| PALAVRA DO SACERDOTE | (continuação)
dimentos à sua celebração, ou seja, circunstâncias verificadas anteriormente, e que, segundo o Direito Canônico, obstam a sua celebração. Esses obstáculos podem ser de direito divino, natural ou eclesiástico. Dependendo da sua gravidade, os impedimentos classificam-se, na doutrina canônica tradicional, em impedientes e dirimentes. Os impedientes representam um obstáculo; portanto tornam o casamento ilícito, mas não atingem sua validade. Quanto aos dirimentes, se não são respeitados, tornam o casamento ao mesmo tempo inválido e ilícito.
O Código Canônico vigente trata apenas dos impedimentos dirimentes que invalidam o matrimônio, como a consanguinidade próxima, o vínculo subsistente de um matrimônio anterior, as ordens sagradas, o voto público perpétuo em um instituto religioso, e ainda outros, como impotência, conjugicídio, rapto e parentesco legal; além disso o limite de idade, que é de 16 anos para o homem e 14 anos para a mulher, sendo que no Brasil os homens menores de 18 anos e as mulheres menores de 16 anos necessitam de licença do Bispo.
Alguns desses impedimentos não são dispensáveis por nenhuma autoridade, como a consanguinidade com ascendentes, descendentes ou irmãos, ou ainda a existência de um casamento válido. Outros podem ser dispensados, como o casamento entre primos irmãos, as ordens sagradas ou o voto público.
Entre os impedimentos que podem ser dispensados, sob certas condições muito estritas, encontra-se o chamado impedimento de disparidade de culto. Diz o atual Código de Direito Canônico: “É inválido o matrimônio entre duas pessoas, uma das quais tenha sido batizada na Igreja católica ou nela recebida e não a tenha abandonado por um ato formal, e outra não batizada” (cânon 1086 § 1).
O motivo desse impedimento é proteger a fé da parte católica que deseja contrair matrimônio, assim como garantir a futura educação católica dos filhos que venham a nascer desse casamento. De fato, pela união muito íntima entre pessoas casadas, a fé da parte católica pode ser continuamente corroída pelas convicções opostas da outra parte; será uma fé vivida em solitário, tendo no cônjuge não um apoio, mas um empecilho, pela profunda diferença de mentalidade e os condicionamentos culturais do cônjuge não católico. Basta mencionar as restrições alimentares ou jejuns dos muçulmanos, além das enormes diferenças de apreciação que os separarão diante dos grandes problemas da vida.
Mais grave ainda é o risco para a transmissão da fé e a perseverança dos filhos nela, sobretudo na idade em que são ainda muito influenciáveis. Na sua educação haverá discrepâncias em assuntos importantes como a moral, ou até no julgamento de situações ordinárias da vida. Ao comprovarem que os pais divergem, acabarão por cair num certo indiferentismo religioso e moral. A unidade familiar será também afetada pelas diferenças que separam os cônjuges em ocasiões importantes, como funerais e casamentos de conhecidos, ou festas religiosas como o Natal e a Semana Santa.
O matrimônio de católicos com não católicos sempre foi proibido, ou pelos menos coibido pela autoridade eclesiástica, sobretudo quando o perigo de apostasia for maior. No Império Romano cristianizado, os códigos de Justiniano e Teodósio proibiam aos cristãos contrair matrimônio com judeus. No século IV, o Código de Elvira proibia as moças católicas de desposarem pagãos, o que foi logo depois confirmado nos Concílios de Arles, Laodiceia e Hipona; e no século V pelo Concílio de Calcedônia. O IV Concílio de Toledo (em 633) ordenou aos católicos que tivessem contraído matrimônio com judeus a se separarem, no caso de o cônjuge não se converter. Aparentemente essas proibições afetavam a liceidade do casamento, mas não a sua validade. A partir da Summa Decretorum de Huguccio de Pisa (1130-1210) essa proibição se desdobra: de um lado, o impedimento de disparidade de culto, que estabelece a nulidade do matrimônio; de outro lado a proibição do matrimônio misto (entre um católico e um herege ou cismático), que o torna ilícito mas, de si, não o invalida.
O cânon 1124 do atual Código estabelece que o matrimônio de um católico com uma pessoa “pertencente a uma Igreja ou comunidade eclesial sem plena comunhão com a Igreja católica é proibido sem a licença expressa da autoridade competente”.
Mais claro e peremptório, o Código anterior estabelecia: “A Igreja proíbe severissimamente, em toda parte, que contraiam entre si matrimônio duas pessoas batizadas, uma delas católica e a outra filiada a uma seita herética ou cismática; e se há perigo de perversão do cônjuge ou da prole, também a mesma lei divina proíbe o casamento”.
Abrandaram-se igualmente (de modo muitíssimo imprudente, a meu ver) as exigências da Igreja para conceder a dispensa necessária para validar um matrimônio onde há disparidade de culto e tornar lícito um matrimônio misto.
No Código de 1917 exigia-se que o cônjuge não católico desse uma garantia por escrito de que não exporia o cônjuge católico ao perigo de perversão; que ambos garantissem que a prole seria batizada e educada somente na Religião Católica (cânon 1061); e lembrava ao cônjuge católico a sua obrigação de procurar, com prudência, a conversão do cônjuge não católico (cânon 1062).
No Código de 1983 exige-se apenas que “a parte católica declare estar disposta a evitar os perigos de abandonar a fé, e faça a promessa sincera de se esforçar para que todos os filhos venham a ser batizados e educados na Igreja católica”; e que conste que a outra parte ficou
O matrimônio de católicos com não católicos sempre foi proibido, ou pelos menos coibido pela autoridade eclesiástica, sobretudo quando o perigo de apostasia for maior.
O cânon 1124 do atual Código estabelece que o matrimônio de um católico com uma pessoa “pertencente a uma Igreja ou comunidade eclesial sem plena comunhão com a Igreja católica é proibido sem a licença expressa da autoridade competente”.