(continuação)
quanto a realidade histórica de vossa nudez, de vossa miséria, de vossa aparente derrota!
Pater Noster. Ave Maria. Gloria Patri.
V. Miserére nostri Dómine. R. Miserére nostri.
V. Fidélium ánimae per misericordiam Dei requiéscant in pace.
R. Amen.
XIII Estação
Jesus é depositado nos braços de sua Mãe
V. Adorámus te Christe et benedícimus tibi.
R. Quia per sanctam Crucem tuam redemísti mundum.
A Redenção se consumou. Vosso Sacrifício se fez inteiro. A Cabeça sofreu quanto tinha de sofrer. Restava aos membros do corpo sofrer também. Junto à Cruz estava Maria. Para que dizer uma palavra que seja, sobre o que Ela sofreu? Parece que o próprio Espírito Santo evitou de descrever a pungência da dor que inundava a Mãe como reflexo da dor que superabundou no Filho. Ele só disse: "Vós, que passais pelo caminho, atentai e vede se há dor semelhante à minha dor" (Jer. I, 12). Só uma palavra a pode descrever: não teve igual em todas as puras criaturas de Deus.
Nossa Senhora da Piedade! É assim que o povo fiel invoca a Nossa Senhora quando A contempla sentada, com o cadáver divino do Filho ao colo. Piedade, porque toda Ela não é senão compaixão. Compaixão do Filho. Compaixão dos filhos, porque Ela não tem só um filho. Mãe dEle, tornou-se Mãe de todos os homens. E Ela não tem apenas compaixão do Filho, tem também dos filhos. Ela olha para nossas dores, nossos sofrimentos, nossas lutas. Ela sorri para nós no perigo, chora conosco na dor, alivia nossas tristezas e santifica nossas alegrias. O próprio do coração de Mãe é uma íntima participação em tudo o que faz vibrar o coração dos filhos. Nossa Senhora é nossa Mãe. Ela ama muito mais a cada um de nós individualmente, ainda ao mais miserável e pecador, do que poderia fazê-lo o amor somado de todas as mães do mundo por um filho único. Persuadamo-nos bem disto. É a cada um de nós. É a mim. Sim, é a mim, com todas as minhas misérias, minhas infidelidades tão asperamente censuráveis, meus indesculpáveis defeitos. É a mim que Ela ama assim. E ama com intimidade. Não como uma Rainha que, não tendo tempo para tomar conhecimento da vida de cada um dos súditos, acompanha apenas em linhas gerais o que eles fazem. Ela me acompanha a mim, em todos os pormenores de minha vida. Ela conhece minhas pequenas dores, minhas pequenas alegrias, meus pequenos desejos. Ela não é indiferente a nada. Se soubéssemos pedir, se compreendêssemos a importunidade evangélica como uma virtude admirável, como saberíamos ser minuciosamente importunos com Nossa Senhora! E Ela nos daria na ordem da natureza, e principalmente na ordem da graça, muitíssimo mais do que jamais ousaríamos supor.
Nossa Senhora da Piedade! Tanto valeria, ou quase, dizer Nossa Senhora da Santa Ousadia. Porque o que mais pode estimular a santa ousadia, ousadia humilde, submissa e conformada de um miserável, que a piedade maternal inimaginável de quem tudo tem?
Pater Noster. Ave Maria. Gloria Patri.
V. Miserére nostri Dómine. R. Miserére nostri.
V. Fidélium ánimae per misericordiam Dei requiéscant in pace.
R. Amen.
XIV Estação
Jesus é depositado no sepulcro
V. Adorámus te Christe et benedícimus tibi.
R. Quia per sanctam Crucem tuam redemísti mundum.
Ao mesmo tempo que as pesadas lajes do sepulcro velam o Corpo do Salvador aos olhares de todos, a fé vacila nos poucos que haviam permanecido fiéis a Nosso Senhor.
Mas há uma lâmpada que não se apaga, nem bruxuleia, e que arde só ela plenamente, nesta escuridão universal. É Nossa Senhora, em cuja alma a fé brilha tão intensamente como sempre. Ela crê. Crê inteiramente, sem reservas nem restrições. Tudo parece ter fracassado. Mas Ela sabe que nada fracassou. Em paz, aguarda Ela a Ressurreição. Nossa Senhora resumiu e compendiou em Si a Santa Igreja nesses dias de tão extensa deserção.
