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(continuação)

mártires índios. [...] Não se trata de uma libertação romântica, mas uma libertação da fome, do mau salário, da favela. Que esta semana seja um compromisso no sangue de Cristo. Importa agora traduzir a palavra num testemunho real".5

Uniforme guerrilheiro, um "sacramento de libertação"

Nesse mesmo evento noturno aconteceu algo realmente sombrio: D. Pedro Casaldáliga, então Bispo de São Félix do Araguaia (MT-GO), vestiu um uniforme de guerrilheiro sandinista trazido da Nicarágua. Entre os muitos aplausos, ele declarou em "portunhol":

"Eu vou procurar agradecer com os feitos, voy a procurar agradecer este sacramento de liberación que acabo de recibir, com los hechos [feitos]. Este color verde é verde da cor como as nossas matas sacrificadas da Amazônia. Às vezes significou a repressão, a tortura. Tem significado também, na Nicarágua, a libertação, a vida, uma pátria nova [...].

"Digo que vou procurar agradecer com os feitos e, se preciso, com o sangue. Juntaremos nossa esperança comum, que é fé em Deus e fé no povo dos pobres; vontade de termos uma América nova, livre; vontade de conquistarmos a liberdade, que não se dá, se conquista. Unidos dentro de cada pátria, os diferentes povos — indígenas, negros — unidos pátria com pátria. [...] Este dia de hoje, para mim, para todos nós, é um dia verdadeiramente histórico [...].

"Eu me sinto, vestido de guerrilheiro, como me poderia sentir paramentado de padre. É a mesma celebração que nos empurra à mesma esperança. Apenas para terminar, gostaria de pedir para todos vocês, que sejamos consequentes. O que estamos celebrando, o que estamos aplaudindo nos compromete até o fim. Nicarágua nos deu o exemplo: todos nós, todos os povos da América Latina, todos os povos do Terceiro Mundo, vamos atrás!" (palmas prolongadas).6

Depois dos livros com literatura marxista, o que mais se vendia no final dessa conferência eram pôsteres do sanguinário guerrilheiro Che Guevara...

A ditadura sandinista Ortega/Murillo

A publicação de Catolicismo, que estamos comentando, adquiriu hoje maior atualidade com a catastrófica situação em que se encontra a infeliz Nicarágua, desde 1979 governada intermitentemente pelo ex-guerrilheiro sandinista Daniel Ortega. No comando da Frente Sandinista de Liberación Nacional (FSLN), e sempre subserviente a Fidel Castro, Ortega derrubou após sangrenta guerra civil o governo de Anastasio Somoza, assassinado em 17 de setembro de 1980. Após tomar o poder, assumiu temporariamente o papel de amigo dos Estados Unidos e defensor do direito de propriedade e livre-mercado, mas estabeleceu uma ditadura pior e mais opressora, dentro de um regime radicalmente igualitário e inimigo da propriedade privada.

Em 2009, agindo de modo análogo ao dos ditadores bolivarianos para se perpetuarem no poder, Ortega pediu à Suprema Corte de Justiça da Nicarágua que declarasse sem efeito o Artigo 147 da Carta Constitucional. Recebendo o pedido como uma ordem, a corte "aparelhada" eliminou o artigo que vedava a reeleição do presidente. Com essa manobra, vai estendendo o seu mandato, o qual ele só pretende transferir em 2021 à sua mulher Rosario Murillo [acima à dir.], grande admiradora de Hugo Chávez, hoje ocupando o cargo de vice-presidente e porta-voz do governo. Com esse modus operandi o país entrou, juntamente com Cuba, Venezuela e Bolívia, para a lista de nações ibero-americanas de "presidentes perpétuos". Muito contra a vontade do povo, é claro.

Também é claro que, depois do mandato da excêntrica e esotérica primeira dama nicaraguense — também chamada de "la Chayo" (a bruxa) e de "Senhora dos Anéis" (pelos mais de 30 anéis que ostenta nos dedos) —, Ortega se interessará em ocupar novamente a presidência, em "reeleições" infindáveis.

Hoje o noticiário do mundo inteiro está registrando o descalabro a que chegou o país. Apenas nestes últimos três meses, mais de 400 nicaraguenses foram brutalmente mortos em manifestações contra a ditadura Ortega/Murillo, inclusive uma universitária brasileira, Raynéia Gabrielle Lima, de 31 anos. Quase três mil foram feridos e centenas estão desaparecidos, sem falar de jovens que foram arbitrariamente sequestrados e torturados, bem como de exilados políticos. Tudo seguindo a mesma cartilha bolivariana de Chávez/Maduro na infeliz Venezuela.

Partido dos Trabalhadores que não trabalham

Petistas brasileiros — inclusive a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e a ex-presidente Dilma Vana Rousseff — estiveram reunidos entre 15 e 17 de julho último com outras forças revolucionárias na

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LEGENDAS:
- D. Pedro Casaldáliga, Bispo de São Félix do Araguaia, recebeu um uniforme de guerrilheiro sandinista, cuja jaqueta ele vestiu no mesmo instante.
- O cardeal da Nicarágua, D. Miguel Obando Bravo, falecido no último mês de junho, apoiou desde os anos 70 a guerrilha sandinista. No cartaz ele aparece ao lado do casal Ortega, na campanha presidencial de 2011.