Carlos Wenzel
A 30 de maio de 1431 - portanto, há 550 anos — chegava a seu termo um dos mais iníquos julgamentos de que se tenha notícia, mas, também, uma das mais sublimes histórias de heroísmo e santidade.
Naquela longínqua manhã de maio, podiam-se avistar, na praça do Mercado Velho, em Rouen, três tablados. Num deles notava-se Henrique de Beaufort, Cardeal de Winchester, entre seus Prelados. No outro, os personagens do sinistro drama: o pregador, os juízes, o bailio e, finalmente, a condenada. Mais além, erguia-se uma terceira plataforma, atulhada de lenha, e que amedrontava pela altura. Na base, um letreiro: "Joana, que se faz nomear a Donzela, dissoluta, invocadora de demônios, apóstata, herética".
A farsa começou com a pregação do mestre Nicolau Midy, um dos luminares da Universidade de Paris, que desenvolveu um tema de São Paulo: "Quando adoece um membro, todos os membros estão enfermos". E concluía pela necessidade de cortar o que estava corrompido para preservar o que estava são.
Ironia da História! Cinco séculos mais tarde Leão XIII lembraria "a iníqua condenação proferida por esses homens, inimigos encarniçados desta Sé Apostólica", e São Pio X, colocando Joana sobre os altares, exaltaria "esta heroína vítima da baixa hipocrisia e da crueldade de um renegado vendido ao estrangeiro" (1).
Em seguida, o juiz eclesiástico, D. Pierre Cauchon, Bispo de Beauvais, declarou Joana herética e relapsa, entregando-a ao braço secular.
* * *
Joana D'Arc cai de joelhos e reza. Levantando-se, protesta sua inocência, e por esta forma, defende seu rei, que a deixava morrer. Pede perdão a todos os presentes e, obtendo um crucifixo, abraça-o, oscula-o, derramando copiosas lágrimas. Chora por si e por esse povo que tanto quisera resgatar: "Rouen, Rouen, morrerei aqui? Serás tu minha moradia?"
Nesse momento supremo, tal é a grandeza encantadora dessa vítima de dezenove anos que a multidão se comove e se põe a chorar. Os próprios fautores do processo também não resistem: Cauchon e o Cardeal de Winchester choram. Mas essas lágrimas de falsidade não impedirão que seu crime se consuma!
Alguns soldados ingleses, impacientando-se com a hora, gritam: —"Como é, Padre, vai fazer-nos jantar aqui?"
Os juízes haviam prolongado ao máximo a cerimônia, na esperança de obter de Joana, senão uma retratação, pelo menos alguma palavra que desmitificasse a legenda de santidade que sobre ela já se formava na opinião francesa. Mas, enfim, era preciso terminar.
Dois oficiais a amarram no local do suplício, e o carrasco ateia o fogo, que sobe lentamente. Ao percebê-lo, Santa Joana D'Arc tem, nesse terrível instante, um desses gestos através dos quais se pode entrever o requinte de perfeição que sua alma atingira: ela convida serenamente seu confessor, que até então estava a seu lado, a deixá-la! A hora de sua libertação ia começar...
As labaredas subiam... Cauchon ainda estava lá esperando ouvir gritos desesperados... Joana não cessava de bradar o nome de Jesus e dos Santos. Envolta já pelas chamas, exclama: — "As minhas vozes eram de Deus, as minhas vozes não me enganaram". Enfim, gritando fortemente o santo nome de Jesus, Santa Joana D'Arc inclina a cabeça: um soldado inglês vê, então, dentre as chamas, evolar-se uma pomba para o lado do então Reino da França, em direção ao céu.
Na árvore esplendorosa do catolicismo francês sempre floresceram grandes Santas que perfumaram com suas virtudes a Cristandade. Para não citar as de nosso tempo, basta ver a influência que tiveram Santa Clotilde na conversão dos francos e Santa Genoveva na salvação de Paris. Vendo-as, quem no entanto imaginaria que naquele entardecer da Idade Média, sob um céu plúmbeo e tempestuoso, floresceria esse lírio alvíssimo que foi Santa Joana D'Arc? Mas o lírio era também uma estrela fulgurante que indicava o caminho, e cuja luz brilhava com os matizes do arco-íris: o dourado da inocência, o rubro da combatividade e a púrpura do martírio!
