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A esquerda católica ante a derrota de Carter

Gregório Lopes

O pronunciamento popular nas últimas eleições norte-americanas continua a repercutir intensamente em todo o mundo livre, sendo objeto de análises e prognósticos feitos dos mais variados ângulos de observação. E é natural. Os Estados Unidos são ainda a nação de maior poderio econômico da Terra, detendo também, provavelmente, a hegemonia militar. Por mais que os últimos presidentes norte-americanos — notadamente Carter — tenham contribuído afincadamente para o declínio do prestígio internacional de sua nação, pela política de concessão sobre concessão e ajuda generosa à Rússia comunista, a liderança econômico-militar dos Estados Unidos no Ocidente permanece presente.

Desse modo, uma manifestação tão categórica dos eleitores daquele país contra o achincalhamento a que vinha sendo arrastada sua pátria — basta lembrar a vergonhosa entrega do Vietnã aos comunistas e a desmoralização produzida pelo fracassado resgate dos reféns americanos no Irã — tem repercussões de todo tipo no jogo dos relacionamentos internacionais.

Tais consequências são de caráter político, social, militar, religioso, econômico e até psicológico. Exorbitaria de muito os limites de um artigo querer abarcar toda a rede de corolários que se depreende daquele acontecimento. Além do mais seria prematuro. Só com o correr do tempo será possível verificar que rumos verdadeiramente se fixaram a partir do referido pleito.

O desaponto dos progressistas

Um fato, porém, é desde já inconteste. A vitória de Reagan, não enquanto significando a vitória de um homem, mas enquanto marcando a derrota de uma política, deixou desenxabidas as esquerdas do mundo todo. E, entre elas, sobretudo a esquerda "católica", que com esforços inusitados tem procurado, de modo claro ou velado, carrear para as águas do socialismo — soviético ou não, pouco importa — a massa da opinião católica.

Vejamos um exemplo desse mal-estar. A revista progressista espanhola "Vida Nueva" estampa, na página 40 de seu número de 8 de novembro de 1980, uma pequena notícia sobre o resultado das eleições norte-americanas. É uma nota de "última hora", mas já vem redigida com todos os molhos do desagrado. Diz que "as cartas jogadas por Reagan [...] deram resultado. Estas teclas soaram harmoniosamente aos ouvidos dos eleitores". Tais expressões, utilizadas pela revista, mais parecem sugerir uma manipulação do eleitorado, do que uma escolha feita livremente por este.

Prossegue: "Em boa parte do mundo a vitória de Reagan produz uma expectativa algo tensa". Ora, parece-nos difícil entender como, a respeito de um fato de "última hora", já se possa ter conhecimento da reação que ele provocou "em boa parte do mundo". Que "parte do mundo" é essa? A grei dos esquerdistas de diversos matizes? E no mundo que fica fora dessa "boa parte", que repercussão produziu? A revista nada diz, limitando-se a qualificar de "inesperada" a maioria que derrotou Carter.

O "namoro" de Carter com o progressismo

A notícia de "Vida Nueva" representa apenas um exemplo. O apoio e o estímulo — para falar só nisso — que a esquerda católica, em todo o orbe, recebia da administração Carter era frisante. Quando, em maio de 1977, D. Evaristo Arns e Carter receberam juntos da Universidade norte-americana de Notre-Dame o título propagandístico de "doutor honoris causa em Direitos Humanos", começou o relacionamento entre eles (1). É o caso de lembrar aqui que os direitos humanos — que, evidentemente, podem ser encarados retamente, alguns deles até como princípios de Direito Natural — costumam, na prática, ser entendidos pela esquerda como próprios aos terroristas ou suspeitos de o serem. Segundo tal concepção, a consequência concreta é que o resto da humanidade parece não ter direitos ou não ser humano...

O relacionamento entre o presidente e o Prelado prosseguiu bastante amistoso, tanto que, em 29 de outubro de 1977, o Cardeal de São Paulo enviou a Carter — chefe de Estado de nação estrangeira — uma correspondência sobre os presos políticos brasileiros, dados como desaparecidos por uma comissão da arquidiocese de São Paulo (2). Tal carta foi divulgada posteriormente pela imprensa.

E, por ocasião da visita de Carter ao Brasil, em março de 1978, muito se falou e publicou sobre a amizade consagrada pelo presidente a D. Arns. Sobretudo quando Carter convidou o Cardeal para acompanhá-lo no Cadillac blindado que conduziu o presidente ao aeroporto, e do colóquio de uma hora que mantiveram no percurso (3).

Agora, tendo a atuação de Carter lhe valido rotunda derrota nas urnas, demonstrando mais uma vez um fato repetido frequentemente nos regimes representativos modernos — que o povo é geralmente mais conservador se comparado a seus líderes — o que fará a esquerda católica?

Opções para os progressistas

Não cremos que o pronunciamento popular seja suficiente para deter a esquerda "católica". De tal forma ela faz o jogo da esquerda internacional e encontra-se com esta comprometida, que nada faz pensar num retrocesso. Mas, a não deter-se e recuar, como prosseguir? Continuarão ostentando a bandeira dos direitos humanos, já tão amarfanhada pela unilateralidade com que foi usado o conceito, ou a jogarão fora, arvorando outro pretexto qualquer que permita o prosseguimento da escalada esquerdista?

