a “odiar o pecado e amar o pecador”, como afirma Santo Agostinho, mas chega-se a justificar o pecado e a absolver o pecador impenitente, concedendo-lhe até o acesso à Sagrada Comunhão sem prévia conversão e reparação. Tal misericórdia é contrária ao ensinamento da Igreja, inclusive o da encíclica Dives in Misericordia de João Paulo II.
Esse permissivismo, que ontem era concedido apenas aos que erravam, estende-se hoje aos pecadores públicos. Se esta abordagem liberal fosse aplicada com rigor, nenhuma sociedade poderia conservar-se por longo tempo, nem sequer a da Igreja, que é divina, porque os tribunais tornar-se-iam ilícitos e, portanto, seriam abolidos.
A abordagem metodológica está em suma na exigência pastoral e no primado da misericórdia. O problema é que essas duas palavras-chave foram falsificadas em seu significado e traídas na sua missão. Na ânsia de diagnosticar as situações pecaminosas absolvendo-as da devida condenação moral, a pastoral tende a eludir a verdade revelada; na ânsia de curar essas situações poupando-as dos inevitáveis sofrimentos, a misericórdia tende a escapar da justiça divina. O resultado é uma pastoral relativista, incapaz de iluminar os que erram e uma misericórdia permissiva incapaz de converter os pecadores.
Catolicismo — Qual é a teoria implícita nessa nova pastoral?
Guido Vignelli — Se consideradas nas suas relações, as mencionadas palavras-chave se explicam e se apoiam mutuamente, sugerindo uma nova metodologia que nos leva a passar de um conceito rigoroso a um permissivo, não só da pastoral doméstica, mas também da moral familiar. A avaliação moral é de fato posta na dependência dos tempos, lugares, pessoas e situações, com base, portanto, em critérios não mais absolutos (ou seja, universais e necessários), mas relativistas (ou seja, particulares e subjetivos); os próprios conceitos de “mal absoluto” e “estado de pecado” são implicitamente rejeitados como abstratos e rigoristas. O que leva ao seguinte paradoxo: quanto mais um cristão se obstina em viver num estado público de pecado, violando gravemente os mandamentos relativos à fidelidade e à castidade matrimonial, ele pode lícita e canonicamente considerar-se “simul justus et pecador” (“que é pecador justificado”), como pretendia o heresiarca Lutero.
A nova pastoral pressupõe e insinua uma teoria moral relativista e permissiva, semelhante à “nova moral” denunciada em seu tempo por Pio XII: afirma-se que, “libertada das sutilezas sofísticas do método tradicional, a moral seja reconduzida à sua forma originária e remetida à inteligência e à determinação da consciência individual. [...] A ‘nova moral’ afirma que a Igreja, em vez de fomentar a lei da liberdade humana e do amor, pelo contrário leva, quase exclusivamente e com excessiva rigidez, à firmeza e intransigência das leis morais cristãs, recorrendo com frequência àqueles ‘sois obrigados’ e ‘não é lícito’ que têm muito sabor de um pedantismo desalentador. [...] Com o resultado de que a acusação de dureza opressora, do movimento ‘nova moral’ contra a Igreja, vai na verdade atingir em primeiro lugar a própria Pessoa adorável de Cristo” (Pio XII, Rádio Mensagem de 23 de março de 1952, por ocasião do Dia da Família).
Prepara-se, portanto, uma revolução pastoral no sentido relativista e permissivo. É uma revolução no sentido relativista, porque o diagnóstico das situações familiares se baseia não na avaliação moral objetiva delas, mas em detectar a experiência psicológica subjetiva e prever as consequências práticas, com o perigo de fazer a consciência perder o sentido de pecado, já tão obnubilado. Com efeito, não se fala mais de “situações imorais” (como o concubinato), nem tampouco de “situações irregulares”, mas apenas de “situações complexas” ou “difíceis”. É também uma revolução no sentido permissivo, porque a terapia para tratar dessas situações se reduz ao uso de paliativos e anestésicos que, longe de eliminar as causas do mal, aliviam-lhe apenas os sintomas, ou seja, as consequências dolorosas, com o resultado de eludir o restabelecimento e tornar crônico o vício. Desta forma, a pastoral familiar é reduzida a uma psicologia ou sociologia da família semelhante à laicista.
Catolicismo — Há também motivos de uma esperança não sentimental, mas racional, quanto ao futuro da família?
Guido Vignelli — Não obstante a mesma análise sinodal admitir que a atual situação familiar global é totalmente desastrosa, pesquisas sociológicas e estatísticas também revelam alguns sinais de esperança quanto ao futuro. Na verdade, apesar de as autoridades tornarem cada vez mais difícil para os jovens constituir família, opondo obstáculos culturais, políticos e econômicos inimigos da castidade, da estabilidade e da procriação, o desejo de família está crescendo precisamente entre as últimas gerações; isto também se aplica à nobre nação brasileira. Talvez seja até para perverter essa saudável tendência juvenil que a propaganda revolucionária tenta distorcer o conceito de família, tornando-a “pluralista”, ou seja, introduzindo nela todas as formas possíveis de convivência (inclusive a homossexual). Mais uma razão para impelir os cristãos a defender a verdadeira identidade e definição de família. Trata-se da própria sobrevivência da humanidade, como também da Igreja.
Quanto mais um cristão se obstina em viver num estado público de pecado, violando gravemente os mandamentos relativos à fidelidade e à castidade matrimonial, ele pode lícita e canonicamente considerar-se “simul justus et pecador” (“que é pecador justificado”), como pretendia o heresiarca Lutero.