RODRIGO GUERREIRO DANTAS
A editora Paz e Terra (Rio de Janeiro) lançou no ano passado o livro "Ação Cultural para a Liberdade", do professor pernambucano auto-exilado Paulo Freire. Trata-se de uma coletânea de textos escritos entre 1968 e 1974 sobre o tema da alfabetização de adultos... Ou por outra, aquilo que P. Freire, bem como toda a multinacional da subversão entendem por "alfabetização".
"Catolicismo" já se ocupou do assunto, focalizando mais especificamente a mecânica do método Paulo Freire de alfabetização, e apontando de modo apenas genérico seus objetivos revolucionários (ver P. Ferreira e Melo, Paulo Freire: educação como prática da "libertação", no. 296/298, agosto/ outubro de 1975).
Pretendemos apresentar agora essas metas revolucionárias, expostas à plena luz do dia em "Ação Cultural para a Liberdade".
Na presente coletânea, Paulo Freire não se preocupa em esconder a inspiração marxista que anima a filosofia educacional por ele proposta. Copiosas citações e referências a Marx e autores marxistas recheiam essas páginas. Delas goteja luta de classes, ódio à estrutura política, social e econômica do mundo ocidental, simpatia pelos países comunistas, especialmente China e Cuba. Será por isso que — como confessa na nota introdutória — ele hesitou tanto em reunir esses textos num só volume e publicá-los no Brasil?
Paulo Freire não aceita a alfabetização, no sentido corrente, de ensinar a ler e escrever. Isto é, de ensinar o valor fonético de cada letra, e pois das sílabas, a fim de que, vendo-as dispostas no papel, o alfabetizando saiba reconhecer as palavras e os textos; bem como as noções básicas de caligrafia, ortografia e gramática, que lhe permitam traduzir o pensamento em linguagem escrita.
Para o professor pernambucano isso não tem valor, e não passa de "ato mecânico de "depositar" palavras, silabas e letras nos alfabetizandos" (p. 13), de nada servindo ao trabalhador rural ou urbano para "compreender, criticamente, a situação concreta de opressão em que se acham" (p. 15); "mera transfusão alienante" (p. 14), que em nada contribui para a "transformação revolucionária da sociedade de classes, em que a humanização é inviável" (p. 122).
Depreende-se facilmente dos textos de Paulo Freire, que só há no mundo um problema verdadeiramente capital: a "libertação" das "classes oprimidas".
Os métodos comuns de alfabetização, ignorando esse problema central, seriam cúmplices da "dominação" e "opressão das classes exploradoras" sobre a massa escravizada. O silêncio diante dessa situação "injusta" significa aprovação e favorecimento do status quo.
Convém aqui chamar a atenção para o significado verdadeiro das expressões "injustiça", "opressão", "desumanização" etc., na linguagem dos progressistas e esquerdistas.
Analisando a obra de Paulo Freire, como aliás de outros autores esquerdistas, vemos que, na realidade, eles não visam a melhoria das condições de vida dos camponeses e operários.
Não; o que essa corrente quer é acabar com a sociedade de classes. Senão, vejamos o que visa Paulo Freire: "a transformação radical, revolucionária, da sociedade de classes" (p. 48); "a organização revolucionária para a abolição das estruturas de opressão" (p. 50); "a denúncia da sociedade de classes como uma sociedade de exploração de uma classe por outra" (p. 59); "a transformação revolucionária da sociedade de classes, em que a humanização é inviável" (p. 122) etc.
A miséria e a fome, são apenas aspectos circunstanciais e acessórios, que podem ser instrumentalizados como fator propagandístico muito útil. Mas o que o professor pernambucano, no fundo, não admite é a existência de classes, seja boa ou não a situação dos operários e camponeses, pouco importa; só considerando "humana" a sociedade sem classes, onde necessariamente todos são pobres, a exemplo das infelizes nações "libertadas" pela seita marxista.
"Injustiça", "opressão", "desumanização" é, pois, a mera desigualdade, ainda que as classes inferiores tenham condições de vida compatíveis com a dignidade humana. Eis o âmago do pensamento de todas as correntes cripto-marxistas.
Coerente com esta impostação, Paulo Freire censura todas as medidas que, dentro de uma estrutura social que respeite a propriedade privada, tenham por objetivo dar boas condições de vida às classes mais humildes. Para ele essas são medidas de cunho "paternalista" e "assistencialista"; são "práticas que costumamos chamar de "ação anestesiadora" ou de "ação aspirina", expressões de um idealismo subjetivista que só pode levar à preservação do "status quo" (p. 106).
