PLINIO SOLIMEO
O misterioso País do Sol Nascente foi praticamente desconhecido dos ocidentais até o século XVI, quando um navio português, dirigindo-se à China, foi arrojado em suas praias em 1542.
Nem os gregos, nem os romanos fazem menção àquela nação asiática. Uma primeira notícia de sua longínqua existência aparece na Idade Média, constante da narração das fabulosas aventuras de Marco Polo, que faz referência ao Reino de Cipango. Mas só isso.
Quando os portugueses desembarcaram na terra dos Samurais, a escrita, os costumes, a arquitetura, o vestuário e até a alimentação japonesa assemelhavam-se à civilização chinesa, já conhecida dos portugueses desde 1506, quando aportaram em Macau.
São Francisco Xavier, o grande Apóstolo das Índias e do Japão, assim descreve, em 1549 o povo nipônico: "De todos os povos bárbaros que tenho visto, nenhum pode ser comparado a este pela sua boa natureza. É de uma perfeita probidade, franco, leal, engenhoso, ávido de honras e de dignidades. A honra é para ele o primeiro de todos os bens. É pobre, mas entre eles a pobreza não é desprezada. A nobreza pobre não é menos considerada do que a rica, e jamais a indigência determinaria um gentilhomem a casar-se para elevar o seu nome pelo auxilio de uma opulência plebeia; julgar-se-ia aviltado" (Carta aos Padres da Companhia de Jesus de Goa, apud J. M. S. Daurignac, "São Francisco Xavier", Livraria Apostolado da Imprensa, Porto, 1959, p. 341).
Muito hospitaleiros, os japoneses acolheram com alegre surpresa os primeiros portugueses que a Providência conduziu até eles. Desejando dilatar "a Fé e o Império"; os lusos pediram e obtiveram licença do Príncipe de Omuro para estabelecer um entreposto comercial em Nagasaki, que rapidamente se desenvolveu em virtude do afluxo tanto de nativos quanto de estrangeiros.
Alguns anos mais tarde, um gentil-homem de Kagoshima, tendo cometido um crime, viu-se perseguido pelos parentes e amigos da vítima. A Providência levou-o a buscar refúgio em uma náu dos portugueses, cujo capitão era seu amigo, e, depois de mil vicissitudes, o fidalgo japonês, acompanhado de dois domésticos, foi recebido por São Francisco Xavier, na Catedral de Málaca.
Abrasado pela graça do Batismo, Paulo de Santa Fé — nome que o fidalgo japonês escolheu para si — assim como seus dois domésticos, batizados respectivamente com os nomes de Antonio e João, insistiram com São Francisco Xavier para que fosse pregar o Cristianismo em sua terra.
No dia de São João Batista de 1549, São Francisco Xavier e seus três discípulos japoneses desembarcaram em Kagoshima. Em apenas quarenta dias, o notável apóstolo aprendeu a língua do país de maneira a iniciar sua pregação pelas ruas e praças da cidade. Os neoconvertidos procuravam emular-se ao "santo Padre" em seu zelo pelo apostolado.
"Paulo de Santa Fé, que prega noite e dia o Evangelho aos seus pais e amigos — escreve São Francisco Xavier aos Padres da Companhia de Jesus, em Goa, a 3 de novembro de 1549 — converteu já sua mulher, sua filha e muitos parentes e vizinhos. E isto tem merecido aprovação de todos".
Seria longo enumerar os prodígios operados por São Francisco Xavier no Japão, pois extravasaria os limites deste artigo. O grande Apóstolo passou pouco mais de dois anos em terras japonesas, mas a semente que ali plantou foi fecunda. Mesmo depois da partida do notável missionário, o entusiasmo dos novos convertidos era impressionante.
Já em 1549, edificou-se em Kagoshima a primeira igreja católica do Japão. Em 1573 havia no país oito missionários, algumas dezenas de fiéis entre os quais várias cabeças coroadas. Em 1575, em Omura, o rei e todos seus súditos abraçaram o Catolicismo. Em 1576, só em Arima, houve vinte mil conversões. Em 1578, o Japão contava com 59 missionários Jesuítas, e o número de fiéis ultrapassava cem mil.
