Eduardo Queiroz da Gama
Abertura do 1º Congresso da CUT, no pavilhão Santa Cruz, em São Bernardo do Campo (SP). Os organizadores afirmaram que mais de 5 mil trabalhadores compareceram ao ato. O local, caso todos os bancos fossem ocupados, teria capacidade para receber pouco mais de 4 mil pessoas...
COM O OBJETIVO de consolidar sua estruturação e engajar a classe trabalhadora do campo e da cidade num amplo plano de agitação rural e urbana, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) realizou seu primeiro congresso nacional - o 1º Concut - em São Bernardo do Campo (SP), nos dias 24, 25 e 26 de agosto último.
Fundada em agosto do ano passado, após congresso realizado naquela mesma cidade, a CUT vem travando feroz batalha com o intuito de encampar os movimentos operários nacionais, quer do campo, quer da cidade.
Apesar de seus esforços, o progresso dessa entidade tem sido lento, pois sérias dificuldades vêm surgindo em seu caminho. A principal delas é, certamente, a falta de engajamento dos trabalhadores nos sindicatos, sobretudo nos de tendência esquerdista. Por exemplo, no ABC paulista, principal reduto da CUT, a porcentagem de metalúrgicos filiados aos sindicatos é apenas de aproximadamente 30%. Por outro lado, a CUT conta com o apoio de somente cerca de 800 dos seis mil sindicatos existentes no País.
Ademais, apesar de contar com o apoio somente de pequena parcela do operariado, a CUT ainda divide com o Conclat (Congresso da Classe Trabalhadora) o controle dos trabalhadores filiados a sindicatos. Agremiação liderada por Joaquim dos Santos Andrade, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, o Conclat recebe a adesão de sindicatos em número idêntico ao dos que apoiam a CUT.
Apoiada pela esquerda católica (D. Cláudio Hummes, Bispo de Santo André - SP; D. Angélico Sândalo Bernardino, Bispo-auxiliar de São Paulo; CEBs e Pastoral Operária), pelo PT - ao qual estão ligados os que controlam a direção nacional da entidade -, pelo PC do B e MR-8, a CUT vai, aos poucos, sobrepujando o Conclat. Este, também esquerdista, é apoiado pelo PCB, mas não recebe respaldo do clero progressista.
Durante o presente ano, a CUT conseguiu que seus candidatos conquistassem a presidência de importantes sindicatos, como os dos metalúrgicos de São José dos Campos (SP), Campinas (SP) e Belo Horizonte (MG).
Na "guerra" pela posse da presidência dos sindicatos, membros do clero de esquerda, ou pessoas ligadas a estes, empenharam-se afanosamente pela causa da CUT. Em Campinas, a Chapa 3, liderada por Durval Aparecido Ferreira de Carvalho, venceu as eleições no primeiro escrutínio (sem necessidade de um segundo), apoiada que foi pelo Pe. Luiz Roberto Benedetti. O sacerdote chegou mesmo a destinar 10% da renda de uma quermesse para a campanha eleitoral da chapa vencedora. Como alguns membros da Pastoral do Batismo da Paróquia do bairro Costa e Silva denunciassem o desvio do dinheiro, o Pe. Benedetti, juntamente com membros do Conselho da Pastoral, emitiu nota explicando sua atitude:
"A Comunidade Cristã [leia-se CEB - Comunidade Eclesial de Base] da Vila Costa e Silva, através de seu Conselho Pastoral .... foi procurada pelo Grupo de Trabalhadores da Comunidade, que propôs a destinação de 10% da renda da Quermesse .... para a Chapa 3 de oposição metalúrgica.
"0 Conselho de Pastoral, entendendo que a proposta da referida Chapa corresponde aos anseios da classe trabalhadora .... deliberou por unanimidade esta doação.
"Chegou a esta conclusão porque, de acordo com o Planejamento da mesma Comunidade e também com o III Plano de Pastoral da Arquidiocese de Campinas, ela apoia os movimentos de Oposição Sindical autênticos nas eleições sindicais de 1984. O Conselho de Pastoral entende que a Chapa 3 é a oposição metalúrgica, sendo que seus membros, dos quais dois deles são desta Comunidade, sempre estiveram presentes na luta pela organização da classe trabalhadora" ("Diário do Povo", Campinas, 30-6-84).
Em São Paulo, nas eleições para a presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, a chapa de oposição, liderada por Hélio Bombardi, foi apoiada pela CUT, PT e Pastoral Operária da Arquidiocese.