A ele pouco importa a diminuição das tensões sociais (p. 77); não procura, tampouco, a "humanização do capitalismo", mas sim a "sua total supressão" (p. 122).
Isto porque a "libertação das classes oprimidas", na sociedade de classes, "só se dá na ultrapassagem daquela sociedade e não na simples modernização de suas estruturas" (p. 122). "As classes dominadas, silenciosas e esmagadas, só dizem sua palavra quando, tomando a história em suas mãos, desmontam o sistema opressor que as destrói" (p. 129). Em última análise, é a "ditadura do proletariado", que opera a "transformação da sociedade de classes" e a "construção da sociedade socialista" (p. 78). Singular "alfabetização", essa do Sr. P. Freire!
Paulo Freire acusa os métodos comuns de alfabetização de "sacralizarem", "mitificarem" a atual ordem social com o fim de preservar o poder das classes dominantes, quebrando nos educandos "oprimidos" qualquer veleidade de contestação. Seriam métodos "opressores", "desumanizantes", "domesticadores" (cfr. pp. 81 e 101).
Contudo, por mais que se procure, não é possível encontrar nos textos de "Ação Cultural para a Liberdade" o mínimo indício que de longe possa significar qualquer concessão a tudo o que não seja a pregação da luta de classes, da transformação revolucionária na sociedade, do estabelecimento de um regime marxista à moda da China vermelha ou da Cuba castrista!
É possível que o autor não veja nisso a "sacralização" de uma mística revolucionária?
Paulo Freire considera Che Guevara "um dos maiores profetas dos silenciosos do Terceiro Mundo" e o aponta como exemplo de "comunhão entre a liderança e as massas populares", e modelo de líder que submetia a "sua prática diária a uma constante reflexão crítica". Logo em seguida reconhece “a falta de interesse dos camponeses pelo movimento guerrilheiro:.. (p. 80).
É sabido que os camponeses bolivianos, aos quais os guerrilheiros se misturavam, a fim de intoxicá-los com a propaganda subversiva, após ouvirem a doutrinação marxista, iam denunciar à polícia a presença dos "libertadores" entre eles. Donde o completo fracasso das guerrilhas na Bolívia.
Por que então Che Guevara, nas suas reflexões críticas, não reviu os seus princípios marxistas? Por que não "comungou" das ideias refratárias ao comunismo, dos camponeses. bolivianos?
É que para esse gênero de Don Quixote fura-mitos, Marx — o "desmitificador" por eles mais do que ninguém mitificado — não pode errar.
Os camponeses bolivianos sim é que deviam estar com alguma forma de "alienação psíquica". Na linguagem do autor, sofreriam de "condicionamento das mentes pelas estruturas opressoras", ou algo assim.
E com tiradas demagógicas desse gênero a minoria revolucionária vai buscando libertar todos os homens da liberdade de recusar a escravidão marxista.
Segundo o sistema revolucionário, não apenas os educadores têm a aprender com os educandos, mas estes ao "refletir criticamente sobre o processo de ler e escrever" (p. 49) "assumem o papel também de agentes da ação" (p. 35). Quer dizer, "na educação para a libertação não há sujeitos que libertam e objetos que são libertados" (p. 89), pois "ninguém conscientiza ninguém" (p. 109).
Mas então, quem "conscientiza", e portanto "educa" e "liberta"?
Um ente extraordinário: "o movimento dialético entre a reflexão crítica sobre a ação anterior e a subsequente ação no processo daquela luta [pela libertação]" (p. 110; negrito nosso).
Acontece que os parâmetros dessa autocrítica — e eles são absolutamente intocáveis — conduzida pelos "educadores", já estão postos "a priori" pela minoria radical adestrada, através de uma terminologia sofisticada e hermética, absolutamente fora do alcance cultural dos educandos.
Por exemplo, fazendo a crítica da educação revolucionária como se deu no Chile de Frei e de Allende, Paulo Freire aponta o fenômeno da permanência do modelo do antigo patrão no espírito dos educandos, como o verdadeiro patrão a quem devem seguir. E os educandos, no caso, eram os camponeses "libertados" pela reforma agrária socialista e confiscatória, forma genuína de "educação revolucionária" (pp. 33-34). Mais adiante, volta a comentar a tendência dos grupos ou classes "dominadas" a seguir o modelo cultural dos "dominadores" (p. 53).
Afirma o autor que a causa desse fenômeno é a "introjeção" dos modelos do patrão dominador e sobretudo do mito da superioridade desse sobre os dominados. E conclui que a solução para essa situação embaraçosa só pode vir através da "dialética da sobredeterminação" .(pp. 33-34, 53).
