu o Ano da Fé, para comemorar o 19.° centenário do glorioso martírio dos Apóstolos São Pedro e São Paulo, Paulo VI lamenta a existência no seio da Igreja de um espírito "pos-conciliar" de caráter subversivo, que vê nos Documentos do Vaticano II uma ruptura com a tradição da Igreja, e pretende instaurar um novo cristianismo: "[...] intenta-se introduzir no povo de Deus uma mentalidade que chamam de "pós-conciliar", que, dos amplos e magníficos desenvolvimentos doutrinários e legislativos do Concílio, abandona a firme coerência com o tesouro de idéias e normas práticas da Igreja, para despojá-los de seu espírito de fidelidade tradicional, e para difundir a ilusão de dar ao Cristianismo uma interpretação nova, arbitrária e estéril".

Pelo exposto o Papa registra duas maneiras de entender o Concílio Vaticano II. Uma, dos que o interpretam de acordo com a Tradição, como floração nova de árvore antiga, que vive da mesma seiva, é da mesma substância, ostenta unidade orgânica com o passado, do qual não se aparta, mas o continua e de novo o afirma. Já outros — os criadores da mentalidade "pós-conciliar" — consideram o Vaticano II uma revolução na Igreja que marca o fim de uma tradição doutrinária e prática, e a instauração de um novo cristianismo, uma nova igreja.

Segundo o testemunho do Santo Padre, a obra da mentalidade "pós-conciliar" não é meramente negativa. Não consiste apenas na destruição do passado. Sobre os destroços da Tradição, seus fautores colimam edificar uma nova religião. Aliás, seria mediante a instauração do novo cristianismo que a mentalidade "pós-conciliar" destruiria o antigo.

Às aspirações religiosas arraigadas nos corações dos fiéis, precisam os inovadores apresentar algo que possa substituir o objeto a que antes aderiam. De onde, a importância de saber qual o novo cristianismo da mentalidade "pós-conciliar". Quais os dogmas, a liturgia, a moral, a doutrina social, qual o espírito que dará unidade orgânica a essa nova igreja.

*

As palavras do Papa nada dizem a respeito. Declaram tão somente que é entre os inovadores, aqueles que na interpretação do Vaticano II se afastam da Tradição, que se encontram os elementos constitutivos da nova religião.

É uma indicação de fontes que merece registro. Como, no entanto, tais inovadores preferem criar ambiente com expressões que, se excitam sentimentos de rebeldia e dão origem a tendências heretizantes, não contêm afirmações doutrinárias precisas, não é fácil detectar os dogmas fundamentais que dariam organicidade ao novo cristianismo.

Cremos, por isso, que o Bispo de Metz, Exmo. Mons. PAUL-JOSEPH SCHMITT, prestou um grande serviço aos fiéis, contribuindo para elucidar ponto de tão capital importância. É em "Itinéraires" de janeiro deste ano, em artigo de seu diretor, sr. Jean Madiran, que tomamos conhecimento da doutrina professada por aquele Prelado e exposta no boletim oficial da Diocese lorena, "L'Eglise de Metz", 125 e 134. Porquanto a reforma da Igreja preconizada pelo Sr. Bispo de Metz, conforme o artigo do Sr. Jean Madiran, ilustra adequadamente as palavras do Santo Padre que acima citamos.

De fato, como se pode ver nos trechos transcritos naquele artigo, Mons. Paul-Joseph Schmitt prega a falência do Cristianismo antigo, e dá as indicações de como construir o novo.

Para o Sr. Bispo de Metz, "a mudança de civilização que vivemos acarreta modificações não somente em nosso comportamento exterior, mas na própria concepção que fazemos quer da criação, quer da salvação operada por Jesus Cristo. As questões mais fundamentais surgidas obrigam não somente a uma nova pastoral, mas, mais profundamente, a uma concepção mais evangélica — ao mesmo tempo mais pessoal e mais comunitária — do desígnio de Deus sobre o mundo" ("L'Egl. de Metz", n.° 134).

Não se poderia afirmar de modo mais claro a ineficácia do Cristianismo tradicional. Para a fé antiga, nada mais fundamental do que o conceito de criação e o de salvação operada por Jesus Cristo. Pois bem. Tais conceitos são declarados caducos. Pois que o Cristianismo antigo não chegou a entender evangelicamente o desígnio de Deus sobre o mundo. Portanto é mister marchar para um novo cristianismo, uma nova igreja. Ainda não se tinha dito isso de maneira assim tão explícita. O Exmo. Bispo de Metz fez-nos esse favor.

A nova fé, sempre de acordo com S. Excia. Revma., tem sua própria fonte de revelação. Quem no-la vai anunciar não é nenhum magistério vivo instituído por Jesus Cristo. São as transformações do mundo que a manifestam. É a evolução que indica os dogmas da Fé. É o mundo que vivifica o fiel. Eis porque Mons. Schmitt nos manda que estejamos à escuta do mundo: "La foi écoute le monde".

Novo cristianismo que se destaca da Tradição, é natural que mantenha com o mundo outra atitude. São João e em geral as Escrituras nos alertam contra a mundo, repositório de erro e maldade, fruto das concupiscências que obscurecem a inteligência e viciam o coração. A nova igreja exorta ao contrário. Devem os fiéis ouvir o mundo, pois que é o mundo que lhes revelará os novos dogmas, o novo conceito de criação, a nova idéia de redenção cristã.

Elemento essencial na economia religiosa do Cristianismo é a graça. Auxílio sobrenatural que à terra trouxe o Sangue Preciosíssimo do Filho de Deus feito homem, para facultar aos mortais a vida eterna no Céu, ensinava o Catecismo antigo. O Sr. Bispo de Metz nos faz conhecida a graça do novo cristianismo. Essa graça é a "socialização". "A socialização — assim o ilustre Prelado — não é somente um fato inelutável da história do mundo. Ela é uma graça".