"Santa Joana D'Arc é uma doce e casta aparição do Céu em meio às agitações tumultuosas da terra, um perfume do Paraíso em nosso triste exílio, é Deus vindo até nós, desta vez ainda por uma senda virginal" (2). Ela reúne em si as vocações mais díspares: tem o ardor de um apóstolo é' a contemplação de uma mística, a candura de uma criança e a sabedoria de um doutor, a delicadeza de uma pastora e a energia de um guerreiro.
"Nela, a natureza e a graça abraçaram-se como duas irmãs; a inspiração divina deixou toda sua parte ao gênio nacional, todo seu livre desenvolvimento ao caráter francês... Ela é um modelo que se pode oferecer às mais diversas condições, à filha dos pastores como à filha dos reis, à mulher do século como à virgem do claustro, aos Padres e aos guerreiros, aos felizes do mundo e àqueles que sofrem" (3).
Na junção de duas eras históricas, ela surge, como um Anjo enviado por Deus, para aliviar as misérias que afligiam seu povo, restaurando a ordem legítima em sua pátria e salvando-a assim, com um século de antecedência, do cisma e da heresia.
Naqueles primeiros anos do século XV, a França e a Inglaterra digladiavam-se numa guerra que já durava 80 anos. Ao mesmo tempo, uma guerra civil dividia os franceses em dois partidos: borguinhões e armagnacs. A miséria e a morte campeavam. O Rei da França, Carlos VI, era louco. O Duque de Borgonha, que tomou o poder, concluiu com o Rei da Inglaterra — em acordo com a Rainha Isabel, esposa de Carlos VI — um tratado pelo qual o monarca francês deserdava o delfim Carlos, seu filho, e oferecia a mão de sua filha Catarina ao soberano inglês. A jovem princesa levaria, como dote, a Coroa da França!
O futuro era sombrio para o delfim Carlos. Os ingleses, aliados aos borguinhões, dominavam o norte do país — exceto o Monte Saint Michel — e preparavam-se para atacar Orleans, no coração da França. Com o tesouro vazio, o exército desmoralizado, a autoridade contestada, abandonado pela própria mãe, Carlos VII duvidava de si mesmo.
Nessa trágica circunstância, a jovem camponesa de Donremy, na Lorena, procurou Roberto de Baudricourt, o capitão de Vaucouleurs, e, sem intimidar-se com a riqueza e gravidade dos homens que o cercavam, disse-lhe:
"Procuro-vos, Roberto, por parte de meu Senhor, a fim de que digais ao delfim que bem se mantenha, pois meu Senhor o ajudará até o meio da Quaresma. O reino não pertence ao delfim, ele pertence ao meu Senhor. Entretanto, meu Senhor quer que o delfim torne-se rei e que tenha o reino em penhor. Ele será rei apesar de seus inimigos e eu o conduzirei à sua sagração".
— "E quem é teu Senhor?"
— "O Rei do Céu".
Mal-humorado, Baudricourt despediu-a, ameaçando surrá-la.
Joana D'Arc retornou a sua aldeia, mas não esmoreceu, pois suas "vozes" advertiram deste aparente fracasso. Que vozes? Ela tinha então dezesseis ou dezessete anos.
Sempre fora uma menina que praticara as virtudes, meiga e piedosa. Nascera numa pequena aldeia, por assim dizer, sob as próprias paredes da igreja. Recebera os primeiros ensinamentos religiosos de sua mãe, narrados com ardente fé, em serões familiares. Certa ocasião, estando no jardim de sua casa, viu uma luz deslumbrante e uma voz lhe soou ao ouvido: "Joana, vai socorrer o Rei da França, e tu lhe restituirás o reino". A luz deslumbrante era São Miguel e ele lhe contava a "grande lástima que havia no Reino da França". Manifestavam-se depois os vultos claros de Santa Catarina e Santa Margarida, com ricos diademas na cabeça, e doces vozes que faziam chorar.
