Plinio Maria Solimeo
O falso ecumenismo vem apresentando o fundador da heresia protestante com tintas cada vez mais amenas e simpáticas. Por exemplo, nas comemorações organizadas pelo Vaticano por ocasião dos 500 anos da revolta de Lutero. Os fatos históricos demonstram claramente que não lhe cabe essa benevolência.
Encontros ecumênicos repetem-se hoje ad nauseam, num clima festivo e de camaradagem, como entre amigos que têm muito em comum e nenhuma divergência. As graves e insolúveis divergências doutrinárias e litúrgicas entre católicos e luteranos são postas de lado, enquanto se ressaltam pequenos pontos secundários de afinidade que não justificam o todo. Para dor dos verdadeiros católicos, isso é promovido até pelas mais altas autoridades da Igreja [vide matéria em Catolicismo, dezembro/2017].
Essa absurda coexistência não leva em conta a realidade, que é muitíssimo diferente. Lutero, segundo os mais conspícuos historiadores, foi um homem depravado, desonesto, tanto do ponto de vista religioso quanto moral; mesmo estudiosos protestantes mais sérios reconhecem esses lados negativos.
Tentaremos mostrar resumidamente, com base em renomados teólogos e tratadistas católicos cujos estudos se apoiam nas próprias fontes luteranas, a verdadeira imagem desse agitador, artífice de uma das maiores revoluções religiosas que o gênero humano conheceu.
Martinho Lutero nasceu no dia 10 de novembro de 1483 em Eisleben, na Alemanha. Seu pai, Hans Luter, homem robusto e severo, de temperamento irascível e descontrolado, trabalhava nas minas de cobre e transmitiu suas características ao filho mais velho. Sua mãe, Margaret Ziegler, é descrita por Melanchton como conspícua por sua "modéstia, temor de Deus e oração".1
Em 1484 — "para escapar da pena ou ódio de homicídio" — Hans Luter foi obrigado a mudar-se para Mansfeld. Essa afirmação, que encontrou admissão na história e na tradição protestante, foi levantada por Georg Witzel (Wicelius, 1501-1573), sacerdote pervertido ao protestantismo, que voltou à verdadeira fé após estudar os Padres da Igreja.2
À força de muito trabalho, Hans Luter tornou-se pequeno empresário em Mansfeld. Mas não conseguia dominar a sua ferocidade, e um dia espancou o filho tão impiedosamente, que Martin fugiu de casa e ficou "amargurado contra o pai, que teve de me reconquistar para si". Outra vez a mãe, "por causa de uma noz insignificante, me bateu até o sangue fluir. Foi essa severidade da vida levada com os pais que me forçou a fugir para um mosteiro e tornar-me monge".3
Em Mansfeld, onde Lutero começou seus estudos, encontrou a mesma severidade. Numa manhã foi punido pelo menos quinze vezes.4 Tendo em vista a constante rebeldia que demonstrou ao longo da vida, pode-se aqui indagar se eram ou não justas as punições.
Frequentou depois a escola em Magdeburg e Eisenach. Em 1501, aos 18 anos, ingressou na Universidade de Erfurt. Pretendia estudar jurisprudência, como queria o pai; mas, como era costume na época, ingressou antes na Faculdade das Artes. Nesta predominava a tendência nominalista, segundo a qual o "universal" não existe como conceito abstrato, nem no mundo material nem no mundo das ideias. Segundo Leibniz (1646-1716), "os nominalistas acreditam que, além das substâncias singulares, só existem os nomes puros, e, portanto, eliminam a realidade das coisas abstratas e universais". Em 1505 Lutero foi promovido ao mestrado. Ocorreu então o fato que mudaria radicalmente sua vida: no dia 17 de julho desse ano ingressou no mosteiro agostiniano de Erfurt. Há muita divergência sobre os motivos que o levaram a abraçar o estado religioso. Segundo ele, foram as brutalidades da vida doméstica e escolar, como vimos. Entretanto, em carta escrita mais tarde ao pai, explica sua deserção da Igreja: "Quando fiquei aterrorizado e dominado pelo medo da morte iminente, fiz um voto involuntário e forçado".5 Kostlin-Kawerau, em sua Life of Luther (New York, 1911, I, 45), dá outra versão: "Voltando de sua casa para Mansfeld, Lutero foi surpreendido por uma terrível tempestade, com relâmpagos e raios alarmantes. Aterrorizado e oprimido, gritou: 'Socorro, Santa Ana, serei monge'". Esta é a versão mais corrente.6
Lutero fez um postulantado de apenas algumas semanas e o noviciado de um ano. Pronunciou os votos no final de 1506, e no ano seguinte foi ordenado sacerdote. "Seu estado de angústia durante a primeira Missa o impulsionava a fugir do altar".7
Nomeado professor de teologia, ensinou primeiramente em Erfurt; e depois, no inverno de 1508-09, na Universidade de Wittenberg, fundada em 1502. Como a cidade era pobre e insignificante, e a universidade nova, Lutero logo se destacou por "sua facilidade de palavra, bem como pelo seu caráter categórico e um não sei quê de hipnotizador que dele se desprendia".8
Lutero ensinava filosofia e dialética sem abandonar seus estudos teológicos. Em 9 de março de 1509, sob o decano Staupitz, tornou-se bacharel bíblico no curso teológico, um trampolim para o doutorado. Foi então chamado de volta a Erfurt no mesmo ano.
Lutero em Erfurt – Sir Joseph Noel Paton, 1861. Scottish National Gallery, Escócia.