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O "saduceismo" está muito difundido na Igreja, com numerosos adeptos entre os Sacerdotes jovens

Continuação

Neste sentido, Marx fala da religião como "o ópio do povo".

Os cristãos-saduceus — quero dizer os cristãos que creem em Deus, amam-nO, adoramnO e O servem, mas não pensam no Céu, na vida depois da morte — estão mais próximos dos marxistas, são pessoas com as quais os marxistas podem entender-se mais facilmente do que com os outros cristãos; os marxistas podem colaborar com eles e até convidá-los a entrarem no partido e, pouco a pouco, comprometerem-se com a própria revolução marxista.

O saduceísmo está bastante difundido atualmente na Igreja Católica: tem muitos adeptos entre os Sacerdotes jovens, que concentram seu zelo pastoral sobre o homem e não sobre Deus. O saduceísmo constitui a base para as correntes das quais falaremos a seguir; ele é uma etapa de preparação, educação e formação.

A maior parte da assim chamada "teologia da morte de Deus" é saducéia, pois — apesar de não negar a existência de Deus — na prática não admite Deus como Céu, como recompensa eterna, como felicidade depois da morte, isto é, como finalidade da vida humana, como objeto do amor eterno.

O "saduceísmo;' (5) tem poucas obras teológicas próprias; ele se manifesta sobretudo em publicações sobre Pastoral e Liturgia (por exemplo nos textos das orações antes do Ofertório). É bem frequente nas obras dos teólogos protestantes e delas passa para a Teologia católica. O saduceísmo nota-se no pensamento de Dietrich Bonhoeffer, Paul van Buren, J. A. T. Robinson, Harvey Cox, E. L. Mascall, autores protestantes, e, entre os católicos, nos livros do Jesuíta Robert L. Richard e, sobretudo, nos escritos do ex-Dominicano norte-americano, o apóstata Jordan Bishop McClave (6).

2. O "Reino de Deus na terra"

A adaptação do Cristianismo às exigências do marxismo é muito patente na escatologia (6A). É sabido que essa é a parte menos precisa da Teologia.

A imagem do "Reino de Deus na terra" (outros tópicos da escatologia não nos interessam aqui) que a escatologia nos proporciona é muito nebulosa. Quando vai chegar esse "Reino de Deus na terra"? Antes ou depois do dia da Ressurreição e do Juízo Universal? Esse "Reino de Deus na terra" será ainda neste mundo, ou quiçá em algum "novo" mundo? Todas estas são perguntas sem resposta clara e precisa, pois se encontramos algumas respostas tanto nas Sagradas Escrituras, como nos trabalhos de teólogos que gozam de autoridade, elas são nebulosas, imprecisas, e se prestam às mais variadas interpretações. Sem entrarmos aqui em uma polêmica sobre estes temas, convém constatar que é precisamente a escatologia, a atual, que constitui o ponto de partida do que poderíamos chamar uma "teologia marxista", como também é a escatologia que mais se presta a interpretações marxistas.

Um dos primeiros teólogos que começaram a construir pontes entre o Cristianismo e o marxismo foi o teólogo protestante Karl Barth, de grande influência sobre os demais.

Karl Barth foi um dos que primeiramente desenvolveram a tese de que o Cristianismo e o marxismo têm a mesma finalidade: a construção de uma nova sociedade do futuro. Os cristãos concebem essa sociedade como o "Reino de Deus na terra"; os marxistas, como o "socialismo" ou o "comunismo". Barth pretendia aproximar estas duas visões do futuro feliz na terra. Porém procurava mais ainda aproximar os cristãos dos marxistas. Ele era membro de um partido marxista-socialista e muito comprometido nas atividades de sindicatos dominados pelos marxistas. Suas simpatias para com o marxismo e o socialismo são muito evidentes e se manifestam na sua maneira de enfocar os problemas teológicos.

Seu discípulo e grande admirador, o teólogo protestante simpatizante do marxismo, Helmut Gollwitzer, escreve: "Como Barth não pôde compreender o Evangelho sem influência sobre a vida, isto é, sem ética, do mesmo modo não podia compreendê-lo sem inclinações para o socialismo" (7). Barth comprometeu-se com o socialismo-marxista imediatamente depois da primeira Guerra Mundial. Segundo Marquardt, o caminho de Barth vai desde um "socialismo religioso, através da democracia socialista sem admiração pela Revolução Russa, e através de sua crítica anarquista da autoridade, até o "Reino de Deus" (8).

