A sublimidade da Encarnação do Verbo de Deus no seio puríssimo de sua Mãe Santíssima e no seu contato alma-a-alma com seu Divino Filho, sendo Ela como que arquiteta e modeladora d’Ele.
Uma pessoa pode ter uma presença, um timbre de voz, um jogo de fisionomia muito agradáveis, pode dizer coisas muito interessantes e expressivas. Tudo isso são dons que a Providência Divina pode dar a alguém, que poderá utilizar esses dons para fazer um grande bem ou um grande mal.
Mas, para além de todos esses dons, há outro mais atraente: o timbre de voz pode ser uma ressonância da alma, e conversando-se com a pessoa sente-se a sua alma. Pode também acontecer o contrário, e o timbre de voz ser agradável, mas não nos permitir sentir a alma. Há cantores que possuem timbre de voz muito agradável, cantam com muita correção, mas não se sente a alma deles quando cantam. E o resultado é que o público, do ponto de vista meramente sonoro, tem uma impressão agradável, mas não vibra com os cantores, pois estes não comunicaram suas almas.
O mesmo se pode dizer de um orador. Ele pode ter um timbre de voz esplêndido, mas se é desses cuja alma mora num fundo pantanoso e longínquo de sua personalidade, não encontrará boa receptividade. Trata-se com ele, ouve-se, mas se tem a impressão de que ele não está interessando, pois não há contato humano nem verdadeira comunicação humana.
Há pessoas que não têm uma grande voz, uma grande estampa, mas a alma delas de algum modo se comunica, têm verve, graça, interesse. O furor delas faz estremecer os outros, a simpatia delas comove os outros. Quando se interessam pelo que o outro diz, os outros são levados a se interessar também, ainda que digam coisas pouco interessantes, pois o modo de elas dedilharem o assunto já desperta interesse. São pessoas que têm a alma mais à flor da pele, comunicam o que os outros sentem.
Nada há que fale mais da alma de uma pessoa do que seu olhar. Pode-se ter lindos olhos, mas isso não quer dizer que se tem um lindo olhar. E pode-se ter um lindo olhar, ainda que os olhos sejam feios, pois através da forma de olhar se comunica a beleza de alma. Pode-se ter olhos muito bonitos, mas se a alma está longe não há verdadeira beleza de comunicação.
A comunicação de alma é um dos dons mais preciosos que uma pessoa pode ter. É lamentável o tipo de gente inteiramente glacial e sem expressão.
Se é verdade que o maior atrativo que a pessoa pode ter é sua alma, o contato entre os puros espíritos, no caso os anjos, deve ser muito mais interessante que o contato entre homens. Nossa face revela a alma, é verdade, mas em certa medida pode também velá-la, pois o rosto tem a capacidade de revelar ou velar a personalidade. O auge do interessante, no convívio humano, seria a comunicação entre almas que se conhecessem, sentissem e entrassem em harmonia, mútua compreensão e simpatia.
Mais ainda seria entre anjos, espíritos que se comunicam com toda a sua pureza, limpidez, grandeza, majestade e força. Há nos anjos uma ação de presença tal, que muitos santos ou místicos que tiveram visão de anjos ficaram dois ou três dias fora da vida normal. Um anjo é uma obra-prima de Deus, e se a pessoa está em condições de ver um anjo, terá um gáudio santificante e intenso.
O quadro “Dama Azul” [foto ao lado], de Thomas Gainsborough (1727–1788), representa uma inglesa de meia idade, com cara passavelmente felina, vestida de azul. Uma mulher com tanta personalidade, que fiquei encantado ao ver a pintura. Merece um artigo intitulado “Conversando com a Dama Azul”, descrevendo as impressões que ela me causava.
Imagine um quadro de um anjo, melhor ainda de um arcanjo: o Arcanjo São Gabriel aparecendo a Nossa
Dama Azul – Thomas Gainsborough (1727–1788). Hermitage Museum, São Petersburgo, Rússia.
Anunciação – Francisco de Zurbarán (1598–1664). Philadelphia Museum of Art, EUA.