D. Angélico Sândalo Bernardino, Bispo-auxiliar de São Paulo e responsável pela Pastoral Operária da Arquidiocese, em entrevista a "O São Paulo" (22 a 28-6-84), órgão oficioso da Cúria, declarou: "A Pastoral Operária não desconhece a importância estratégica do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo na conjuntura nacional em questões sócio-econômico-políticas". Evidentemente, este sindicato, hoje sob uma direção de esquerda tida como moderada, uma vez conquistado pela CUT transformar-se-ia no carro-chefe da agitação trabalhista.
É D. Sândalo Bernardino que levanta a ideia: "Já pensaram o que poderá resultar, com a vitória da Chapa 2, da união, em lutas comuns, dos Sindicatos dos Metalúrgicos de São Paulo, São Bernardo, Santo André e São José dos Campos?" (Com exceção do de São Paulo, todos os outros sindicatos de metalúrgicos mencionados estão filiados à CUT).
Apesar de o Bispo coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo terminar sua entrevista dizendo que "gostaria que saísse, das presentes eleições, robustecida a CUT", a Chapa 2 de oposição perdeu para a chapa da situação, liderada por Joaquim dos Santos Andrade, líder do Conclat.
Avelino Ganzer, vice-presidente nacional da CUT e presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém (PA), propôs uma moção de apoio às invasões de terras e de apoio à luta pela Reforma Agrária. Na foto, apresenta um cartaz onde aparece a figura de "Benezinho', líder sindical morto recentemente no Pará.
O primeiro congresso nacional da CUT pouco se diferenciou do realizado por ocasião de sua fundação. Tendo sido convocado com a finalidade de discutir a modificação de alguns pontos do estatuto da entidade e para eleger nova diretoria, a convenção apresentou como nota tônica a urdidura de agitações urbanas, e principalmente rurais.
A CUT pretende convocar uma greve geral com a finalidade de paralisar o País. A mesma famigerada greve, já decidida no congresso anterior, e que nunca se concretizou.
No tocante ao campo, entretanto, o panorama apresenta-se mais inquietador. Os sindicatos rurais - principalmente os do Pará e Rio Grande do Sul - foram dos mais ativos durante a convenção. Avelino Ganzer, vice-presidente nacional da CUT e presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém (PA), ao fim do congresso propôs que a assembleia da CUT aprovasse moção no sentido de incentivar a invasão de terras. Tal proposta foi aprovada por aclamação, o que representa um índice do espírito de subversão que se observou no congresso.
Como é sabido, o Estado do Pará é hoje palco de sangrenta disputa entre fazendeiros e invasores de propriedades. Estes são respaldados, e muitas vezes até organizados, por elementos do clero de esquerda. Tais invasões de terra têm provocado violentos atritos, e o sangue já começa a correr, quer entre proprietários que lutam na defesa de seus legítimos direitos, quer entre os invasores.
O encontro da CUT contou com amplo apoio econômico e moral. No plano econômico, a Prefeitura de São Bernardo do Campo concedeu uma ajuda de 20 milhões de cruzeiros e metade da alimentação dos congressistas, cedendo ainda local para a realização da convenção.
No tocante ao apoio moral, a CUT foi muito bem servida. O Cardeal-Arcebispo de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns, enviou Waldemar Rossi (membro da Pastoral Operária da Arquidiocese) como seu representante ao congresso. E confederações sindicais de 16 países - alguns comunistas - também se fizeram representar. Lula, o líder nacional do PT, esteve em duas oportunidades no local da convenção, mantendo-se, porém, à margem dos debates.
No local do congresso, podia-se adquirir grande variedade de livros comunistas. Entre eles: "Diário da Guerrilha do Araguaia", "Marx para Principiantes", a "Vida de Trotsky" em quadrinhos, "Batismo de Sangue" (de Frei Beto) etc.
Esse primeiro congresso da CUT foi indiscutivelmente um festival da esquerda. Apesar do pequeno número de participantes (menos de cinco mil - o que representa pouco, levando-se em conta o número de sindicatos existentes no Brasil), é provável que a reunião venha a contribuir ponderavelmente para agravar o clima de agitação em que já vai afundando o Brasil.
Roberto Guimarães
EM VÉSPERAS da definição da sucessão presidencial, não deixa de ser especialmente oportuno averiguar qual o papel que desempenha a crise econômica no Brasil.
Para isso, seria conveniente examinar qual é, para as forças que promovem a subversão da ordem no País, a fórmula mais vantajosa de apresentar a crise econômica. Em outros termos, é importante responder à seguinte pergunta: qual a forma mais eficaz de mostrar a crise ao público, de tal maneira que crie nele uma predisposição para aceitar planos e medidas de cunho socialista e até comunista? É o que veremos a seguir.
