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| ATUALIDADE | (continuação)
Porém, do entrechoque dos exércitos, das raças e das batalhas, em meio ao pandemônio geral, lentamente se foi formando, nos campos, a estrutura feudal. E, nas bibliotecas dos conventos, os livros em que se havia refugiado a cultura greco-latina começaram a projetar sua luz sobre novas gerações que lentamente foram aprendendo que viver não é só lutar, mas também estudar.
Aos poucos, sem que quase ninguém se desse conta, os dedos febris e desordenados do caos foram produzindo um tecido novo: a cultura medieval, cujos esplendores os pós-modernos –– para vantagem de sua argumentação –– descobrem agora, como se ontem ainda não os ignorassem ou os vilipendiassem.
E, como um prestidigitador tira de repente um coelho de dentro de uma cartola, os atuais profetas do caos e da pós-modernidade tiram das penumbras e das agitações de hoje, bem como das dramáticas turbulências da mais Alta Idade Média, motivos para embair nossos contemporâneos com as esperanças e as luzes de uma nova era.
Mas há algo que eles esquecem de incluir no quadro histórico que lhes serve de argumento. É a Igreja. A Igreja, sim, na qual não cessaram de reluzir Santos que deixaram na terra a sabedoria de ensinamentos e a força viva de exemplos que até hoje o mundo não esqueceu. Sacerdotes muitos, os quais, fiéis à doutrina e às leis da Santa Igreja, foram por toda parte suscitando almas que começavam a brilhar nas trevas, como originariamente se puseram a brilhar no céu as estrelas, por ação do Criador. Essas foram as mãos sagradas que gradualmente limparam do caos o espírito, as leis e os hábitos dos povos europeus.
A civilização medieval foi tecida por mãos benditas, como as de São Bruno (séc. XI), fundador da Ordem dos cartuxos, e que construiu na França a famosa abadia denominada "Grande Cartuxa".
A civilização foi tecida por essas mãos benditas, e não pelos dedos trêmulos, sujos e poluídos do caos.
Tendo isto em vista, o leitor se voltará naturalmente para a Igreja de hoje, esperando dela a mesma ação, desenvolvida a partir da Alta Idade Média. E tem razão, pois da Igreja se pode dizer o que diz de Nossa Senhora a Salve Regina: Ela é "vita, dulcedo et spes nostra". Mas a História jamais se repete com mecânica precisão. Como diferem das condições de então, as condições presentes da Santa Igreja de Deus.
Assim como um filho sente redobrar seu amor e sua veneração quando vê sua própria mãe atirada ao infortúnio e opressa pela derrota, assim é com redobrado amor, com veneração inexprimível que me refiro aqui à Santa Igreja de Deus, nossa Mãe. Precisamente neste momento histórico em que a ela caberia refazer, à eterna luz do Evangelho, um novo mundo, vejo-a entregue a um doloroso e deprimente processo de "autodemolição", e sinto dentro dela a "fumaça de Satanás", que penetrou por infames fissuras (cfr. Paulo VI, alocuções de 7-12-68 e 29-6-72).
Para onde voltar então as esperanças do leitor? Para o próprio Deus, que jamais abandonará sua Igreja santa e imortal, e que por meio dela fará, nos dias longínquos ou próximos, cujo advento sua Misericórdia e sua Justiça marcaram, mas permanecem misteriosos para nós, o esplêndido renascimento da civilização cristã, o Reino de Cristo pelo Reino de Maria.
| CADERNO ESPECIAL |
Batismo de Nosso Senhor Jesus Cristo
(Mt. III, 13-17)
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