P.24-25
| REVOLUÇÃO E CONTRA-REVOLUÇÃO – PARTE III | (continuação)
Capítulo III – A IV Revolução que nasce
O panorama que assim se apresenta não seria completo se negligenciássemos uma transformação interna na III Revolução. É a IV Revolução que dela vai nascendo.
Nascendo, sim, à maneira de requinte matricida. Quando a II Revolução nasceu, requintou, venceu e golpeou de morte a primeira. O mesmo ocorreu quando, por processo análogo, a III Revolução brotou da segunda. Tudo indica ter chegado agora para a III Revolução o momento, ao mesmo tempo pinacular e fatal, em que ela gera a IV Revolução, e por esta se expõe a ser morta.
–– No entrechoque entre a III Revolução e a Contra-Revolução, haverá tempo para que o processo gerador da IV Revolução se desenvolva por inteiro? Esta última abrirá efetivamente uma etapa nova na história da Revolução? Ou será simplesmente um fenômeno abortivo, que vai surgindo e desaparecerá sem influência capital, no entrechoque entre a III Revolução e a Contra-Revolução? O maior ou menor espaço a ser reservado para a IV Revolução nascente, nestas notas tão apressadas e sumárias, estaria na dependência da resposta a essa pergunta. Resposta essa, aliás, que, de modo cabal, só o futuro poderá dar.
Ao que é incerto, não convém tratar como se tivesse uma importância certa. Consagremos aqui, pois, um espaço muito limitado ao que parece ser a IV Revolução.
1. A IV Revolução prevista pelos autores da III Revolução
Como é bem sabido, nem Marx, nem a generalidade de seus mais notórios sequazes, tanto "ortodoxos", como "heterodoxos", viram na ditadura do proletariado a etapa terminal do processo revolucionário. Esta não é, segundo eles, senão o aspecto mais quintessenciado e dinâmico da Revolução universal. E, na mitologia evolucionista inerente ao pensamento de Marx e de seus seguidores, assim como a evolução se desenvolverá ao infinito no suceder dos séculos, assim também a Revolução não terá termo. Da I Revolução já nasceram duas outras. A terceira, por sua vez, gerará mais uma. E daí por diante...
É impossível prever, dentro da perspectiva marxista, como seria uma Revolução nº XX ou nº L. Não é impossível, entretanto, prever como será a IV Revolução. Essa previsão, os próprios marxistas já a fizeram.
Ela deverá ser a derrocada da ditadura do proletariado em consequência de uma nova crise, por força da qual o Estado hipertrofiado será vítima de sua própria hipertrofia. E desaparecerá, dando origem a um estado de coisas cientificista e cooperativista, no qual – dizem os comunistas – o homem terá alcançado um grau de liberdade, de igualdade e de fraternidade até aqui insuspeitável.
2. IV Revolução e tribalismo: uma eventualidade
–– Como? –– É impossível não perguntar se a sociedade tribal sonhada pelas atuais correntes estruturalistas dá uma resposta a esta indagação. O estruturalismo vê na vida tribal uma síntese ilusória entre o auge da liberdade individual e do coletivismo consentido, na qual este último acaba por devorar a liberdade. Segundo tal coletivismo, os vários "eus" ou as pessoas individuais, com sua inteligência, sua vontade e sua sensibilidade, e consequentemente seus modos de ser, característicos e conflitantes, se fundem e se dissolvem na personalidade coletiva da tribo geradora de um pensar, de um querer, de um estilo de ser densamente comuns.
Bem entendido, o caminho rumo a este estado de coisas tribal tem de passar pela extinção dos velhos padrões de reflexão, volição e sensibilidade individuais, gradualmente substituídos por modos de pensamento, deliberação e sensibilidade cada vez mais coletivos. É, portanto, neste campo que principalmente a transformação se deve dar.
–– De que forma? –– Nas tribos, a coesão entre os membros é assegurada sobretudo por um comum pensar e sentir, do qual decorrem hábitos comuns e um comum querer. Nelas, a razão individual fica circunscrita a quase nada, isto é, aos primeiros e mais elementares movimentos que seu estado atrofiado lhe consente. "Pensamento selvagem",(cfr. Claude Lévy-Strauss, La pensée sauvage, Plon, Paris, 1969.) pensamento que não pensa e se volta apenas para o concreto. Tal é o preço da fusão coletivista tribal. Ao pajé incumbe manter, num plano místico, esta vida psíquica coletiva, por meio de cultos totêmicos carregados de "mensagens" confusas, mas "ricas" dos fogos fátuos ou até mesmo das fulgurações provenientes dos misteriosos mundos da transpsicologia ou da parapsicologia. É pela aquisição dessas "riquezas" que o homem compensaria a atrofia da razão.
Da razão, sim, outrora hipertrofiada pelo livre exame, pelo cartesianismo etc., divinizada pela Revolução Francesa, utilizada até o mais exacerbado abuso em toda escola de pensamento comunista, e agora, por fim, atrofiada e feita escrava a serviço do totemismo transpsicológico e parapsicológico...
A. IV Revolução e preternatural
"Omnes dii gentium dæmonia", diz a Escritura.("Todos os deuses dos pagãos são demônios" – Sl. 95, 5.) Nesta perspectiva estruturalista, em que a magia é apresentada como forma de conhecimento, até que ponto é dado ao católico divisar as fulgurações enganosas, o cântico a um tempo sinistro e atraente, emoliente e delirante, ateu e fetichisticamente crédulo com que, do fundo dos abismos em que eternamente jaz, o príncipe das trevas atrai os homens que negaram Jesus Cristo e sua Igreja?
É uma pergunta sobre a qual podem e devem discutir os teólogos. Digo os teólogos verdadeiros, ou seja, os poucos que ainda creem na existência do demônio e do inferno. Especialmente os poucos, dentre esses poucos, que têm a coragem de enfrentar os escárnios e as perseguições publicitárias, e de falar.
B. Estruturalismo – Tendências pré-tribais
Seja como for, na medida em que se veja no movimento estruturalista uma figura – mais exata ou menos, mas em todo caso precursora – da IV Revolução, determinados fenômenos afins com ele, que se generalizaram nos últimos dez ou vinte anos devem ser vistos, por sua vez, como preparatórios e propulsores do próprio ímpeto estruturalista.
Assim, a derrocada das tradições indumentárias do Ocidente, corroídas cada vez mais pelo nudismo, tende obviamente para o aparecimento ou consolidação de hábitos nos quais se tolerará, quando muito, a cintura de penas de ave de certas tribos, alternada, onde o frio o exija, com coberturas mais ou menos à maneira das usadas pelos lapões.
O desaparecimento rápido das fórmulas de cortesia só pode ter como ponto final a simplicidade absoluta (para empregar só esse qualificativo) do trato tribal.
A crescente ojeriza a tudo quanto é raciocinado, estruturado e metodizado só pode conduzir, em seus últimos paroxismos, à perpétua e fantasiosa vagabundagem da vida das selvas, alternada, também >>>
Legendas desta página:
– Nas tribos (como esta dos índios Gimi, na Papua-Nova Guiné) a coesão entre os membros é assegurada sobretudo por um comum sentir, do qual decorrem hábitos comuns e um comum querer. A razão está praticamente ausente.
– "Todos os deuses dos gentios são demônios" Sl. 95,5).
– No Ocidente, é acentuada a tendência para o nudismo, mediante a qual, de futuro, se tolerará quando muito a cintura de penas de aves usada em certas tribos.
Página seguinte