Foto: Nelson Barretto
Alvo da cobiça internacional desde o século XIX, a Amazônia vem sendo povoada por ONGs nos últimos 50 anos, e o cerco se intensifica. Trombeteia-se falsamente que ela é o "pulmão do mundo"; que está sendo desmatada e pegando fogo, transformando-se num deserto; que sem a floresta faltará chuva em outras regiões do País e do mundo, prejudicando a agricultura e o clima. Além disso, sob o pretexto de que o Brasil não tem condições de mantê-la, um falacioso plano pretende transferi-la para a tutela de uma governança internacional.
Nesse já preocupante panorama, causa ainda maior perplexidade nos fiéis católicos o Sínodo da Pan-Amazônia, a realizar-se em Roma nos dias 6 a 27 de outubro. Cerca de 250 bispos ali comparecerão, com o objetivo de operar mudanças jamais imaginadas na disciplina e estrutura da Igreja, produzindo inevitáveis reflexos na sociedade temporal. Seu Instrumentum laboris (instrumento de trabalho) maisparece uma obra de ONGs ambientalistas, e vem sendo contestado por importantes autoridades eclesiásticas. Para o renomado historiador cardeal Walter Brandmüller, o documento é "herético", "apóstata", além de constituir uma "intrusão agressiva ao Brasil"; e pede que os bispos o rejeitem.
Acompanhando atentamente o que diz a mídia sobre aspectos ecológicos e sobre as condições dos indígenas da Amazônia, pareceu-nos que os comentários e conclusões seguiam ponto por ponto uma espécie de cartilha divulgada em âmbito mundial: os mesmos conceitos, as mesmas tendências, a mesma linguagem eivada de pressupostos esquerdistas, muitas vezes sem base na realidade. E concluímos ser necessário alguém examinar de perto esse quadro, a fim de esclarecer em que medida ele reflete ou falseia a realidade. Antes de analisarmos as origens e consequências previsíveis do Sínodo da Pan-Amazônia, daremos uma descrição da realidade amazônica, vívida e vivida, que constatamos in loco.
Como seria atualmente a vida dos quase 20 milhões de habitantes da região? Quem percorreu aquele imenso território para examinar as suas condições de vida? Nas cidades para onde muitos índios estão afluindo, quem teve o cuidado de ouvi-los? Quem manifestou interesse em lhes conhecer os desejos, aspirações e realizações? Sem o apoio para progredirem nas suas aldeias, seriam os indígenas obrigados a viver da caça e pesca, sem vislumbrar alguma possibilidade de desenvolvimento?
Decidimos nós tomar a iniciativa de obter informações seguras sobre tudo isso, e foi o que fizemos ao longo dos últimos meses. Faremos aqui um relato da viagem com a qual procuramos conhecer os costumes e aspirações de algumas lideranças e povos indígenas. Os depoimentos falam por si, derrubando mitos fabricados por certas correntes eclesiásticas, ONGs e órgãos da mídia. Mostram uma realidade bem diferente daquela encenada por atores fantasiados de índios, articulando discursos de luta de raças.
Manaus — capital do Estado do Amazonas, cidade moderna com dois milhões de habitantes — está cercada de águas e florestas quase intactas. Eis aí, já no início da nossa viagem, uma constatação visual oposta à falácia de que estamos queimando a Amazônia. E o fato concreto é que 97% do Estado do Amazonas encontra-se preservado!
Andando pelas ruas, encontramos brasileiros indígenas dispersos no meio da população. No dia 19 de junho, na Assembleia Legislativa, participamos de um Seminário das populações mestiças. Após nossa palestra, cujo tema foi "Princesa Isabel, a Redentora – mito ou realidade", fomos procurados pela simpática índia Kaynä Munduruku [foto], 41 anos, conhecida jornalista e radialista. Ela ficara encantada com a história da Princesa Isabel, que infelizmente não é contada nos livros escolares.
Depois de gravarmos uma entrevista para a sua rádio Tribos do Norte, conversamos longamente e nos impressionamos com o relato da sua vida pessoal, um verdadeiro depoimento para a história. Ela descende de várias etnias, como Munduruku, Sateré-Mawé e Mura. Seus antepassados são originários do Pará, onde o povo está enraizado e mantendo muito viva a sua língua.
Como qualquer amazonense do interior, Kaynä não calcula as distâncias por quilômetros, mas por dias de viagem em barco; e a essa informação um tanto imprecisa acrescenta-se uma particularidade pitoresca: rio acima ou rio abaixo. Até os 14 anos, quando faleceu seu pai, ela habitava em plena selva, em local isolado num dos braços do Rio Madeira, município de Manicoré. A que distância? Três dias de barco até Manaus... rio abaixo.
Kaynä possui uma personalidade e capacidade de expressão fora do comum, a julgar pelo tempo de contato que tem com a cidade. Foi muito perseguida pela estrutura indigenista petista, mas não abre mão de sua independência. Gravou um vídeo num linguajar cauteloso e ponderado, mas também corajoso, em que faz uma denúncia contra a FUNAI e as ONGs indigenistas.
Ela mostra que a situação mudou para os povos indígenas. Eles estão despertando, querendo mais liberdade, e não aceitam que antropólogos e indigenistas "imponham a nossa identidade", pois "sabemos quem somos". Também as ONGs se meteram muito na questão indígena, fazendo com que milionários donos de ONGs, e os indígenas que se aliaram a eles, estejam muito bem de vida, enquanto os povos indígenas que realmente precisam estão na mais extrema miséria. Não têm nada, e muitos vivem como mendigos na rua, viciados em álcool.
Kaynä conclui: "O que precisa ser feito para os povos indígenas é dar-lhes oportunidade de trabalhar. Quem vai conseguir comprar suas coisas com uma bolsa família, ter uma vida boa e saudável? Não consegue. O índio precisa produzir. Não é preguiçoso, é capaz e tem uma inteligência grande. Sabe plantar, sabe produzir, só precisa de oportunidade. Com seu trabalho, os indígenas darão uma grande contribuição para a economia do Brasil".