Quando o Visitador Geral, Pe. Valignani, chegou ao Japão em 1579, notando que os nipônicos se consideravam um dos povos mais educados do mundo, incentivou os reis de Bunga, Arima e Omura a enviar uma embaixada a Roma para oferecer as homenagens dos japoneses ao Santo Padre.
Em 1582, Felipe II recebeu em Madrid, com grande pompa, os cinco embaixadores japoneses — entre os quais dois de sangue real — que se dirigiam à Cidade Eterna. Gregório XIII recebeu-os em 1585, promovendo orações e festas públicas pela entrada no grêmio da Santa Igreja dos filhos do Império do Sol Nascente. Falecendo pouco depois Gregório XIII, os japoneses tiveram ocasião de assistir à coroação do novo Pontífice Sisto V, prestando-lhe também a homenagem de seu povo.
Toda a Igreja se rejubilava e concebia as maiores esperanças na conversão do Japão inteiro. Contudo, todo o inferno se armara para frustrar os planos do Catolicismo nascente no país das cerejeiras em flor...
O Imperador de todo Japão, Taikosama, de início favoreceu a pregação dos missionários e até tratou com desdém os bonzos que o ameaçavam com as maldições de "Amida" e "Chaka", divindades pagãs do país. Mas, tendo consolidado seu poderio com a submissão de vários poderosos senhores, os bonzos começaram a insinuar-lhe que alguns desses príncipes, que se haviam tornado cristãos, aspiravam à soberania total com o auxílio dos estrangeiros.
Um incidente fortuito tornou mais grave a situação para os católicos. Visitando um navio espanhol, um ministro do Imperador impressionou-se com o mapa mundi no qual estavam assinaladas todas as possessões espanholas. Perguntando ao capitão do veleiro como Felipe II havia podido conquistar aquelas diversas terras em partes tão distintas do globo, respondeu irrefletidamente o capitão: "Pela Religião e pelas armas. Nossos Sacerdotes, convertendo os povos ao Catolicismo, facilitam para que os mesmos nos prestem obediência". O Imperador foi logo informado sobre essa conversa.
Mas o que fez transbordar a cólera do Imperador foi; o fato de duas jovens convertidas ao Catolicismo, se recusaram a satisfazer seus desejos voluptuosos. Era o auge! Ele, a quem antes todos obedeciam quase como a um deus, ver-se agora rejeitado por duas frágeis donzelas... A 25 de julho de 1578 publicou um mandamento pelo qual todos os Sacerdotes seriam desterrados, o culto católico proibido e todos os japoneses obrigados a abjurar à Fé Católica, sob pena de morte ou de desterro.
Tendo o Imperador ordenado que se fizesse uma lista dos católicos que frequentavam os templos de Meako e de Osaka, o número foi tão elevado que o ministro encarregado da missão julgou mais prudente suprimir a lista dizendo que não era intenção do Imperador despovoar o Japão, mas somente punir os Sacerdotes, em sua maioria franciscanos vindos há pouco das Filipinas e que contrariavam as ordens imperiais.
A notícia das primeiras perseguições espalhou-se entre os fiéis como um rastilho de pólvora. Longe de se atemorizarem os católicos japoneses, fortalecidos na Fé, desejavam confessá-la com o próprio sangue.
Um dos mais belos exemplos foi o que deu o fidalgo Justo Ukondono, filho de Takayama, a quem esta folha já dedicou um artigo (cfr. "Catolicismo", n.° 287, novembro de 1974). Estava ele na corte do Rei de Kanga, seu amigo, quando recebeu a notícia da perseguição; foi então a Meako ter com o Pe. Gnecchi, Jesuita, para morrer com ele. Encontrando-se naquela localidade, viu chegarem dois filhos do Vice-Rei de Tense, grande mestre da Casa Imperial, com o mesmo objetivo.
