(continuação)
E que o cristianismo dentro do sandinismo se manifestou de muitas formas. Uriel falava da alegria pascal que havia no povo enquanto os tiranos lançavam bombas em Manágua. O povo respondia com cantos. E o mundo se surpreendeu após a revolução, por não existir na Nicarágua fuzilamentos.
Talvez muitos esperassem isto, mas eles têm um lema: ser generoso na vitória. E para eles o perdão e o amor são importantes no sandinismo. Deve-se chegar a uma sociedade aonde haja autêntica justiça social.
E que a Nicarágua quer ser ajudada pela Igreja, para que ela própria, como nação, possa realizar o ideal evangélico. E que a Igreja agora na Nicarágua tem uma oportunidade única, porque lamentavelmente nem sempre ela soube estar do lado dos que têm fome e sede de justiça.
A Igreja antes não sabia reconhecer no clamor do povo o chamado do Senhor. Agora, na Nicarágua, ele pode dizer que a Igreja reconhece a voz de Deus nesse clamor (73).
(73) O destaque em negrito no texto realça que Frei Betto, expressivo elemento da extrema "esquerda católica" no Brasil, ao repetir os conceitos do Padre-Chanceler da Nicarágua, nenhuma ressalva lhes faz.
Frei Betto. – Nós temos, sem dúvida nenhuma, o privilégio de escutar agora a palavra do comandante Daniel Ortega Saavedra, da Junta de Governo da Nicarágua e da Direção Nacional da Frente Sandinista de Libertação Nacional (palmas, assobios).
Daniel Ortega. – Deixem-me agradecer estes aplausos, este entusiasmo de vocês, em nome de nossos heróis e mártires que vivem na Revolução Nicaraguense, que vivem no coração dos povos da América Latina.
Nossa revolução é uma revolução que não podemos, indiscutivelmente não podemos isolar da luta dos povos. Se a revolução foi possível na Nicarágua é porque os povos da América Latina, os povos do mundo, a apoiaram, a respaldaram, de maneira decidida.
Não somos alheios a este esforço, não somos alheios tampouco ao sangue derramado em nosso Continente, em luta permanente para alcançar a sua libertação (74).
(74) Para um membro da Junta Governativa da Nicarágua, Comandante Ortega Saavedra, é claro que a Revolução Sandinista constitui um só todo com as agitações que sacodem no momento a América Latina:
a - os "heróis e mártires" sandinistas "vivem no coração dos povos da América Latina";
b - a vitória do sandinismo se deve ao apoio dos "povos da América Latina", dos "povos do mundo";
c - há uma correlação entre o esforço dos sandinistas e "o sangue derramado em nosso Continente, em luta permanente para alcançar a sua libertação".
É claro que nem todos os dias podem ser de vitória. Mas esse esforço diário, esse sacrifício que é catalogado por alguns como estéril, soma forças, soma vontades, soma decisão e ajuda a ser possível o triunfo revolucionário em nossa pátria.
Hoje, aqui no Brasil, sentimo-nos contentes com o entusiasmo de vocês. Sentimo-nos contentes com o otimismo de vocês. E trazemos ao povo do Brasil, aos trabalhadores brasileiros, aos operários, aos camponeses brasileiros, aos patriotas brasileiros, a saudação, o abraço franco dos trabalhadores nicaraguenses, dos camponeses nicaraguenses, dos patriotas nicaraguenses, dos revolucionários nicaraguenses.
Um companheiro muito querido, tombado em combate em 1970, comentava numa roda com outros companheiros, lá por volta de 1964, comentava que a grande dificuldade que tínhamos nos movimentos de libertação, era que na direção dos movimentos de libertação todo mundo queria ser Fidel Castro (risos).
E vendo à distância esse passado, nós confirmamos na prática quanta razão tinha nosso irmão sandinista.
Porque havia, sobretudo, uma tendência de cair na cópia fiel de uma revolução triunfante. Havia, inclusive, a tendência de procurar um Fidel Castro para cada revolução latino-americana.
E nossa revolução, com o passar do tempo, se veio persuadindo de que a Revolução Cubana era única na América Latina, de que a Revolução Cubana – heroica e magnífica, com Fidel Castro à frente – não podia repetir-se da mesma maneira (palmas).
Em nosso país, nossa Vanguarda tem um dirigente máximo, que se chama Direção Nacional, e é composta por nove membros. Não se podia repetir, com pontos e virgulas, o fenômeno da Revolução Cubana (75).
*(75) Merece nota o elogio à "Revolução Cubana, heroica e magnífica com Fidel Castro à frente". A divergência só está na direção "monárquica" do movimento castrista, e do caráter colegiado da direção sandinista. Vê-se bem que castrismo e sandinismo são, em substância, a mesma coisa, ou seja, comunismo.
LEGENDAS:
- O comandante Daniel Ortega chega à sessão para ocupar a mesa.
- Incita o público à revolução.
- Erguendo o punho, agradece os aplausos da assistência.