P.02-03

AO LEITOR


"CATOLICISMO" LANÇOU em junho p.p. uma edição especial analisando a agitação que conflagrou algumas áreas rurais e urbanas, nos meses de maio e junho últimos.

Naquele número - ao qual demos o título geral de Brasil em chamas? -, nossa publicação demonstrou que tais agitações, vistas panoramicamente e analisadas no seu espírito, nas suas metas e nos seus métodos, obedeceram a um plano que se estende por todo o território nacional. Tal plano é arquitetado principalmente pela "esquerda católica", envolvendo elementos altamente credenciados na Hierarquia eclesiástica, atuando através de organismos como a Comissão Pastoral da Terra - CPT e as Comunidades Eclesiais de Base - CEBs. Apresentamos à página 3 da presente edição uma síntese dos tópicos principais da matéria estampada no número de junho de "Catolicismo".

Tendo ele alcançado expressiva repercussão, tanto entre nossos leitores quanto no público em geral, chegaram-nos vários pedidos no sentido de "Catolicismo" ocupar-se novamente do tema, uma vez que a agitação prossegue de modo crescente, alastrando-se sempre mais pelo território nacional.

Que saibamos, nenhum órgão de imprensa publicou uma visão panorâmica desses acontecimentos. Explica-se, pois, que "Catolicismo" dedique a assunto de tanta gravidade mais esta edição especial.

Ao lado, o leitor encontrará o índice das matérias que a presente edição especial contém.


Siglas e abreviaturas utilizadas nessa edição

JORNAIS:

AN - "A Notícia", Joinville (SC);

APP - "A Província do Pará", Belém;

AT - "A Tarde", Salvador;

AU - "A União", João Pessoa;

CB - "Correio Braziliense". Brasília;

CBA - "Correio da Bahia", Salvador;

CP - "Correio da Paraíba", João Pessoa;

DP - "Diário do Pará", Belém;

EM - "Estado de Minas", Belo Horizonte;

FE - "Folha do Estado", Goiânia;

FL —"Folha de Londrina" (PR);

FM - "Folha da Manhã", Porto Alegre;

FSP - "Folha de S. Paulo";

FT - "Folha da Tarde", São Paulo;

GP - "Gazeta do Povo", Curitiba;

JB - "Jornal do Brasil", Rio de Janeiro;

JD - "Jornal do Dia", Cuiabá;

JM - "Jornal de Minas", Belo Horizonte;

JTST - "Jornal dos Trabalhadores Sem Terra", Porto Alegre, editado sob a direção do Pe. Arthur Agostini, assessor do "Movimento dos Sem Terra";

OA - "O Ascensor", órgão oficioso da Diocese de Jaboticabal (SP);

OE - "O Estado", Florianópolis;

OEP - "O Estado do Paraná", Curitiba;

OESP - "O Estado de S. Paulo";

OG - "O Globo", Rio de Janeiro;

OL -"O Liberal", Belém;

ON - "O Norte", João Pessoa;

OP - "O Popular", Goiânia;

OPA - "O Panorama", Dourados (MS);

OSP - "O São Paulo", órgão oficioso da Arquidiocese de São Paulo;

TB - "Tribuna da Bahia", Salvador;

ZH -"Zero Hora", Porto Alegre.

OUTRAS PUBLICAÇOES:

"Boletim da CPT", Goiânia, órgão do Secretariado Nacional da CPT;

"O Domingo", São Paulo, boletim litúrgico editado pela Pia Sociedade de São Paulo (Paulinas);

"Renovação", Porto Alegre, órgão informativo da Regional Sul III da CNBB;

"SEDOC", Petrópolis (Ri), Editora Vozes;

"Sem Fronteiras", São Paulo, órgão dos missionários Combonianos.

ENTIDADES:

ABRA - Associação Brasileira de Reforma Agrária;

ACR - Animação Cristã no Meio Rural;

CEBs - Comunidades Eclesiais de Base;

CIMI - Conselho lndigenista Missionário;

CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil;

CONCLAT - Congresso da Classe Trabalhadora;

CPO - Comissão Pastoral Operária;

CPT - Comissão Pastoral da Terra;

CUT - Central Única dos Trabalhadores;

PUCSP - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

OBRAS LANÇADAS PELA TFP:

AS CEBs... - "As CEBs... das quais muito se fala, pouco se conhece - A TFP as descreve como são", Editora Vera Cruz, São Paulo;

AS CEBs... C.D.T. - "As CEBs... das quais muito se fala, pouco se conhece - A TFP as descreve corno são (Comentários e Documentação Totais)", edição mimeografada, Editora Vera Cruz, São Paulo;

SOU CATÓLICO.. - "Sou católico: posso ser contra a Reforma Agrária?", Editora Vera Cruz, São Paulo.


