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| BAHIA | (continuação)

em Pau-de-Colher. As reuniões são realizadas no mato, sob o comando de pessoas que vêm de fora; elas falam de muita coisa importante, mas eu sou desconfiado e temo uma nova guerra de caceteiros" ("AT", 3-9-84).

JUAZEIRO

Bispo indiciado como coautor de chacina

D. José Rodrigues, Bispo de Juazeiro, além de apoiar o trabalho do Pe. Almeida em Casa Nova, vem pessoalmente insuflando o descontentamento entre trabalhadores rurais.

Em fevereiro último, durante o período de intensa seca, um grupo de trabalhadores rurais que vinha sendo "orientado" por D. José Rodrigues interrompeu o tráfego sobre a ponte do rio Salitre, numa região conhecida como Campo dos Cavalos, próxima a Juazeiro. Com a intenção de prejudicar as plantações de grandes fazendas, os grevistas desligaram os transformadores da rede elétrica, impossibilitando o funcionamento das bombas de irrigação. Dois produtores rurais (um deles subgerente do Banco do Brasil) foram ao local tentar convencer os trabalhadores a religarem os transformadores, sendo recebidos a bala e assassinados no ato.

No mesmo dia, pouco depois do incidente, D. José Rodrigues esteve no local. Em seu retorno a Juazeiro, não teve uma única palavra de reprovação pelo duplo assassinato, limitando-se a afirmar que se a seca continuasse, muito sangue ainda iria correr na região ("CBA", 8-2-84).

Em abril, D. José Rodrigues foi indiciado em inquérito policial, como "coautor ativo" da chacina, sendo que dois trabalhadores foram responsabilizados pelo crime.

Tendo em vista a atuação subversiva do Bispo de Juazeiro, o deputado estadual Raimundo Sobreira sugeriu que D. José Rodrigues fosse convidado a comparecer à Assembleia Legislativa, a fim de explicar os fatos. Afirmou também ser favorável à transferência do Prelado, uma vez que "não prega o Cristianismo, e sim a luta armada" ("Ar', 17-5-84). O Cardeal D. Avelar Brandão Vilela veio a público para discordar do deputado quanto à transferência do Prelado agitador. Considerou apenas razoável que D. José Rodrigues comparecesse à Câmara para explicar "sua filosofia de trabalho" ("AT", 17-5-84).

MONTE SANTO

Padre progressista "conscientiza" "posseiros"

O Pe. Enoque de Oliveira desenvolve nesse município do sertão baiano, ativo trabalho de formação de Comunidades Eclesiais de Base. Nas últimas eleições, engajou-se na campanha política, apoiando o atual prefeito de Monte Santo, Ariston Correia de Andrade.

Entretanto, as atividades do sacerdote progressista não estão sendo bem vistas pelas autoridades locais, as mesmas que foram auxiliadas por sua atuação durante as eleições. Recentemente, o Pe. Enoque acusou pessoas ligadas ao prefeito da cidade de o estarem ameaçando de morte, devido à ação que desenvolve junto aos trabalhadores rurais e "posseiros".

A CPT da Diocese de Senhor do Bonfim saiu em defesa do sacerdote agitador, elogiando seu trabalho de "conscientização" dos trabalhadores: "Há alguns anos não havia em Monte Santo qualquer trabalho de conscientização, mobilização e organização dos trabalhadores, sobretudo do campo, apesar das grandes e violentas grilagens que ocorriam. .... Diante de tudo isso, a Comissão de Pastoral da Terra de Bonfim reitera seu total apoio ao trabalho desenvolvido pelo Pe. Enoque" ("Ressurreição e Vida", boletim da Diocese de Senhor do Bonfim, jun./84).

CARINHANHA

CPT apoia invasões

Apesar de não ter sido noticiado nenhum conflito recente nessa zona, é intensa a atuação da CPT e do Sindicato de Trabalhadores Rurais - STR desse município em favor de invasores de terras.