Um rico e poderoso senhor feudal, batizado havia pouco, fez publicar em suas terras que castigaria severamente a quem, interrogado em virtude da ordem imperial se seu senhor era cristão, dissimulasse a verdade.
Ongassayara, grande Senhor do Reino de Bungo, fez questão de que o colocassem na cabeça da lista dos católicos, procurando a mesma honra para toda a família. Entretanto, receiou por seu idoso pai, recém-convertido, sugerindo-lhe que se retirasse para uma residência no campo. O velho pai, indignado, respondeu-lhe que nunca fugiria ao perigo, e que, pelo contrário, morreria por sua Fé com as armas na mão, como convinha a um velho militar.
As duas primeiras pessoas a merecerem a palma do martírio foram duas escravas enforcadas por seus patrões por ódio à Fé.
No dia 9 de dezembro de 1596, foram presos no Convento Franciscano de Meako, dezessete pessoas, sendo seis religiosos e onze leigos, entre domésticos e catequistas.
Todos os Frades franciscanos provinham das Filipinas, onde florescia um Convento da Ordem Seráfica. Cinco eram espanhóis, e um deles mexicano. De quase todos constam milagres operados ainda em vida, antes do martírio.
Completada a lista, os soldados ataram os Frades, um a um. Frei Felipe — mexicano de origem e que, de volta a sua pátria fora atirado por uma tormenta às costas do Japão — foi conduzido à prisão com os outros, unindo-se a eles pouco depois três Jesuítas, todos japoneses, e três seculares.
Entre esses confessores da Fé encontravam-se três meninos cujo fervor e constância deixaram admirados até os pagãos, atraindo a compaixão da multidão. Um deles, Luís, tinha apenas doze anos. Antonio e Tomás, os outros dois, não haviam atingido ainda os quinze. Luís não estava incluído na lista dos que sofreriam o martírio, mas tanto fez, tanto chorou, que o oficial lhe deu essa satisfação.
Antes de serem levados ao local do suplício, cortaram aos condenados a orelha esquerda. Assim, cobertos com próprio sangue, as vítimas foram sendo levadas numa carroça de cidade em cidade, até Nagasaki. Cansados, sofrendo dores, fome, sede e frio, recebiam, por acréscimo, as injúrias dos pagãos, se bem que os consolasse ver fiéis ajoelhados em todo o percurso suplicando suas preces e incentivando-os a morrer generosamente animados pela verdadeira Fé.
Numa colina de Nagasaki, esperava-os o martírio. No Japão as cruzes tinham um suporte onde as vítimas apoiavam os pés e uma espécie de barrote no qual se sentavam. Depois de amarrados, a cruz era levantada. Em seguida um verdugo perfurava os condenados com uma longa lança até que cessasse qualquer vestígio de vida.
Quando o noviço jesuíta João de Goto estava para ser traspassado pela lança homicida, viu chegar junto a si seu pai, que viera dar-lhe a última bênção. "Vede, meu pai — disse-lhe o futuro mártir — que não há nada de tão precioso que não se deva sacrificar pela nossa salvação". — "Eu o sei, meu filho", respondeu o pai. "E agradeço ao bom Deus pela graça que Ele nos concede, a ti e a mim. Esteja certo de que tua mãe e eu estamos prontos a seguir o teu exemplo". E encostou-se mais à cruz de seu filho para receber seu generoso sangue.
O primeiro a sofrer o martírio foi Frei Felipe, que o sofreu atrozmente pois uma das cordas que o prendiam à cruz, ao ser esta levantada, resvalou, deixando-o preso só pela garganta. Afogando-se, o primeiro mártir só pode dizer: "Jesus, Jesus, Jesus". Quando o verdugo o foi perfurar com a lança, a alma de "Felipinho" de Jesus, como era conhecido, já se encontrava na presença de Deus.
São Paulo Miki, Jesuíta, pregava com tanta eloquência do alto da cruz que apressou a tarefa do verdugo em traspassá-lo para não converter mais nenhum pagão.