Ora, imaginemos uma reflexão crítica entre "educadores" revolucionários e camponeses. É fácil concluir que não serão esses últimos que vão manipular uma terminologia tão sofisticada e ambígua, indispensável para levar à frente o processo subversivo pelo próprio desconcerto que causa.
É claro. Se os camponeses, a quem não falta o bom senso e a noção do concreto, ouvissem explicações nesses termos para solucionar seus problemas, sem dúvida mandariam tal gênero de educadores "introjetar batatas" ou "sobredeterminar dialeticamente o boi"...
Quanto à desigualdade de classes, é perfeitamente de acordo com a natureza, e com a doutrina católica. "Não é verdade que na sociedade civil todos tenhamos direitos iguais, e que não exista hierarquia legítima", afirma Pio XI (Encíclica Divini Redemptoris, de 19 de março de 1937; Editora Vozes, Petrópolis, p. 8).
E Leão XIII é ainda mais explícito: "A igualdade que a Igreja proclama conserva intactas as distinções das várias classes sociais, evidentemente requeridas pela natureza" (Encíclica Parvenu, de 19 de março de 1902; Editora Vozes, Petrópolis, p. 16).
Poderíamos alongar indefinidamente o artigo com citações de Encíclicas e outros documentos do Magistério tradicional da Igreja, no mesmo sentido.
A superioridade de uma classe sobre outras, do ponto de vista social, cultural e econômico não significa exploração da classe superior em relação às demais. Assim pensa a Igreja há vinte séculos, ininterruptamente. Paulo Freire é tido e havido por católico. Ou aceita essa doutrina, ou usa da máscara de católico para destruir por dentro o Corpo Místico de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Aliás, sempre, numa sociedade catolicamente ordenada, há uma sadia permeabilidade que torna possível aos elementos mais capazes e esforçados das classes mais modestas galgarem até mesmo altos postos da hierarquia social, política e econômica. A existência de classes é assim fator estimulante de progresso social e de renovação das elites.
No Brasil, é proverbial o número de fortunas saídas do nada: nordestinos que vieram para o Sul com a roupa do corpo, imigrantes de todas as partes que aqui chegaram de bolsos vazios, ou pessoas que alcançaram êxito do ponto de vista social, político ou econômico no próprio lugar de origem.
O singular dialeto de palavras e expressões equívocas, empregado por Paulo Freire e por toda a multinacional da subversão, tem um papel mais profundo que fica subjacente nos textos de "Ação Cultural para a Liberdade".
Pois fica evidente que uma vez começado em qualquer país um processo onde a agitação não encontre mais obstáculos para atuar, a minoria radical adestrada, manipulando essa terminologia revolucionária, submete a massa do povo a um estado de completo desconcerto e insegurança. Isto porque esta se vê diante de um jogo de palavras cujo conteúdo sofístico não alcança explicitar, e de cujo sentido ambíguo não consegue desvencilhar-se.
Então os fracassados, os ressentidos, os oportunistas, os que gostam de aparecer, compreendendo que os ventos sopram no sentido da subversão, são imediatamente polarizados como instrumentos da agitação revolucionária. Chateaubriand observou esse fenômeno na Revolução Francesa: "Os mais deformados do bando [a esquerda da Assembleia Legislativa] obtinham de preferência a palavra. As enfermidades da alma e do corpo desempenharam um grande papel nas nossas desordens: o amor próprio ferido fez grandes
O que pensar de uma "missa" cujo texto contém os seguintes versos?
Papel contra balas
Nunca serviu:
Uma canção desarmada
Não enfrenta um fuzil.
Ou então:
O Povo se organiza
As primeiras organizações operárias aparecem.
Os partidos socialistas e comunistas se organizam.
Eles questionam o sistema, denunciam as injustiças
e despertam a ideologia proletária.
As forças armadas, instrumento da burguesia e
do capital servem-se das primeiras greves como
pretexto para massacrar os operários e tentar
abater os primeiros esforços de libertação do povo
em via de se organizar.
Ou ainda:
O Povo prossegue sua marcha em busca da libertação.
Os movimentos revolucionários e de guerrilha
aparecem nos campos e nas cidades.
O triunfo de Cuba.
obriga o imperialismo a intervir diretamente
e a CIA toma a iniciativa direta da repressão das forças populares.
Ela prepara os exércitos nacionais a fim de lutar vigorosamente
contra as organizações populares. A luta é aberta e decisiva.
Dia 12 de setembro último, num salão do Centro paroquial da igreja de São Pedro Apóstolo de Montréal, vários Padres católicos e um ministro protestante celebraram uma "missa" sacrílega, para a qual os textos litúrgicos foram substituídos pelos acima citados e outros do mesmo gênero. Somente as orações da consagração do pão e do vinho foram conservadas. Os Padres não vestiam nenhum paramento.