A 15 de fevereiro último, o presidente do STR de Carinhanha foi preso juntamente com oito invasores da Fazenda Pau de Trempe. Na ocasião, além de divulgar nota em defesa dos invasores, a CPT, a paróquia de Carinhanha, o STR e a FETAG organizaram manifestação de protesto de trabalhadores em frente à Delegacia de Polícia (cfr. "O Realista", n° 30, jan.-fev./84, boletim da Pastoral da Juventude de Santa Maria da Vitória).

Em março, dia 21, teve lugar nova manifestação de solidariedade aos invasores. A Pastoral da Juventude de Santa Maria da Vitória externou também seu apoio: "O grupo jovem de Santa Maria da Vitória e todos os jovens da Diocese aqui representados pela equipe, através desta nota, quer demonstrar o nosso apoio aos posseiros da comunidade de Carinhanha" ("O Realista", n° 31, mar.-abr./84).

PAU BRASIL

Os falsos índios

Oitocentos índios pataxó hã-hã-hãe invadiram a Fazenda São Lucas, em 1982, mantendo-se até hoje na propriedade. Em agosto úItimo, quando parecia iminente um enfrentamento entre indígenas e fazendeiros, uma comissão de deputados, chefiada pelo deputado federal Mário Juruna, esteve no local.

Depois de conversar com os silvícolas, o deputado Juruna declarou: "Não existe índio na Fazenda São Lucas. É tudo caboclo de cabelo enrolado. Os caciques pataxós Saracura e Samada não são índios também. São criadores de problemas e, se depender de mim, eu retiro todos aqueles caboclos da área" ("JB", 31-8-84).

Embora concorde que não há índios na fazenda, D. Paulo Lopes Faria, Bispo de ltabuna, tem auxiliado os invasores a se manterem na propriedade (cfr. "AT", 4-9-84). Depois de visitar a Fazenda São Lucas, em 2 de julho, lançou a "Campanha Diocesana de Ajuda aos Pataxós".

ITAETÊ

Impedida procissão "reivindicatória"

Na última festa de São João Batista, dia 24 de junho, Frei Ivo tentou dar um caráter reivindicatório à procissão que seria realizada no povoado de Rumo. Cerca de seis mil pessoas vivem nessa localidade, que não possui fornecimento de água. Os habitantes compram ou buscam água no rio Una, distante quatro quilômetros do povoado.

A fim de pressionar a Prefeitura a atender as necessidades de água da pequena vila, Frei lvo organizou uma procissão com a imagem de São João Batista, padroeiro do povoado de Rumo, durante a qual várias pessoas deveriam caminhar com panelas e latas vazias.

Por solicitação do prefeito de ltaetê, a polícia militar impediu a procissão, desvirtuada pela intenção do sacerdote de imprimir-lhe um significado contestatário.

Empenhado em sua campanha, Frei Ivo esteve com o Bispo de Rui Barbosa, D. Mathias Schimidt, o qual, segundo ele, "se prontificou em analisar o problema e pedir providências para que seja realizado o abastecimento de água para o povoado" ("TB", 3-7-84).

OUTRAS ÁREAS DE CONFLITO

CPT informa com conhecimento de causa

A CPT da Regional Nordeste III da CNBB indica outras áreas de conflito, sobre as quais os jornais nada noticiam. Estas, certamente, são do conhecimento desse órgão eclesiástico, uma vez que ele exerce naquela zona uma certa atuação.

"Em vários pontos do Estado, os mutirões, inclusive na defesa da terra, assim como novas formas de luta, têm se multiplicado.

Em Una, os posseiros vêm lutando e resistindo na posse de suas terras. .... Em Wenceslau Guimarães, mais de 2.000 posseiros vêm enfrentando violenta repressão, mas se organizando e lutando . .... Em Caém os posseiros enfrentaram os grileiros e seus pistoleiros, fazendo-os recuar . .... Em Juazeiro e Santa Maria da Vitória .... os trabalhadores se organizam e reagem energicamente à violência imposta pelos grileiros e seus aliados. Da mesma forma, em Itapicuru, Uauá, Simões Filho e outras regiões da Bahia, os trabalhadores já deram provas de resistência, não aceitando as cercas construídas pelos grileiros em suas terras, tendo se organizado para derrubá-las coletivamente" ("SEDOC", set./84, col. 243).