Marquardt destaca o caráter marxista do socialismo de Barth, afirmando que ele é "eher Marxist als Ontologe" ("mais marxista do que ontologista") (9) , apesar de o próprio Barth afirmar que seu socialismo é antes exterior ("exoterisch") (10).

Quando Adolf Hitler chegou ao poder na Alemanha, Karl Barth estreitou seus vínculos com a organização "Freies Deutschland", na qual entrou em contato direto com os comunistas e caiu sob sua influência (11).

As diferentes correntes de marxistização da Teologia saem precisamente da teologia de Karl Barth (12) e, entre elas, em primeiro lugar, a corrente marxistizante escatológica do "Reino de Deus na terra". Barth — como socialista-marxista — vê na luta por uma nova sociedade do futuro o primeiro e mais importante dever religioso do cristão. Para ele, o ensinamento cristão sobre o "Reino de Deus na terra" identifica-se com o programa marxista relativo ao futuro da sociedade ideal. Mais ainda, os partidários de Barth encontram em sua teologia a justificação da opinião de que o marxismo — a seu modo, ateísta e materialista — luta pela realização da tarefa, omitida e esquecida pelos cristãos, de construir o "Reino de Deus na terra".

Há pontos em que a posição de Barth é quase idêntica à de Marx. Por exemplo, ambos sustentam a mesma coisa com respeito ao "desaparecimento" da instituição do Estado, precedendo a realização completa de uma sociedade ideal do futuro. É sabido que este ponto é de muita importância no marxismo de Marx (os outros "marxismos" não insistem tanto sobre este ponto). Segundo Marx, o fato de que a instituição do Estado comece a desaparecer é uma característica essencial da sociedade comunista; se em uma sociedade marxista a instituição do Estado se mantém firme, essa sociedade não é ainda "comunista", mas "socialista" (13). O mesmo sustenta Barth (que é antes um anarquista); segundo sua teologia, no "Reino de Deus na terra", na "nova Jerusalém", não haverá lugar nem para a Igreja, nem para o Estado, nem mesmo para qualquer tipo de "Ordnung", pois tanto a Igreja como o Estado caracterizam o período do "caminho" até a "visio" (14).

Ver na construção do "Reino de Deus na terra" o primeiro e o mais importante dever do cristão, e, mais ainda, identificar esse "Reino" com a escatologia marxista, isto é, com o conceito marxista de uma sociedade perfeita do futuro, assim como sustentar, como conclusão, que os cristãos deveriam colaborar com os marxistas para, juntos, alcançarem o mesmo fim, — aí está a medula da "teologia marxista", construída sobre o pensamento de Barth por seus discípulos.

Barth já os tinha numerosos, antes da segunda Guerra Mundial, especialmente entre os teólogos protestantes, dos quais suas ideias passaram para os teólogos católicos. Uma dessas "escolas" teológicas marxistas, fundadas sobre o pensamento de Barth — talvez a de maior peso e importância — é a que se desenvolveu na Tchecoslováquia, representada por Hromadka, Gardavski e Machovec (15). As principais obras destes escritores estão traduzidas em vários idiomas e, por essa razão, são bem conhecidas e comentadas. Esta é a assim chamada "teologia dialética", iniciada por Barth, mas que seus discípulos subordinaram completamente ao pensamento marxista. Os mencionados escritores tchecos, todos teólogos protestantes, enfocam estes problemas não tanto do ponto de vista teológico, como do ético. Se os escritos de Barth são estritamente teológicos, os desses pastores protestantes são antes ensaios éticos, muito superficiais e profundamente penetrados de marxismo.

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O problema do "Reino de Deus" recebeu um novo enfoque e um novo impulso na obra de Jürgen Moltmann, "A Teologia da Esperança" (16). Talvez pela coincidência de sua obra ter aparecido imediatamente depois do II Concílio do Vaticano e num ambiente de "diálogo" e de "ecumenismo", como também pela circunstância de os leitores de seus livros já estarem preparados pela teologia de Barth sobre o "Reino de Deus na terra" e pelo estudo de Ernst Bloch (17).

