O IBAMA é muito alinhado com as ONGs, e aplica aos indígenas multas milionárias pelo que fizeram ou deixaram de fazer.
(continuação)
é muito pesada. Além disso há muitas ONGs nacionais e internacionais se imiscuindo no assunto. Os índios querem trabalhar e produzir, mas as ONGs não querem que eles se desenvolvam. O IBAMA é muito alinhado com as ONGs, e aplica aos indígenas multas milionárias pelo que fizeram ou deixaram de fazer. Eles foram então a Brasília tentar apoio parlamentar, ou mesmo do próprio Executivo, para negociar essas multas. Estão agora nesta batalha, para evitar que o problema se agrave ou se avolume mais.
Catolicismo — O senhor vem acompanhando o desenrolar dessas negociações? Há chances de os índios vencerem essa batalha que nos parece justa?
Dr. Ubiratan — O que vem ocorrendo é uma violência praticada contra os indígenas, pois as parcerias são um mecanismo que estava dando certo. Mas o Estado brasileiro entrou com a sua força quase onipotente e onipresente, e impôs essas multas para inviabilizar a iniciativa dos índios. Os parecis são muito aguerridos, têm elevada autoestima, e pretendem fazer esse projeto avançar. Decidiram trabalhar com os seus próprios maquinários, adquiridos ao longo dos anos. Podem encontrar dificuldades nesta iniciativa, mas acredito no espírito empreendedor deles. Acredito também nos índios caingangues, que estão trabalhando da mesma forma.
Catolicismo — Os caingangues são do Rio Grande do Sul e Santa Catarina?
Dr. Ubiratan — Exatamente. É importante que essas parcerias avancem, para que num futuro próximo eles possam até tocar suas próprias lavouras. Não me refiro só à cultura de soja ou monocultura, mas também a todo o sistema de desenvolvimento da produção deles, pois cada terra indígena possui os seus potenciais. Creio que essa multa do IBAMA seria imposta igualmente aos índios, mesmo se estivessem plantando trigo, arroz ou feijão, ou trabalhando em qualquer outra atividade agropecuária.
Catolicismo — O que os nossos governantes vêm fazendo — ou deixando de fazer — para dar autonomia aos índios?
Dr. Ubiratan — Não tivemos nenhum avanço nesse sentido, no governo Michel Temer. Pelo contrário, houve um retrocesso nesses processos judiciais. A FUNAI, por meio de sua procuradoria que pertence à AGU, tem entrado no polo ativo contra os indígenas. Assim a FUNAI deixa de defender os índios, quando a obrigação dela é defendê-los. Toda vez que o MPF entra com uma ação civil pública no judiciário, a FUNAI entra no polo ativo com ação contrária aos indígenas. A FUNAI está totalmente ideologizada.
Catolicismo — Mas não há ajuda financeira proveniente desses órgãos públicos?
Dr. Ubiratan — Nem ajuda financeira nem pessoas para fazerem avançar esses projetos indígenas em curso. Eu repito que o que vem existindo é retrocesso. Atribuo isso em grande parte à ideologização da FUNAI, o que considero um verdadeiro absurdo. Pode-se perceber nitidamente a proliferação de ONGs lá dentro. Ao contrário do que se pensa, elas estão lá justamente para travar o desenvolvimento dos índios. Ouso dizer mais: estão lá para travar o desenvolvimento do Brasil.
Catolicismo — O senhor poderia ilustrar um pouco mais sobre este ponto, para que o leitor entenda o paradoxo?
Dr. Ubiratan — Com muito gosto. Na FUNAI existe um setor chamado Coordenação Geral de Licenciamentos, que lida com os empreendimentos indígenas no Brasil inteiro nesse processo de desenvolvimento. Sabe quantos processos de licenciamentos existem ali parados? Mais de 3.000 processos. Envolvem empreendimentos que seguramente produziriam renda e qualidade de vida para os indígenas, e também para os brasileiros. Vou citar um desses milhares, porque ele é muito emblemático e já é conhecido. O “linhão” que liga Manaus a Boa Vista deveria levar energia para lá. E no futuro poderá trazer a energia que vier a ser produzida lá naquele estado do Norte. O projeto está travado há anos, por exigência descabida da FUNAI, pois os índios waimiri-atroaris não permitem que a rede passe sobre suas reservas. Como consequência, Roraima vem subsistindo com energia comprada da Venezuela. Há muitos apagões, pois a Venezuela é um país socialista falido, já a caminho do comunismo pleno. A legislação brasileira não pode admitir a paralisação de uma obra como essa, de interesse nacional.
Catolicismo — O que o senhor tem a nos dizer sobre o “marco temporal”? Qual a incidência dele na questão indígena atual?
Dr. Ubiratan — As terras da Raposa/Serra do Sol, em Roraima, eram exploradas por arrozeiros, e passaram a constituir mais uma imensa reserva indígena. Por ocasião do julgamento do caso, o STF impôs 19 condições judiciais a serem levadas em conta no caso de novas demarcações de terras para os índios. A principal delas é que as terras só poderão ser demarcadas se eram ocupadas por indígenas até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da nova Constituição. Se não havia presença indígena nessa data, a terra não poderá ser caracterizada como terra indígena. Mas a FUNAI quer incluir as terras tradicionalmente ocupadas, e isso nos remete para um passado longínquo, talvez de uns cinco séculos ou mais... pelo menos de Pedro Álvares Cabral para cá. A FUNAI quer levar isso adiante, a ferro e fogo, pois faz parte da ideologização que a domina. Outra condicionante determina que as obras de interesse nacional não podem ser sobrestadas por interesses indígenas. Os índios podem ser ouvidos, para influírem em questões como compensação por prejuízos decorrentes da aplicação dos projetos. Mas se a obra for legalmente viável, ela tem de ser feita, ainda que existam índios envolvidos no processo. Isso é uma coisa de que o Brasil precisa. Afinal, os índios são tão brasileiros como os outros, e se beneficiarão pelo processo de desenvolvimento.
Catolicismo — O senhor pode desenvolver mais essa questão das possibilidades e riquezas que esse desenvolvimento traria para os índios e para o Brasil?
Dr. Ubiratan — Claro, pois este é um ponto crucial. Nossa Constituição padece de muitas incongruências e inconsistências. Por exemplo, prescreve que o desenvolvimento das pessoas deve ser sem discriminação de