A TERRA É INACESSÍVEL AO LAVRADOR?

Roberto Guimares

PRÉDICA constante da esquerda é que no Brasil o homem do campo dificilmente tem acesso à propriedade da terra.

De acordo com informações do Banco Mundial, dentre os países em vias de desenvolvimento, o Brasil é o que tem uma das maiores porcentagens de trabalhadores com terra (proprietários, parceiros, arrendatários), em relação ao total da população que trabalha no campo.

Por outro lado, o número de proprietários em relação ao total da população vem crescendo constantemente. No ano de 1950 essa relação era de 16,9%, em 1960 subiu para 20,0%, em 1970 para 23,6%, e em 1980 para 26,8%.

Tendo em vista que os menores de 24 anos e as mulheres são, em sua maioria, dependentes de um pai de família, as porcentagens acima deveriam ser corrigidas mediante a exclusão dessa parcela da população. Fazendo-se tal exclusão, as porcentagens aumentam para os seguintes valores: 1950 - 30,3%; 1960 - 36,9%; 1970 - 42,2%; 1980 - 50,61/6. Ou seja, pode-se dizer que 50% da população que trabalha no campo, e que potencialmente pode ser proprietária, já é de fato proprietária. E que tal proporção aumentou significativamente entre os anos de 1950 e 1980 (cfr. "Sou católico; posso ser contra a Reforma Agrária?" e Censo Agropecuário de 1980).

A REALIDADE mostra que a situação do trabalhador do campo é bem diversa daquela de um pobre explorado por uma estrutura inumana.

Sem negar que possam existir bolsões de pobreza que exijam remédio urgente (o que precisa, aliás, ser documentadamente exposto e demonstrado, a fim de evitar as generalidades demagógicas), numerosos estudos provam, entretanto, que durante as décadas de 60 e 70 os salários de todas as categorias de trabalhadores rurais, em quase todos os Estados da Federação, tiveram um aumento significativamente maior do que a inflação. A taxa de aumento do salário real (descontada a inflação) no período que vai de 1966 a 1979 foi a seguinte, por categoria de lavrador: administrador: 5,8%; capataz: 5,3%; tratorista: 3,8%; trabalhador permanente: 4,5%; trabalhador eventual: 6,3% (cfr. "Análise do mercado de trabalho na agricultura brasileira", in "Revista de Economia Rural", julho-setembro de 1983).

Essa tendência ascensional do salário real parece não se ter mantido entre os anos 80 e 83, de acordo com dados disponíveis do Estado de São Paulo (cfr. "Prognóstico 84/85", da Secretaria da Agricultura de São Paulo).

Entretanto, para qualquer espírito desapaixonado, parece evidente que tal inversão de tendência, verificada nos últimos anos, nada tem a ver com a estrutura agrária. Ela é fruto da recessão econômica, como, aliás, o indica o fato de que quase todas as categorias profissionais sofreram uma queda em suas remunerações.

NUMEROSOS estudos econômicos mostram que os bolsões de pobreza se concentram especialmente em áreas onde predomina o pequeno produtor. A baixa produtividade desses estabelecimentos tem sua origem no emprego de técnicas inadequadas e na má organização, sendo agravada por uma política econômica que penalizou este setor.

Portanto, não tem sentido querer resolver os problemas de pobreza aumentando o contingente de pequenos produtores, como se pretende fazer através da Reforma Agrária. O bom senso indica que o certo seria, antes de tudo, acabar com a penalização da agricultura e dar assistência ao pequeno produtor. Se isto já é uma tarefa difícil com o atual número de pequenos produtores, ela se tornaria praticamente impossível após uma Reforma Agrária.