Em forma esquemática, seria o seguinte:
1) Apresentar a crise como sendo mais grave do que ela é, ocultando ou diminuindo os aspectos positivos da realidade e aumentando os aspectos negativos. Para isso, jogam um papel essencial as agitações e invasões de terras promovidas pelo clero esquerdista em todo o País, sutilmente apresentadas como fruto do desespero dos trabalhadores agrícolas.
2) Atribuir ao capitalismo a origem da crise econômica, ocultando a principal causa dela: o caráter intervencionista e socialista em aspectos essenciais da economia brasileira.
3) Apresentar as medidas de austeridade como imposições capitalistas arbitrárias, omitindo o fato de que muitas delas são convenientes para a população como um todo, além de, algumas vezes, prejudicarem determinados setores capitalistas, como também certa gama de operários qualificados.
4) Na apresentação e análise da crise, confundir o regime econômico de propriedade privada e de livre iniciativa com os interesses dos grandes capitalistas anônimos e seus representantes nacionais e internacionais, de tal maneira que o público fique predisposto a aceitar reformas de base supressoras da propriedade privada dos meios de produção, sob pretexto de combater os abusos do grande capital.
5) Apresentar casos de corrupção administrativa nos órgãos públicos como uma consequência do sistema capitalista, criando na opinião pública a impressão de que sua substituição por um regime socialista eliminaria tais anomalias na administração da coisa pública.
Não será difícil comprovar a aplicação do esquema acima, considerando o conteúdo de certos jornais, de alguns programas de TV e de sermões proferidos por padres progressistas. São esses, em nossos dias, fatores que se conjugam para criar a respeito da crise econômica existente no País uma imagem que predisponha a opinião pública a aceitar reformas socialistas.
Na raiz do esquema propagandístico acima, adotado pelos articuladores da subversão, vamos encontrar as seguintes teses:
a) a crise econômica é uma crise do sistema capitalista;
b) este é sinônimo de um regime socioeconômico baseado na propriedade privada e na livre iniciativa;
c) portanto, para sair da crise, é indispensável coarctar a propriedade privada e a livre iniciativa.
Essa tese é profundamente errônea. Isso porque, independentemente da origem da situação anômala em que nos encontramos, a propriedade privada dos meios de produção e a livre iniciativa não são, e não podem ser, causa de uma crise econômica.
A razão é muito simples. Crises desse gênero originam-se essencialmente de dois fatores:
1) Os que suspendem o funcionamento da ordem socioeconômica. Por exemplo, guerras, catástrofes naturais (maremotos, terremotos), epidemias etc.
2) Aqueles que não suspendem o funcionamento do sistema, mas que o afetam. Incluem-se nesta categoria decisões erradas de política econômica, como por exemplo, medidas estatizantes; e também transformações bruscas no sistema político e socioeconômico de determinada nação, como seria o estabelecimento de uma tirania.
As crises originadas por motivos compreendidos dentro da primeira categoria podem chegar a justificar, a título temporário e limitado, a supressão da livre iniciativa e da propriedade privada. Não é o caso, entretanto, das crises originadas devido a erros de política econômica. Pelo contrário, habitualmente o fortalecimento da propriedade privada e da livre iniciativa, e não sua coarctação, contribuem para aliviar os efeitos perversos de tais políticas erradas.
Quem defende reformas de base (reforma agrária, reforma empresarial, reforma urbana etc.) que coíbem a propriedade privada e a livre iniciativa, como solução para os problemas econômicos que afligem o Brasil, atuaria como o prefeito de uma cidade que, para resolver o problema dos engarrafamentos de trânsito provocados por erros de sinalização, recomendasse a expropriação dos veículos particulares e os entregasse a motoristas do Estado. É evidente que tais medidas não só não resolveriam o problema do trânsito, mas ainda o agravariam.
A propriedade privada e a livre iniciativa, inclusive para os não proprietários, possibilitam ao homem desenvolver todas as suas faculdades e, desta forma, engrandecer a Nação. Proporcionam horizontes e metas não cogitados num regime socialista, promovendo assim a prosperidade de cada um e do conjunto. Naturalmente, sempre haverá pobres, não como fruto do sistema, mas como consequência das características próprias a cada ser humano.
Um regime onde vigoram a propriedade privada e a livre iniciativa estimula o empregado a realizar um esforço maior e a empenhar-se para conseguir salário mais compensador. E convida o proprietário a melhorar a produção, a buscar novas técnicas para ganhar em competitividade etc. Assim, a propriedade privada e a livre iniciativa (esta, uma decorrência daquela) representam fatores indispensáveis de progresso e de prosperidade.
Portanto, quem culpa a propriedade privada dos meios de produção e a livre iniciativa pelos problemas econômicos existentes no País, revela desatino ou má-fé comparáveis aos do prefeito que, para resolver os problemas do trânsito, decidisse expropriar os carros particulares.