| VIDAS DE SANTOS |

São Domingos de Gusmão

Luminar da ortodoxia, coluna da Igreja, flagelo das heresias, fundador da aguerrida Ordem dominicana

Plinio Maria Solimeo

São Domingos de Gusmão nasceu em Caleruega, Castela a Velha (Espanha), em 24 de junho de 1170. De ilustre estirpe, seus pais Félix de Gusmão e Joana de Aza geraram uma família de santos. Além de Domingos, os dois outros filhos do casal morreram em odor de santidade. O primeiro foi Antônio de Gusmão, que distribuiu todos os seus bens aos pobres, tornou-se sacerdote e se retirou a um hospital para servir Nosso Senhor Jesus Cristo em seus membros sofredores. Manes, o segundo, ingressou na Ordem dominicana, da qual se tornou grande pregador e exemplar religioso. Foi beatificado, juntamente com sua mãe, por Gregório XVI.

Não admira que numa tal família Domingos se sentisse desde o berço atraído para a virtude. Segundo a tradição, antes de ele nascer sua mãe fez uma novena no santuário de São Domingos de Silos, e no sétimo dia o santo abade lhe apareceu rodeado de glória para lhe anunciar que o filho que trazia no ventre seria a luz do mundo e a consolação de toda a Igreja. Pouco depois ela viu em sonhos que dava à luz um pequeno com uma tocha na boca, com a qual começou a incendiar o mundo.

São Domingos de Gusmão – Claudio Coello (1642–1693). Museu do Prado, Madri.

Maturidade precoce, exemplo de virtude

Domingos possuía precocemente na infância a sabedoria dos anciãos. Sempre foi sério, maduro, modesto, recolhido, humilde, devoto, temperante e obediente. Aos sete anos foi aprender as primeiras letras com seu tio, que era arcipreste em Gumiel d’Yzan, e aos catorze ingressou na universidade de Castela, em Palência. Durante 10 anos brilhou nos bancos escolares e deu exemplo de virtude.

Seu primeiro biógrafo afirma: “As verdades que ele compreendia, graças à facilidade de seu espírito, regava-as com o orvalho dos afetos piedosos, para que germinassem os frutos da salvação. Como um silo, sua memória se enchia da abundância das riquezas divinas, e suas ações exprimiam no exterior o tesouro sagrado que enchia seu peito”.1

Os pobres, órfãos e viúvas encontravam nele amparo e auxílio. Acorriam às suas luzes os sacerdotes com dificuldades em teologia, casos de consciência ou pontos da Escritura. Nessa época ele dava lições públicas de Sagrada Escritura na Universidade de Palência.

Dedicação heroica à salvação das almas

Tendo o bispo de Osma reformado sua diocese, convidou os cônegos da catedral a viverem em comunidade, observando a regra de Santo Agostinho. Convidou também Domingos a se mudar para lá e vestir o hábito de cônego regular. Pouco depois o nomeou vice-prior dos cônegos, que era o mais alto posto, porque o prior era o próprio bispo, cargo que acumulava com seu múnus episcopal. Domingos passou assim nove anos numa vida de contemplação e união com Deus, raramente ultrapassando os limites da casa canonical. Estremecia-se, contudo, ao saber que tantos se perdiam por falta de pregadores, e implorava a Nosso Senhor que lhe desse um meio de se consagrar por inteiro à salvação das almas. E foi ouvido:

“Já tinha trinta e três anos, e terminara sua formação física, intelectual e moral. Sem ele dar-se conta, Deus vinha temperando sua natureza heroica com um caráter essencialmente combativo: possuía ampla educação eclesiástica e universitária; a cátedra deu solidez a seus conhecimentos; a vida regular do cabido o iniciou nas vias da perfeição religiosa; e seu cargo à frente dos cônegos abriu-lhe as perspectivas da administração temporal e do regime das almas”.2 Estava pronto para a grande odisseia espiritual de sua vida.

Heresia albigense incentivou o zelo apostólico

A prova do fogo: os livros dos hereges pegam fogo, mas os de São Domingos voam, sendo preservados (Quadro de Pedro Berruguete, séc. XV - Museu do Prado).

No ano 1203, o rei de Castela Afonso VIII pediu ao novo bispo de Osma, D. Diego de Acevedo, que fosse à corte da Dinamarca para negociar o casamento de um dos príncipes com uma princesa dinamarquesa, cuja formosura havia sido celebrada na corte pelos trovadores. Com ele iria Domingos de Gusmão. Era um longo caminho. Deviam atravessar os Pireneus e entrar no sul da França, passando por Toulouse, então capital dos hereges cátaros, uma seita maniqueísta que estava fazendo muitos prosélitos, inclusive atraindo os condes de Toulouse.

A vista dessa região devastada pela heresia impressionou sensivelmente os dois viajantes. Como diz um dos biógrafos de Domingos, ele sentia o cheiro dos inimigos da Fé, do mesmo modo como Santa Catarina de Siena sentia o dos pecadores. Foi aí que Domingos se deu conta da necessidade de uma congregação de pregadores apostólicos para opor-se às heresias.

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