Grandes pedaços de pão substituíam as hóstias e o vinho foi consagrado em pequenas xícaras que passavam de mão em mão, como se poderá constatar pela abundante documentação fotográfica tomada na ocasião.
Essa estranha "missa", cujo texto é de sabor claramente comunista, foi celebrada a pedido da "Comunidade Cristã Chilena" de Montréal. Serviu de introdução uma projeção sonora sobre o ex-presidente ateu e marxista Salvador Allende, e sobre a crise do Chile.
Entre os celebrantes estavam o Pe. Patrick Donavan, ex-missionário canadense no Chile, expulso daquele país após a queda de Allende, o Pe. Jacques Couture, atual Ministro do Trabalho, Mão de Obra e Imigração da Província de Québec, o Pe. Anselmo Leonelli, chileno, e um ministro protestante.
Julgamos oportuno esperar transcorrer algumas semanas antes de tornar público nosso protesto contra esse ato abominável perpetrado no interior de um edifício da Igreja. Não tendo chegado ao nosso conhecimento nenhum eco de medidas do Arcebispado a esse respeito, nós — os JOVENS CANADENSES POR UMA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ — não podemos mais nos calar. Com efeito, em 13 de abril de 1976, interrogamos publicamente D. Paul Grégoire, por que ele tolerou impunemente a realização de manifestações comunistas nos subsolos da igreja desta diocese (Ver "La Presse" de 19-4-76). D. Grégoire manteve-se num inexplicável e inquietante silêncio.
Não obstante assistimos agora a fatos bem mais graves. Trata-se da profanação das sagradas espécies do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor, no decurso de uma "missa" marxista em que se pregou a luta armada e na qual foram elogiados regimes ateus e mesmo anticristãos.
Estranha atitude essa de nossas autoridades eclesiásticas em face de grupos religiosos de orientação claramente marxista e subversiva. Tratando-se de matéria tão grave, a indiferença não roça na aprovação?
Essa atitude é tanto mais espantosa quanto se assiste a uma repressão violenta dessas mesmas autoridades contra os católicos tradicionalistas.
A presente situação é o resultado da nova estratégia adotada pela Internacional Comunista, de infiltrar-se na Igreja Católica a fim de servir-se dEla como instrumento para a conquista do Ocidente. Há alguns anos, as TFPs (Sociedades de Defesa da Tradição, Família e Propriedade) do Brasil, da Argentina, do Chile e do Uruguai, recolheram dois milhões de assinaturas de católicos da América Latina endossando um apelo respeitoso e filial, enviado à Santa Sé, pedindo medidas que impedissem a evidente infiltração comunista no seio da Igreja. É-nos penoso o dever de dizê-lo: este apelo não provocou qualquer reação. Como era de esperar, o problema agravou-se a partir de então.
Para o Partido Comunista esta infiltração na Igreja é essencial, uma vez que os métodos clássicos de propaganda direta e de conquista do poder pela violência fracassaram. Apesar de um século de existência e de ação, nenhum partido comunista obteve jamais, em eleição livre, uma situação majoritária em qualquer país.
Esta nova tática comunista apresenta diversos aspectos importantes nos campos político e social. Lembremos, por exemplo, a sorridente política de "détente" (distensão) e de desarmamento que se desenvolve rapidamente enquanto os países comunistas se armam até os dentes, violando assim os acordos e tratados logo depois de firmados. Igualmente é a política de frente comum levada a cabo por Mitterrand na França e do eurocomunismo de Berlinger na Itália, que se diz independente de Moscou.
No Canadá assistimos a essa mesma tática de infiltração na Igreja. Estupefatos, vemos aumentar cada dia o número de Padres que abandonam o verdadeiro Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo por um contra-Evangelho, o contra-Evangelho marxista. Pouco a pouco, a difusão desse novo Evangelho torna-se o objetivo fundamental, o esforço mais constante e o principal meio de ação desses elementos da estrutura eclesiástica. Entretanto, diante desse fato trágico, a maior parte dos membros da Hierarquia guarda silêncio e não intervém...
Para consternação de grande número de católicos canadenses, a imagem da Santa Igreja se modifica progressivamente. Aquela imagem da Igreja tradicional, que protegia e ajudava os pobres sem por isso odiar o rico, torna-se cada vez mais nebulosa. Quase já não se ouve mais a voz tranquilizadora da nossa Santa Madre Igreja, ensinando a Verdade aos povos com autoridade e ponderação, daquela igreja eterna que denunciava com firmeza os excessos do capitalismo onde fosse necessário. Não obstante, fiel à sua doutrina imutável, Ela se mostrou sempre como a adversária irreconciliável do comunismo, inspirando uma cruzada mundial, de ordem espiritual, contra o perigo marxista.
