(continuação)
com que o pai de Alessandro acudisse e encontrasse a mártir esvaindo-se em seu próprio sangue.
Enquanto Maria era levada às pressas para o hospital de Nettuno, Alessandro, de 20 anos, ia para a cadeia, onde ficaria durante 28 anos.
Sofrimento oferecido a Deus
Chegando ao hospital, pediu água insistentemente, devido à sede decorrente da perda de sangue, mas não podia ser atendida por causa das chagas no corpo. O pároco foi chamado para ministrar-lhe a Extrema Unção, antes de iniciar-se a arriscada operação. Mostrando um crucifixo, disse-lhe que Jesus também sofreu sede na cruz, e perguntou se ela queria oferecer sua sede a Ele pela salvação dos pecadores. A menina aceitou e não mais pediu água.
Antes de receber o Sagrado Viático, o sacerdote perguntou: "Mariazinha, perdoas de todo coração ao teu assassino?". Ela respondeu: "Sim, por amor de Jesus perdoo-lhe. E também quero que ele esteja no Céu comigo".
Os médicos deram início à operação. Eram 14 feridas, nove das quais perfurantes. Como a menina estava muito fraca, eles não usaram anestesia. Maria estava inteiramente consciente quando cada uma das feridas foi aberta para ser suturada por dentro. Apesar das dores, ela não chorou e sofreu sua agonia com perfeita paciência, oferecendo-a a Deus. Às 4 horas da tarde do dia 6 de julho de 1902, com 12 anos incompletos, Maria Goretti entregou sua alma virginal ao Criador, por cujo amor preferiu a morte à ofensa.
Além da dilacerante dor de ver sua filha morrer tão cruelmente, Assunta teve uma pungente dor adicional: uma semana depois, não dispunha de mais ninguém para cuidar dos filhos enquanto trabalhava no campo. Por ser muito pobre, não teve outro remédio senão entregá-los à adoção.
Conversão do assassino
Na prisão, Alessandro mostrou-se agressivo e revoltado, tendo de ser removido para uma solitária. Entretanto, seis anos depois, Maria Goretti lhe apareceu em sonho, e sem dizer uma só palavra lhe entregou 14 alvos lírios, símbolo da pureza, cada lírio representando uma de suas punhaladas.
O assassino compreendeu por esse sonho que Maria o havia perdoado do crime e estava no Céu. Comovido, sentiu grande arrependimento, seguido de milagrosa conversão. Pediu então que chamassem o bispo encarregado da prisão, a quem confessou seus crimes e pecados. Pagou o resto da sentença como prisioneiro modelo, razão pela qual foi libertado três anos antes do fim de sua pena.
Uma vez posto em liberdade, Alessandro foi procurar a mãe de sua vítima. Era véspera de Natal, e queria saber se ela ainda o reconhecia. Sim, ela o reconhecia como o homem que matou sua filha e destruiu sua família. Alessandro então lhe pediu perdão. A resposta dessa mãe verdadeiramente católica foi: "Se Maria, minha filha, o perdoa, e Deus o perdoa, como posso também não perdoá-lo?". Os dois foram então à Missa de Natal, durante a qual receberam a comunhão de joelhos, lado a lado. Alessandro fez mais: confessou então publicamente na igreja seu pecado, diante dos fiéis, aos quais pediu também perdão.
Aceitação da sentença
No longo período que passou na prisão, Alessandro teve tempo para pensar no mal que fizera e se arrepender. Uma vez cumprida a pena, recolheu-se em um convento dos Padres Capuchinhos, onde faleceu em 1970 aos 88 anos de idade. Em 1962 ele escreveu o que pode ser tido como seu testamento espiritual, do qual transcrevemos aqui uma parte:
"Estou velho, com quase 80 anos, e prestes a terminar a minha vida na Terra. Olhando para o meu passado, reconheço que na minha mocidade segui um caminho errado. [...] Aos 20 anos, cometi o meu crime passional, cuja lembrança hoje me aterroriza. Maria Goretti, agora santa, foi o anjo bondoso que a Providência pôs nos meus passos. Ainda trago as suas palavras de repreensão e de perdão impressas no coração. Rezou por mim, intercedeu por mim, seu assassino.
"Passaram-se os 30 anos de cadeia. Se não fosse menor de idade, teria sido condenado por toda a vida. Aceitei a sentença merecida; resignado, expiei a minha culpa. Maria Goretti foi verdadeiramente a minha luz, a minha padroeira. Com o seu auxílio comportei-me bem, e procurei viver honestamente, quando de novo a sociedade me recebeu entre os seus membros.
"Os filhos de São Francisco, os Capuchinhos, acolheram-me com caridade seráfica, não como criado, mas como irmão. Estou com eles desde 1936. E agora espero serenamente o momento de ser admitido à visão de Deus, de rever e abraçar os meus entes queridos, e de estar perto do meu Anjo protetor (Santa Maria Goretti) e da sua querida mãe, a senhora Assunta.
"Os que lerem esta minha carta, queiram tirar a boa lição de sempre, de fugirem do mal desde novos e seguirem o bem. Convençam-se de que a Religião, com os seus mandamentos, não é coisa para se pôr de lado, mas é o conforto verdadeiro, o único caminho seguro em todas as circunstâncias, mesmo as mais dolorosas da vida."
Glorificação final
A causa da beatificação de Maria Goretti foi aberta em 1935, com o próprio Alessandro testemunhando sua santidade e sua intercessão. Foi beatificada em 1947 por Pio XII. Sua mãe, presente ao ato, relata: "Quando vi o Papa se aproximando, rezei: 'Madonna, por favor, ajudai-me'. Ele pôs sua mão em minha cabeça, e disse: 'Bendita mãe, feliz mãe, mãe de uma Beata'".
Maria Goretti foi canonizada três anos depois, pelo mesmo Papa, com a presença de Alessandro Serenelli, Assunta Goretti e seus quatro filhos restantes.
Os restos mortais da Santa estão na Basílica de Santa Maria Goretti, ao lado do mar, em Nettuno, Itália, perto do local onde ela viveu e morreu. Estão em um relicário, envoltos numa imagem de cera seguindo seus traços.
Fontes:
Site "Who is St. Maria?", disponível em http://mariagoretti.com/who-is-st-maria/
Pe. José Leite, S.J., Santos de Cada Dia, Editorial A.O., Braga, Portugal, 1987, tomo II, pp. 385-388.
LEGENDAS:
- Alessandro Serenelli, assassino da santa, reza no quarto que pertenceu a ela.
- As relíquias de Santa Maria Goretti, em peregrinação pelos EUA.