ÍNDICE

1) Ivinhema e Guariba: início de uma revolução social? (p. 3)

2) "Esquerda católica" - "conscientização" - revolução: alerta da TFP - Modorra dos fazendeiros (p. 4)

3) Ante as investidas da "esquerda católica", o que fez, o que

faz e o que pode fazer a TFP (p. 6)

4) Advertência preliminar (p. 7)

5) Organismos religiosos articulam as agitações - Grave ameaça à estabilidade do Brasil (p. 8)

6) Elenco das agitações por Estado:

Rio Grande do Sul (p. 12)

Santa Catarina (p. 14)

Paraná (p. 16)

São Paulo (p. 20)

Rio de Janeiro (p. 31)

Minas Gerais (p. 32)

Bahia (p. 33)

Pernambuco (p. 35)

Paraíba (p. 37)

Ceará (p. 38)

Maranhão (p. 39)

Goiás (p. 41)

Pará (p. 42)

Mato Grosso (p. 47)

Rondônia (p. 48)

Acre (p. 49)

Amazonas (p. 49)

7) Estatuto da Terra: bomba relógio anti-fazendeiro (p. 19)

8) As CEBs - um organismo em crise? - João Paulo II adverte

às CEBs (p.21)

9) 'Romaria da Terra": conclamação de uma guerra contra a

propriedade privada (p. 40)

10) Usucapião rural: invasores resistem para se beneficiarem

da lei (p.46)

11) Papel de Frei Boff e da Teologia da Libertação na agitação

agrária (P. 50)

12) Alguns tópicos do documento do Cardeal Ratzinger sobre

a Teologia da Libertação (p. 51)

13) EM QUADRINHOS:)

As CEBs, este balão furado... Agitação rural: como se prepara - como se realiza - como acabar com ela (pp. 23-30)


IVINHEMA E GUARIBA: ENSAIO DE REVOLUÇÃO SOCIAL?

A INVASÃO da Fazenda Santa Idalina, em Ivinhema (MS) e a revolta dos boias-frias em Guariba (SP) podem ser consideradas como marco característico do esforço comuno-progressista mais recente para provocar uma revolução social sem precedentes na história do Brasil.

Importantes em si mesmos (embora enormemente inflados pelos meios de publicidade), estes dois episódios traziam no seu bojo algo como uma descarga elétrica, própria a exacerbar descontentamentos e mobilizar revoltosos, levando-os, depois de devidamente orientados, a provocar tumultos que apresentavam aspecto de incontenível revolução. Antes de Ivinhema e Guariba, a "esquerda católica" já empreendera lances audaciosos, ao organizar invasões, liderar passeatas e deflagrar greves. Nenhum desses movimentos, entretanto, apresentara tão nitidamente o deliberado propósito de levar adiante - quase se diria a ferro e fogo - a revolução social no Brasil.

Tendo, pois, em vista que se tratava de uma revolução em marcha, "Catolicismo" julgou seu dever consagrar uma edição inteira (n° 402, junho/84) à descrição, com riqueza de pormenores, desses dois lances da guerra psicológica revolucionária comunista, bem como à cadeia de pequenas agitações por eles iniciada.

À guisa de complementação do elenco estampado na presente edição, faremos um rápido relato dos episódios de Ivinhema e Guariba.

Invasão em Ivinhema: a CPT faz sua Reforma Agrária

Procedentes de uma dezena de localidades de Mato Grosso do Sul, de outros Estados e até do Paraguai, cerca de 1.500 pessoas - em sua grande maioria, homens pertencentes ao movimento dos sem-terra - invadiram no dia 29 de abril último a Fazenda Santa Idalina, de propriedade da Someco - Sociedade de Melhoramentos e Colonização S/A.

Quando ocorreu a invasão, o Bispo de Dourados, D. Teodardo Leitz, encontrava-se em Itaici, participando da Assembleia Geral da CNBB. Não hesitou em abandonar a reunião, deslocando-se imediatamente para Ivinhema, onde chegou no dia 2 de maio.

No primeiro encontro com representantes da Pastoral da Terra, que "assessoraram" o movimento dos sem-terra, D. Teodardo Leitz afirmou que a invasão era de seu conhecimento 15 dias antes de ser efetivada.

Acrescentou que foi procurado em sua casa por um grupo de boias-frias, que lhe expôs todo o plano de entrada na propriedade: "Não contei isso a ninguém porque me pediram segredo". Depois, observou: "Mas se me tivessem pedido conselho, diria para não fazerem isso. A invasão foi um ato perigoso de grande ousadia. Perguntei a eles: como vocês vão alimentar-se? E eles me responderam simplesmente que as comunidades cristãs se encarregariam disso" ("OP", 4-5-84).

Note-se que o Bispo não fez nenhum reparo à ilegalidade da ação considerada em si mesma, mas apenas apresentou uma ressalva de caráter estratégico e uma dificuldade prática: a alimentação. Esta última, como afirmou o Prelado, foi solucionada pelas "comunidades cristãs", ou seja, as CEBs.

Quando no dia 14 de maio o Cel. Joli Paes, comandante militar, foi efetivar o mandado de despejo, teve uma surpresa. Pouco depois das 8 horas da manhã, aquela autoridade militar tomou o megafone e convocou os invasores para ouvirem o oficial de Justiça fazer a leitura da ordem judicial. Ninguém se mexeu. Foi como se a ordem não lhes dissesse respeito. Os invasores afirmaram que aguardariam a chegada de D. Teodardo Leitz, pois somente ele daria a palavra final!

