(continuação)
em seu tempo, e seu rosto se inflamava com o fogo do amor divino.
Não eram somente os membros da Igreja Militante que recebiam os benefícios de suas Missas. Também os da Igreja Padecente vinham implorar-lhe a esmola de suas orações. "Ele teve muitas aparições das almas que tinha livrado do Purgatório, entre elas a de alguns religiosos que expiavam nas chamas pela falta de zelo na observância de sua Regra".5
Certa noite, por exemplo, ele ouviu alguns gemidos e suspiros profundos. Tratava-se de um frade falecido recentemente, que gemia nas chamas do Purgatório: "Irmão Nicolau, suplico-te que digas amanhã a Missa de defuntos para livrar-me de minhas penas". Ora, o dia seguinte era domingo, quando não se pode celebrar Missa de defuntos. Por isso, respondeu-lhe Nicolau: "O Sangue do Redentor caia sobre ti, mas não posso aceder a teus desejos, pois amanhã é domingo, e não posso mudar o ofício do dia".
O Santo viu então uma multidão de crianças, homens e mulheres gemendo no fogo do Purgatório, e que lhe diziam: "Piedade, piedade para os que imploram o teu socorro! Amanhã livrarias quase todos nós de nossas penas, se quisesses dizer a Missa por nós". Impressionado, o Santo consultou seu Superior, mostrando a premência dessas almas benditas do Purgatório. Recebeu então licença para celebrar, não só no dia seguinte, mas durante toda a semana, consagrando todas as suas missas, orações e penitências ao resgate dos defuntos. No último dia o Irmão Peregrino apareceu ao Santo, para lhe agradecer por ter aberto o Céu a ele e a grande número de seus companheiros.6
São Nicolau foi então transferido para Tolentino, onde passou os últimos trinta anos de sua vida catequizando o povo simples, pregando a todos a palavra de Deus e confessando os muitos penitentes que vinham à sua procura. "Ele ganha, por sua doçura, todas as pessoas que lhe são enviadas, para fazê-las entrar na via da salvação. Todo o tempo que lhe resta depois das divinas funções, ele o emprega na oração, sobretudo mental [...]. Quando, durante suas grandes enfermidades, seu corpo está ainda mais acabrunhado de sofrimentos, é então que seu espírito se eleva com mais fervor ao Céu, e a doçura que ele experimenta nesse estado lhe tira toda a percepção de suas dores".7
O demônio decretou uma guerra sem quartel contra São Nicolau, a fim de fazê-lo abandonar a via de perfeição, impacientando-se ou deixando de lado seus exercícios de piedade: "Lançava algumas vezes gritos espantosos, imitando o mugido de touros, o rugido dos leões, o uivo dos lobos, o silvo das serpentes e a voz dos animais mais selvagens. Fingia descobrir e romper os tetos do mosteiro, quebrar-lhes as telhas e fazer desabar a casa. Mas Nicolau, zombando de seus truques, permanecia firme como um rochedo, sem mudar de posição."8
Essa atitude enfurecia ainda mais o demônio, que passava então para a violência. Desferia golpes tão numerosos e tão fortes contra o Santo, que o deixavam prostrado por vários dias. O pai da mentira, inspirador dos edulcorados "direitos humanos", fez com que São Nicolau ficasse coxo para o resto de sua vida. Mas às vezes mudava de tática: "Para afastá-lo das práticas religiosas, o demônio lhe sugeria o pensamento de que seu gênero de vida ofendia a Deus. Transformando-se em anjo de luz, dizia-lhe: 'Só o orgulho te move a isso. Limita-te a cumprir a regra comum, pois de outro modo te debilitas, tornas-te inútil ao próximo e uma carga onerosa para a tua Ordem'. Estas reflexões provocaram grandes sofrimentos em Nicolau, cujo único desejo era conformar-se com a vontade divina. O Senhor compadeceu-se dele, dissipou seus temores e o animou a continuar suas mortificações".9
A abstinência do santo era de estarrecer. Além da carne, privava-se de leite, ovos, frutas e peixe, comendo apenas ervas fervidas. Suas contínuas privações fizeram-no contrair uma grave enfermidade. Os médicos foram então chamados e determinaram que ele comesse carne para recuperar a saúde. Embora ele quisesse manter a penitência, seus superiores o obrigaram, em nome da obediência, a quebrar a abstinência. Nicolau obedeceu e comeu um pedaço de carne. Depois insistiu tanto com os superiores para prosseguir suas mortificações, que eles concordaram.
Outra vez, estando às portas da morte, apareceram-lhe a Santíssima Virgem, Santo Agostinho e Santa Mônica, e lhe ordenaram comer um pedaço de pão abençoado pela Virgem, com o que sua saúde se restabeleceu imediatamente. Em memória deste milagre, os religiosos agostinianos benzem pãezinhos no dia de sua festa. Muitos, invocando com fé o nome da Virgem Maria e de São Nicolau, se veem curados após comer desses pães. Muitos camponeses os dão até aos seus animais, para preservá-los de acidentes e epidemias.
Narram-se muitos prodígios operados por São Nicolau. Um deles, que faz lembrar o profeta Elias, foi o de multiplicar a farinha de uma generosa mulher que lhe dera tudo o que tinha, ficando na miséria. Outra mulher, que só dava à luz natimortos, recorreu a ele, e Deus fez com que depois fosse mãe de numerosa prole. Curou também outra mulher da cegueira, e a muitas pessoas curou de várias doenças. O remédio ordinário usado por São Nicolau nessas curas era fazer o Sinal da Cruz sobre a pessoa enferma.
Nos últimos seis meses de vida, ele viu muitas vezes a Santíssima Virgem e Santo Agostinho, que lhe davam a prelibar as doçuras celestiais, completadas pela visão dos anjos e de sua música harmoniosa.
São Nicolau de Tolentino expirou no dia 10 de setembro de 1306, nos braços de Nossa Senhora e de Santo Agostinho. Foi canonizado no dia 1º de fevereiro de 1446, e incluído no Martirológio em 1585. Sua vida foi escrita por um frade da sua Ordem.
"A paz há tantos anos perdida, a paz que os mais prudentes julgavam ainda alcançar, era a prece solene de Eugênio IV que, no final de seu laborioso Pontificado, confiava a causa da Igreja ao humilde servo de Deus, posto por ele nos altares. Segundo testemunho de Xisto V, esse foi o maior milagre de São Nicolau, que induziu este Pontífice a mandar celebrar sua festa com rito duplo, honra mais rara naqueles tempos do que nos nossos".10
Notas:
1. Edelvivies, El Santo de Cada Dia, Editorial Luis Vives, S.A., Saragoza, 1955, tomo V, p. 102.
2. Pe. João Croisset, S.J., Año Cristiano, Madrid, Saturnino Calleja, 1901, tomo III, p. 790.
3. http://www.franciscanos.org.br/?p=49103.
4. Croisset, p. 792.
5. Mgr Paul Guérin, Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, Bloud et Barral, Paris, 1882, tomo XI, p. 16.
6. Edelvives, p. 104.
7. Bollandistes, p. 16.
8. Id., p. 17.
9. Edelvives, p. 107.
10. Dom Próspero Guéranger, El Año Liturgico, Editorial Aldecoa, Burgos, 1956, tomo V, p. 367.
LEGENDAS:
- São Nicolau celebra a Missa pelas almas do Purgatório.
- Capela dos afrescos com a vida do santo na sua basílica em Tolentino.