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| VIDAS DE SANTOS | (continuação)

procurou um piedoso sacerdote como diretor espiritual e recorreu com frequência aos Sacramentos. Prostrava-se diante de um Crucifixo e suplicava: "Ó Jesus, não sejais um Juiz para mim, sede antes o meu Salvador". Ou, como Santo Agostinho: "Senhor, sede para mim verdadeiramente Jesus! Só Vós podeis ser meu Salvador".

Aos poucos foi controlando suas paixões, sobretudo a ira, pelo exercício da docilidade e da paciência. Adquiriu assim a verdadeira humildade e mansidão de coração, tornando-se o homem mais afável e pacífico de Veneza.

Para recompensá-lo por seu valor na defesa de Castelnuovo, o Senado da Rainha do Adriático (assim era conhecida Veneza) nomeou-o governador de Castelnuovo. Mas ele teve pouco tempo para exercer o cargo, pois necessitou tomar sobre si a tutela dos sobrinhos, que o repentino falecimento de seu irmão deixara órfãos. Tendo-lhes assegurado uma boa educação e um rendimento de acordo com sua alta categoria, ficou livre para cumprir o que havia prometido.

Jerônimo Emiliani já não era o mesmo. Renunciara a todos os cargos e às comodidades da vida, mesmo as mais legítimas, às belas roupas, e afligia seu corpo com jejuns e penitências extraordinários, passando longas horas em oração e empregando o tempo livre no socorro aos pobres e doentes.

Em 1528 uma grande carestia assolou a Itália, com fome geral. Todos os dias a morte ceifava inúmeras vítimas. Para socorrê-las, vendeu seus próprios móveis, transformando sua casa em hospital.

À fome sucedeu uma moléstia contagiosa, que multiplicou o número de vítimas. Jerônimo foi atingido tão fortemente, que chegou a receber os últimos Sacramentos. Mas pediu a Deus saúde para poder, por meio de uma penitência mais longa, reparar sua vida passada. Foi ouvido, e redobrou de zelo no amor a Deus e ao próximo.

Orfanato, obra precursora de uma família religiosa

A fome e a peste haviam deixado grande número de órfãos vagando pelas ruas, reduzidos à mendicidade e expostos aos piores vícios. Começou a recolhê-los em uma casa que comprara para esse fim. Procurou mestres a fim de ensinar-lhes alguns ofícios, e proveu sobretudo à saúde de suas almas. Fazia com eles as orações da manhã e da noite, levava-os para assistir à Missa diariamente, além de alternar o trabalho manual com momentos de silêncio, cântico de ladainhas e outras orações. Levava-os uma vez por mês à confissão. Nos dias de festa, vestidos de branco, iam visitar os principais santuários de Veneza, cantando ladainhas pelas ruas e praças. Toda a cidade via emocionada aquele que fora um cavaleiro tão brilhante, agora transformado em pai dos órfãos.

A caridade de Jerônimo Emiliani não se circunscreveu a Veneza, logo atingiu Bérgamo, Bréscia, Somasca e Como. Nesse tempo já havia recebido a ordenação sacerdotal, e a ele se haviam reunido mais dois santos sacerdotes, que também distribuíram aos pobres tudo o que possuíam, para abraçar a pobreza voluntária.

Congregação e Ordem de amparo à pobreza

Jerônimo pensou logo em fundar uma Congregação regular, a fim de dar mais estabilidade à sua obra. Escolheu Somasca, entre Milão e Bérgamo, para estabelecer a casa-mãe e o seminário. Daí veio o nome Clérigos Regulares de Somasca, pelo qual ficaram conhecidos. Escreveu os primeiros regulamentos, tomando como base a santa pobreza, a qual deveria se manifestar em todas as coisas, desde o hábito até o mobiliário da casa. Os alimentos mais requintados foram abolidos, e durante as refeições haveria leitura espiritual. Observariam o silêncio e as mortificações da regra. Empregariam parte da noite em oração. Durante o dia, se não estivessem atendendo os órfãos ou os doentes, deveriam entreter-se com algum trabalho manual. A finalidade principal dos Clérigos Regulares era a instrução das crianças e de jovens eclesiásticos.

Em Bérgamo, procurou também reconduzir ao bom caminho mulheres perdidas que ele havia convertido. Obteve o fechamento das casas que serviam para a sua libertinagem. Com o aumento do número das arrependidas, reuniu-as em uma casa especial, com uma regra de vida, para perseverarem nos bons propósitos.

A Congregação foi aprovada como Ordem religiosa pelo Papa Paulo III, grande amigo de Jerônimo. Esse Pontífice, juntamente com São Caetano de Tienne, era um de seus mais ardorosos defensores e benfeitores.

Vendo o bem que Jerônimo fazia, o Senado de Veneza ofereceu-lhe a direção do hospital dos incuráveis. Ele aceitou, pela oportunidade que se apresentava de dar assistência a muitos doentes terminais. Quando se via desprovido de recursos materiais para acudir a tantas iniciativas, escolhia quatro de seus orfãozinhos com menos de oito anos de idade, portanto mais inocentes, para fazerem violência ao Céu com suas orações.

Entrementes, a fama de santidade lhe granjeava muitos doadores e novos membros para sua Congregação.

Último ato de caridade numa epidemia

Embora contasse pouco mais de 55 anos, Jerônimo teve certa premonição de que seu fim estava próximo. Procurou então consolidar sua obra, visitando todas as casas da Ordem. Ia sempre a pé e tinha como único alimento pão e água.

Uma terrível peste afligiu Bérgamo, fazendo inúmeras vítimas. Para lá acorreu com o mesmo ardor de sempre. Contraiu a peste, e viu que seus dias estavam contados. Alegre, repetia com São Paulo: "Quero a morte, para viver com Cristo".

No dia 8 de fevereiro de 1537, tendo recebido os últimos Sacramentos, entregou sua alma a Deus, na idade de 56 anos.

Pio XI proclamou-o patrono universal dos meninos órfãos e abandonados. 

Fontes de referência:

Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, d'après le Père Giry, par Mgr Paul Guérin, Paris, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, 1882, tomo VIII, pp 528 a 534.

Pe. Jean Croisset, Año Cristiano, tradução para o castelhano do Pe. José Francisco de Isla, Madrid, Saturnino Calleja, 1901, tomo III, pp. 216, 217.

Fr. Justo Pérez de Urbel, O.S.B., Año Cristiano, Ediciones FAX, Madri, 1945, tomo III, pp. 159 a 162.

Edelvives, El Santo de cada Día, Editorial Luis Vives, S.A., Saragoça, 1948, tomo IV, pp 201 a 209.

D. Próspero Guéranger, El Año Liturgico, Editorial Aldecoa, Burgos, 1955, tomo IV, pp. 617 a 622.

São Jerônimo apresenta seus órfãos a Nossa Senhora. Igreja de Santa Maria da Visitação, em Veneza.

Santuário de São Jerônimo Emiliani em Somasca. Nele se encontram os restos mortais do Santo.

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