Nossa Senhora, protetora da fé. É este o tema da presente meditação. Da fé e do espírito de fé, ou seja, do senso católico. Hoje, a muitos olhos, as possibilidades de restauração plena de todas as coisas segundo a lei e doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo parecem tão irremediavelmente sepultadas quanto aos Apóstolos parecia irremediavelmente sepultado Nosso Senhor em seu sepulcro. Os que têm devoção a Nossa Senhora recebem dEla, entretanto, o inestimável dom do senso católico. E, por isto, eles sabem que tudo é possível, e que a aparente inviabilidade dos mais ousados e extremados sonhos apostólicos não impedirá uma verdadeira ressurreição se Deus tiver pena do mundo, e o mundo corresponder à graça de Deus.
Nossa Senhora nos ensina a perseverança na fé, no senso católico e na virtude do apostolado destemido — "Fides intrepida" — mesmo quando parece tudo perdido. A Ressurreição virá logo. Felizes dos que souberem perseverar como Ela, e com Ela. Deles serão as alegrias, em certa medida as glórias do dia da Ressurreição.
Pater Noster. Ave Maria. Gloria Patri.
V. Miserére nostri Dómine. R. Miserére nostri.
V. Fidélium ánimae per misericordiam Dei requiéscant in pace. R. Amen.
Dialogando francamente
D. A. C.
Há uma organização internacional, com tentáculos estendidos por toda parte, de maneira que nação alguma escapa à sua influência, cuja finalidade é difundir em todos os meios a heresia modernista. Chama-se IDO-C, e se propõe controlar toda a imprensa católica. Já tem nas mãos grandes órgãos católicos e boa parte das secções religiosas dos jornais neutros (cf. "Catolicismo", n.° 220-221, de abril — maio de 1969).
Daí, o verdadeiro heroísmo que demonstram os órgãos de publicidade que timbram em não romper com a tradição, o que quer dizer, que não atraiçoam a verdadeira Igreja de Cristo.
Neste número está o valoroso semanário do Rio de Janeiro, "A Cruz", ele mesmo repositório de gloriosas tradições. Hoje, sob a direção do Sr. Antônio Guedes de Holanda, milita em defesa da Fé, da Moral, dos costumes católicos, contra a invasão bárbara dos neomodernistas, apostados a tudo destruir para impor uma religião anárquica de feitio marcusiano.
Em "A Cruz" terça armas pela boa causa o Revmo. Padre LUIZ GONZAGA DA SILVEIRA D'ELBOUX, S. J., na sua leve e fluente secção "Dialogando francamente", lida com agrado, proveito e conforto nos angustiosos tempos que correm.
Em boa hora, o Revmo. Padre D'Elboux reuniu em livro ("CRISE RELIGIOSA" — que melhor se apelaria "Crise na Igreja" — Editora "Mensageiro do Sagrado Coração de Jesus", Rio, 1969) parte de suas crônicas semanais (de janeiro de 1967 a junho de 1969). Oferece ele, assim, aos seus leitores vista panorâmica dos destroços — ao menos de muitos deles — a que católicos, eclesiásticos e leigos, vão reduzindo sua Fé, sua Moral, sua Liturgia, seus costumes. Alguns títulos dos capítulos são suficientes para se ver a amplidão dos estragos, a que tenta pôr cobro o zelo do Autor: "Aberração da imprensa católica"; "Devoções e associações injustiçadas"; "Celebremos o mês de Maria"; "Mania de simbolismo teológico"; "Criançolas representando a Igreja"; "Porque fracassam as vocações"; "Não festejamos Lutero"; "Laicizam-se os colégios católicos"; "Pode-se justificar incitamento à revolução?"; "Repudiamos o paganismo da mini-saia"; "Bailes paroquiais"; "Fobia de normas e estruturas"; "Nova heresia e nova consagração"; "Amor profano e amor santo"; "Diabólico triunfalismo de Religiosos"; "Os ambíguos sinais dos tempos"; "Religiosos pervertidos são os que mais pervertem"; "Não rodopiemos com todo vento de doutrina"; "Distinção na virtude, na doutrina e no traje"; "Cristianismo não é apenas sociologia"; "Mais um desertor em Belo Horizonte"; "Liturgia "hippy" na zona sul"; "O Catecismo holandês invade o Brasil"; "Há eclesiásticos que crucificam a Igreja"; "O celibato desfigurado e ultrajado num inquérito"; "Os mercenários se omitem abandonando as ovelhas"; "A título de amostras de erros"; etc.
O livro ressente-se de certa falta de unidade, porque acompanha o erro nos vários campos em que surge; e o erro, como tudo quanto destrói, é dispersivo. Há, no entanto, nessas páginas, uma unidade de intenção: o empenho na defesa da tradição católica, da Igreja de Cristo. Neste sentido, gostaríamos de ver, em certos pontos, diálogo ainda mais franco; de onde, não é em todas as asserções que acompanhamos o Autor.
UMA APRECIAÇÃO INFELIZ...
