São Francisco de Assis - Pintor anônimo, século XIII, Capela de São Gregório, Subiaco (Itália), O afresco foi pintado em vida do "Poverello', antes de 1224, ano em que ele recebeu os estigmas. Compreende-se, pois, que estes não figurem nessa admirável obra de arte.
ÚNICA PINTURA de São Francisco efetuada ainda em vida do "Poverello" é o admirável afresco que reproduzimos nesta página. Ele se encontra na capela de São Gregório, uma das que compõem o famoso complexo de capelas de Subiaco, inserido no rochedo como um "ninho de andorinhas", segundo a expressão do Papa Pio II. Elas foram construídas sobre o "Speco", a gruta na qual São Bento habitou como eremita no século VI. Um conjunto de mosteiros beneditinos foi construído, em épocas diversas, nessa região onde ainda pairam as bênçãos do Patriarca dos monges do Ocidente e o perfume de suas insignes virtudes.
Embora grandes mestres da pintura universal tenham deixado afrescos e quadros célebres representando São Francisco, como Ghiotto e Simone Martini, nenhuma dessas obras de arte se equipara à impressionante pintura da capela de São Gregório.
É provável que o artista, contemporâneo do fundador da Ordem franciscana, o tenha conhecido pessoalmente, podendo retratá-lo com uma objetividade ímpar, impossível de ser atingida por famosos pintores que viveram após a morte do "Poverello".
A pintura apresenta sensíveis diferenças em relação à iconografia corrente do santo. Mas depois de uma análise mais detida, observa-se que de tal maneira ela coincide com o relato autêntico de sua vida - tão deformada por certos autores de orientação progressista - que se compreende a exclamação de um observador lúcido: "Ele deve ter sido assim!". E considerando-se o fato de o pintor possivelmente ter visto São Francisco, também é explicável que se considere o afresco quase como um retrato do Santo que inspirou os "Fioretti''.
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Afirmar que a pintura, com simplicidade de traços, reflete a alma humilde do Santo que desposou a "dama pobreza", é uma verdade, mas ao mesmo tempo poderia considerar-se um lugar comum.
Pois, quando se escreve sobre São Francisco, em geral acentuam-se de modo quase exclusivo suas incomparáveis simplicidade e humildade, aliadas à virtude que mais o caracterizou: a pobreza.
Há, porém, uma série de outras virtudes que esta fisionomia mais reflete. Ela denota grande fortaleza e extraordinário domínio de si. Mas é uma fortaleza que não contém nada de força bruta. É uma força que provém toda de arraigada convicção.
Além disso, neste rosto transparece inocência virginal, sumamente reta. Ele também revela uma alma profundamente convicta de sua própria inocência e disposta a chegar às últimas consequências em todas as suas ações. E sendo inocente, compreende-se que na mesma fisionomia haja igualmente pureza ilibada, quase inexprimível. Tudo isto vem aliado à doçura.
Se um homem irresoluto fixa este afresco, é natural que ele perceba como que uma censura. O olhar de São Francisco denota uma retidão que parece penetrar o íntimo do observador. E o confronto se estabelece: de um lado, a alma dotada de certezas inabaláveis, de convicções profundas; de outro, o espírito relativista, hesitante e débil.
E para concluir, poder-se-ia perguntar: qual a relação entre a virtude rectrix praticada por São Francisco - a pobreza - e esse rico complexo de outras virtudes? A pobreza é um meio para se atingir esse grau de força, de pureza, de retidão, de firmeza de espírito. O "Poverello" de Assis, praticando uma inigualável pobreza, desapegou-se tanto de todas as coisas que se tornou possível tal ascensão espiritual.