Por ocasião do cerco de Orleans, suas vozes tornaram-se prementes e Joana dirigiu-se uma segunda vez a Vaucouleurs. Nada disse, porém, aos pais, pois temia que a impedissem de viajar, caso lhes revelasse sua missão. Seus juízes, mais tarde, veriam nisso uma ofensa ao quarto Mandamento.
Desta vez, ante a ressonância favorável que Joana encontrou no público local, Baudricourt deixou-se convencer. A um fidalgo que a interrogou, Joana respondeu: "É preciso que esteja diante do rei, nem que tenha que ir a pé, gastando as pernas até os joelhos. Porque ninguém no mundo, nem reis, nem duques, nem a filha do rei da Escócia, pode recuperar o Reino da França. O único socorro sou eu mesma".
Escoltada por cinco cavaleiros, Joana partiu enfim, levando consigo apenas sua fé, sua pureza e sua espada. Atravessaram território inimigo e a viagem foi longa e penosa.
Os soldados que a acompanharam diriam mais tarde que, vivendo a seu lado, jamais tiveram sequer a sombra de um mau pensamento.
No castelo de Chinon, onde se encontrava o futuro Carlos VII, este só se decidiu a recebê-la depois de muita insistência. Mas, para testá-la, disfarçou-se entre outros senhores mais bem trajados. A Donzela, que jamais o vira, dirigiu-se até ele, abraçou-lhe os joelhos, dizendo: "Gentil delfim, chamo-me Joana, a Donzela. O Rei dos Céus vos manda dizer por mim que haveis de ser sagrado e coroado na cidade de Reims. E sereis o lugar-tenente do Rei dos Céus, que é o Rei da França".
Carlos VII ficou pasmo: Joana lhe revelava uma oração que fizera — um segredo entre ele e Deus — num dia de angústia, quando duvidava de sua legitimidade, e portanto de seu direito à Coroa. A Donzela lhe trazia a resposta: "Eu vos digo da parte de Deus que sois o legítimo herdeiro da França e filho do rei".
O príncipe formou uma comissão de teólogos e doutores para examinar o caso. Questionada durante várias semanas, Joana os impressionou pela vivacidade e precisão de suas respostas.
Vendo-os, porém, perderem-se em discussões intermináveis, ela advertiu: "Escutai, no Livro de Deus, há mais do que nos vossos... Eu não sei nem "a" nem "b", mas venho da parte de Deus para levantar o cerco de Orleans e sagrar o delfim em Reims. Antes, tenho que escrever aos ingleses. Escrevei o que vou ditar: "A vós, Suffolk, Classidas e La Poule, eu vos intimo, em nome do Rei dos Céus a voltardes à Inglaterra..."
Os examinadores ouviram boquiabertos... E terminaram por dar um parecer favorável.
Joana podia partir para a realização de sua epopeia: a libertação de Orleans e a expulsão dos ingleses. Epopeia que seria premiada com o martírio, executado pelos que traíram sua pátria e, sobretudo, sua Religião. Mas isto já seria assunto para outro artigo...
Casa de Santa Joana D'Arc, em Donremy (Lorena).
Este pedaço de muro, com os remanescentes de uma alta chaminé gótica, é o que resta da grande sala do castelo de Chinon, onde, em 1429, uma jovem camponesa de dezoito anos anunciou a Carlos VII: "Eu me chamo Joana, a Donzela. O Rei dos Céus vos manda dizer por mim que haveis de ser sagrado e coroado na cidade de Reims..."
A esquerda: tapeçaria do século XV representando a entrada de Santa Joana D'Arc em Chinon (Museu histórico de Orleans).
(1) Pierre Virion, "Le mystère de Jeanne D'Arc", Librairie Téqui, Paris, 1972, p. 139.
(2) Discurso do Cardeal Pie, apud op. cit., p. 248.
(3) Discurso do Cardeal Pie, apud op. cit., p. 248.
(4) H. Wallon, "Jeanne D'Arc", Librairie de Firmin Didot et Cie., Paris, 1892, p. 214.
• Régine Pernoud, "Vie et mort de Jeanne D'Arc", Hachette, Paris, 1953.