Na realidade, tanto Bloch como Moltmann ocupam-se do mesmo problema de que se ocupava anteriormente Barth, mas enfocam-no de outro ponto de vista, mais atraente, a saber, tomam em conta a esperança como o motor da vida humana, como um elemento dinâmico, como fonte de otimismo e catalisador das energias humanas, dirigidas a um fim concreto, temporal, terreno, prático: a construção de um porvir melhor; a esperança como confiança, quase certeza, de que o homem pode, aqui, na terra, construir uma sociedade ideal do futuro, que será uma realização tanto do conceito cristão do "Reino de Deus na terra", como também do conceito marxista de uma sociedade marxista. Assim são compreendidas e interpretadas as ideias tanto de Bloch como de Moltmann, pela pseudo-teologia dos Sacerdotes marxistas, professores das Universidades Católicas (1-8).

Por onde se vê que, principalmente através da protestantização, a Teologia católica sofreu um processo de marxistização.

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Um grupo à parte é constituído pelos escritores comunistas (marxistas-leninistas), membros dos Partidos Comunistas, que convidam os marxistas e os cristãos para colaborarem na construção da sociedade ideal do futuro. Além de Roger Garaudy, um dos mais destacados intelectuais comunistas da França, que há mais de quinze anos se dedica principalmente a essa tarefa de promover a aproximação e a colaboração entre marxistas e cristãos, merece uma especial atenção o suíço Konrad Farner. Este vai tão longe, que afirma que o comunismo (como uma sociedade ideal do futuro e não como a doutrina do marxismo-leninismo) "não é uma alternativa em face do cristianismo, mas uma possibilidade e talvez a única possibilidade" (19). A respeito da esperança de Moltmann e de outros, escreve: "A Teologia da esperança deveria desenvolver-se em uma teologia do comunismo, pois o comunismo é a única e total esperança do homem" (20). E, em outro lugar de seu livro, adverte: "Sem comunismo não haverá no futuro cristianismo algum" (21). Farner não vê nenhum futuro para o marxismo ou para o Cristianismo, sem o comunismo (concebido como um regime), e por esta razão faz um apelo a uns e a outros, marxistas e cristãos, para que se unam e colaborem (22). Ele chega à conclusão de que o futuro não pode ser edificado nem contra os crentes, nem sem a participação deles, como também não pode ser construído nem contra o marxismo, nem sem ele (23).

O fato de um dos capítulos de seu livro levar o título de "Agradecimento dos marxistas a Karl Barth" mostra até que ponto Farner se encontra sob a influência desse teólogo protestante marxista (24).

Farner lamenta que o marxismo, apesar de construir uma nova sociedade na Rússia, não tenha podido formar um "homem novo", e adverte que, se o homem permanece o mesmo, há perigo de uma volta à antiga sociedade (25). Desta maneira, prevê um malogro inevitável do marxismo, o qual não poderia ser evitado senão pela colaboração dos marxistas com os cristãos. Esta colaboração se justifica pelo fato de que estes também estão comprometidos na construção de uma sociedade ideal do futuro, a que chamam o "Reino de Deus na terra". Como Barth, Farner salienta que não se trata de uma colaboração ditada por exigências táticas ou estratégicas da revolução marxista, mas sim de uma colaboração sincera, honesta e duradoura.

Deste modo, os teólogos e os escritores comunistas elaboraram as bases para uma sólida e fraternal colaboração dos cristãos com os comunistas. Fala-se de uma colaboração para construírem juntos uma sociedade ideal do futuro, mas, na prática, tudo se reduz a um compromisso com a revolução marxista que já está em marcha.

O "cristianismo horizontal" constitui a causa principal da apostasia de muitos Padres e Religiosos

3. O cristianismo horizontal

A Cruz é o símbolo da Teologia tradicional: seu tronco, isto é, a direção vertical, simboliza o amor do homem a Deus e o amor de Deus ao homem, enquanto seus braços, isto é, a direção horizontal, indicam as consequências desse amor: sua projeção até o próximo.

