Estávamos com passagem marcada de Manaus para Boa Vista, mas fomos obrigados a adiar a viagem devido ao mau tempo e estradas alagadas em Roraima. Entretanto, não poderíamos deixar fora desta reportagem um Estado tão paradigmático, no sentido de vítima desse malfadado tribalismo bafejado pelo clero de esquerda e ONGs internacionais. Decidimos então publicar as palavras muito atuais de Silvestre Leocádio [foto], transcritas de uma entrevista que fizemos com ele em 2015. Apesar dos quatro anos decorridos, suas declarações são mais atuais que nunca.
Silvestre Leocádio foi tuxaua (cacique), descendente de macuxi e igarikó. Foi muito solícito em nos falar sobre o que acontecia na Raposa/Serra do Sol, de onde fora obrigado a sair. Hoje septuagenário, vive em Boa Vista, mas criticou duramente a política do governo federal em relação aos índios, qualificando-a de trágica, sobretudo no que se refere à Raposa/Serra do Sol, com a demarcação de 1.750.000 hectares.
À época ele declarou que "era para os índios estarem muito bem, ganhando dinheiro e recebendo projetos do Governo. Mas o Governo Federal simplesmente abandonou a população indígena, e não foi só os da Raposa/Serra do Sol, foi em todo o Estado. Os ianomâmis estão ao 'leléu', andando pelas ruas de Boa Vista com vassouras no ombro, para trocar por um calção, por uma camisa, por vestidos para as mulheres deles. Cadê o Governo Federal? Demarcaram terras para os índios ou para as ONGs?"
Muito fluente, e indignado com o que vinha ocorrendo no seu Estado, Silvestre prosseguia num fôlego só: "Como índio, eu teria prazer em falar nesta entrevista que o índio está muito bem, está ganhando dinheiro, utiliza tecnologia, participa do progresso brasileiro, do progresso de Roraima. O que se passa é o contrário. Os índios estão abandonados. É triste ver os ianomâmis aí passando fome, passando necessidade, sem remédio e sem educação".
Perguntado pelo trabalho das ONGs junto aos índios, respondeu: "Eu não conheço vocês e vocês não me conhecem. Mas se pegarem um avião e forem a Santa Rosa ou Maracá, lá em cima, vão encontrar um grupo de americanos instalado com casa, rádio, televisão, tem de tudo. Eles estão lá, mas os brasileiros não podem se instalar lá. Há um grupo lá que se diz missionário".
Sobre os índios da Raposa/Serra do Sol, ele nos informou que estavam todos "pedindo educação, pedindo saúde, pedindo estrada, porque não têm estrada, não têm pontes, eu os vi fazendo essa reivindicação para a governadora daqui. E quem criou o problema foi o Governo Federal. Por que não se aperta as ONGs, os padres e os missionários? Lá dá de tudo! Se plantar, dá. Mas como é que o índio vai plantar, se não tem apoio? O índio está abandonado".
Silvestre citou exemplos do descaso em relação às reservas indígenas: "No município de Alto Alegre, nós temos 11 comunidades com terras demarcadas em ilhas, não tem nada dado pelo governo para que esse povo tenha dias melhores. Na Raposa/Serra do Sol, a maioria ficou sem nada. Os que têm alguma coisa estão vendendo para comprar arroz, açúcar, feijão, comprar tudo. Eu vejo eles aqui na cidade, até banana eles levam daqui. É triste!"
Em tom discursivo, Silvestre prosseguiu: "No Uiramutã, os marreteiros levam de tudo daqui para vender lá, peixe, galeto, e os índios são obrigados a pagar um preço absurdo. Aqui na capital já está tudo caro. Aí o marreteiro sai daqui para vender lá, e só pode vender caro mesmo, pois a situação está muito difícil para os índios".
Sobre o Conselho Indigenista de Roraima (CIR) — uma espécie de filial do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), órgão da CNBB — Silvestre disse que "o CIR sempre atuou, mas para desmoronar. Os cabeças estão todos empregados na Secretaria do Índio, com bons salários, e sempre viveram assim, sempre viveram por trás da população indígena, que fica lá sofrendo. O resto é que se dane".