Estando quase todos mortos, Frei Batista entoou o cântico de Zacarias: "Bendito seja o Senhor Deus de Israel", sendo acompanhado com entusiasmo pelos fiéis presentes. O pequeno Antonio, ao seu lado, pediu-lhe que entoasse também o "Laudate pueri Dominum". Entretanto, o santo Franciscano, imerso em profunda contemplação, não ouviu o pedido. Antonio iniciou, então, só, o Salmo 112, quando foi atingido pelo golpe mortal.
Assim que os mártires expiraram, os guardas não puderam conter, nem com bastonadas, o entusiasmo dos fiéis que correram junto às cruzes para recolher a terra embebida pelo sangue sagrado.
À tarde, o Bispo do Japão, a quem havia sido proibido estar presente ao martírio, foi com um grupo de Jesuítas de Nagasaki ajoelhar-se diante dos mártires. A colina sagrada tornou-se local de peregrinação, onde se operaram muitos milagres.
Urbano VIII beatificou esses mártires, e Pio IX os canonizou a 8 de junho de 1842.
Tendo falecido o Imperador Taikosama em 1598, sucedeu-lhe seu filho Fidejori que, chegando à maioridade, tendo mostrado inclinação em amparar os católicos, foi deposto por seu tutor Ijesaz, que governou de 1618 a 1630, recrudescendo a perseguição.
Movidos pelo mesmo ódio aos católicos, aliaram-se aos pagãos os protestantes holandeses, ávidos de prejudicar em tudo a dilatação da Fé católica, bem como as duas grandes potências missionárias da época, Portugal e Espanha. Não só excitaram no espírito do Imperador suspeitas contra os missionários e contra os ibéricos, mas chegaram a auxiliar os oficiais nipônicos nas revistas que estes faziam nos galeões espanhóis e portugueses para ver se traziam missionários. Contribuíram também com sua artilharia, para, em 1637, aniquilar o último reduto católico, na fortaleza de Shimabara, onde trinta e sete mil católicos japoneses foram massacrados.
Obtiveram, com isso, o monopólio exclusivo do comércio com o Japão, uma vez que portugueses e espanhóis foram proibidos, sob pena de morte, de aportarem em terras japonesas.
Mas que preço tiveram que pagar os batavos por essa infâmia! Foi-lhes reduzida a licença para se estabelecerem exclusivamente, e em número reduzido, na ilha Deshima, perto de Nagasaki. Ao chegar, deveriam passar sobre um crucifixo para provarem não serem católicos. Nessa ilha não podiam celebrar o domingo ou dia festivo, rezar publicamente, entoar cânticos religiosos ou pronunciar o Nome de Jesus.
O grande médico e naturalista alemão, Engelbert Kaempfer, cirurgião da frota holandesa da Companhia das Índias Orientais — portanto insuspeito —narra o que presenciou em sua passagem pela ilha Deshima: "A permanência em Deshima era uma prisão. Os holandeses toleraram coisas que são intoleráveis para todo homem de honra. O alcaide mór [dos holandeses] devia cada ano levar presentes ao Imperador, e, então, chegar até seu trono de gatinhas e sem poder levantar a cabeça, permanecendo ajoelhado, com a cabeça baixa, em respeitoso silêncio; e da mesma maneira deveria afastar-se depois, andando para trás como um caranguejo. Logo, toda embaixada era conduzida para o interior do palácio para servir de diversão às esposas, filhas e familiares do Imperador. Ali tinham que tirar as roupas exteriores, saltar como bufões, fazer macaquices, bailar, imitar os bêbados, balbuciar o japonês, pintar e cantar em holandês e alemão" (Lengo, Alemanha, 1712, IV, c. 2, apud. J.B. Weiss, "História Universal", Tipografia La Educación, Barcelona, 1927, tomo I, p. 338).
A Igreja do Japão, no entanto, deveria se fortificar na tormenta. É, nessa terra longínqua, repetiram-se as cenas de fervor da Igreja das Catacumbas. Ilustra-o o Martirológio dos Mártires do Japão em que cada página apresenta uma epopeia de varões, virgens e até de crianças que arrostaram os poderes da terra e do inferno, para permanecerem fiéis a Jesus Cristo e a Sua Igreja.