O essencial no Cristianismo é o amor de Deus, mas sua consequência se expressa no amor do próximo — amar a Deus no próximo. Pois bem, a "nova teologia" silencia o aspecto vertical, pois está concentrada totalmente sobre o homem, sobre o horizontal. A Teologia tradicional é teocêntrica, enquanto a "nova teologia" é antropocêntrica.

A corrente teológica concentrada sobre o homem tem atualmente muitos representantes, mas do ponto de vista do problema que nos interessa neste trabalho, a saber, a influência do pensamento marxista sobre a Teologia contemporânea, talvez o mais importante deles seja Dietrich Bonhoeffer (26). Sua teologia contribuiu não somente para a elaboração das bases para o "saduceísmo", como já vimos, mas também para o "cristianismo horizontal", que é o cristianismo que se esquece de Deus, pois se ocupa exclusivamente do homem, do próximo.

O "cristianismo horizontal" parte da premissa — aparentemente verdadeira e justificada — de que cada cristão deveria imitar a vida de Jesus de Nazaré (nunca dizem Jesus Cristo). E em que consistiu — segundo eles — a vida de Jesus (quase sempre escrevem "Jesua" ou "Jeschua")?

Para o "cristianismo horizontal", Jesus foi um homem que sacrificou completamente sua vida pelos demais; veio para servir e não para que O servissem. Em seu amor pelo próximo, chegou até a oferecer a vida. Assim, a Cruz é o símbolo do sacrifício, do amor ao próximo. Ser cristão quer dizer viver como Jesus, servir aos demais, "ser para os outros", até o sacrifício de sua própria vida, viver para os outros (27).

Na prática, para o "cristianismo horizontal" Deus não existe, pois tudo se reduz ao "viver para os outros". Todavia, esta maneira de "viver para os outros" nada tem de comum com a antiga caridade, praticada com zelo durante toda a história do Cristianismo. Não se trata, pois, de obras de caridade inspiradas pelo amor de Deus, mas antes uma atividade desenvolvida por motivos puramente humanos, sentimentais, posto que, apesar de baseada na imitação da vida de Jesus, Ele mesmo é apresentado como um homem que sacrificou sua vida pelos demais por motivos puramente humanos, como expressão da solidariedade humana. Ao passo que tudo o que é o essencial do Cristianismo, o sobrenatural, a divindade de Cristo, seu amor a Deus Padre e seu amor divino, ao homem, que O leva até a Paixão para realizar a Redenção, tudo isso é silenciado. Fala-se de Jesus como de um homem excepcional, ideal, perfeito, como de um exemplo, um modelo de vida para os demais, e sua perfeição — segundo o "cristianismo horizontal" — consiste exclusivamente no fato de que era um homem a serviço dos demais. Daí o compará-Lo — de modo blasfemo e sacrílego — a "Che" Guevara e outros.

Concebido desta maneira laica e secular, o "cristianismo horizontal" é hoje, lamentavelmente, muito comum entre grande parte do Clero, especialmente na América Latina. Muitas Congregações Religiosas, tanto de homens como de mulheres, assimilaram-no completamente (28).

O "cristianismo horizontal" apresenta uma excelente ocasião para a penetração de ideias e opiniões marxistas, como também para a colaboração com diferentes "obras" marxistas e até para os contatos diretos com os partidos políticos marxistas, o que quase sempre termina em compromisso com a própria revolução marxista. Os numerosos Sacerdotes marxistas, membros dos Partidos Comunistas e até frequentemente seus representantes nos Parlamentos, como deputados ou senadores, encontram no "cristianismo horizontal" um ambiente em que se sentem à vontade. Em suas homilias tocam quase exclusivamente em temas econômico-sociais; as funções litúrgicas são por eles transformadas em cerimônias laicas, sem nenhum sentido sobrenatural, mas sim com muito sentido sociológico, das quais se servem para reforçar os vínculos sociais e para os contatos com os grupos marxistas. Desta maneira toda especial, o "cristianismo horizontal" manifesta-se nas orações e cânticos litúrgicos, compostos para a circunstância. As igrejas são transformadas em "casas do povo". Até a Santa Missa fica reduzida a uma assembleia do povo, frequentemente com a participação ativa de pessoas ateias, indiferentes, agnósticas e não batizadas. Nas cerimônias públicas "penitenciais", com as quais se pretende substituir a confissão auricular, ou seja, o Sacramento da Penitência, as pessoas são ensinadas a acusar-se unicamente do "pecado social" (os demais pecados não existem para o "cristianismo horizontal") , o qual se reduz apenas ao "pecado estrutural", isto é, o próprio regime capitalista, qualificado como "estruturas de opressão e exploração".

