| NOSSA SENHORA E A LUTA CONTRA A REVOLUÇÃO |(continuação)

onde uma simples chispa pôs fogo em tudo.

Estas e outras considerações tiradas do ensinamento da Igreja abrem perspectivas para o Reino de Maria, isto é, uma era histórica de Fé e de virtude que será inaugurada com uma vitória espetacular de Nossa Senhora sobre a Revolução. Nessa era, o demônio será expulso e voltará aos antros infernais, e Nossa Senhora reinará sobre a humanidade por meio das instituições que para isso escolheu.

O Reino de Maria e a união de almas

Quanto a essa perspectiva do Reino de Maria, encontramos na obra de São Luís Maria Grignion de Montfort algumas alusões dignas de nota. Ele é sem dúvida um profeta que anuncia essa vinda. Disso fala claramente:

"Quando virá esse dilúvio de fogo do puro amor, que deveis atear em toda terra de um modo tão suave e tão veemente, que todas as nações, os turcos, os idólatras, e os próprios judeus hão de arder nele e converter-se?" ("Oração Abrasada" de São Luís Maria Grignion de Montfort, "Oeuvres Completes", Editions du Seuil, Paris, 1966, pág. 681). Esse dilúvio, que lavará a Humanidade, inaugurará o Reino do Espírito Santo, que ele identifica com o Reino de Maria. Nosso santo afirma que vai ser uma era de florescimento da Igreja como até então nunca houve. Chega inclusive a afirmar que "o Altíssimo, com sua Santa Mãe, devem formar para si grandes santos, que sobrepujarão em santidade a maior parte dos outros santos, como os cedros do Líbano se avantajam aos pequenos arbustos" ("Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem" de São Luís Maria Grignion de Montfort, "Oeuvres Completes", Editions du Seuil, Paris, 1966, págs. 512 e 513, N° 47.) Considerando os grandes santos que a Igreja já produziu, ficamos deslumbrados ante a envergadura desses que surgirão sob o bafejo de Nossa Senhora.

Nada é mais razoável do que imaginar um crescimento enorme da santidade numa era histórica em que a atuação de Nossa Senhora aumente também prodigiosamente. Podemos, pois, dizer que São Luís Maria Grignion de Montfort, com seu valor de pensador, mas sobretudo, com sua autoridade de santo canonizado pela Igreja, dá peso, autoridade, consistência, às esperanças que brilham em muitas revelações particulares, de que virá uma época na qual Nossa Senhora verdadeiramente triunfará.

A realeza de Nossa Senhora, embora tenha uma soberana eficácia em toda a vida da Igreja e da sociedade temporal, realiza-se em primeiro lugar no interior das almas. Daí, do santuário interior de cada alma, é que ela se reflete sobre a vida religiosa e civil dos povos, enquanto considerados como um todo.

O Reino de Maria será, pois, uma época em que a união das almas com Nossa Senhora alcançará uma intensidade sem precedentes na História (exceção feita, é claro, de casos individuais).

Escravidão a Nossa Senhora e Apóstolos dos Últimos Tempos

- Qual é a forma dessa união em certo sentido suprema? - Não conheço meio mais perfeito para enunciar e realizar essa união do que a Sagrada Escravidão a Nossa Senhora, tal como é ensinada por São Luís Maria Grignion de Montfort no "Tratado da Verdadeira Devoção" .

Considerando que Nossa Senhora é o caminho pelo qual Deus veio aos homens e estes vão a Deus, tendo presente a realeza universal de Maria, nosso santo recomenda que o devoto da Santíssima Virgem se consagre inteiramente a Ela como escravo. Essa consagração é de uma radicalidade admirável. Ela abarca não só os deveres materiais do homem, como também até o mérito de suas boas obras e orações, sua vida, seu corpo e sua alma. Ela é sem limites, porque o escravo por definição nada tem de seu.

Em troca dessa consagração, Nossa Senhora atua no interior de seu escravo de modo maravilhoso, estabelecendo com ele uma união inefável.

Os frutos dessa união serão vistos nos Apóstolos dos Últimos Tempos, cujo perfil moral ele traça, a fogo, em sua famosa "Oração abrasada". Ele usa, para isto, uma linguagem de uma grandeza apocalíptica, na qual parece reviver todo o clamor de um São João Batista, todo o fogo de um São João Evangelista, todo o zelo de um São Paulo. Os varões portentosos que lutarão contra o demônio pelo Reino de Maria - conduzindo gloriosamente, até o fim dos tempos, a luta contra o demônio, o mundo e a carne - São Luís os descreve como magníficos modelos que convidam desde já, à perfeita escravidão a Nossa Senhora, os que, nos tenebrosos dias de hoje, lutam nas fileiras da Contra-Revolução.

Assim, com essas considerações sobre o papel de Nossa Senhora na luta da Revolução e da Contra-Revolução, e sobre o Reino de Maria, vistas segundo o "Tratado da Verdadeira Devoção" , creio ter enunciado os principais pontos de contato entre a obra prima do grande santo e meu ensaio - tão apequenado pela comparação - sobre "Revolução e Contra-Revolução".


Nota da Redação

Atualidade perene de "Revolução e Contra-Revolução"

Em seu número 100, de abril de 1959, "Catolicismo" se viu honrado por estampar, pela primeira vez, o ensaio "Revolução e Contra-Revolução" do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira que posteriormente, em forma de livro, seria publicado em espanhol, francês, inglês, italiano e português.

Em 1976, o autor acrescentou uma nova parte ao livro para tratar da revolução anarquista desencadeada a partir da Sorbonne, em maio de 1968.