Rumo ao Japão, São Francisco Xavier invoca o auxílio de Deus ante a terrível tempestade. A Providência o atendeu e a tormenta cessou.
São Paulo Miki, um dos Jesuítas japoneses martirizados na primeira perseguição, prega aos fiéis antes de ser crucificado
GREGÓRIO LOPES
O que pensaria o leitor se alguém dissesse que vai apresentar "o Evangelho com menos floreados. De modo simples..." E acrescentasse: "Até agora, do Evangelho temos ficado apenas com o maravilhoso, o mágico, o fantástico, os anjos, o parto sem dor..."
A primeira reação ante tais afirmações poderia infelizmente não ser de perplexidade, pois é moda em nossa época, muitos desejarem ser considerados "simples" e "humanos", expressões que frequentemente escondem mediocridade de espírito.
Mas se a perplexidade estivesse ausente, o mesmo não deveria acontecer com a desconfiança. É claro. A frase cheira a progressismo católico: estranha mistura, num mesmo conjunto, do maravilhoso cristão com a magia; dos anjos — cuja existência é absolutamente certa pela doutrina católica — com o fantástico imaginário; e por acréscimo a expressão "parto sem dor", tão infeliz no contexto por se prestar a mil insinuações malévolas e mesmo blasfemas contra Nossa Senhora. E tudo vem junto, de cambulhada, como se fossem ingredientes do mesmo “floreado” evangélico.
Quem pensou em mediocridade não errou. Mas, sobretudo, não se enganou quem relacionou o tema com progressismo. Aliás, quantas e quantas vezes mediocridade e progressismo andam de braços dados...
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Trata-se do opúsculo denominado "Qué Bueno que Viniste!", apresentando cenas dos Evangelhos, em quadrinhos. Os desenhos mais parecem caricaturas medíocres e vulgares — o leitor poderá comprovar pelos exemplos que reproduzimos — sendo a inspiração claramente progressista. Não faltam também figuras e insinuações imorais, as quais, evidentemente, não poderiam ser aqui estampadas, como também blasfêmias clamorosas.
O autor? Um Sacerdote espanhol, do Clero secular: Pe. José Luiz Cortés, da Arquidiocese de Madrid, ordenado em 1975. Dele são as afirmações que acima citamos.
Os personagens sagrados do Evangelho, inclusive Nosso Senhor e Sua Mãe Santíssima, desfilam diante de quem folheia o livro como seres vulgares, desprovidos de qualquer elevação de espírito. Além disso, não está ausente, é claro, a nota subversiva. Em vários trechos, a luta de classes transparece de diversos modos.
Perdoe-nos o leitor se transcrevemos do livro algo que, de maneira alguma, normalmente reproduziríamos em nossas páginas. Contudo, pareceu-nos necessário publicar desenhos e citações para que nossas afirmações não se afigurassem como inverossímeis. Traduzimos os textos procurando tornar a linguagem menos crua.
O autor desse estranho Evangelho conclui a apresentação da obra com as seguintes palavras: "Maria, vendo pela primeira vez a José (São) pensou: Eis que não é tão velho como o pintam nas gravuras!" (p. 1 1).
O mesmo Padre publica em todos os números do semanário católico progressista, editado em Madrid, de grande tiragem — "Vida Nueva" — histórias em quadrinhos sobre temas religiosos, algumas das quais o pudor e o respeito pelas coisas sagradas nos impediriam de reproduzir.
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Ainda terá fé na divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo esse Sacerdote que, na obra analisada por nós, assim apresenta o Redentor? — "A mim também me perguntaram uma vez por que acreditava que Jesus era Deus. Antes eu os mandava aos livros de teologia: ali estava "demonstrado". Mas agora, lhes digo que, na verdade, rapaz, eu não tenho a evidência de que esse homem fosse Deus (entre outras coisas porque o que é Deus?). Mas que conforme vais conhecendo a fundo e amando a Jesus homem, quando um dos que com ele conviveram te diz que Deus estava com ele, respondo: Não me estranha" (p. 108).