Pe. Frei Teodoro de A. Chaves
O Pe. Frei Boaventura Kloppenburg, Redator-chefe da "Revista Eclesiástica Brasileira", em o número 2 do ano p. passado, publicou uma apreciação do CATECISMO HOLANDÊS; apreciação que achamos muito estranha, em se tratando de um TEÓLOGO que esteve, de qualquer forma, presente ao Vaticano II e se ocupa continuamente de Teologia.
Parece que Frei Boaventura, não saberia porque, experimenta um grande prazer em recomendar e elogiar tudo o que cheira a progressismo e modernismo e se manifesta "anti-romano". Qualquer coisa deve ter criado nele uma "psicose", que o irrita diante da intervenção da "Cúria Romana", e sente alegria em discordar da mesma.
Não podemos explicar de outro modo a "Apreciação" que ele fez da edição brasileira do tal Catecismo. Apreciação que se manifesta até contraditória.
Começa por confessar que o "Novo Catecismo" holandês foi traduzido e publicado sem inserir no texto "as correções SUGERIDAS pela Comissão Cardinalícia", encarregada pelo Papa.
Notamos que tais correções não foram simplesmente "sugeridas", mas exigidas pela Comissão Cardinalícia, pois trata-se de "erros" graves e fundamentais. Erros que vêm envolvidos numa maneira ambígua, incompleta, nebulosa de expor a VERDADE católica.
Esse sistema de dizer, sem manifestar claramente, é o sistema dos falsos profetas, na fase inicial de sua pregação: necessitam de uma roupagem diversa dos sentimentos internos, para dizer, sem aparecer que dizem.
* * *
Vamos frisar uns pontos, sobre os quais a Comissão achou tal Catecismo deficiente e precisando de correções:
1° — O Mistério da Santíssima Trindade, que não pode ser visto como uma manifestação externa do mesmo Deus, em três tempos diferentes da história da salvação. Nossa fé católica ensina-nos que a única Natureza Divina subsiste em TRÊS PESSOAS, Pai, Filho, Espírito Santo; PESSOAS realmente distintas.
2º — No princípio do tempo, Deus criou não só este mundo visível, material, mas criou também seres totalmente espirituais, que chamamos ANJOS. Como também Deus cria imediatamente, em cada homem, a alma espiritual e imortal.
3º — O pecado original não é o "pecado do mundo", o conjunto de todos os pecados da humanidade, como diz o Catecismo holandês, mas é o pecado cometido pelo primeiro homem, Adão. Pecado que importa na privação da graça santificante e na deterioração de todos os descendentes do primeiro pai, mesmo os que não cometeram pecados pessoais, mas pelo fato de serem filhos de Adão.
4º — Cristo satisfez pelos nossos pecados, oferecendo ao Pai as dores de sua Paixão e Morte na Cruz, ato de amor perfeito para com o Pai Celeste e para com os homens, seus irmãos...
O Sacrifício da Missa é a renovação incruenta do Sacrifício da Cruz; sacrifício oferecido pela oblação consecratória do Sacerdote ministerial.
5º — A presença de Cristo na Eucaristia é REAL e PERMANENTE, produzida pela transubstanciação do pão e do vinho, no momento da consagração e independentemente da vontade dos presentes.
6º — A Santíssima Mãe de Deus, Maria, concebeu e deu à luz o Filho de Deus, por obra do Espírito Santo, "no esplendor permanente da virgindade" física. Jesus é Filho Único de Maria, tendo Ela permanecido "sempre Virgem".
7° — A igreja define "Verdades permanentes", reveladas por Deus, e expressa tais verdades de maneira conveniente e definitiva, não dependendo seu sentido da "mentalidade filosófica de sistemas variáveis".
8° — A Igreja, fundada por Cristo e provida por Ele do poder de ensinar, santificar e governar, é Sociedade HIERÁRQUICA. Tais poderes são dados por Cristo diretamente aos legítimos Pastores e não foram entregues ao povo cristão, para que os delegasse aos seus representantes...
9° — Existem leis morais, manifestações da Lei Eterna e da Vontade Divina, que constituem normas objetivas e perenes. A essas leis o homem deve conformar sua consciência, para que suas ações sejam boas.
10º — O matrimônio é uno e indissolúvel por natureza. A moral conjugal não depende unicamente da consciência subjetiva dos esposos, mas deve seguir as normas traçadas pela Igreja...
* * *
Estes são uns pontos em que o tal Catecismo holandês se mostra deficiente e errôneo. Como todos podem ver, não se trata de coisas de somenos importância, mas de verdades que atingem a estrutura toda do Cristianismo.