Outro problema ainda enfrenta a esquerda católica. Caso não se detenha, corre ela o risco de desembestar à frente de um processo que o grosso da opinião pública ocidental parece decidido a não querer acompanhar.

Falamos em opinião pública do Ocidente, pois, ao que tudo indica, o fenômeno norte-americano tem amplitude que vai além dos limites do seu território nacional.

Diante desse panorama, surge uma questão: os eclesiásticos que compõem a esquerda "católica", com sua coorte de leigos agrupados em "comunidades de base" ou associações análogas, desejarão agora isolar-se? Ou pretenderão, em determinado momento, apelar para meios ainda não confessados?

Tais perguntas se impõem, uma vez que os resultados por eles obtidos mediante o processo de esquerdização — denominado frequentemente de "conscientização" — das massas católicas é muito inferior ao esforço e recursos até agora empregados.

Mesmo antes da derrota de Carter — observa com finura de análise o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira — já era possível constatar a enorme defasagem entre o que realmente pensa e deseja o operariado, de um lado, e o que a esquerda "católica", por outro lado, se esforça por que ele pense e queira. E desde que alguém pretenda verificar isto, o Presidente do Conselho Nacional da TFP sugere o seguinte: "prestar atenção na mais insistente das palavras de ordem da "esquerda católica": conscientizar, conscientizar... Pergunto: a quem? Ao operariado. Do quê? De que há razões para que este se indigne contra os patrões. Concluo: logo, essa indignação é menor do que a esquerda católica quer. E está sendo soprada a golpes de fole por esta" (4).

Fato concreto: esquerdismo é impopular

Em face de tal situação não é de se excluir que uma parte da esquerda católica seja tentada a correr o risco de uma aventura, lançando mão de meios extremos.

Como também é possível que uma parte dela, pelo contrário, se veja na contingência de andar mais devagar no processo de esquerdização, para chegar com mais segurança ao seu termo. Algo disso, aliás, já se tem notado. Os esquerdistas que escolherem tal senda serão seguidos nessas condições? Em outras palavras, aqueles que pulam fora do carro quando este passa a correr demais, permanecerão nele se o mesmo diminuir a marcha?

O futuro representa uma incógnita, até o momento em que se realizarem as promessas de Nossa Senhora em Fátima, fazendo cessar tal processo e concretizando a admirável vitória de seu Imaculado Coração.

Quanto ao presente, uma coisa é certa: mais uma vez ficou provado que o esquerdismo não é popular.

Encontro do Cardeal Arns (centro) com Jimmy Carter, no Rio, em março de 1978.

NOTAS

(1) É o que afirma o correspondente da "Folha de S. Paulo", Ricardo de Carvalho, na edição de 30/3/78 desse matutino.

(2) Idem, ibidem.

(3) Ver, por exemplo, o farto noticiário publicado a respeito no "Diário de Pernambuco", de 1../4/80, e na "Folha de S. Paulo" da mesma data.

(4) Artigo intitulado "Conscientizar, conscientizar...", na "Folha de S. Paulo" de 17/11/80.


Correspondentes da TFP residentes em Campos e outras cidades do norte fluminense estiveram em São Paulo nos primeiros dias do ano, onde foram recebidos pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira (centro), após participar de intensa programação.

O encontro dos correspondentes teve lugar nas diversas sedes da TFP, e foi ocasião para que pudessem atualizar-se a respeito das atividades e metas da associação.


Padre "comunista-cristão" diz-se "profeta"

NOVA YORK — "Sou um comunista-cristão", confessava em 24 de dezembro de 1972 o Pe. Ernesto Cardenal ao repórter Ruben Lau, do jornal chileno "La Nación", quando Allende ainda estava no poder em Santiago.

Durante a visita de João Paulo II ao México, aquele Sacerdote nicaraguense, hoje ministro da Cultura do regime sandinista, chamou a atenção por ter participado da chamada "conferência paralela" de Puebla, acompanhado de dois guerrilheiros de seu país.

Agora lemos no jornal "The Catholic News" (31/ 7/ 80) a seguinte declaração do Pe. Cardenal:

"Como sacerdote eu me vejo como um profeta no sentido bíblico da palavra, o que significa aquele que denuncia injustiças e anuncia um novo reino de justiça na terra. E como poeta eu também sou profeta naquilo que para mim também significa ser um revolucionário".

Afirma ainda o ministro da Cultura nicaraguense: "Estive recentemente em Roma, onde falei com o Cardeal Agostinho Casaroli, Secretário de Estado do Vaticano, e ele me disse que, para o Vaticano, o caso da Nicarágua é diferente, é uma exceção nas normas do Papa. Ele me disse que isto era uma nova experiência, toda uma nova concepção".

No entanto, os fatos vêm comprovando que a "experiência" sandinista não é substancialmente muito diferente da cubana, exceto quanto ao apoio que o regime de Manágua vem ostensivamente recebendo da maioria do Clero.

Pe. Ernesto Cardenal, ministro da Cultura da Nicarágua, diz-se "comunista-cristão".