P.06-07

(continuação)

os simples judeus que O amam, como Jó, por ter sido fiel na provação; Deus "tornou-lhe em dobro tudo quanto tinha possuído", chegando a acumular "catorze mil ovelhas, seis mil camelos, mil juntas de bois e mil jumentas" (Jó 42, 10-12).

Esses exemplos mostram como para o Antigo Testamento a riqueza é um dom de Deus, sinal da generosidade divina e merecida recompensa do homem justo.

Ricos e pobres se encontram

Mas a riqueza não é considerada o bem mais elevado, pois o homem sábio prefere as riquezas espirituais às materiais. Isso fica muito patente nos Provérbios, onde abundam conselhos como: "Vale mais o pouco com o temor do Senhor que um grande tesouro com a inquietação" (Prov. 15, 16); "bom renome vale mais que grandes riquezas; a boa reputação vale mais que a prata e o ouro" (Prov. 22, 1). Além disso a riqueza é um valor relativo, onde "rico e pobre se encontram: foi o Senhor quem criou ambos" (Prov. 22, 2). O que os textos sagrados realmente reprovam é a riqueza obtida de maneira desonesta, como também quando ela apodrece o coração do homem e o leva a lesar seus semelhantes e a não dar esmola aos pobres.

No Novo Testamento, Nosso Senhor também estimula a confiança num Deus que enche o homem de bens, mas muito mais no campo espiritual do que no campo material: "Eu sou o pão da vida: aquele que vem a mim não terá fome, e aquele que crê em mim jamais terá sede" (Jo. 6, 35). E São Paulo se alegra em que os Coríntios tenham sido "ricamente contemplados com todos os dons, com os da palavra e os da ciência" (1 Cor. 1, 5), e por terem eles sido cumulados "com toda espécie de benefícios, para que tendo sempre e em todas as coisas o necessário, vos sobre ainda muito para toda espécie de boas obras" (2 Cor. 9, 8).

Condenáveis são o egoísmo e a injustiça

As invectivas de São Tiago contra os avaros e os injustos são dignas dos antigos profetas: "Vós, ricos, chorai e gemei por causa das desgraças que virão sobre vós. Vossas riquezas apodreceram e vossas roupas foram comidas pela traça. Vosso ouro e vossa prata enferrujaram-se, e a sua ferrugem dará testemunho contra vós e devorará vossas carnes como fogo. Entesourastes nos últimos dias. Clama contra vós o salário que defraudastes aos trabalhadores que ceifavam os vossos campos, e os gritos dos ceifadores chegaram aos ouvidos do Senhor dos exércitos" (Tg 5, 1-4). Note-se que ele não condena a riqueza em si mesma, mas sim o egoísmo e a injustiça.

As admoestações do Novo Testamento contra os ricos de coração tomam maior relevo quando comparadas aos ensinamentos de Nosso Senhor. Ele é muito claro quando diz que ninguém pode servir a dois senhores – Deus e o dinheiro (Mt 6, 24); para adquirir a pérola preciosa é preciso vender tudo (Mt 13, 45-46); a sedução das riquezas impede que seja ouvida a Palavra de Deus (Mt 13, 22). Estimula o jovem rico a vender tudo o que possui, dar aos pobres e segui-Lo (Mt 19, 21-22), e a recusa do convite leva-O a declarar: "É mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus" (Mt 19, 24). Está muito claro aí que não se referia aos que são ricos, mas aos que têm apego às próprias riquezas ou às que gostariam de possuir. À luz das bem-aventuranças, isso se torna ainda mais evidente. Nosso Senhor não diz bem-aventurados os que morrem de fome, mas "bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos céus" (Mt 5, 3).

Igrejas, palácios dos pobres

Na sua vida pública, o Redentor esteve rodeado de pessoas abastadas. José de Arimateia, por exemplo, era proprietário do túmulo que recebeu o divino Corpo (Mt 27, 57). São Lucas conta que as mulheres que acompanhavam Jesus e seus discípulos "os assistiram com as suas posses" (Lc 8,2), porque o Evangelho não ordena desprender-se da riqueza, mas usá-la para dar esmolas, fazendo para si "bolsas que não se gastam, um tesouro inesgotável nos céus" (Lc 12, 33). A generosidade não deve ser vista como um mérito próprio, mas como um dom de Deus. Diz S. Paulo a Timóteo: "Exorta os ricos deste mundo a que não sejam orgulhosos nem ponham sua esperança nas riquezas volúveis, mas em Deus, que nos dá abundantemente todas as coisas para delas fruirmos. Que pratiquem o bem, enriqueçam-se de boas obras, sejam generosos, comunicativos, ajuntem um tesouro

Página seguinte

LEGENDAS:
- Abraão era muito rico em rebanhos, prata e ouro (Gn 13,2);
Isaac obteve o cêntuplo numa colheita e "tornou-se extremamente rico" (Gn 26, 12-13) - Hospitalidade de Abraão e sacrifício de seu filho Isaac – Basílica de São Vital, séc. X, em Ravena, Itália.
- O pobre que entrava numa igreja sabia que todos aqueles esplendores — os muros suntuosos, as imagens imponentes nos altares, os quadros magníficos, a música sublime — estavam lá para ele, à sua inteira disposição, a serviço de sua alma. - Co-catedral de São João, Valletta, Malta.