Perante este e outros pontos da Doutrina Católica, tão mal expostos, sonegados, ou mesmo negados pelos autores do Catecismo, não compreendemos a obstinação em não querer aceitar as correções impostas pela Comissão Pontifícia, — recusa que atinge a autoridade do Mestre Supremo da Verdade, na Igreja, o Santo Padre o Papa...
Nem compreendemos o "furor" com que tal Catecismo está sendo traduzido e divulgado, no meio do povo católico.
Decerto não é para dar aos nossos fiéis uma formação realmente católica. Deve existir uma organização internacional, dirigida por forças ocultas e infernais, empenhadas em "autodemolir" a Igreja Católica, Apostólica, Romana.
Pelas ideias expressas no tal Catecismo, podemos identificar tais forças com as que foram condenadas por São Pio X, que são os PROGRESSISTAS-MODERNISTAS.
Será que Frei Boaventura é uma "vítima inocente" de tais emissários do erro e da subversão, dentro da Igreja?
Seja ele "consciente" ou "inconsciente", o certo é que muito estranhamos a apreciação que deu da edição brasileira do Catecismo holandês.
* * *
Citemos alguns tópicos de tal apreciação.
Diz ele que o Catecismo foi traduzido e publicado, no Brasil, sem "as correções sugeridas pela Comissão Cardinalícia".
Não obstante isso, ele confessa: "Muitas vezes já me pediram um livro que pudesse ajudar a introduzir alguém na vida e na doutrina cristã. Sempre tive dificuldades nesta espécie de aconselhamento pastoral. De hoje em diante meu problema está resolvido: o livro indicado será mesmo este NOVO CATECISMO".
Julga-o apto para o Brasil, embora o declare ainda anacrônico para o Brasil. Somos ainda subdesenvolvidos "teologicamente", pois: "Este Catecismo foi elaborado sob os auspícios dos Bispos da Holanda, "para a gente da Holanda", a seu modo. Tem as cores, os acentos, a tonalidade exigidas pela situação na Holanda" e não necessariamente... no Brasil... Continua: "O que é importante na Itália pode não ser na Holanda" e, também, por certo "no Brasil"...
O Catecismo não serve para italianos e brasileiros... mas é o único livro que ele acha aconselhável para uma introdução "na vida e na doutrina cristã".. Simples "introdução" para o brasileiro, mas livro que calha perfeitamente aos holandeses...
Com isso entramos perfeitamente no subjetivismo e relativismo religioso, — no dogma, na moral e em tudo. Isto é possível para um "discípulo" do idealismo subjetivista de Kant & Cia.
O que faz a verdade é a evolução subjetiva. Consequentemente, verdades fundamentais, boas ainda e aceitáveis para brasileiros subdesenvolvidos, seriam verdades superadas para holandeses, ou franceses. Estes já evoluíram e, portanto, concebem de maneira diferente os dogmas revelados por Deus; mas nós também, com o auxílio do Catecismo holandês, chegaremos a evoluir e, um dia, seremos tão "modernos" e "progressistas", como os holandeses...
A coisa é clara, para Frei Boaventura, que nos ensina que a Igreja "tem o dever de conformar-se à diversidade dos sinais dos tempos"...
Nós estamos em atraso com os tempos, defendemos ainda a validade da filosofia aristotélico-tomista, que admite o "realismo objetivo". Filosofia que o Vaticano II teve a ousadia de recomendar, chamando-a "patrimônio filosófico perenemente válido" (OT, no 15).
Continua: "No hic et nunc do Brasil, os acontecimentos, as exigências, e as aspirações — e portanto as interrogações — não serão os mesmos do hic et nunc da Holanda [...] Deveríamos fazer o nosso Catecismo, o Catecismo Brasileiro [...] Mas enquanto não tivermos coisa melhor, demos êste Novo Catecismo do Episcopado Holandês" ao nosso bom povo religioso, simples, ao nosso caboclo do interior...
* * *
Frei Boaventura termina, manifestando um "escrúpulo": "E para evitar sombras que de fato pairam sobre tão preciosa iniciativa [...] desejaria sinceramente uma edição revista segundo as indicações e sugestões da Comissão Cardinalícia".
"SOMBRAS"... que nosso bom povo religioso, simples, e especialmente nosso caboclo, saberá perfeitamente dissipar. "O sancta simplicitas!".
O mal é que, em lugar do caboclo, quem compra, lê, estuda e explica o Catecismo holandês, são Padres, Irmãos e Freiras, encarregando-se de envenenar com ele o nosso bom povo, religioso e simples.
A propósito do "Novo Catecismo" holandês - 3
PEDRAS E SERPENTES PARA AS ALMAS QUE PEDEM PÃO
Cunha Alvarenga
Imaginemos um conciliábulo em que elementos infiltrados em meios eclesiásticos se propusessem escrever um catecismo destinado a solapar as bases de nossa Fé. De onde partiriam para semear erros de gravidade tal, que abalariam as firmes convicções que formam o cerne da mentalidade católica?