Na ocasião, um dos acampados confidenciou a outro: "Se o Bispo disser para a gente sair, a gente sai; mas se ele achar que devemos ficar aqui, ninguém deve sair.... ("FL", 16-5-84).

Mas D. Teodardo concordou com o despejo... pois, conforme assinalou, sua autoridade não era suficiente para manter no local os invasores.

Despejados, os invasores acamparam numa área de quatro hectares em Dourados, de propriedade da Cúria Diocesana, onde continuaram recebendo assistência do Bispo.

Durante sua permanência no acampamento de Dourados, os sem-terra fizeram repetidas pressões para que o governo estadual os reassentasse no Estado. Opunham-se a sair de Mato Grosso do Sul.

Para obter isso, armaram acampamento em frente à Assembleia Legislativa, em Campo Grande, onde permaneceram até meados de junho. Em julho voltaram a pressionar o Governo, interrompendo o trânsito na BR-163 que dá acesso à cidade de Dourados.

Em meados do mês de setembro, o governo do Estado iniciou o reassentamento dos sem-terra numa propriedade de 2.500 hectares no município de Nioaque.

Certamente a CPT já estará computando como uma nova vitória o desfecho dessa invasão, início de sua investida para efetivar a Reforma Agrária "na marra", mais do que na lei.

Revolta de Guariba, operação bem planejada

A revolta (termo usado pela imprensa) dos boias-frias de Guariba foi apresentada como espontânea por muitos órgãos de publicidade. A CPT também tentou afirmar a mesma coisa, sem, contudo, ser convincente.

Na realidade, a aparente espontaneidade da greve dos cortadores de cana de Guariba serviu apenas para demonstrar que ela tinha sido bem planejada, conseguindo os organizadores até mesmo simular uma explosão de descontentamento popular "voluntária".

A greve realizou-se do dia 15 a l7 de maio. No primeiro dia, ao amanhecer, pequeno número de grevistas formou piquetes nas estradas de acesso à cidade, impedindo os trabalhadores de irem para o campo. Pouco depois, dois mil cortadores de cana se aglomeraram na praça da Matriz.

Após curta permanência neste local, 100 boias-frias depredaram os edifícios onde funcionam os escritórios e depósito da Sabesp (companhia de águas), saqueando ainda um supermercado.

O presidente da Fetaesp - Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de São Paulo - Roberto Horiguti, insuspeito de parcialidade, negou ter sido espontâneo o movimento. Suas razões para afirmar isso: o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jaboticabal e Guariba, com a ajuda da CPT, combatia há um ano o novo sistema de corte de cana (considerado como principal motivo da revolta).

O próprio Pe. José Domingos Braghetto, secretário da CPT/SP, declarou que a Pastoral da Terra vinha "conscientizando" os boias-frias.

Em debate sobre os acontecimentos de Guariba, realizado no auditório da "Folha de S. Paulo", em 7-6-84, discorrendo sobre seu trabalho de reorganização dos sindicatos de trabalhadores rurais, o secretário da CPT declarou:

"Além disso a gente procurou na região, dentro dessa perspectiva de ajudar o pessoal, acompanhar o homem do campo nas suas lutas, ajudar a conscientizar um pouco, levantar essa consciência crítica, levantar seus direitos trabalhistas, tão desconhecidos por eles próprios. A gente reunia periodicamente em Jaboticabal - em conjunto com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jaboticabal - estes boias-frias".

O mesmo Pe. Braghetto (à maneira de D. Teodardo Leitz) não se encontrava na região quando estourou a revolta: estava em Ivinhema, onde também "assessorava" os invasores da Gleba Santa Idalina.

* * *

Os grevistas foram também apoiados pelo Bispo de Jaboticabal, D. Luiz Eugênio Perez, e pelo Bispo de Assis, D. Antonio de Souza.

O Bispo de Jaboticabal considerou pequenas as reivindicações dos grevistas de Guariba, e afirmou que eles "poderiam ter exigido mais". A esse título declarou: "É necessário uma ação mais efetiva da pastoral nessa área, de termos entre os trabalhadores agentes bem formados e preparados para atuarem com critérios evangélicos nestas oportunidades" ("OA", 1°-6-84). Já o Bispo de Assis, após tentar a justificação da greve dos boias-frias, afirmou que há "necessidade urgente de promover uma reforma agrária estruturada com base no Estatuto da Terra" ("FSP", 17-5-84).

Em Nota à Opinião Pública, o secretariado nacional da CPT declarou: "Os boias-frias em São Paulo, os Sem Terra do Sul do Brasil..... tomaram em suas mãos as lutas para vencer a miséria imposta pela política econômica do governo. .... É feliz e promissora tal iniciativa: este é o caminho que apoiamos e gostaríamos que todos que querem estar com o povo também apoiem" ("Boletim da CPT', mai.-jun./84, p. 9).

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