Paulo Roberto Campos
Há meio século, um abaixo-assinado com grande número de aderentes denunciou a infiltração comunista nos meios católicos, pedindo a Paulo VI medidas contra o avanço comunista no Brasil.
Reverente e Filial Mensagem a Sua Santidade o Papa Paulo VI — Assim se intitulava o abaixo-assinado em que a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP) colheu 1.600.368 assinaturas, entre julho e setembro de 1968 [vide Anexo I, à p. 32]. Membros da TFP ergueram seus estandartes rubros com o leão dourado em 229 cidades de quase todos os estados brasileiros, numa histórica campanha percorrendo o País em coleta de assinaturas e denunciando um processo de autodemolição da Igreja perpetrado por eclesiásticos de mentalidade comunista. As entidades coirmãs do Chile, Uruguai e Argentina aderiram à campanha, elevando o número de adesões para 2.025.201.1
Naquele ano, os católicos estavam preocupados com a atuação do clero comuno-progressista infiltrado na Igreja Católica. Entre eles se destacava o sacerdote belga Joseph Comblin, professor no Instituto Teológico da Arquidiocese de Recife, onde era acobertado por Dom Helder Câmara, cognominado "Arcebispo Vermelho". Os objetivos e ideias do Pe. Comblin estavam compendiados em um documento reservado, não destinado ao grande público, mas acabaram vazando na imprensa e estarreceram o País [vide Anexo II, à p. 34]. Propunha uma revolução não apenas nos ambientes católicos, mas também na sociedade civil, incluindo tribunais de exceção para punir os adversários anticomunistas.
Esse documento subversivo foi o estopim para a deflagração da campanha da TFP pedindo a Paulo VI providências para fazer cessar a ação deletéria dentro da Igreja. O regime proposto pelo Pe. Comblin tinha como modelo a ditadura cubana; e o modelo religioso era uma igreja miserabilista a serviço do comunismo. Alguns itens do projeto bastam para avaliar a sua radicalidade:
- "Será necessário montar um sistema repressivo: tribunais novos de exceção contra quem se opõe às reformas. Os procedimentos ordinários da justiça são lentos demais. O poder legislativo também não pode depender de assembleias deliberativas.
-"O poder deve neutralizar as forças de resistência: neutralização das forças armadas se [elas] forem conservadoras; controle da imprensa, TV, rádio e outros meios de difusão; censura das críticas destrutivas e reacionárias.
- "Sem dúvida, a religiosidade católica tradicional do povo está condenada a desaparecer com o desenvolvimento. Se a Igreja não tiver OUTRA religião mais evoluída para oferecer-lhes, as massas voltar-se-ão para outras mensagens mais ao alcance delas ou mais preocupadas com elas."
Autoridades e órgãos de imprensa se manifestaram sobre a campanha. Dentre elas, destacamos:
Mons. Alfredo Cifuentes Gómez, Arcebispo de La Serena (Chile), um dos mais destacados e respeitados membros do Episcopado daquele país: "Li com especial interesse a reverente e filial mensagem [...]. Ela reflete duas características que sempre animaram o espírito cristão e o verdadeiro amor à pátria. Espírito cristão, porque justamente veem ameaçados os princípios ligados intimamente à doutrina da Igreja; e amor à pátria, porque precisamente o ataque a esses princípios vulnera em suas bases o bem-estar e a paz da nação. Como filhos fiéis, os senhores recorrem à suprema Autoridade da Igreja com sentimentos de profundo respeito e confiança".
A revista americana "Time", em sua edição de 23-8-68, reconheceu "a facilidade com que a TFP coletou as assinaturas. [...] Reflete o fato de que a maioria dos latino-americanos aprova ou pelo menos tolera o conservadorismo católico". No mesmo sentido, afirmou o sacerdote francês Charles Antoine: "De todas as campanhas organizadas pelo movimento Tradição, Família e Propriedade, a mais espetacular é sem dúvida a de julho de l968".2
De passagem pelo Brasil naquele ano, o Pe. René Laurentin, renomado teólogo francês e doutor em Mariologia, relatou em um de seus livros: "Grupos volantes recolheram assinaturas um pouco por toda a parte, nas estações ferroviárias, nos aeroportos e noutros lugares públicos. Os autores desta iniciativa abordaram-me muito cortesmente num supermercado de Curitiba. Desfraldavam um estandarte de veludo vermelho com a figura de um leão em pé. Convidavam a assinar 'contra o comunismo'." 3
[vide quadro à p. 28-29].
Empilhadas, as folhas do abaixo-assinado ultrapassavam dois metros de altura. Foram copiadas em rolos de microfilmes e entregues sob essa forma na Secretaria de Estado da Santa Sé.
Qual foi a resposta do Vaticano? Lamentavelmente, o silêncio. Desconcertante silêncio, pois revelava insensibilidade ante a preocupação de mais de dois
LEGENDAS:
- Coletores de assinaturas no centro de São Paulo.
- Plinio Corrêa de Oliveira observa a impressionante pilha com mais de dois milhões de assinaturas.