São Pio X nos deu, há sessenta e seis anos atrás, o programa que tais filhos das trevas seguiriam: eles começariam "por negar a queda e ruína primitiva do homem. Puras fábulas, portanto, a mancha original e todos os males que dela resultaram: viciadas as fontes da humanidade, por sua vez viciam toda a raça humana; em consequência, o mal introduzido entre os homens vem a acarretar a necessidade de um Redentor. Tudo isso rejeitado, é fácil compreender que não resta lugar para Cristo, nem para a Igreja, nem para a graça, nem para nada que vá além da natureza. É o edifício da Fé derrubado a partir dos alicerces. — Ora, se os povos crerem e professarem que a Virgem Maria foi, desde o primeiro instante de sua conceição, preservada de toda mancha, então será necessário que admitam tanto a falta original quanto a reabilitação da humanidade por Jesus Cristo, e o Evangelho e a Igreja, e enfim a lei do sofrimento: em virtude do que, tudo o que há de racionalismo de materialismo no mundo é arrancado pela raiz e destruído, e resta esta glória à sabedoria cristã, de haver conservado e defendido a verdade" (Carta Apostólica "Ad Diem Illum", de 2 de fevereiro de 1904, a propósito do cinquentenário da proclamação do dogma da Imaculada Conceição).
À luz de nossos comentários anteriores ("Catolicismo", n.°s 224 e 228, de agosto e dezembro de 1969), não foi esse o caminho seguido pelos teólogos progressistas de Nimega em seu "NOVO CATECISMO"?
Como os autores do "Novo Catecismo" naufragaram na Fé
Depois de ter denunciado a base gnóstica desse livro que é um repositório de erros, pouco nos resta acrescentar no que diz respeito às consequências desse pressuposto incompatível com a doutrina católica, que é o de tomar como fábula o primitivo estado de justiça e santidade em que o homem foi estabelecido e a queda de nossos primeiros pais.
Diz São Pio X no trecho atrás citado que a crença na Imaculada Conceição da Virgem Maria traz como consequência necessária que admitamos tanto o pecado original quanto a reabilitação da humanidade por Jesus Cristo, o Evangelho, a missão divina da Santa Igreja e a lei do sofrimento. Como tratam os autores do "Novo Catecismo" este tema tão fundamental da mariologia?
Sob o título de "A supremacia da graça", escrevem eles: "Essa alegria por causa da supremacia da graça e do bem destaca-se, fortemente, numa verdade, que se evidenciou muito lentamente na Igreja. Nem sequer um Santo Tomás ou um São Bernardo podiam imaginar que isso se pudesse dizer. E, no entanto, chegou a Igreja, aos poucos, a essa verdade, a partir de toda a Revelação, e se pronunciou, solenemente, no século passado. A saber, que Maria Santíssima foi isenta do pecado original, e concebida imaculada. Quer isto dizer que, vivendo num mundo pecaminoso, Nossa Senhora foi, por certo, atingida pelo sofrimento do mesmo mundo, mas, graças a privilégio todo particular, não o foi pela sua malícia. Irmã nossa no sofrimento, não o é no mal. Triunfou, perfeitamente, sobre o mal, pelo bem. Deve-o, é claro, à salvação de seu Filho, Jesus" (pp. 312-313).
Ora, em que termos a Santa Igreja, pela voz do Sumo Pontífice Pio IX, definiu o dogma da Imaculada Conceição? — "Em honra da Santa e Indivisível Trindade, para glória e adorno da Virgem Mãe de Deus, para a exaltação da Fé Católica e o incremento da Religião cristã, em virtude da autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, e da Nossa própria, declaramos, pronunciamos e definimos que a doutrina que tem a Santíssima Virgem Maria — por singular favor e privilégio de Deus onipotente, à vista dos méritos de Jesus Cristo, o Salvador da raça humana — como isenta de toda mácula do pecado original, desde o primeiro instante de sua conceição, é doutrina revelada por Deus e, por conseguinte, deve ser crida firme e constantemente por todos os fiéis. Se alguém, portanto, presumisse dissentir interiormente desta nossa definição, do que Deus o guarde, saiba e se compenetre de que seu próprio juízo já o condenou, sua fé naufragou e ele se desligou da unidade da Igreja [...]".