A nós nos parece que reduzir a graça, que é entidade sobrenatural, à socialização, está na linha do marxismo.

*

Delineam-se assim os contornos da nova igreja. A nova religião cristã destaca-se da Tradição, e orienta-se ao sabor do mundo, não de qualquer mundo, mas do mundo comunista. Com efeito, são os marxistas que saúdam a socialização qual graça de salvação para o homem que, intoxicado com o ópio do povo, aliena-se da realidade.

Mais. Os marxistas encerram o homem no círculo estreito da vida presente. Materialistas, não admitem que o homem se volte para o além-túmulo, à busca de um complemento à bem-aventurança que o mundo não lhe pode proporcionar. Uma religião marxista só seria concebível se outra finalidade não tivesse que não fosse o bem-estar terreno. Mais precisamente, uma finalidade que se exprimisse em termos econômicos. Porquanto o marxismo é totalitário, e não admite ideologia diversa da sua. Pois, a nova concepção do cristianismo chega até lá.

Para o Exmo. Mons. Paul-Joseph Schmitt a finalidade da Igreja é colocar a economia ao serviço do homem, e repartir eqüitativamente os bens deste mundo. Afirma ele: "É preciso tomar em consideração a censura que nos fazem os marxistas. Os cristãos, dizem eles, em dezenove séculos não conseguiram pôr a economia ao serviço do homem, e repartir eqüitativamente os bens deste mundo".

S. Excia. Revma. parece esquecer a finalidade ultraterrena da Igreja; pois Lhe assinala como escopo algo limitado a êste mundo. O que a Igreja consegue como corolário de sua doutrina e da prática de seus preceitos, para o Sr. Bispo de Metz passa a razão de ser de sua existência. De fato, Jesus Cristo veio para salvar as almas, e para isso declarou que devem os homens se exercitar na prática das virtudes cristãs. Conseqüência natural do exercício de tais virtudes é na sociedade a harmonia entre as classes com o bem-estar para todos. Silenciar o fim verdadeiro da Igreja, e assinalar-Lhe outro, circunscrito a esta terra, é diminuir a dignidade da Esposa de Cristo, e aproximá-La do ideal marxista.

Em resumo: o novo cristianismo aceita a concepção marxista da existência, e empenha-se por realizá-la na História. O que a Igreja de Cristo, pelos seus Pontífices, chama de "intrinsecamente mau", isso a nova igreja diz que é intrinsecamente bom, que é mesmo uma graça. Não estamos diante de certos exageros na interpretação do "aggiornamento" conciliar. Estamos diante de uma anti-Igreja.

As exposições doutrinárias do Exmo. Mons. Paul-Joseph Schmitt, consideradas por "Itinéraires", explicam certos pronunciamentos e atitudes de membros da Igreja, que poderiam parecer obscuros. Lembremos a maneira como alguns setores eclesiásticos consideram a guerra no Vietnã, ou o silêncio, dos mais profundos, que observam em relação ao brutal imperialismo exercido sobre povos da Europa central e balcânica, ou como mostram a mais perfeita ignorância do verdadeiro genocídio com que os invasores comunistizados operam a liquidação das tribos negras do Sudão, ou uma admiração embevecida por expoentes ativos da propaganda comunista.

Neste sentido, o Sr. Jean Madiran dá especial saliência à mensagem em que consubstanciaram seu pensamento sobre a Igreja no mundo de hoje, os Prelados do chamado terceiro-mundo, quando aqui se reuniram no ano findo. De tal encontro participaram personalidades eclesiásticas das partes mais distantes geográfica e etnicamente. Estiveram presentes Bispos do Saara, da Oceania, do Laos, do Líbano, além de outros da América Latina. Ao todo, eram dezessete, congregados pela identidade ideológica.

Ora, os conceitos emitidos na declaração que publicaram, embora não os enunciem de maneira categórica, ajustam-se bem ao novo cristianismo projetado pelo Sr. Bispo de Metz. Conhecendo as idéias reformistas de S. Excia. Revma., o leitor comum é naturalmente levado a entender no mesmo sentido a mensagem dos Prelados do "terceiro-mundo". Também estes têm uma censura à Igreja, quando A dizem tolerante com o capitalismo e usos econômicos "pouco conformes com a Moral dos Profetas e do Evangelho". Também estes não creditam à Igreja o aparecimento de um novo sistema social mais conforme com a Moral evangélica, uma vez que constatam tão somente o fato, ao qual a Igreja assiste com satisfação. Também acham que o Cristianismo pede a repartição eqüitativa dos bens, e o identificam com o verdadeiro socialismo. Tudo isso, no esquecimento da parte mais nobre da vida da Igreja, a contemplação, e na exaltação do trabalho, que põem no primeiro lugar na vida social, e dos operários e trabalhadores rurais, a quem atribuem toda a honra social.

*

A reunião dos Prelados do "terceiro-mundo", sem julgar das intenções, mostra como há focos espalhados por toda parte, de pessoas empenhadas por instaurar um catolicismo diferente do antigo e que põe em perigo a verdadeira Fé. À reforma sugerida pelo Sr. Bispo de Metz, o Sr. Jean Madiran chama de heresia do século XX.

Relacionada com os intentos de instaurar um novo cristianismo, está certamente a atitude de certos comunistas militantes, que começam a julgar extremada a opinião dos primeiros marxistas, para quem a Religião era o ópio do povo. Realmente, não poderá um comunista acusar de ópio do povo um cristianismo que lhe vai ao encontro. Talvez nesse novo cristianismo esperem confraternizar-se progressistas e comunistas.