Plinio Corrêa de Oliveira
Acabo de ler a notícia de que no PC polonês vai acesa — a propósito da projetada greve operária — a luta entre duros e "moles". Estes últimos pleiteiam concessões ao sindicato livre "Solidariedade", com o intuito de abrandar o ânimo dos fautores da greve. Os primeiros, isto é, os duros, afirmam que concessões jamais abrandam o ânimo de organizações em ascensão como é "Solidariedade". E que, pelo contrário, elas constituem arriscadas manifestações de fraqueza.
Essa divergência tem um alto aspecto teórico-prático. Ela levanta princípios de teoria da ação, a propósito dos quais os homens se vêm dividindo, em todos os tempos e em todos os lugares, no decurso das pugnas ideológicas e políticas mais diversas.
Porém, no caso concreto, está muito menos em foco um alto e aliás belo problema estratégico, do que uma comédia patusca, uma sinistra velhacaria.
Com efeito, aludi pouco acima aos homens: sim, exceção feita dos da linha comunista-leninista, os quais parecem seguir inflexivelmente, desde 1917 até hoje, uma alternação perfeitamente estudada entre avanços e concessões, entre ameaças e sorrisos. No fundo, o empenho invariável deles é jugular o adversário. Se ameaçam e avançam, é para isto. Se sorriem ou concedem, é também para isto. As táticas moles só lhes servem para bobear o adversário, para dividi-lo, e assim despojá-lo, mais rápida e inteiramente, dos meios de luta. Para os leninistas-comunistas, em última análise, toda distensão não é senão um artifício tático. É um modo de guerrear.
Isto posto, não acredito na autenticidade das discussões entre duros e "moles", que estariam sendo travadas nas reuniões de cúpula do PC polonês. Uns e outros são — por convicção ou por interesse — títeres do "lenino"-comunismo instalado em Moscou. Se deixam filtrar para o público opostas teorias da ação, é com algum fim sorrateiro, comum a ambos. Vendo os duros acusarem os "moles" de infiltrantes a serviço de "Solidariedade", e os "moles" revidarem acusando os duros de infiltrantes do PC russo no PC polonês, a meu ver é impossível não desconfiar de que se está em presença de um bem ensaiado show.
* * *
Mas para que tal show? — perguntará algum ingênuo. A resposta é simples. Também em "Solidariedade" — dizem os jornais — distingue-se entre duros e moles. "Solidariedade" não é, entretanto, um bloco monolítico como o PC polonês. Ele se compõe de grupos ideológicos e políticos distintos, aos quais correspondem naturalmente posições temperamentais, como táticas de ação, específicas. Diante da presente alternativa, consumar ou não a greve, é natural, e quase até forçoso, que estejam em desacordo entre si. Reúne-os tão-só a aversão ao comunismo.
Ora, é considerável a utilidade do show comunista.
Com efeito, os moles de "Solidariedade" — pelo menos em sua maioria — são moles autênticos. Como tais, têm certa propensão em acreditar na sinceridade dos adversários. Bem entendido, não na dos duros do comunismo, acerca dos quais todos de além cortina de ferro têm uma experiência horripilante, a qual não tolera ilusões. Mas, pelo menos, tendem a esperar algo dos "moles" do PC polonês. Entre moles, do esperar para o negociar só vai um passo. Do negociar para o concluir só vai mais outro. É tudo tão fácil de combinar quando os dois lados são moles...
Assim, na mesa de negociações entre o PC polonês (do qual o governo de Varsóvia não é senão um títere) e os representantes de "Solidariedade", começa a soprar o zéfiro da concórdia entre "moles" e moles.
O que decorre daí? Os moles de ambos os lados dão a impressão de se estarem rebelando contra os respectivos duros. É possível que cheguem a firmar um acordo de moles, que tenha ares de vitória para a paz, e uma derrota para os duros.
Mas, oh ilusão! Se assim caminharem os fatos, coisa muito diversa se terá passado por detrás dessas aparências enganosas. Os "moles" do PC são meros fantoches dos seus correligionários duros. Eles terão pactuado com os moles de "Solidariedade" única e exclusivamente as concessões que os duros do PC lhes tenham mandado fazer.
Que concessões? As que forem necessárias para abrir nas fileiras de "Solidariedade" uma fissura profunda entre duros e moles, para levar os moles (sempre e por toda parte maioria, pois a Escritura diz que é infinito o número dos estultos) a assumirem a direção de :Solidariedade", desbancando os duros (sempre uma minoria, porque é difícil, ingrato, penoso ser duro).