Isto posto, atentemos para o fato de que ao pé da própria página em que o Catecismo holandês faz a aludida referência ao dogma da Imaculada Conceição da Santíssima Virgem, claramente se percebe a ação demolidora (já iniciada à página 311) empreendida pelos falsos profetas de Nimega contra a doutrina do pecado original, e isso através das seguintes palavras: "Para muitos, restará mais uma pergunta em relação a assunto que ocupava lugar de relevo no antigo ensino religioso: o estado de inocência da natureza humana, antes do pecado" (p. 313). Em nossos primeiros comentários ("Catolicismo", n.° 224, de agosto de 1969) exaustivamente vimos como a partir dessa frase o "Novo Catecismo" holandês frontalmente nega o estado de inocência e de justiça em que foram estabelecidos nossos primeiros pais, negando a seguir a queda de Adão conforme a doutrina católica a apresenta. Ora, se não houve o pecado original, como compreender que a Santíssima Virgem haja sido isenta de uma, culpa que nunca existiu? Ao assim minarem pela base o dogma da Imaculada Conceição, os autores desse livro nefasto se condenaram pelo seu próprio juízo, naufragaram na Fé e se desligaram da unidade da Igreja. Para eles, "o pecado que contagia os outros não é cometido por um Adão no início da humanidade, mas por todo "Adão": o homem, cada homem. É ele "o pecado do mundo" (p. 311), expressão que, como vimos anteriormente, somente se explica a partir dos pressupostos evolucionistas, panteístas e gnósticos que formam a ossatura do "Novo Catecismo".
A Imaculada Conceição de Nossa Senhora, proclamada como dogma no século passado, mas admitida pelo mundo católico desde tempos imemoriais — sendo uma das mais caras devoções trazidas ao Brasil pelos nossos primeiros colonizadores — segundo os teólogos progressistas de Nimega quereria dizer simplesmente que Ela não foi atingida pela malícia terrena, entendida no sentido gnóstico de qualquer coisa maléfica, inerente à natureza humana, e não como fruto da corrupção dos homens pelo pecado original.
Ultrajes à SS. Virgem renovam a Paixão de Cristo
Fora disso, a Santíssima Virgem seria simplesmente uma jovem israelita como outra qualquer, que nem sequer sabia que Ela era a Mãe de Deus: "Será que Maria tenha tido plena consciência de quem ela trazia ao mundo? — Não, ela não sabia. E só através da ressurreição de Jesus que se começou a ficar claro quem Ele era propriamente" (p. 96). Pasme o mundo católico: Aquela que é a Sede da Sabedoria, a Esposa do Espírito Santo, a Rainha dos Profetas, a Mãe do Bom Conselho, Aquela que sabia pelas Escrituras que o Redentor haveria de nascer de uma Virgem descendente de Davi, Aquela que ouviu o Arcanjo São Gabriel Lhe dizer que seria Mãe do Filho do Altíssimo, cujo reino não terá fim, A que foi a primeira e maior Discípula de Nosso Senhor, que com Ele conviveu por trinta anos, guardando todas as suas palavras em seu Imaculado Coração, essa excelsa maravilha da Criação ignorava, até a Ressurreição, aquilo que aos pastores de Belém fora anunciado, que os Reis Magos sabiam, que São João Batista confessava publicamente, que até um pobre cego miraculado ouviu dos lábios do Filho de Deus "e, prostrando-se, O adorou" (Jo. 9, 38), que Nosso Senhor provou com seus inúmeros e portentosos milagres, o primeiro dos quais feito a pedido da própria Santíssima Virgem, verdade, ademais, que São Pedro proclamou ao receber do Filho de Deus a promessa das chaves do Reino dos Céus!
Tomemos ao acaso um dos inúmeros Santos e Doutores que cantaram as glórias da Mãe de Deus. Diz Santo Afonso de Ligório: "Já a Santíssima Virgem sabia pelas Divinas Escrituras as penas que devia padecer o Redentor em toda a sua vida, e muito mais no tempo de sua morte. Compreendia bem os Profetas, que anunciavam que Ele devia ser atraiçoado por um seu familiar. ‘Até o homem de minha estima, que comia o meu pão, urdiu grande traição contra Mim’ (SI. 40, 10). Bem sabia dos desprezos, dos escarros, das bofetadas e zombarias que Ele devia sofrer. ‘Aos que Me feriram, entreguei o meu corpo, e as minhas faces aos que Me arrancavam os cabelos da barba’ (Is. 50, 6). Estava ciente de que Ele havia de Se tornar o opróbrio dos homens e a abjeção da plebe mais vil, a ponto de ser saturado de injúrias e vilanias. ‘Sou um verme e não homem; o opróbrio dos homens e abjeção da plebe’ (SI. 21, 7). Sabia que no fim da vida as suas carnes sacrossantas deviam ser todas laceradas e rotas pelos açoites, de modo a ficar seu corpo todo desfigurado, semelhante a um leproso, todo chagado, deixando aparecer os ossos descobertos. ‘Mas Ele foi ferido pelas nossas iniquidades, foi quebrantado pelos nossos crimes’ (Is. 53, 5). Não tem beleza, nem formosura... e o reputamos como um leproso (Is. 53, 2 e 4). ‘Contaram todos os meus ossos’ (51. 21, 18). Sabia que o Filho devia ser traspassado pelos cravos, colocado entre malfeitores, pregado finalmente à Cruz, na qual morreria pela salvação dos homens" ("Glorias de Maria Santíssima", Ed. Vozes, Petrópolis, 1935, pp. 279-280). Isto diz um Santo Doutor da Igreja, mas os "profetas" de Nimega, do alto de suas cátedras de pestilência, dizem o contrário, renovando assim os ultrajes feitos ao Divino Redentor em sua Paixão.
