P.06-07
PALAVRA DO SACERDOTE...

O principal remédio para o escrúpulo é a oração, pedindo a Deus com fervor, por meio de Maria Santíssima, as luzes sobrenaturais necessárias para ver com clareza e segurança, e assim poder retificar os julgamentos errados que a angústia inspira na alma.

(continuação)

de carne é obrigatória, mas de fato a abstinência não está prescrita para hoje. Neste caso, ela não pode comer carne, e peca se o fizer.

Por isso, é muito importante que a consciência seja bem formada, com fundamento nos Dez Mandamentos e nos princípios da moral. Desse ponto de vista, quando se trata de um estado permanente, a consciência pode ser delicada, relaxada ou escrupulosa.

Consciência delicada, relaxada e escrupulosa

Quando a consciência é delicada, habitualmente pronuncia julgamentos relativamente fáceis e objetivamente acertados, mesmo diante de situações nas quais há apenas pequenos matizes para distinguir se é um bem ou um mal. Uma pessoa com consciência delicada procura conhecer seus defeitos e reconhecer suas pequenas quedas. Considera-os fraquezas, imperfeições, ou até mesmo pecado venial se for o caso, mas não os confunde com o pecado mortal. E trata de corrigir-se deles por amor a Deus. Ou seja, não consente em nada de pecaminoso, mesmo em matérias leves; e para permanecer fiel a Deus, foge sempre das ocasiões que poderiam ser danosas à sua vida espiritual. Alarma-se quando os pecados são reais, mas não com os puramente imaginários.

A consciência relaxada julga habitualmente, com base em motivos insuficientes, que uma coisa é permitida, embora na realidade ela seja pecaminosa; ou que algo é pecado venial, quando na realidade se trata de pecado mortal.

Pelo contrário, a consciência escrupulosa teme, por motivos fúteis e tortuosos, cometer um pecado em questões nas quais não há matéria de pecado. Ou então acredita estar cometendo um pecado mortal, quando a falta é apenas venial.

A essência do escrúpulo consiste menos num erro de julgamento do que num estado de inquietação. Seja por causa de sugestões da imaginação, de impressões muito vivas ou de movimentos da sensibilidade, o julgamento feito pela consciência escrupulosa acaba sendo deturpado. Quanto mais a pessoa tem uma sensibilidade muito viva, que a coloca num estado de ansiedade e a faz perder a paz de alma, tanto mais ela corre o risco de errar na apreciação do valor moral dos atos e de suas disposições interiores no momento agir.

O escrúpulo se manifesta por alguns sintomas muito característicos, mas que não precisam estar todos reunidos numa mesma pessoa.

Do escrúpulo ao desvario

O mais genérico desses sintomas é a incapacidade que a pessoa tem para chegar ao sentimento de certeza em questões de ordem moral, ou pelo menos em algumas áreas da moralidade. Essa insegurança a priva da paz e do contentamento interior, deixa-a com a sensação de mal-estar espiritual, gerando nela uma dúvida a respeito do conjunto de seu agir, de suas disposições íntimas ou de sua vida sobrenatural. Como isso concerne ao que ela considera seus interesses mais sagrados, a todo propósito ela vive torturada pelo temor de cometer pecado, e até pecado grave, mesmo em ações perfeitamente honestas ou moralmente indiferentes.

A angústia causada por esse temor obnubila a inteligência e produz tal desvario interior, que uma apreciação moral objetiva e sadia se torna quase impossível. Desse estado enfermiço resulta uma tendência a multiplicar as confissões, até mesmo de faltas já confessadas anteriormente. No tribunal da penitência a pessoa se perde em detalhes ou no relato de circunstâncias cujo conhecimento é inútil ao confessor. Não raras vezes, não se sentindo convencido pelas explicações do confessor ou diretor espiritual, o escrupuloso pede novas explicações. Por vezes vai consultar outras pessoas, com a ideia de que o confessor não o compreendeu, ou pelo menos fez uma avaliação muito benigna dos seus atos, do seu estado de alma. E pode acontecer que aos poucos se torne obstinado no seu próprio desvario. Por isso, São Francisco de Sales comentava que “os escrúpulos são filhos do orgulho mais refinado”.

Na maioria das vezes, o escrúpulo tem uma causa natural. Seja por falta de sadias recreações e de convívio com outras pessoas, seja por esgotamento físico ou psicológico temporário, seja ainda por uma disposição temperamental durável, tendente à melancolia. Também ocorre pela falta de conhecimentos religiosos ou de inteligência necessários para a solução prática de questões morais, o que pode conduzir a erro no julgamento. Por exemplo, quando não se sabe distinguir entre a impressão e o consentimento, entre a tentação e o pecado. Por vezes, influi nos escrupulosos um temor excessivo da justiça divina, sem o devido contrapeso da consideração da misericórdia de Deus.

Os escrúpulos podem também ter origem preternatural, já que o demônio pode agir sobre as faculdades sensitivas do homem. Em particular, pode agir sobre a imaginação, e assim sugerir temores que podem levar ao abatimento ou ao desespero; ou ainda provocar uma piedade falsa, baseada na atenção excessiva a minúcias e na fidelidade à letra, mas não ao espírito das regras da vida espiritual.

Oração e auxílio sobrenatural

Além dos efeitos malfazejos à saúde, os danos morais decorrentes do escrúpulo são nefastos. Figurando-se equivocadamente em estado de pecado grave, a pessoa corre o risco de perder a confiança em Deus e na virtude teologal da esperança; absorvida pelas dificuldades interiores, a oração se torna penosa; receber a Sagrada Comunhão pode tornar-se angustiante, pelo temor infundado de cometer um sacrilégio; finalmente, pode-se chegar ao abandono de todo esforço de santificação.

Como em todos os campos da vida espiritual, o principal remédio para o escrúpulo é a oração, pedindo a Deus com fervor, por meio de Maria Santíssima, as luzes sobrenaturais necessárias para ver com clareza e segurança, e assim poder retificar os julgamentos errados que a angústia inspira na alma.

O segundo grande remédio, recomendado por todos os mestres da vida espiritual, notadamente por Santo Afonso Maria de Ligório, é a obediência incondicional a um diretor espiritual prudente e douto, que saberá dar regras de conduta concisas e precisas.

Além disso, as pessoas escrupulosas devem guiar-se pelo axioma lex dubia, lex nulla — ou seja, uma lei ou regra duvidosa é nula. Portanto devem considerar sem efeito quaisquer leis, obrigações ou proibições duvidosas, bem como qualquer temor de pecar que seja motivado pela dúvida. Depois de uma tentação ou de uma ação, se a pessoa não tiver certeza absoluta de que consentiu na tentação ou de que cometeu um pecado, deve se comportar na prática como se não tivesse sucumbido, e portanto considerar-se na graça de Deus.

Outra regra prática muito valiosa para os escrupulosos é não repetir orações, atos de piedade e leituras espirituais, levados pela impressão de tê-los feito de modo distraído ou sem a reta intenção.

Os escrúpulos constituem um mal muito pernicioso para a vida espiritual, mas esse mal tem remédio. Além de serem observadas as sugestões que apresentamos, é necessário ter grande devoção a Nossa Senhora e confiar plenamente na sua proteção materna, na sua insondável misericórdia.

(Próxima página)