| ESPANHA |(continuação)

em dificuldades, temos sido socorridos.

Há quanto tempo estão andando?

Saímos de Roncesvales, junto à fronteira da França, há dez dias, e já percorremos uns 270 quilômetros. Calculamos estar em Santiago dentro de uns quinze dias.

Que rotina seguem durante o caminho?

Bom. Levantamo-nos antes do amanhecer para aproveitar o frescor das primeiras horas do dia. Tomamos o café-da-manhã no primeiro lugar aberto que encontramos, e com as forças restabelecidas dispomo-nos a enfrentar os calores do caminho. Caminhar, sempre caminhar, é a vida do peregrino. Por volta do meio da tarde, geralmente, terminamos o percurso prescrito daquele dia. Então procuramos um lugar onde passar a noite. Lavamo-nos, curamos as feridas e saímos à procura de alguma igreja para comungarmos, se não tivermos comungado antes.

Até que ponto é proveitosa uma peregrinação assim, e por que vão vestidos à moda antiga?

Proveitosa ela o é sob todos os pontos de vista. Espiritualmente sobretudo. O cansaço é tremendo, ainda mais sabendo que faltam 500 quilômetros, e tendo os pés cheios de chagas. Manter sempre o ânimo elevado exige muito esforço. Somos vistos como penitentes pelas pessoas, e isso humilha, não há dúvida, mas a eles creio que faz bem ver alguns que se submetem à penitência. E portanto, o traje tem sua função, além de proteger muito durante o caminho.

A Espanha de sempre

Os peregrinos contaram-me um sem fim de pequenos fatos pitorescos. Por exemplo, em uma pousada, creram que um deles, o mais jovem, era o príncipe herdeiro da Espanha, D. Felipe, pois realmente em alguns momentos tem um ar muito parecido.

Com grande pesar — por que não dizê-lo também — cansado de haver caminhado bastante enquanto conversava com eles, despedi-me dos dois com o brado tradicional dos peregrinos: "Ultreia!", que quer dizer "Adiante! Mais além!"

Senti grande contentamento ao reencontrá-los, dezesseis dias depois, às portas de Santiago. Estavam transbordantes de alegria. Não conseguiam cumprimentar a todos os que se aproximavam. Ali me mostraram o diploma que os qualifica como peregrinos, e que foram selando ao longo do caminho nos mosteiros e prefeituras.

Mostraram-me também o diário que vinham redigindo, assim como os mapas dos caminhos percorridos.

O peregrino, ao chegar a Compostela, sente-se como se estivera em sua casa. Cumprimenta ali todo mundo, encontra-se com outros peregrinos que saudou pelo caminho, e cria um ambiente especial que dá a nota na cidade. Além disso, na festa do Apóstolo, é colocado em funcionamento o imponente "Botafumero": trata-se de um gigantesco turíbulo de mais de um metro 'de altura!

Meu afortunado encontro com esses peregrinos foi-me de grande utilidade, pois corrobora a impressão que tinha do nosso povo espanhol. Explico-me. Uma coisa é a "Espanha oficial", socialista e amoral, que pretende dar a impressão de que os valores eternos ninguém mais os considera, e outra é a "Espanha real" que nos prova que a população tem uma adesão subjacente, mas ainda verdadeira, às tradições católicas da Espanha de sempre.

Felipe Barandiarán

1) Trata-se de São Tiago Maior, irmão de São João Evangelista, que presenciou a transfiguração de Jesus no Monte Tabor, e com Ele esteve durante Sua agonia no Horto das Oliveiras. Não confundir com outro Apóstolo, São Tiago Menor, primo de Nosso Senhor e autor de uma das Epístolas contidas na Sagrada Escritura. 2) Os fatos aqui narrados são autênticos.

A "compostelana" é o certificado que o cabido de Santiago de Compostela fornece ao peregrino que visitou o sepulcro do Apóstolo. Além do aspecto honorífico, proporciona também comida e cama por três dias para a reposição das forças.


| DESTRUIÇÃO DA FAMÍLIA |

Pílulas e aborto dizimam população alemã

A JOVEM REPÚBLICA Federal da Alemanha, constituída após a II Guerra Mundial, está ficando velha. Pela primeira vez na história da Europa, uma nação registra um decréscimo paulatino de sua população em época de paz, com o risco de se transformar num país em que as pessoas idosas constituem a maioria da população.

Um estudo recém-publicado, do historiador-econômico berlinense, Wolfram Fischer, intitulado "Manual de história econômica e social da Europa", apresenta por primeira vez a demografia europeia como leitmotiv de uma descrição histórica.

Segundo o autor, nunca houve na história da Europa um período de estagnação ou retrocesso demográfico. A população medieval não deixou de crescer e se expandir até o século XIV, quando a "peste negra" pela primeira vez empreendeu uma cruel colheita de vidas nos países europeus. A cultura urbana e o comércio ficaram arruinados durante várias gerações. Seguiram-se as explosões do fanatismo religioso (protestante). O retorno a uma relativa normalidade permitiu uma ascensão demográfica, apesar das guerras, catástrofes, fome e epidemias havidas.

A guerra dos 30 anos desferiu novo e trágico golpe sobre a população: de cada três alemães, um morto. Cultura e capital, poder e orgulho das cidades alemãs entraram em agonia, da qual, de algum modo, nunca se refizeram.

A revolução industrial do século XIX, com o rápido aumento da produção de bens de consumo, foi acompanhada por um grande aumento da população.