Como se fosse pouca tamanha audácia, eis como esses novos algozes de Nosso Senhor tratam o inefável privilégio da Mãe de Deus que é o de sua pureza virginal antes e depois de dar ao mundo o Salvador: "Jesus é o "primogênito" de Maria. Que, ela tenha tido, depois dele, mais outros filhos, não é mencionado nos Evangelhos. O fato de nestes se falar de "irmãos e irmãs" de Jesus (Mi. 13, 55-56), em si, nada diz a respeito desse ponto. Pois, em hebraico e aramaico usa-se essa mesma denomina- não para membros mais remotos do clã. Ainda hoje em Nazaré. Que os "irmãos e irmãs" de Jesus não devem ser necessariamente filhos de Maria e José, evidencia-se pelo fato de que os dois "irmãos" de Jesus, mencionados primeiro em Mt. 13, 55, aparecem em Mt. 27, 56, como filhos de outra Maria. É, com efeito, totalmente improvável que os chamados Tiago e José fossem mencionados sem mais nada, aqui, se se tratasse de personagens diferentes dos já citados. Além disso, temos o texto de João, 19, 27, que, por si só, já tira toda probabilidade de Maria ter tido mais filhos. Interessa notar que, na arte cristã, inclusive na Reforma, não há nenhum caso conhecido em que Nossa Senhora seja representada com mais filhos" (pp. 95-96). Esse excelso dom da Mãe de Deus sai das alturas de uma certeza tão bela e consoladora de nossa Fé, para descer ao chão raso e movediço das probabilidades. Nada para estranhar, portanto, que a Comissão de Cardeais haja sido levada a reclamar dos autores do "Novo Catecismo" holandês a expressa confissão das seguintes verdades: "3. JESUS CONCEBIDO DA VIRGEM MARIA. - A Comissão de Cardeais pediu que o Catecismo confesse abertamente que a Bem-aventurada Mãe do Verbo Encarnado sempre gozou da honra da virgindade, e que ele afirme claramente o próprio fato da conceição virginal de Jesus, que convém altamente ao mistério da Encarnação; e que por conseguinte não se exponha ao abandono desse fato, contido na Tradição da Igreja, fundado sobre a Sagrada Escritura, para dele não conservar senão uma significação simbólica, como aquela da soberana gratuidade do dom que Deus nos fez em seu Filho" (AAS, an. LX, n.° 12, p. 688).
Erros quanto à reparação oferecida por Cristo
A negação da queda de todos os homens em Adão, além dos graves erros já apontados anteriormente, acarreta outros que seria longo enumerar, coisa aliás desnecessária para acentuar o caráter fundamentalmente herético dessa obra. Renunciando, assim, à desagradável tarefa de apontar todos os desvios doutrinários do "Novo Catecismo", ocupemo-nos apenas de mais alguns deles, na intenção de mostrar aos nossos leitores até que ponto vai a audácia dos falsos profetas neerlandeses. Comecemos pela satisfação oferecida por Nosso Senhor Jesus Cristo pelos nossos pecados. Eis o que, com relação a este ponto chave da doutrina católica, sustenta o livro posto a circular entre os católicos brasileiros com (segundo o folheto de propaganda da Editora Herder) "a anuência da Cúria Metropolitana de São Paulo":
"Na Idade Média, e muito tempo depois, até mesmo em nossa pregação hodierna, acentuou-se, principalmente, o elemento da reparação-satisfação; a morte de Jesus é sacrifício de expiação. O Pai fora ofendido, a ordem jurídica perturbada; devia, pois, haver um castigo; esse caiu sobre o Filho. Assim, restabeleceu-se a ordem jurídica.