Uma grande parte dos catecismos editados nos últimos anos já está penetrada pelo "cristianismo horizontal". Jesus Cristo, a Santíssima Virgem, os Apóstolos e os Santos são apresentados como cristãos exemplares, modelos de vida cristã, pois foram pessoas que dedicaram sua vida ao serviço da comunidade (bem entendido, tais catecismos não empregam nomes tão "rançosos" e antiquados; fala-se de Jesus, o Carpinteiro; de Miriam, a Mãe de Jesus, etc.); de Deus não se fala, nem sequer dEle se faz menção.

Este "cristianismo horizontal" constitui a causa principal da apostasia de tantos Padres, Religiosos e Religiosas, pois não encontram nele nenhum alimento espiritual sobrenatural para suas almas; exige-se deles unicamente "viver para os demais", o que se pode fazer sem o celibato e levando a vida de qualquer leigo.

Esta corrente manifesta-se principalmente nas obras pseudoteológicas da assim chamada "teologia da secularização". Seus representantes mais conhecidos são Paul van Buren, J. A. T. Robinson, Robert L. Richard, Harvey Cox, E. L. Mascall, já mencionados anteriormente (vide a nota 6).

4. Fé sem religião

O marxismo sempre combateu a religião, considerando-a como o "ópio do povo", segundo a expressão de Marx. Claro está que quando os marxistas falam de "religião", abarcam com este termo também a fé. Mas ultimamente presenciamos uma mudança de tática da parte dos marxistas: combatem apenas a religião, mostrando-se dispostos a tolerar a "fé". Evidentemente trata-se de mera manobra tática, pois na realidade combatem tanto a religião (o culto) como a fé na existência de Deus. Mas esta tática é-lhes necessária no momento, pois dão-se conta da necessidade de conquistar as grandes massas, crentes em Deus, para poderem fazer a revolução. Precisam da colaboração dos cristãos, e por esta razão, por motivos táticos, fazem esta distinção entre a religião e a fé. Dizem aos cristãos: "Limpai vosso cristianismo dos elementos de religião e sereis dignos de tomar parte na revolução marxista e na construção de uma nova sociedade ideal do futuro".

Mas, para facilitar ainda aos cristãos esta "operação limpeza", isto é, a depuração do Cristianismo dos elementos de religião, pretendem convencê-los de que desta maneira voltam a um "verdadeiro Cristianismo", a um Cristianismo puro, não manchado pela religião. Nos últimos anos apareceram muitos "estudos" que tratam deste Cristianismo "puro" e que pretendem convencer os cristãos (antes de tudo os que tanto anelam colaborar com os marxistas) de que o Cristianismo primitivo, o de Jesus e de seus Apóstolos, este Cristianismo "verdadeiro", era a-religioso, era somente uma "fé" e só depois, quando se propagou entre os gregos, pelo contato com as religiões pagãs, assimilou muitos "mitos" e tomou um caráter de religião.

A Igreja Católica, porém, não pode de forma alguma compartilhar a posição de algumas seitas protestantes que combatem a religião como tal, pois o Cristianismo, do ponto de vista católico, é essencialmente tanto "fé" como "religião". O culto a Deus — realizado de uma maneira perfeita pelo Sumo Sacerdote Jesus Cristo, o qual Se serve dos Sacerdotes, participantes de seu Sacerdócio, pela Santa Missa, que é uma contínua renovação do Sacrifício do Calvário e da Última Ceia — é um elemento essencial do Catolicismo. De onde, o Sacerdócio e o culto — isto é, a religião — são essenciais no Cristianismo, da mesma maneira que a fé, isto é, a totalidade do ensinamento de Cristo (Depositum Fidei).