Esse texto parece revelar o sentido profundo das caricaturas. É o de apresentar um Jesus Cristo não divino, mas como se fosse um homem qualquer. Trata-se, pois, de um anti-apostolado. Assim como os antigos missionários empenhavam-se em converter os pagãos, utilizando para tal fim, muitas vezes, representações cênicas, ilustrações etc., o Pe. Cortés procura, através da caricaturização do sagrado, apagar do espírito dos fiéis a noção da divindade do Salvador da humanidade, fundamento de toda fé. Negada essa verdade, que sentido tem, por exemplo, a sacralidade e a sublimidade da figura de Nossa Senhora, obra-prima da criação? Não estranha, pois, o desrespeito afrontoso com que a Santíssima Virgem é abordada nos desenhos e nos textos que os acompanham.
A obra é publicada por Propaganda Popular Católica, Madrid, 1977. Figura o Nihil Obstat de Alfonso de La Fuente Adanez e o Imprimatur do Provigário Geral da Arquidiocese de Madrid, Mons. José M. Martin Patino. Portanto, o livro conta com todas as aprovações canônicas de praxe. E tal aprovação constitui uma perplexidade ainda maior, que se soma ao fato de um Sacerdote chegar a escrever um opúsculo desse teor, ilustrado com desenhos inqualificáveis.
O Pe. Cortés tira aos personagens sagrados toda sua grandeza e sacralidade, e os degrada: eis como ele vê Nossa Senhora e São José antes do casamento (p. 17).
Os três Santos Reis Magos são apresentados como uns rapazolas, autênticos "play-boys", cientistas do Centro Aeroespacial de Houston (EUA) (p. 65).
O respeitabilíssimo e santo ancião que esperou uma vida inteira na certeza profética de que veria o Salvador — o velho Simeão — assim é apresentado pelo Pe. Cortês, quando reconheceu o Messias (p. 75).
Como deveriam ser ternas, respeitosas, cheias de adoração as palavras de São José dirigidas ao Menino Deus! O autor, contudo, apresentando Este como um garoto vulgar, que segura atrás de Si um estilingue, coloca nos lábios do Pai adotivo do Redentor a chula expressão: "Se eu te der um soco no nariz, então vais me repetir que já és um homem!" (p. 109).
O relacionamento de Nossa Senhora com o Menino Deus atingiu sublimidades inauditas, cujo perfume nos foi transmitido pela Tradição cristã. Também a este campo o Pe. Cortés estende seu espirito de irreverência blasfema. A Virgem Santíssima ameaça Seu divino Filho com uma sandália, pelo fato de ter Ele quebrado um vaso (p. 124).
Não podia faltar uma insinuação no sentido da luta de classes. Aliás, não é a única que encontramos no livro. Na primeira estampa é representada uma família pobre, dispondo apenas de pão e água, mas que sabe repartir o que tem. Enquanto o rico do desenho abaixo está como que submerso em sacos de dinheiro e com o coração ressequido. "Clichê" constante da propaganda esquerdista de todos os naipes (pp. 129 e 130).
Este seria o modo — segundo o livro blasfemo — mediante o qual Nossa Senhora, no Magnificat, imaginaria a santidade e a misericórdia de Deus: "E é Santo Seu nome. E Sua misericórdia se estende de geração em geração em todos os que O temem" (p. 23).
O desenho é acompanhado por um texto inacreditável: o Redentor, o Verbo Divino, foi enviado ao Oriente para "culturalizar-se e instruir-se". Como se o Deus humanado necessitasse aprender doutrinas de cunho panteísta, como por exemplo, o budismo (p. 122).
Nosso Senhor é apresentado como um homem, vagabundeando, que carrega nas costas um violão. Lembra a figura de um "hippie" (p. 138).
Pe. José Luiz Cortés