Essa concepção parte da ideia um pouco unilateral, que já não defendemos: a ideia medieval, de que o crime ou pecado destruía uma ordem jurídica, e que o castigo e sofrimento podiam restabelecer essa ordem. Também pensamos ainda; muitas vezes, da mesma forma. Alguém que cometeu certo mal, diz: podem bater-me! Mereço-o! — Acontece, porém que, em geral, nós, homens hodiernos, consideramos o mal e a culpa muito mais ao nível "pessoal": não é tanto uma ordem jurídica que foi perturbada, mas antes uma pessoa que foi ofendida. A reparação não se faz, agora, por castigo e sofrimento, mas antes por desculpas, obras e amor.
A concepção da Sagrada Escritura vai também, manifestamente, nessa direção. A salvação que Jesus nos traz não reside, em primeiro lugar, na dor que Ele sofreu, com vistas a restabelecer a ordem jurídica partida, mas, sim, na serviçalidade e bondade de sua vida, que constituem reparação-satisfação por nossa desobediência e falta de amor. O que o Pai queria não era sofrimento e morte, mas vida humana boa e bela. Que essa vida tenha afluído para a morte, é culpa nossa. Jesus, porém, não hesitou: sua morte tornou-se suprema obediência.
Tornou-se, também, reparadora e salvadora para nós. Neste sentido, a sua morte é a vontade do Pai. Que, precisamente aqui, intervenha sofrimento e morte, constitui grande mistério que homem algum é capaz de sondar. Mas, seria erro de nossa parte se pensássemos que o Pai queria "houvesse derramamento de sangue" (pp. 327-328).
Mais ainda: "Todas essas expressões [redenção, reconciliação, justiça, sangue, pecado] nos descrevem a obediência de Jesus, a sua servidão até a morte. Não significam, pois, que o Pai precisava de sua paixão e morte, como castigo de substituição. Mas Deus precisava de sua ‘vida’, como amor representativo. Ora, quem quer amar neste mundo, encontra-se face a uma existência em que o amor é rejeitado" (p. 329).
A algaravia continua, mas o que acima transcrevemos é suficiente para justificar a seguinte nota da Declaração dos Cardeais: "4. DA SATISFAÇÃO OFERECIDA POR NOSSO SENHOR JESUS CRISTO. - Os elementos da doutrina da satisfação oferecida por Cristo, que pertencem à nossa Fé, devem ser expostos sem ambiguidades. Deus de tal modo amou os homens pecadores, que enviou seu Filho ao mundo, a fim de os reconciliar com Ele (cf. 2 Cor. 5, 19). "Nós somos, diz Santo Agostinho, reconciliados [com Deus] que já nos amava [...] com Deus em relação ao qual, por causa dos pecados, tínhamos inimizades" ("In Ioannis Evangelium"., tr. CX, n.° 6). Jesus, portanto, como Primogênito de muitos irmãos (cf. Rom. 8, 29), morreu por nossos pecados (cf. 1 Cor. 15, 3). Santo, inocente, imaculado (cf. Hebr. 7, 26), Ele não sofreu de nenhum modo uma pena que haja sido infligida por Deus, mas, obedecendo livremente com amor filial a seu Pai (cf. Fil. 2, 8), aceitou, por seus irmãos pecadores e como seu Mediador (cf. 1 Tim. 2, 5), a morte que é para eles o salário do pecado (cf. Rom. 6, 23; Conc. Vat. II, Const. "Gaudium et Spes". n.° 18). Por sua santíssima morte, que, aos olhos de Deus, compensou abundantissimamente os pecados do mundo, Ele fez com que a graça divina fosse restituída ao gênero humano, como um bem que este havia merecido em seu divino Chefe (cf. p. ex. Hebr. 10, 5-10; Conc. Trid., sess. VI, Decr. "De iustificatione", cap. 3 e 7, can. 10)" (AAS, vol. cit., p. 688).
"Se alguma vez se devesse falar em mortificação"...
Como vimos no início deste artigo, São Pio X põe a lei do sofrimento como consequência do reconhecimento do pecado original. Não é, portanto, para estranhar que a negação da queda dos homens em Adão leve os autores do "Novo Catecismo" holandês à afirmação de que "a reparação não se faz, agora, por castigo e sofrimento, mas antes por desculpas, obras e amor" (p. 327). Mais adiante dizem: "Estamos livres de todos os sacrifícios. Entramos no único sacrifício. Fazemo-lo, comendo" (p. 395). Baniu o "Novo Catecismo" completamente da vida religiosa a prática da mortificação. Tratando dos velhos "que aprenderam a achar a própria felicidade na felicidade dos outros", prossegue o texto: "Quem assim vive, sai de si mesmo; quer dizer: torna-se grande. (Se alguma vez se devesse usar o termo "mortificação", estaria bem aqui, para se designar essa plenitude de vida,