Não se poderia dizer que nossa Igreja, este sol resplandecente de Justiça e de Verdade, está submersa num misterioso crepúsculo? Estávamos habituados a ver brilhar no Clero, com admiração e respeito, essa luz que não se apagará nunca. E eis que um número incalculável de mãos consagradas se transformam lenta e confusamente em cúmplices do inimigo mortal da civilização cristã. Cumpre-se tragicamente dessa maneira o que Paulo VI chama de “autodemolição” da Igreja.
O que fazer?
Guiados pela luz da doutrina católica e do direito canônico, e levados pela força irresistível da lógica, não é possível deixar de afirmar que o comportamento desses elementos revolucionários do Clero representa realmente um perigo muito grave para as almas e favorece a heresia.
Desse fato, uma questão se impõe: como católicos e canadenses, que atitude devemos tomar à vista desses elementos do Clero?
Nas circunstâncias presentes os católicos, mesmo os simples fiéis, têm objetivamente o direito e por vezes também o dever de RESISTIR a esses pastores revolucionários.
Portanto nós — os JOVENS CANADENSES POR UMA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ — declaramos aqui que nós tomamos a firme e irrevogável decisão de RESISTIR.
RESISTIR significa que aconselharemos os católicos a prosseguir sua luta contra a doutrina comunista, através de todos os meios lícitos, para a defesa da Pátria e da civilização cristã ameaçadas.
RESISTIR significa, entretanto, que não empregaremos jamais os recursos indignos da contestação, e menos ainda, não tomaremos uma atitude que não reflita a veneração e a obediência devidas aos Pastores legítimos, segundo as normas do direito canônico.
RESISTIR quer dizer, no entanto, que nos permitiremos emitir respeitosamente nosso juízo sobre acontecimentos como a "missa" sacrílega celebrada em São Pedro Apóstolo.
Seria por demais longo enumerar os Pontífices, os Padres da Igreja, doutores, teólogos e especialistas em direito canônico (*) — muitos dos quais canonizados — que sustentam o direito dos fiéis à resistência em situações como a presente, quando as decisões da autoridade eclesiástica são objetivamente errôneas, perigosas para a Fé ou prejudiciais à integridade de um país. O próprio Apóstolo São Paulo diz aos Gálatas: "Há pessoas que vos confundem e que querem mudar o Evangelho de Cristo. Mas, ainda mesmo se um anjo descido do céu vos anunciasse um outro Evangelho que não aquele que vos anunciamos, seja anátema" (Gal. I. 7-8).
O grande Santo Tomás de Aquino nos ensina: "Quando a 'Fé está em perigo iminente, os Prelados devem ser interpelados, mesmo publicamente por seus fiéis"((Summa Theológica, II-II, 33, 4-2).
Com a consciência tranqüila e firmemente resolvidos a prosseguir a luta contra o comunismo, apoiando-nos nos ensinamentos da imutável doutrina católica, voltamo-nos para Nossa Senhora de Fátima.
Suplicamos Àquela que nos trouxe uma mensagem maternal e misericordiosa, que conserve os católicos do Canadá na integridade da Fé. Pedimos que chegue sem demora o momento glorioso em que Ela nos concederá a graça de ouvir nossos Pastores repetir diante do Divino Pastor aquelas palavras que Ele mesmo pronunciou nesta terra: "Padre Santo [...] conservei os que me destes; e nenhum deles se perdeu" (Jo. XVII, 11-12).
Montreal, 7 de dezembro de 1976
Michel Renaud — Presidente
(*) Nota: Doutores em Direito Canônico e teólogos entre os mais sérios e os mais renomados como Wernz Vidal e Palmieri ,sustentam que não são rebeldes e menos ainda cismáticos aqueles que desobedecem aos detentores da autoridade eclesiástica, desde que estes se tenham tornado suspeitos de heresia. (Wernz Vidal, Jus Canonicum, Romae, 1937, tomus VII, p. 439; Palmieri Tractatus de Romano Pontifice, Romae, 1877, pp. 194-195; Francisco de Vitoria, Obras, BAC, Madrid, 1960, pp. 486-487; Suarez, De Fide, disp. X, sec. VI, no. 16, Vives, Paris, 1858; Cornelio a Lapide, ad Gal. 2, 11; Peinador, Cursus Brevior Theologiae Moralis Coculsa, Madrid, Tomus II, p. 287).