Explicou-nos também que, embora a administração das reservas seja da competência da União, o Estado vinha se obrigando a preencher muitas lacunas. A Secretaria do Índio ajuda um aqui, outro lá, pois não dá para ajudar a todos.
Citou o exemplo da energia elétrica. Romero Jucá foi à TV para dizer que "a energia elétrica atingiu todo mundo em Roraima. Mas a 100 km daqui, onde eu morava, estão 19 famílias sem energia elétrica. Na Raposa/Serra do Sol não tem energia, só quem tem seu motor".
Silvestre nos falou da cachoeira na Raposa/Serra do Sol, onde se pode erguer uma hidrelétrica para abastecer Roraima e outros estados, até mesmo países. E reclama: "A luz de Roraima vem da Venezuela. Pode parecer que estou mentindo, mas vá lá para ver. Se fizer a hidrelétrica lá, vai ser a vida para as comunidades indígenas".
Índio de personalidade marcante, ele lamentou mais uma vez a saída dos arrozeiros e dos produtores da região, pois "o prejuízo para Roraima foi grande demais, só o Quartiero tinha 5.000 funcionários trabalhando na empresa dele. Ele foi embora, e essas 5.000 pessoas estão hoje quase todas desempregadas, o desemprego é grande aqui".
Silvestre lamentou: "É triste hoje os índios não poderem ter nada, lá eles querem os índios andando nus, pedindo as coisas. Eu discordo disso aí, na qualidade de indígena. Temos de acompanhar o progresso do Brasil e do mundo, temos de acompanhar o branco, o preto, temos de acompanhar a política brasileira, a política estrangeira, tudo nós temos de conhecer, se não para onde nós vamos? Trabalhei com os padres durante 20 anos, aprendi muita coisa, estudei, era para eu ter ido para a Itália, ter-me formado. Depois chegou um momento em que entendi que não estava fazendo o que queria, mas o que eles queriam. Aí fui para a SODIUR, tornei-me presidente dela e nos colocamos contra a demarcação da Raposa/Serra do Sol".
Silvestre ainda aludiu ao fato de que a FUNAI não o considerava como índio, por morar na cidade, portanto não tinha direitos: "minha mulher não tinha o direito ao 'salário maternidade', minha família não tinha direito de tirar o registro indígena, porque já estávamos na cidade. A discriminação é grande. Se eu não aprender como o branco procede, ele vai passar por cima de mim, e tenho de me defender. Se a FUNAI desse condições, hoje não estaríamos sendo tão discriminados".
Em 1977, na sua obra Tribalismo Indígena, ideal comuno-missionário para o Brasil no século XXI, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira denunciava os comuno-missionários:
Ouça-os que pregam o desmantelamento da família e da sociedade contemporânea, a extinção do pudor e a morte de toda a tradição cristã.
Ouça-os que acusam de tirano, opressor, sanguinário e ladrão o branco que aqui veio ter; que destratam os bandeirantes e missionários dos séculos idos; que nem sequer poupam com suas críticas a obra sagrada do grande Anchieta, cujo perfil moral quase sobre-humano alcançou junto aos indígenas tão magnífico êxito missionário; ouça-os conclamar a juventude dos seminários, dos conventos, do País inteiro, para esse "neocomunismo" tribal, que se ufana de mais comunista do que o próprio comunismo; considere esta coorte de demolidores utopistas, e em sua linha de vanguarda dois bispos, D. Pedro Casaldáliga e D. Tomás Balduíno.
E compreenda, por fim, que este é um perigo real para os índios, mas menos para eles do que para os civilizados. É, em última análise, uma investida de eclesiásticos contra a Igreja. E de civilizados contra a civilização.
O que é o pobre índio, em tudo isto? Mais uma vez, um pomo de discórdia, de lutas entre civilizados. Civilizados que querem conservar a civilização: alguns recristianizando-a; outros afundando-a nos erros que a agitam; e outros, ainda, tentando arrasá-la.
E, lido isto, o que fazer?
Resista, brasileiro, a menos que tenha morrido em sua alma a fibra do cristão e do desbravador de outros tempos.
Que a Divina Providência, pela intercessão de Nossa Senhora Aparecida, nos reconduza nas vias da Civilização Cristã, nesta Terra de Santa Cruz.