As duas grandes guerras estancaram na Alemanha essa dinâmica e, pela primeira vez na história, o problema que se põe agora não é a expansão demográfica, mas o retrocesso, o murchamento populacional. O exército alemão já foi atingido pelas consequências do fenômeno. A falta de recrutas para a formação de seus quadros poderá trazer consequências graves para a política interna e externa germânica, atualmente ainda imprevisíveis. As escolas estão se ressentindo da falta de alunos, e os fabricantes de brinquedos estão voltando sua atenção para o entretenimento de adultos. As grandes empresas estão à procura de aprendizes, várias universidades de fundação recente estão à procura de estudantes e as companhias seguradoras de pensões à procura de pagadores...

Desde 1974, especialmente em consequência da propagação da amoralidade, e dos amargos frutos da revolução da Sorbonne de 1968, o número de habitantes na Alemanha vem diminuindo ano após ano, sem cessar. Cálculos estimativos preveem para o ano de 2030 uma população de 42 milhões de habitantes, o que representa apenas 2/3 da população atual.

Pílulas anticoncepcionais e aborto legalizado e pago pelo Estado são os grandes promotores dessa sorrateira catástrofe!

Beno Hofschult


| TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO |

Frei Clodovis: peregrinação (ou viagem-prêmio!) a Moscou

HÁ UM SENTIMENTO conatural à alma humana que leva o homem a querer visitar os lugares nos quais se passaram episódios especialmente marcantes relacionados com sua Fé, ou onde esta se expandiu com mais vigor. Qual é o católico, verdadeiramente fervoroso, que não gostaria de seguir as pegadas de Jesus na Terra Santa? A Roma dos Papas, quantas e quantas peregrinações não atraiu ao longo dos séculos!

Os irmãos Boff e Frei Betto não são exceções a essa regra. A fé marxista que os anima levou-os a peregrinarem — acompanhados de um protestante e mais três pessoas — pela Rússia comunista, em junho do ano passado (1).

Peregrinação bastante complicada essa, por ser feita em campo minado. Apesar do terreno bastante difícil, os alegres romeiros nada tinham a temer. Sua atuação anterior, tanto no Brasil quanto em outros países do Ocidente, dava-lhes credenciais de sobra para provar sua irrestrita fé nos. dogmas de Marx, de modo que houve até quem se perguntasse se não se tratou de uma viagem-prêmio...

A versão oficial, apresentada por Frei Clodovis, é que a viagem se fez a convite "da igreja ortodoxa russa, na proximidade do milênio do Cristianismo naquelas terras (988-1988)". Curiosamente parece ter havido grande sofreguidão do clero da Igreja cismática russa, comumente chamada Igreja Ortodoxa — cujos dirigentes, como se sabe, são subservientes ao comunismo moscovita — em querer abraçar seus amigos brasileiros, pois não tiveram paciência para esperar a Mia do milênio, mas contentaram-se já com a "proximidade" deste. O fato é que nas apreciações jornalísticas que publicaram na revista "Vozes" sobre sua viagem, os "devotos romeiros" não fazem alusão a qualquer comemoração havida a propósito do alegado milênio, o qual parece não ter passado de pretexto para a tournée.

Eles provavelmente teriam preferido receber um convite diretamente de Gorbachev ou de seus ministros, mas pelo que consta dos relatos que fizeram, o máximo representante soviético a que tiveram acesso foi o "Presidente do Conselho para Assuntos Religiosos junto ao Conselho de Ministros". Tratados, portanto, como visitantes de segunda classe.

Porém, abnegados apóstolos que são de suas crenças, os peregrinos não se abalaram com isso e publicaram, ao retornar, matérias sobre sua viagem, altamente laudatórias do socialismo, na revista "Vozes", de Petrópolis, n? 6, novembro/dezembro de 1987, edição especialmente dedicada à dita viagem.

Na presente edição, faremos algumas considerações sobre o artigo de Frei Clodovis Boff, "Carta teológica sobre a União Soviética", que é o que mais importa, por apresentar o relato da viagem. Deixaremos para o próximo número a análise sucinta dos artigos de Frei Leonardo Boff e de Frei Betto.

Anormalidade "normal"

Frei Clodovis encarrega-se de oferecer-nos o roteiro comentado da viagem. Esforça-se por parecer imparcial: elogia e critica. Mas tudo segundo um critério "moral" único e preconcebido, ou seja, é bom o que realiza o socialismo ou conduz a sua realização, mau o que afasta dessa meta.

Assim, mostra-se ele contrário a uma "exaltação romântica ou ideológica da União Soviética como sendo o 'socialismo realizado"'. Em outros termos, se fosse o "socialismo realizado" mereceria ser exaltada. E mais adiante acrescenta: "O socialismo soviético está ainda a caminho, deve ainda tornar-se o que é". Na realidade — e isso fica claro em vários tópicos dos artigos do número da "Vozes" aqui analisado — o para onde Frei Clodovis e seus companheiros rumam ideologicamente é o socialismo auto gestionário, meta última do comunismo (2).

Em seu artigo, em forma de carta, Frei Clodovis insinua a existência de uma certa liberdade na Rússia, mas os dados concretos são apenas aflorados superficialmente. Fala em "passeios pela cidade em livrarias, mercados, lojas etc.", mas evita dizer o que tais estabelecimentos tinham para vender. Andou por vários conventos

Frei Clodovis Boff reconhece que "nas filas, numerosas pessoas aí estão como resignadas, avançando sem pressa, falando baixo ou mesmo em silêncio.

Em sua "Carta teológica sobre a União Soviética", Frei Clodovis Boff faz um relato da peregrinação dos "teólogos da libertação" brasileiros nas plagas leninistas.

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