| DISCERNINDO |
Paulo Henrique Américo de Araújo
Um jovem de boa aparência coloca-se tranquilamente diante do microfone. Educado e respeitoso, apresenta-se para um debate no programa “Unbelievable” (Inacreditável), veiculado por uma emissora de rádio na Inglaterra.1 Alex O’Connor (este é o nome do rapaz) transmite impressão favorável a quem, como nós católicos, gostaria de ver e admirar um jovem de bons princípios. Mas logo se desvanece tal primeira impressão quando ouvimos Alex expor seus pensamentos, pois ele se autoproclama cético. Não um cético qualquer, mas cético radical. E o título dado por ele à sua página na internet e ao seu canal no Youtube não deixa dúvidas: Cosmic Skeptic: question everything (Cético Cósmico: questione tudo).
Alex está cursando graduação em filosofia e teologia na conceituada Universidade de Oxford. Além desta credencial, talvez sua jovialidade e aparente segurança discursiva explique o porquê de sua fama nos ambientes ingleses e americanos embrenhados no ceticismo e ateísmo.2 Não quero parecer injusto, pois de fato ele demonstra capacidade intelectual invulgar na sua idade, daí o número de jovens atraídos por seu discurso.
Em termos gerais, o ceticismo é uma doutrina filosófica que nega a capacidade do intelecto humano de conhecer qualquer certeza.3 Tendo tal doutrina como pressuposto, no seu programa de rádio Alex argumenta contra a existência de Deus. Seu opositor é Frank Turek, polemista protestante, conhecido nos meios apologéticos norte-americanos, autor de livros provocativos como “Eu não tenho suficiente fé para ser ateu”.
A discussão gira em torno da pergunta: será Deus o fundamento dos preceitos morais objetivos? Frank Turek, debatedor experiente, discorre sobre o assunto com desenvoltura e firmeza. Apesar de protestante, recorre a argumentos da apologética católica tradicional. Infelizmente, logo o diálogo mergulha em digressões sobre ontologia, epistemologia e semântica. Poupo ao leitor outras referências a assuntos tão superespecializados, mas Alex recorre a eles frequentemente, como escapatórias diante de certas dificuldades.
O mais interessante para atrair o ouvinte é que Frank Turek consegue evidenciar os dilemas e incoerências insanáveis da posição de Alex, e nessas ocasiões o rapaz titubeia, vacila, arrastando-se no terreno pantanoso e movediço da falta de certezas. Convicto da sua “falta de convicção”, ele repete muitas vezes contestações como “não necessariamente”, “não tenho certeza disso”. Um exagero didático, muito cômodo para quem “duvida de tudo”, é citar a si mesmo como autoridade: “De acordo comigo...”!
No fim do debate, o ouvinte dotado de bom senso se convence de que, independente das veleidades humanas, só pode haver moral objetiva se existe Deus para fundamentá-la. Caso contrário, qualquer desejo subjetivista justificaria as loucas atrocidades praticadas por Hitler, Stalin ou Mao Tsé-Tung.
Essa conclusão é óbvia, repito, para pessoas de bom senso. Mas a maioria dos seguidores de Alex O’Connor pertence àquela gama de espíritos incoerentes, ansiosos de não serem responsabilizados por seus atos diante de um Divino Juiz. Pois a consequência lógica de admitir uma moral objetiva é que se tem a obrigação de prestar contas ao Divino Autor e garantidor dessa moral. Disso o cético procura fugir a todo custo e agarra-se a qualquer solução, por mais pobre que seja. Para esses, Alex fornece saídas tranquilizadoras, pseudo-racionais.
A consequência lógica do raciocínio sem fundamentos4 é um mundo igualmente sem fundamentos, autodestrutivo por si mesmo. Sem convicções, nada de seguro, elevado e sublime se constrói. Nenhuma instituição ou civilização pode perdurar sem bases sólidas. Caso o ceticismo triunfasse, chegaríamos ao fim da História.
No Brasil, não me consta que haja celebridades do ceticismo, como o jovem inglês. Apesar da falta de notoriedade (e talvez à procura dela), alguns resolveram recentemente levantar a voz para alcançar o público brasileiro.
Em artigo publicado pela “Folha de S. Paulo” em 10 de setembro de 2020, Contardo Calligaris confessa sua inclinação ao ceticismo: “Somos condenados a sermos liderados por fanáticos incultos?”. Nas entrelinhas, muitas semelhanças com a mentalidade de Alex O’Connor: vacilações, irresponsabilidades e a consequente ruína da civilização.
Em resumo, Calligaris usa a narrativa da queda do Império Romano do Ocidente (século V d.C.) para fazer uma espécie de alerta sobre o grande erro — segundo ele — de sermos governados atualmente por pessoas convictas de suas ideias. Para ele, o perigo são os fanáticos “incultos, analfabetos funcionais ou, no mínimo, leitores de um livro só”. Obviamente, o alvo aqui são os cristãos.
Ainda segundo o autor, uma minoria de “cristãos fanáticos e incultos” assumiu o poder no Império Romano e provocou a queda da outrora grandiosa Roma dos Césares. Do mesmo modo, a “minoria fanática” de hoje — leia-se o movimento conservador — galgou o poder nos últimos anos no Brasil, e assim vai preparando a derrocada da nossa cultura.
Sem entrar em todos os pormenores do artigo, apenas desejo apontar as vacilações e incongruências do autor. Antes de tudo, demonstra uma ignorância histórica imperdoável. Roma se tornou grande exatamente em razão das convicções e certezas de seus habitantes. A noção da Pax Romana impregnava a mentalidade dos romanos. Eles estavam certos de que levariam o bem-estar aos povos sujeitos à sua administração, e com tal convicção forjou-se a grandeza de Roma. Pouco importa se alguém está de acordo ou não com essa política, o fato é que os romanos se mostraram coerentes com ela.
Ora, a queda do Império se deveu justamente ao fato de os “céticos cultos”, “gozadores da vida” (para usar