A aceitação das posições e opiniões protestantes por muitos teólogos católicos — o que lamentavelmente ocorre hoje — expressa-se amiúde no desleixo e negligência no que diz respeito ao culto, dando-se importância exclusivamente ao princípio de "viver a fé" (a qual, em muitos casos, é cada dia menos católica e mais próxima da protestante). A tática astuta dos marxistas aproveita-se dessa situação.

Os teólogos marxistas protestantes facilitam as bases teológicas desta ação. É o caso de Karl Barth e Dietrich Bonhoeffer, seguidos por seus admiradores, especialmente os partidários do "cristianismo desmitologizado", como também pelos pseudoteólogos marxistas declarados, como Hromadka (29) e seu fiel discípulo Júlio Santa Ana (30).

Os teólogos marxistas-católicos, apesar de aceitarem completamente esta posição dos teólogos marxistas-protestantes, consideram que — por razões de tática — é preciso tolerar por algum tempo a religião, pois a grande massa dos fiéis está acostumada ao culto. Mas levam também a cabo uma luta constante e contínua contra tudo o que expressa a religião na vida cristã, e o fazem principalmente pela "conscientização", aproveitando para este fim a pastoral e a catequese. Combatem, pois, todas as formas de culto; daí sua luta contra o culto mariano (o rosário, as procissões, o mês de Maria, etc.) e todo tipo de devoções (ao, Sagrado Coração, etc.). No Chile chegaram a fundar uma instituição para tal finalidade, chamada Fundação Manuel Larraín (31), a qual publica "estudos" que combatem a religião, predominando entre eles trabalhos de professores marxistas da Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Santiago.

Tirar ao Cristianismo seu caráter de religião é — segundo os marxistas — a condição prévia para a sua completa marxistização.

5. Cristianismo sem mitologia

Não há dúvida de que no decorrer dos séculos alguns elementos mitológicos de diferentes religiões pagãs penetraram em práticas religiosas do Cristianismo. Não poderiam penetrar na Fé (no Depositum Fidei) , mas poderiam fazê-lo, e efetivamente o fizeram, em algumas práticas do culto, apesar da severa e estrita vigilância das autoridades eclesiásticas (32). Por esta razão, uma preocupação em descobrir esses elementos e práticas é justificada.

Contudo, a atual corrente do "cristianismo sem mitologia" nada tem que ver com essa preocupação, pois ela não é inspirada pela preocupação com a integridade e pureza da Fé (do Depositum Fidei), mas antes pelo afã de destruir a Fé, reduzindo todos os dogmas à categoria de "mitos". Os teólogos (?) marxistas sustentam atualmente que o dogma da Santíssima Trindade é um mito, que o são também os Anjos, a Anunciação, tal como a Encarnação, a Redenção, pois considera-se mito tudo o que se relaciona com o pecado original e com o Paraíso. À categoria de mito se reduzem igualmente o Céu e o inferno, etc. Todos os dogmas do Cristianismo, enfim, são reduzidos a mitos. Das crenças cristãs fica só um fato histórico, a pessoa de Jesus de Nazaré, que, segundo os marxistas, foi um homem excepcional, fundador de um movimento político-social de luta para libertar o homem da escravidão e da exploração por um regime de opressão da época, tal como o foi Espártaco, também ele crucificado (33).

Esse esforço dos marxistas coincide com outra corrente, a de diferentes doutrinas atuais dos teólogos protestantes, que pretendem desmitologizar o Cristianismo ("Entmythologisierung"). Na prática, estas correntes se confundem e se apoiam mutuamente. Não há dúvida de que muitos trabalhos de autênticos teólogos protestantes sobre este tema são aproveitados pelos marxistas e facilitam ao marxismo a destruição da Fé cristã.

O mais doloroso é que o "cristianismo sem mitologia" penetra atualmente na Igreja.

O vandalismo iconoclasta de nossos dias é, em muitos casos, de inspiração marxista e se apresenta como assimilação da posição desmitologizante.

O mais grave ocorre nas traduções tendenciosas das Sagradas Escrituras. Abundam hoje as edições dos Evangelhos e de outras partes do Novo Testamento nas quais se aplica

Continua