"Revolução e Contra-Revolução" descreve a crise multissecular do Ocidente, aponta-lhe as causas, mostra suas últimas perspectivas, mas indica também o caminho de salvação.

O livro é um compêndio básico para a vasta família de almas que se congrega, em dezenas de países, em torno dos ideais da Contra-Revolução. Convida o homem contemporâneo a rejeitar todos os aspectos da revolução laicista e igualitária e a restaurar em suas bases, ao mesmo tempo perenes e atualizadas, a ordem espiritual e a ordem temporal cristãs.

No momento em que a Revolução Francesa, embora velha de 200 anos, salta para capa de revistas internacionais, o livro de Plinio Corrêa de Oliveira, por causa da vastidão de horizontes que que analisa a crise contemporânea, torna-se instrumento imprescindível para os católicos que desejam se manter em dia, esclarecidos e sadiamente atualizados.


| DISCERNINDO, DISTINGUINDO, CLASSIFICANDO |

O telefone e o pêndulo

D. PEDRO II, viajando pelos Estados Unidos em 1876, foi visitar a feira de exposições em Filadélfia.

A febre de invenções estava então em seu auge. Antes e depois dessa data, o mundo se embriagava com as sucessivas descobertas e invenções - eletricidade, lâmpada incandescente, rádio, para-raio, fonógrafo, avião etc. – sem falar do campo da medicina – que haviam se sucedido ao aeróstato, à máquina a vapor e outros. A técnica prometia - e todos, salvo honrosas exceções, ingenuamente acreditavam - o paraíso nesta terra, feito de comodidades e facilidades sem fim.

Foi em meio a essa euforia generalizada, que o nosso saudoso imperador chegou à feira de Filadélfia e lá se aproximou do pavilhão onde um antigo professor de surdos-mudos exibia um aparelho singular. Tomando nas mãos o objeto que lhe era mostrado, e aproximando-o do ouvido, D. Pedro II teve a conhecida exclamação: "Isso fala!". O professor era Graham Bell e o aparelho, um primeiro modelo de telefone.

De então a nossos dias, o telefone fez seu caminho (como, aliás, as demais invenções), passando por aperfeiçoamentos sucessivos. Chegamos assim a este final do século XX num auge de progresso científico em que, contra toda a expectativa de nossos ancestrais, a euforia da técnica mudou-se em fobia. A poluição dos ares e das águas, o ruído ensurdecedor dos motores, o pavor dos armamentos sofisticados, a agitação e o stress das cidades industrializadas, tudo isto criou um novo estado de espírito, preocupado e desconfiado em relação à técnica.

O paraíso científico revelou-se mais bem um purgatório, quiçá a caminho de um inferno. E o pêndulo oscilante das preferências públicas já se desloca rapidamente em direção ao ponto oposto do quadrante. Estado de espírito propício à atuação dos novos utopistas, pregadores de ecologismos, tribalismos e naturismos de toda espécie. Muitos deles, sob pretexto de libertar a humanidade dos perniciosos efeitos da técnica, é contra a própria civilização que investem.

* * *

O que faltou à ciência para desenvolver-se de modo harmônico e católico, evitando assim a reversão do pêndulo da História para o tribalismo?

A pergunta talvez exigisse uma enciclopédia para ser adequadamente respondida. Permita-nos aludir de passagem a um dos elementos apenas dessa complexa resposta. A ciência foi conduzida sob o signo do funcional. A despreocupação e mesmo a hostilidade em relação ao adorno e ao embelezamento foram monumentais. O telefone, por exemplo, deveria ser prático, atendendo às necessidades (ou caprichos) da comunicação. Telefones belos, artísticos, ornamentais, para quê? No fundo, era a concepção materialista que se esgueirava. Tudo para um funcionamento material perfeito, nada para preencher a necessidade de beleza que tem a alma humana. Ornamento foi considerado sinônimo de supérfluo.

Assim chegamos aos horríveis "orelhões" que enfeiam a paisagem urbana de todo o Brasil. Altamente funcionais, são entretanto abjetos quanto à sua aparência. Se um bicho falasse ao telefone, sentir-se-ia, quiçá, perfeitamente à vontade num "orelhão". Mas o caminho para o vulgar não parou aí.

Em março deste ano realizou-se em Hanover (Alemanha) uma "feira da telecomunicação", onde foi apresentado o último "grito" da modernidade: o telefone em forma de tênis que vemos na foto.

Levar um sapato ao rosto é repugnante. Ademais, em meio às formas de calçado hoje habituais, o tênis sobressai-se por sua especial vulgaridade: até há pouco só era admitido para a prática de esportes. No tênis, como aliás em qualquer calçado, nada mais vil do que a sola, pelo seu contato direto com o chão, com os vermes, com a imundície. Pois bem, é a sola de um tênis que a pessoa terá a impressão de estar esfregando no próprio rosto, e em especial em sua boca e ouvido, quando usar esse tipo de telefone. É possível que ele seja muito prático. Mas é extravagante, grotesco, vil, e o espírito humano sente-se maltratado ao ter de utilizar tal meio de comunicação. Por que não aliar o funcional ao belo?

É mais uma queda rumo à total ausência do que é ordenado, proporcionado, da beleza enfim. Ausência que leva o homem moderno a sentir-se expatriado em meio ao "paraíso" técnico. E essa sensação de exílio parece estar sendo orientada rumo à constituição de uma sociedade ecológico-tribal.

O tênis-telefone é ao mesmo tempo uma perfeição técnica e um passo que degrada o espírito humano, aproximando-o da anticultura e da anticivilização.

C. A.


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