É o que demonstram as fracassadas experiências de Reforma Agrária, em diversos países. Elas aumentam bruscamente o número de pequenos produtores, que passam a viver inteiramente dependentes de onerosíssimas subvenções estatais.

Deixando de lado os países sob o jugo comunista, nos quais a Reforma Agrária é aplicada até as últimas consequências apesar de seus desastrosos resultados, o que sucede costuma ser o seguinte: diante do fracasso da experiência reformista e do esgotamento dos recursos, o processo para, como ocorreu no México, no Chile, na Bolívia e em outras nações. O setor agrícola fica então dividido em duas zonas: um território submetido à Reforma Agrária, produzindo, quase sempre, apenas para seu próprio sustento e deixando, muitas vezes, a terra abandonada; e o setor não atingido pela Reforma Agrária - o qual continua a produzir e alimentar o país - que acolhe, com frequência, como assalariados os minifundiários "favorecidos" por aquela Reforma, e que fogem dela...


PERNAMBUCO
POR TRÁS DA GREVE, EFICIENTE AÇÃO DE ORGANISMOS RELIGIOSOS

ABORDANDO o presente documentário apenas as agitações rurais e urbanas que, direta ou indiretamente, são organizadas ou apoiadas pela "esquerda católica", poderia alguma pessoa estranhar o fato de incluirmos aqui a greve dos canavieiros de Pernambuco, decretada no dia 23 de setembro último pela Contag (Confederação dos Trabalhadores na Agricultura), pela Fetape (Federação dos Trabalhadores Rurais de Pernambuco) e por sindicatos de trabalhadores rurais daquele Estado.

É que a Contag tem atuado em estreita colaboração com a CPT e a CUT. Vejamos algo sobre a Fetape e os sindicatos de trabalhadores rurais.

Quem manobra nos bastidores?

Quando em setembro de 1980 eclodiu uma greve de proporções inéditas nos canaviais, engenhos e usinas de Pernambuco, um jornal de São Paulo trouxe ampla reportagem sobre o sindicalismo rural naquele Estado. Eis alguns tópicos principais daquela matéria:

"A ação da Igreja - A organização que permitiu a paralisação quase total de 250 mil homens e mulheres, em sua grande maioria analfabetos, é resultado de longo e paciente trabalho da Igreja Católica.

Em 1964, três grupos estavam empenhados em organizar os trabalhadores dos canaviais pernambucanos: o grupo do então deputado Francisco Julião, com as Ligas Camponesas; o PCB e a Igreja, que fundavam sindicatos dentro dos padrões do Ministério do Trabalho. Depois de 31 de março de 64, foram afastados dos campos o grupo de Julião e o PCB. Restou a Igreja, que, com grande dificuldade, devido à desconfiança e ao medo deixados pela repressão inicial, pacientemente foi conscientizando os trabalhadores e organizando-os em sindicatos legais. Hoje, praticamente toda a estrutura sindical rural em Pernambuco é ligada à Igreja.

Três organismos religiosos são os principais responsáveis pela organização dos trabalhadores: a Regional II da CNBB (Bispos do R. G. do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas), a Pastoral da Terra (padres, religiosos e leigos que se dedicam aos problemas rurais) e a Animação Cristã no Meio Rural, dirigida pelo padre José Servat e que leva aos campos os ensinamentos de Medellin e Puebla.

À frente do secretariado da Regional II da CNBB está o ex-padre Paulo Crespo que, como vigário de Jaboatão, foi antes de 64 um dos principais organizadores dos trabalhadores rurais.

Os 46 sindicatos que estão em greve [a de setembro de 1980] são orientados pela Federação

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Os holofotes do IV Poder (a imprensa) focalizam os gestos da oratória demagógica de D. Helder, enquanto ele explica - sem velames - em conferência na Catedral de São Paulo, como auxilia as invasões de terrenos urbanos...