O que terão ganho com esta artimanha maquiavélica os duros do PC? Terão ganho o óbvio. Quando, entre dois grupos em luta, um começa a ser dirigido pelos respectivos duros e outro pelos respectivos moles, todos os entrechoques passam a ser os do pote de ferro contra o pote de barro...
* * *
Tenhamos a coragem de ver a realidade inteira. A ajudar os moles de "Solidariedade", deve haver, nesse tão simpático movimento, uma esparsa e bem coordenada quinta-coluna comunista. Pois é desde sempre conduta do comunismo reprimir pela força todos os movimentos que contra ele tentem constituir-se. Mas, de outro lado, por pouco que algum desses movimentos pareça durável e capaz de tornar-se perigoso, o comunismo já não se limita a combatê-lo sumariamente de fora para dentro. Sem abandonar as táticas da força, ele começará a usar também as da inteligência. Por exemplo, tentará infiltrar o adversário com espiões e com "desviacionistas". Para ser espião é preciso ter certo grau de inteligência. Muito mais para ser "desviacionista". Consiste a missão deste em infiltrar-se até no cerne do partido adversário, em semear fatores de divisão, em sugerir manobras erradas, em fomentar o desânimo decorrente dos reveses. Ou seja, em produzir a derrota.
Estremeço, a propósito de "Solidariedade", quando penso nisto. Não estará o movimento infiltrado de espiões, de "desviacionistas"? Que mal lhe estarão fazendo?
Tudo isto, para onde vai conduzindo a Polônia e o mundo? Sim, o mundo. Porque na Polônia está sendo forjado um "modelo" que, antes mesmo de ser definido e posto à prova, já vai sendo esperado com avidez pelas esquerdas de todo o mundo.
Os líderes sindicais Walesa e Gwiazda com o vice- primeiro-ministro Rakowski, após as negociações de 31 de março último.
Aparato policial diante da sede dos agricultores poloneses, em Bydgoszcz, ocupada por sindicalistas de "Solidariedade".
Moles e "moles" em negociação, liderados por Walesa e Jagielski (dir.).
Plinio Corrêa de Oliveira
Não tenho idéia de quem constitui o cerne duro de "Solidariedade". E nem do que pensam os deste cerne. Mas, a ver a situação polonesa como ela se apresenta, quanto sou propenso a simpatizar com eles! Outrossim, vejo aqui e lá pessoas que confiam debandadamente em Walesa. E que, às preocupações que externei em meu artigo anterior, oporiam um só mas triunfal argumento: "Walesa não permitirá que ocorra a hecatombe que o Sr. receia". Qualquer desacordo quanto à política de contemporização de Walesa com os comunistas do governo polonês soa-lhes como uma blasfêmia, quase uma heresia.
Penso que há nessa incondicionalidade uma indigência de motivação, de análise, de penetração que me desconcerta.
É verdade que o chefe sindical tem em seu favor a mais universal, contínua e entusiástica sinfonia publicitária. Mas isto não é motivo para se confiar em ninguém. Antes pelo contrário...
Para justificar a incondicionalidade com que alguns o seguem, que bagagem traz ele? O que de notável disse ele alguma vez? O que fez? A essas perguntas, seus mais ardorosos entusiastas nada de substancioso respondem. Limitam-se a lhes fechar os ouvidos, como se fossem blasfêmias.
Não sei o que no passado ele disse ou fez. O grande público não sabe. Se ele fosse um fantoche da demagogia, as coisas não lhe correriam muito diversas. Figuras assim como que não precisam de passado.
O grande dia de glória de Walesa foi quando João Paulo II o acolheu em Roma com honras muito parecidas — a
O grande dia de glória de Walesa foi quando João Paulo II o acolheu em Roma com honras muito parecidas — a comparação é de órgãos da imprensa romana — às que os Papas dispensavam outrora aos monarcas do Sacro Império Romano-Alemão. O que equivale à entrega de um bastão de marechal, de condestável.
O leite chega para os grevistas dos estaleiros de Gdansk. — "Se isso (a greve) durar um ano, resistiremos", dizem os operários.